Impasse escrita por Paulinha Almeida


Capítulo 21
Capítulo 20




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/659984/chapter/21

Acordei no sábado deitado de bruços, como normalmente eu acordava, e Ginny enroscada em mim. Me virei com cuidado para não acordá-la e fiquei de frente para ela, aproveitei sua perna sobre mim e levei minha mão até sua coxa, onde fiz carinho enquanto a olhava dormir. A expressão tranquila que ela tinha não demonstrava que ali dentro estava a resposta para todas as dúvidas que eu tinha agora e para as quais eu estava ansioso desde a noite anterior.

Apenas um pouco da luz da manhã entrava no quarto, mas era suficiente para eu ver seu cabelo bagunçado, a expressão relaxada e seus seios a mostra pelo edredom deslocado. Levantei um pouco a coberta e olhei o resto antes de puxar e cobri-la por inteiro, Ginny tinha dormido nua e era uma visão e tanto. Quando voltei minha mão para sua perna e a deslizei até próximo ao quadril ela deixou escapar uma risada baixa.

—Qual é a graça? - Perguntei voltando meu olhar para seu rosto e a vi ainda de olhos fechados.

—Quero espiar também. - Respondeu com sua voz típica de sono, um pouco manhosa e mais lenta que o normal.

Constatei com um sorriso que até disso eu estava com saudade.

Sem abrir os olhos ela se arrastou pelo espaço entre nós e encostou o rosto no meu peito, se aninhando ali e dando sinais de que ainda não considerava ser a hora de levantar. Subi minha mão para seu cabelo e o alisei, aproveitando o cheiro do seu shampoo e a sensação de intimidade do momento.

—Dormiu bem? - Perguntei sem interromper meu carinho.

—Muito bem, e você?

—Melhor impossível. - A senti rindo encostada ao meu peito quando respondi.

Ficamos alguns minutos em um silêncio confortável, e então o quebrei novamente:

—Está com fome?

—Estou. - Confirmou esfregando os olhos e se espreguiçando.

Fiz o mesmo que ela e me desvencilhei do seu abraço antes de jogar a coberta para o lado e me levantar. Vesti outra vez minha cueca, calcei o chinelo que estava ali por perto e joguei o resto das roupas para cima da cama para que ela as alcançasse. Seu olhar me acompanhou em todos os movimentos, e eu a informei antes de sair do quarto:

—Vou ver algo para nós comermos.

—Obrigada. - Agradeceu sorrindo antes que eu saísse.

Passei no banheiro tempo suficiente para ficar mais apresentável e segui para a cozinha a fim de preparar algumas das panquecas que Ginny gostava bastante. No lugar da ansiedade e nervosismo da noite anterior agora eu sentia uma leveza quase completa que estampou um sorriso bobo no meu rosto durante todo o tempo em que eu fiquei sozinho no cômodo.

Sexo não era o único tipo de relacionamento que eu queria com minha melhor amiga, mas eu não discordava de que era uma ótima maneira de começar um. Eu queria perguntar algumas coisas a ela, como por exemplo o que ela estava pensando agora e o que tinha na cabeça quando decidiu cochilar na escada do meu prédio. Lembrar disso me fez rir e admirá-la um pouco mais, porque eu reconhecia que uma dose muito grande de coragem seria necessária para aparecer sem nenhuma garantia e ainda assim disposta a se abrir.

—Qual é a graça? - Imitou minha pergunta e eu me virei na direção de sua voz.

Encostada no batente da porta com os braços cruzados e os cabelos já mais arrumados, usando apenas minha camiseta e calcinha, descalça e me olhando casual e confortavelmente como se já estivesse parada ali há um tempo. Era uma visão que eu não me importaria de ter muito mais vezes.

—Você é a graça. - Respondi no mesmo tom e me virei novamente para a frigideira à minha frente.

—Graça bom ou graça ruim? - Questionou e eu senti quando ela andou em minha direção e se encostou na pia ao meu lado, ainda na mesma pose, mas de frente e mais próxima de mim agora.

—Graça muito bom. - Esclareci e ela mordeu o lábio para conter outro sorriso. - Panquecas e café está bom ou quer algo mais?

—Está ótimo, obrigada.

Voltei minha atenção ao que estava fazendo e senti seus olhos me estudando por um tempo. Ao contrário de ficar sem graça, achei aquilo muito confortável. Ela suspirou após sua observação silenciosa e comentou:

—Lindo, só de cueca e cozinhando para mim. Já te falei que você é muito sexy?

Eu ri com o elogio e não disfarcei ao passear meus olhos por ela também. Tirei a última panqueca do fogo e o apaguei, então a olhei de novo e comentei no mesmo tom sério, mas claramente fazendo piada:

—É, você se esforça.

Ela riu com vontade e eu a acompanhei, tirando com isso qualquer possibilidade de credibilidade que minha afirmação pudesse ter.

Levei o prato para a pequena mesa no canto da sala e ele me acompanhou trazendo duas canecas cheias. Nos acomodamos um de frente para o outro e por algum tempo ninguém falou nada, apenas comemos em um silêncio agradável, mas não natural. A ideia de conversar me parecia mais aterrorizante no dia anterior, quando eu não sabia o que esperar, mas de qualquer forma eu ainda me sentia ansioso para saber o que ela tinha a dizer.

—Então, você queria conversar. - Puxei o assunto e Ginny respirou fundo antes de se encostar na cadeira e me olhar.

—Sim, eu queria. - Confirmou e eu notei que ela não sabia por onde começar.

—Comece me contando tudo o que aconteceu nesses meses, deve haver alguma novidade. - Sugeri e ela me olhou entre divertida e agradecida.

—Na verdade não aconteceu quase nada. - Deu de ombros ao dizer isso, indicando que não tinha muita importância. - Saí pouco, na maioria das vezes com a Luna, terminei aquela série que você me indicou e o final é horrível. - Eu ri com esse comentário e ele me acompanhou. - Continuei procurando emprego e continuei não encontrando. E você? Aposto que tem muito mais coisas para contar.

Pousei minha caneca na mesa e também me acomodei melhor antes de começar a dizer:

—Cheguei aqui meio perdido, o primeiro dia de trabalho foi um pouco estranho, no começo não fiz muita coisa além de resolver as pendências da mudança, foi bem chato. - Dei de ombros e fiz uma pausa rápida, ela apoiou os cotovelos na mesa e se acomodou atenta a mim. - Melhorou depois que conheci a Amy, ela sai bastante e eu acabo acompanhando, assim tenho me divertido um pouco no final de semana.

—Amy é a garota que chegou com você ontem? - Perguntou com esforço para soar casual, desinteressada.

Achei graça disso, mas não ri e me limitei a responder apenas o que ela queria saber.

—Sim, ela mesma. - Seus olhos traíam que ela não gostava daquilo, mas não me disse nada então continuei. - Fui para casa duas vezes só, mas meus pais e Ron vieram para cá em alguns dos finais de semana. Fora isso, o que mais fiz foi trabalhar.

—E você está gostando?

—Bastante, agora já faço implantações completas. - Ela me olhou animada e com interesse, como sempre quando eu falava sobre meu trabalho. - Estou trabalhando no lançamento de um condomínio, todo o projeto é meu. A responsabilidade e a cobrança são grandes, mas acho que estou me dando bem.

—Tenho certeza de que sim. - Falou com sinceridade e eu sorri em agradecimento. - Você acha que estão satisfeitos por terem te trazido para cá?

—Acho que sim, os outros dois projetos que entreguei foram muito bem aceitos.

—Esse já é seu terceiro projeto? Em só isso de tempo? - Perguntou impressionada e eu assenti. - Quão muito você tem trabalhado, Harry?

Dei de ombros antes de falar, indicando que eu não achava nada demais.

—Eu chego em casa sozinho, ninguém para conversar, nada para fazer, então para que me apressar? Tenho trabalhado até mais tarde com frequência, mas sinceramente prefiro assim, pelo menos tenho em que me ocupar. - Expliquei e ela assentiu.

—Espero pelo menos que você esteja se cuidando.

—Eu estou sim, não precisa se preocupar. - A tranquilizei, satisfeito com sua preocupação.

Quando terminamos esse assunto o silêncio se instaurou por um tempo, mas ao contrário do dia anterior não ficamos constrangidos. Vi que ela estava escolhendo o que dizer, então fiquei quieto e esperei.

—Eu senti bastante a sua falta. - Confessou me olhando e esperando que eu dissesse alguma coisa.

—Minha falta de que jeito? - Perguntar isso fez meu estômago se agitar.

—De todos, mas principalmente da sua presença. - Explicou e eu entendi, porque me sentia exatamente da mesma forma. - Antes de vir para cá você já tinha reparado quão próximos nós éramos?

Eu ri e ela me acompanhou, porque nos últimos meses já tinha pensado muitas vezes sobre essa mesma questão.

—Olhando hoje não parece muito coisa de apenas amigos, não é? - Contei minha conclusão e ela confirmou mordendo o lábio. - Também senti demais a sua falta.

—De que jeito? - Repetiu minha pergunta.

—De tudo em você. - Resumi e ela sorriu feliz com a minha resposta. - Mas principalmente de conversar com você no começo, quando tudo era novidade. Teria sido mais fácil me adaptar se eu tivesse como conversar com alguém como a gente conversava, sem se importar com o que vai ser dito e fazendo graça de tudo.

—E eu morria de vontade de perguntar como estava sendo.

—Mas nunca perguntou. - Afirmei e ela assumiu com um aceno. - Orgulhosa. - Acusei e nós rimos.

—Senti muita falta das suas panquecas também. - Comentou pegando o último pedaço e colocando na boca, me fazendo rir.

—Senti falta do seu perfume no banco do meu carro e impregnado no cinto de segurança.

Ela abriu um sorriso enorme para minha afirmação antes de dizer a sua próxima.

—Senti falta de te abraçar

—De te ligar. - Acrescentei e ela concordou sorrindo.

—De deitar com você pra assistir qualquer coisa, de almoçar com você no meio da semana. - Completou me olhando e eu não consegui me manter sério, assumindo que gostei do que ouvi.

Confirmei que ela não diria mais nada antes de escolher as palavras certas para minha próxima pergunta:

—Aquele dia em que conversamos na sua casa, você sabe, antes de eu vir embora. - Comecei e ela assentiu. - Você me disse que era desde sempre, sim, mas que eu não estava nem aí. Como você conviveu tão bem com isso? Era fácil para você deixar de lado? Doía quando eu estava com alguém, Gin? Não consegui parar de pensar na sua expressão magoada quando falou, porque eu realmente não me toquei, mas hoje sabendo como é ruim não ser correspondido eu odiaria saber que te fiz isso por tanto tempo.

Ela mordeu o lábio e olhou para baixo antes de responder, indicando que aquele não era seu assunto preferido:

—Eu aprendi a lidar. - Disse simplesmente, como se fosse fácil, e respirou fundo antes de continuar. - No começo era ruim, a primeira vez que te vi com alguém, ou que te ouvi falar sobre alguém com o Ron, foi bem ruim. Quando paramos de nos ver todos os dias melhorou, mas aí comecei a faculdade e foi pior que antes. Depois eu me acostumei, deixei de lado.

Ela parou de falar por um tempo, pensativa, e eu esperei que continuasse. Por um lado eu ficava feliz por ela ter lidado bem com a situação, por outro não gostei de saber que ela conseguia me deixar de lado porque eu com certeza eu não conseguiria fazer o mesmo que ela agora.

—Eu gostava tanto de você, Harry, que te ter por perto já era muito bom. - Explicou simplesmente, mostrando que era tudo o que eu ofereci por muito tempo, e me doeu ouvir aquilo e saber que eu causei. - Não pense que eu fiquei me martirizando, chorando por isso, eu não fiquei. Eu realmente estava bem, até você bagunçar tudo de novo.

Ela riu um pouco para descontrair e eu acompanhei, mas nenhum dos dois estava realmente achando graça.

—Desde quando você sente isso por mim? - Questionei outra coisa que estava me deixando em dúvida.

—Sinceramente, eu não sei. Desde criança, desde sempre. Eu queria que você fosse meu primeiro namorado, meu primeiro beijo, meu primeiro cara.

Eu me surpreendi com como ela se mantinha calma ao falar dos próprios sentimentos tão friamente, como se estivesse contando o que se passa com outra pessoa. Enquanto sua expressão dizia que ela sentia, claro, tudo o que estava dizendo, mas não transmitia nenhum embaraço ou hesitação, nem a minha voz era a mesma mais enquanto ela contava tranquilamente a tudo o que eu não correspondi.

—E você, desde quando? Desde que fizemos sexo? - Perguntou no mesmo tom.

—Não necessariamente. - Pensei por um momento sobre nem eu mesmo saber quando exatamente, e me decidi por ser o mais sincero possível. - No dia seguinte àquele tudo o que eu conseguia pensar era que tinha sido ótimo, mas que não poderia de jeito nenhum estragar nossa relação.

—Acho que não deu certo. - Ela brincou e eu ri um pouco.

—Tudo foi sempre tão perfeito desde que começamos a nos ver todos os dias, conversar e sair com frequência, Ginny, que eu só tinha certeza de que precisava que você estivesse por perto. E o que todo mundo diz sobre amizades coloridas? - Questionei e ela assentiu, concordando. - Eu não queria estragar aquilo, mas então tudo ficou normal, você não ligou, nada mudou e eu fui percebendo que a gente poderia ter os dois. Lembra na casa da Luna, quando você me pediu uma massagem? - Ela assentiu e eu prossegui. - Acho que você estava brincando, mas eu teria ido com você para outro lugar na hora.

Ela riu da minha afirmação e eu a acompanhei.

—Eu morri de ciúmes do Colin, você não imagina o quanto.

Ginny deu uma risadinha sarcástica quando eu disse isso, e eu entendi que ela imaginava sim, talvez melhor do que eu.

—Eu não sei dizer desde quando. - Afirmei por fim, olhando dentro dos seus olhos com a mesma intensidade que ela olhava nos meus. - Na verdade eu acho que estava aqui há muito tempo porque eu gostava tanto de você por perto, tinha algumas manias suas que eu odiava em qualquer outra pessoa e adorava em você, eu nunca me importava em trocar o que quer que fosse pra ficar com você. Eu acho que só não sabia dizer o que era. - Assumi por fim, explicando toda a conclusão dos meus últimos meses de auto avaliação.

—Você não imagina quanto eu quis ouvir isso de você. A Ginny adolescente teria entrado em transe. - Comentou divertida.

—E como a Ginny de hoje de sente?

—Muito mais racional, com certeza. Prova disso é que nem estou chorando.

Nós rimos da sua piada e eu fiquei sem saber ao certo o que ela quis dizer com isso.

—Tenho que te contar uma coisa. - Ela anunciou um pouco apreensiva, e eu senti a desconfortável sensação do meu estômago despencar com a expectativa. - Eu aceitei, a proposta do meu pai de abrir um consultório para mim.

—Absorvi a informação ponderando sobre o que aquilo significava. Antes que eu me manifestasse ela continuou:

—Era isso o que eu estava fazendo aqui ontem, e também na semana passada e duas semanas atrás. Assinando a licença de funcionamento, resolvendo a questão do advogado que saiu da sala comercial para eu ocupar. Agora está tudo certo, começo em três semanas.

Levei um minuto para assimilar que o que nós dois supostamente considerávamos nosso problema na última conversa já não existiria, que era a distancia entre nós. Se Ginny trabalharia aqui, nós estaríamos a uma distância perfeita um do outro, porque eu duvidava que ela continuaria morando em nossa cidade tendo que viajar todos os dias.

—Você veio para cá antes mais vezes? - Perguntei e ela assentiu. - E por que não veio aqui antes? Por que só me contou agora?

—Porque é minha carreira, Harry, e essa é minha prioridade. Eu não queria correr o risco de desistir ou repensar porque as coisas poderiam não se resolver com você. - Começou a se explicar e continuou quando viu que eu não ia dizer nada. - Eu vou me mudar para cá porque profissionalmente vai ser bom para mim, e seria perfeito se também conseguíssemos nos acertar, mas não é por sua causa.

Se pensar calmamente, Ginny não disse nada além do que tinha me aconselhado a fazer: priorizar minha carreira ao invés dela. Ainda assim, me chateou ouvi-la dizer que eu era só o bônus, e não a principal motivação.

Eu não soube o que dizer de imediato, então me levantei e comecei a tirar as coisas da mesa para pensar um pouco. Quando apanhei o prato e me levantei ela fez o mesmo e me acompanhou levando nossas canecas. Ela foi à frente, deixou as coisas que carregava dentro da pia e deu licença para que eu fizesse o mesmo. Deixei o prato na lateral e me virei para ela, encostando na pedra atrás de mim.

Ginny estava encostada no armário em frente, os braços cruzados sobre o peito. Algumas pessoas achariam estranho estarmos tendo uma conversa tão séria vestindo apenas uma cueca boxer, no meu caso, e nada além de uma camiseta e calcinha, no dela, mas eu só achava que isso demonstrava a intimidade incrível que temos.

—Você teria me procurado se não tivesse se decidido por seguir sua carreira aqui?

—Teria. - Respondeu rápido, sem pensar nem um segundo sobre o que perguntei e isso me fez sentir muito melhor. - Eu decidi vir atrás de você antes de decidir aceitar o que meu pai propôs, só que achei essa a ordem mais lógica.

—Eu entendi que algumas coisas não mudaram, ainda devemos priorizar nossas carreiras, você ainda sente minha falta. O que mudou então, Ginny, desde a última vez que conversamos?

—Você mudou, Harry. Era mais fácil para mim quando você não sentia nada, porque agora tudo o que eu penso é que o que eu quis a vida inteira está acontecendo e eu estou desperdiçando por covardia. E eu estava errada também. - Ela respirou fundo antes de continuar e olhou para baixo, indicando que ela não gostava do que estava prestes a dizer. - Eu ainda tenho medo, ainda acho que corro um risco enorme de que daqui a pouco você descubra que não é nada disso e que eu saia disso muito mais machucada do que jamais estive, mas hoje o que mais dói é não tentar e você vale o risco.

Ela terminou mordendo o lábio e me olhando com receio. Meu coração já estava acelerado com o rumo da conversa, mas contive o sorriso e selecionei com cuidado as palavras que usaria a seguir.

—Então é disso que você tem medo? De que eu não tenha certeza? - Perguntei cruzando os braços.

Ela ainda estava parada na mesma posição e assentiu sem dizer nada.

—No dia em que conversamos eu disse que te amo e você me respondeu que não fazia diferença quando eu perguntei se você também me ama. Ainda não faz diferença?

—Sempre fez. Eu estou aqui disposta a tudo, ainda preciso falar sobre isso? - Me respondeu olhando nos olhos e dessa vez eu não consegui segurar o sorriso.

—Você me disse também que não ia pagar para ver eu perceber que não era nada disso e cair fora três meses depois. - Ela não me interrompeu quando fiz uma pausa lenta, então continuei. - Se te deixa mais segura e tira qualquer dúvida da sua cabeça, já faz quase quatro meses disso e se alguma coisa mudou é que eu te amo mais e valorizo muito mais a sua presença, porque agora eu sei como é ficar longe de você.

Ginny abriu um sorriso tão radiante com isso que eu soube que era exatamente o que ela queria ouvir.

—Agora até a Ginny de hoje está com um pouquinho de vontade de chorar.

Nós rimos com vontade da sua piada antes que eu continuasse o assunto.

—E o que a Ginny de hoje sugere que façamos?

—Vamos com calma, uma coisa de cada vez. Começamos de onde paramos, eu amo ser a sua melhor amiga.

—Eu também amo ser o seu melhor amigo.

—Então ficamos com isso por enquanto.

—Só por enquanto, porque depois eu quero mais.

—Eu também quero muito mais.

Hoje eu poderia dizer que a melhor sensação do mundo é quando as coisas se encaixam, como agora, e o jeito bobo com que nos encaramos por um tempo sem dizer nada me dizia que ela também achava isso.

—Sexo faz parte do por enquanto ou do depois? - Perguntei olhando com malícia para suas pernas a mostra.

Ela riu com a minha pergunta e quando me olhou novamente já não me parecia mais tão inocente.

—No nosso caso sexo já fazia parte do antes.

Ri da sua resposta e estendi minha mão em um convite mudo que ela não precisou pensar para aceitar.

Ela se inclinou um pouco para me alcançar e eu a puxei em minha direção quando sua mão se encaixou na minha, fazendo-a se chocar comigo. Apoiei minhas mãos em sua cintura e me virei, deixando-a agora entre mim e a pia onde estava encostado até então.

Não nos beijamos de imediato, mas ela não desgrudou os olhos dos meus enquanto desci minhas mãos pela lateral do seu corpo nem quando trilhei com os dedos o contorno da sua calcinha pequena, até parar minhas mãos logo abaixo da sua bunda e puxá-la para cima, fazendo-a se sentar sobre a pedra fria em contraste com sua pele quente para me acomodar entre suas pernas.

O movimento a fez bater a mão no prato que eu tinha deixado perto da beirada e ele caiu no chão, espalhando cacos pela cozinha e fazendo um barulho alto.

—Me deve um prato. - Afirmei sem desviar nossos olhos.

—Mas eu ainda nem tenho renda. - Se justificou descendo as mãos do meu pescoço e passeando os dedos pelo meu peito.

—Se vira. - Dei de ombros ao dizer e ela riu, mas não disse mais nada.

Enrosquei os dedos na barra da camiseta que Ginny usava e puxei para cima, deixando-a só de calcinha. Deixei a peça ao seu lado, segurei firme suas coxas ao redor de mim e me virei com ela em meu colo para o balcão onde estava encostada antes e sem tantos cacos em volta. Antes de me acomodar novamente entre suas pernas ela fez uma expressão típica de quem quer dizer algo e suas bochechas ruborizaram antes mesmo que ela perguntasse entre apreensiva e envergonhada:

—Aquela moça, a Amy. - Apesar de todo o cuidado ela não conseguiu ocultar tão bem o desdém ao falar o nome da minha vizinha e colega de trabalho.

—Meu Deus, já começou o ciumes. - Rolei os olhos teatralmente enquanto dizia isso, sem nem tentar esconder como estava achando divertida sua reação.

Ela riu um pouquinho também e me deu um tapa no braço antes de dizer o que queria saber:

—Você estava tentando me substituir? - Mordeu o lábio ao concluir a pergunta.

Me encostei novamente entre suas pernas e coloquei uma mecha do seu cabelo atrás da orelha enquanto respondia sinceramente:

—Eu nem ousaria tentar.

Seu sorriso satisfeito me disse que pela segunda vez hoje eu tinha dito a coisa certa na hora certa.

—Eu nunca disse a ninguém, mas sempre te achei super gostosa. - Mudei o foco da conversa, percorrendo os olhos por seu corpo e alisando suas coxas.

—Eu nunca disse a ninguém, mas pensei muito em você enquanto iniciava minhas descobertas sexuais. - Disse normalmente, sem parecer constrangida.

—Sério? - Perguntei encarando seu rosto de novo, achando a revelação excitante e me sentindo o máximo com isso.

—Muito sério. - Confirmou rindo do meu espanto. - Você não?

—Umas duas ou três vezes. - Assumi e ela repetiu minha cara de satisfação.

—Eu tenho certeza que foi mais. - Afirmou e se inclinou para o meu pescoço.

—Eu também. - Concordei e fechei os olhos dando espaço para ela fazer o que quisesse.

Ela riu com os lábios encostados em mim e me fez cócegas, mas estas logo foram substituídas por arrepios quando a senti passar suavemente a língua em direção ao meu queixo, me arrancando um gemido baixo. Não me preocupei em procurar um lugar melhor para nos satisfazer porque ambos estávamos muito confortáveis ali e sentir as pernas de Ginny cruzadas atrás de mim e me puxando para cada vez mais fundo era surreal, assim quando nos deitamos juntos no sofá foi apenas para descansar.

—Que horas são? - Ela me perguntou depois de alguns minutos de olhos fechados e respirações profundas.

—Meio dia e quarenta. - Informei depois de uma olhada rápida no display do meu aparelho de som e voltando meu rosto para o emaranhado dos seus cabelos em cima do meu braço.

—Eu preciso ir embora, mas agora tudo o que eu quero é dormir. - Resmungou fechando os olhos de novo e se acomodando melhor no meu peito, minhas mãos foram automaticamente para suas costas.

—Então dorme, você não precisa ir embora agora. Nem hoje, na verdade. - Sugeri e ela sorriu.

—É uma proposta muito tentadora, mas daqui a pouco vão pensar que fui sequestrada.

—Liga para eles e avisa, oras. - Opinei e ela assentiu.

—Preciso estar em casa amanhã a tarde, vou sair com a minha mãe.

—Então vai amanhã cedo. - Argumentei e ela sorriu com satisfação diante da minha insistência.

—Pedindo assim, como dizer não?- Brincou e eu ri. -  Onde você colocou minha bolsa? Preciso carregar meu celular. - Pediu e levantou o rosto para me olhar.

—Está na mesa do meu quarto.

—Vou pegar então. - Decidiu já se levantando e indo em direção ao corredor.

Por um segundo só admirei a visão, mas antes que ela chegasse até lá me levantei também e fui atrás.

—Deixa, eu coloco para você. Deita e dorme um pouco, vou avisar o Ron e me junto a você daqui a pouco. - Me ofereci e ganhei um selinho de agradecimento.

—Obrigada, mas vou deitar na sua cama porque o seu sofá é realmente péssimo. - Reclamou e eu ri enquanto olhava ela se enfiar embaixo das cobertas e se acomodar no meu travesseiro.

Nunca tivemos problemas em mexer nas coisas um do outro, então abri sua bolsa e procurei em meio a bagunça costumeira o celular e o carregador, vesti minha calça que ainda estava em cima da cama e voltei à sala. Coloquei seu aparelho para carregar, apanhei o meu em cima da mesa de centro, onde havia ficado na noite anterior, e liguei para o Ron.

—Oi, Harry. Beleza? - Me atendeu no terceiro toque.

—Comigo tudo ótimo, e você? - Respondi me sentando no mesmo sofá onde estávamos deitados minutos atrás.

—Também. O que manda? - Fez sua pergunta característica de todas as vezes que nos falávamos.

—Ginny pediu para ligar e avisar que ela volta só amanhã, ok? - Informei sabendo que ele avisaria seus pais.

—Ginny está aí? - Perguntou espantado e visivelmente surpreso. - Mas como?

—Está, ninguém ficou mais surpreso do que eu. - Confirmei com um sorriso grande. - Aliás, obrigado por dizer a ela meu endereço.

Ele riu incrédulo antes de se manifestar novamente:

—Não sei quem de vocês dois é mais imprevisível. - Resmungou e eu ri. - Cara, não sei como isso aconteceu, porque eu te garanto que nunca dei seu endereço à minha irmã, e não o daria sem falar com você antes.

—Não? - Perguntei por hábito, não duvidando do que ele disse.

—Não. Eu pensei que ela estivesse na casa da Luna ontem a noite quando minha mãe disse que não dormiria em casa. - Afirmou e riu.

Franzi o cenho para sua afirmação, me perguntando onde então essa mulher conseguiu meu endereço. Ainda estava quieto quando ele interrompeu meus pensamentos.

—Mas bem, isso não importa. O que vocês estão fazendo eu imagino, mas está tudo certo agora? - Perguntou se referindo à relação como um todo.

—Agora acho que sim, mas eu te conto melhor depois. - Informei e ele percebeu que esse não era o momento que eu considerava perfeito par ter uma conversa.

—Ok, volte para o seu tão esperado fim de semana. - Ri do seu comentário despretensioso e ele me acompanhou. - Eu avisarei a eles, diga a Gin para tomar cuidado na estrada.

—Direi, Ron. Valeu, até mais. - Me despedi e mal o esperei fazer o mesmo para jogar o aparelho de lado.

Fui à cozinha e juntei os cacos de vidro com a vassoura antes de colocá-los no lixo, joguei no cesto as roupas que deixamos espalhadas e só então voltei ao meu quarto. Ginny já dormia quando cheguei, então me acomodei ao seu lado e fiz o mesmo.

Acordamos no fim da tarde, tomamos banho e fomos jantar em um restaurante perto de onde fica o edifício em que trabalho e eu aproveitei o caminho para mostrar a ela onde era. O jantar foi tranquilo e sem nada diferente de como eram todos os que já fui com ela, e que não eram poucos, mas caminhar de mãos dadas e pontuar uma ou outra frase com beijos foi um adicional que me deixou feliz.

Entramos na minha casa sorridentes e satisfeitos, ainda conversando sobre pequenos detalhes desses últimos meses em que ficamos longe e fomos direto ao meu quarto. Tiramos os sapatos e os casacos e nos jogamos na cama, onde ficamos por bastante tempo rindo de qualquer coisa e conversando como sempre fizemos. Entre um assunto e outro me lembrei de algo que deveria já ter perguntado:

—Gin, quem te deu meu endereço?

Ela riu e se apoiou nos cotovelos para me olhar melhor antes de responder, me deixando meio incrédulo:

—A sua mãe.

—Você ligou para minha mãe? - Questionei me sentindo um pouco lisonjeado com o ato, mas não conseguindo imaginar como tinha sido essa conversa.

—Sim, e nós saímos para almoçar juntas. Morri de vergonha, aquele olhar profundo dela é intimidador. - Opinou e eu gargalhei de sua expressão, mas não pude discordar.

—Me conta, quero saber o que vocês conversaram. - Pedi e adotei a mesma posição que ela, ficando agora de frente um para o outro.

—Primeiro quando eu cheguei e disse que queria que ela me desse seu contato, porque eu não tinha seu novo número, ela falou que nós dois somos muito lentos. - Ri com essa primeira observação e ela me acompanhou. - Depois ela me perguntou por que eu queria entrar em contato com você agora. Não gosto muito de falar de sentimentos, mas vai eu me declarar pra mãe do cara que me deu um gelo, fazer o que?! - Gesticulou indicando que era o jeito e eu ri convencido. - No geral foi uma conversa bem interessante e no fim ela me deu seu telefone e seu endereço dizendo para eu fazer o que achasse melhor, mas ela achava que uma ligação era pouco demais para o tanto que a gente precisava conversar.

—Não dá para discordar dessa parte. - Opinei e ela assentiu.

—E ela aconselhou também que eu não tomasse nenhuma decisão impulsiva só por causa de você, porque se eu te aconselhei a se importar com suas coisas em primeiro lugar eu deveria fazer o mesmo. Não dá para discordar disso também. - Deu de ombros e eu acenei concordando dessa vez.

Ficamos em silêncio por um momento e ela se deitou de novo, o rosto virado para cima. Continuei como estava, olhando sua expressão tranquila até que ela se virou de repente para mim e acusou:

—E você me bloqueou, seu ridículo! - Ri do seu tom indignado e no fim ela me acompanhou.

—Você disse que eu não tinha direito de bagunçar a sua vida e que não me queria nela, foi o que eu fiz, oras. - Dei de ombros como se fosse óbvio.

—Não acredito no que estou escutando. - Comentou me olhando com diversão.

—Mas se te conforta, salvei todas as suas fotos antes. - Acrescentei a informação como se fosse crucial que ela soubesse, e em troca ganhei uma gargalhada.

—Meu Deus, Harry, como você é infantil. - Exclamou com as mãos no rosto, me fazendo rir também.

—Falando sério agora, eu não queria ver a movimentação da sua vida social indo muito bem sem mim. - Me expliquei e ela não parou de rir, mas suavizou a expressão de indignação.

—Quase não teve vida social nesse meio tempo, e praticamente toda ela foi com a Lulu. - Contou e eu ri, secretamente satisfeito em saber disso. - Falando nela, de acordo com sua avaliação eu sou burra e covarde, você é só burro mesmo.

Ri com isso e ela me acompanhou.

—Olha, que casal promissor. - Ironizei e ela fez um gesto de mãos concordando.

Rimos mais um pouco depois disso e o assunto morreu. Aproveitei que ela estava confortavelmente deitada e me sentei no colchão ao seu lado.

—Vem aqui, Gin. - Chamei puxando-a pela mão para que se sentasse também e retirei seu suéter assim que foi possível.

—Você não cansa? - Perguntou com a sobrancelha arqueada, sem reclamar.

—Não. - Afirmei e ela riu enquanto terminava de tirar a peça deixá-la de lado.

—Já posso tirar a sua roupa também? - Questionou divertida e eu ri empurrando para que ela se deitasse de novo.

—Fica quieta, não é nada disso. - Me expliquei e ela concordou com um aceno enquanto eu abria sua calça e a puxava para baixo, deixando só de lingerie. - Vira de costas. - Pedi e ela ficou de bruços ao meu lado.

Desabotoei seu sutiã e ela entendeu que deveria terminar de tirá-lo também, deixando de lado com o resto das peças. Me sentei um pouco abaixo de seu quadril, onde sabia que meu peso não iria machucar, e comecei a massagem que ela tinha pedido no dia anterior. Ginny não disse nada enquanto eu apalpava estrategicamente toda a extensão de suas costas, mas com o tamanho do sorriso nem precisou.

Fiz isso por vários minutos, até sentir que ela estava completamente relaxada embaixo de mim, e me deitei ao seu lado quando minhas mãos começaram a doer com os movimentos repetitivos. Ela ficou de olhos fechados ainda por um tempo, e quando abriu a preguiça era visível neles.

—Vou ficar mal acostumada. - Sentenciou e eu ri.

—Você já é. - Ela quem sorriu dessa vez. - Temos que marcar uma balada qualquer dia. - Sugeri e ela me olhou sem entender. - Você ainda me deve aquela tal dança super incrível e excitante. - Nós dois rimos com o meu pedido.

Ficamos bastante tempo namorando ainda, e quando finalmente fomos dormir já era de madrugada.

Não tivemos pressa em nos levantar no dia seguinte, mas Ginny precisava estar em casa a tarde então assim que terminamos de tomar café da manhã, mais ou menos na hora do almoço, ela se vestiu novamente e descemos juntos as escadas para nos despedirmos em frente ao seu carro.

—E então? - Me perguntou se encostando no capô e ficando de frente para mim.

Me encostei nela e posicionei meus braços em suas costas enquanto suas mãos iam para trás do meu pescoço, fazendo um carinho gostoso na minha nuca.

—Então faça uma boa viagem, cuidado na estrada e não deixe de me avisar quando chegar em casa. - Finalizei meu pedido com um selinho.

—Não deixarei. Você tenha uma boa semana e se cuide por aqui. - Recomendou e me beijou novamente.

—Eu gostei muito do nosso final de semana. - Falei enquanto a puxava para um abraço apertado.

—E eu já não vejo a hora de repetir. - Confessou aspirando o cheiro do meu pescoço e eu fiz o mesmo no dela.

Nos beijamos mais uma vez e eu abri a porta do carro para ela entrar e se acomodar. Me debrucei na janela quando ela abriu o vidro para perguntar:

—Eu acho que vou precisar vir para cá no meio da semana resolver algumas coisas ainda. Se for algo muito demorado posso ficar na sua casa? - Pediu por educação, já sabendo minha resposta.

—Vou pensar. - Me fiz de difícil e ela riu antes de me dar mais um selinho.

— Tchau, Harry.

—Tchau, Gin. - Levantei e coloquei as mãos no bolso enquanto via seu carro se afastar.

Quando ela virou a esquina entrei novamente pelo portão do prédio e a euforia não me deixou subir as escadas com calma, então pulei de dois em dois degraus com um sorriso estampado no rosto. Fechei a porta atrás de mim e me joguei no sofá ainda sorrindo, mal acreditando em como eu sou um cara de sorte.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Olá, pessoal. Tudo bem?
Não tenho muito o que falar sobre esse capítulo além de que gosto muito dele. Eles finalmente se acertaram e isso já é algo para achar ótimo.
Espero que tenham gostado também, e não deixem de me dizer o que estão achando de tudo.
Obrigada a todos que acompanham, espero ver vocês nos comentários.
Esse retorno é super importante e motivador, então opinem, critiquem, recomendem, digam o que pensam ;)
Até semana que vem,
Beijos.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Impasse" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.