Impasse escrita por Paulinha Almeida


Capítulo 16
Capítulo 15




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Quando cheguei em casa meus pais já estavam, e eles estranharam me ver ali tão cedo. Aproveitei a presença de ambos e contei o que tinha acontecido na empresa e a notícia que tinha recebido.

Conversamos um pouco sobre o que me foi oferecido e os dois leram os detalhes da proposta antes de mim, então foi por eles que eu soube que McGonagall tinha razão: na minha idade essa era uma oportunidade única. Eles fizeram questão de afirmar e reafirmar que me apoiariam e que, apesar de ficarem tristes, eles sabiam que uma hora isso iria acontecer.

A questão agora era Ginny, nossa falta de relações, as dúvidas quanto ao que ela sentia e tudo o que certamente nunca aconteceria se eu fosse embora nesse momento.

Quando eu disse que era mais fácil manter a nós dois na relação descomplicada e fácil de amigos, era disso que eu estava falando. Se assim fosse, eu daria minha resposta positiva para McGonagall amanhã mesmo, depois eu sairia com minha melhor amiga para comemorar em qualquer lugar, nós dormiríamos na minha casa ou na dela e eu teria sua visita com uma frequência mensal, no mínimo.

Agora, no entanto, eu já não conseguia nem imaginar um de nós dois trocando de roupas na frente do outro, por exemplo, com aquela naturalidade toda. E só de pensar em dormir novamente na mesma cama que ela eu já quero muito mais do que deitar e apagar.

Eu não receberia nenhum novo projeto até decidir meu destino, então pedi a sexta-feira feira de folga e fiquei em casa descansando e pensando no que fazer. No sábado acordei mais tarde que o normal e desci tempo suficiente para comer algo, retornando em seguida para o meu quarto.

A porta se abriu suavemente um tempo depois e minha mãe apareceu pela fresta antes de me perguntar:

—Posso entrar?

—Claro. - Respondi baixando as pernas e dando espaço para que ela sentasse na cama ao meu lado.

—Você quase não saiu do quarto. Eu fiquei preocupada. - Justificou-se e me olhou antes de continuar. - Você já se decidiu?

—Ainda não, tenho muita coisa para considerar. - Respondi sem vontade de chegar no assunto para o qual ela estava guiando a conversa

—Ginny é uma delas? - Perguntou direta, passando os dedos pelo meu cabelo.

—Ela não deveria ser, não é? - Rebati com um sorriso forçado tentando diminuir o caos visível dos meus pensamentos.

—Isso é você que deve decidir, Harry. - Respondeu calmamente, como se entendesse tudo. - Acho que você não deve se atrapalhar por isso, mas também acho que deve levar em consideração tudo o que quer nesse momento. E se é ela que você quer, imagino que já saiba o que deve fazer.

—Eu também acho isso. O problema é que tudo indica que eu estou sozinho nessa. - Expliquei o que me afligia, não disfarçando mais tão bem o quanto eu estava triste com a situação.

—Tente, Harry, você nem tentou e já está dizendo isso? - Opinou levantando meu rosto. - Vocês se conhecem desde criança, não tem por que esconder agora se está tão envolvido.

—Não tenho nenhum sinal que diga que ela está envolvida também, mesmo que só um pouco. Isso não é suficiente?

—Acho que isso pode não dizer nada. - Afirmou com segurança. - Pense em tudo que você quer e decida-se sobre o que fazer. Seu pai e eu não o ensinamos a vida inteira a ser confiante e persistente para você se trancar no quarto quando algo não segue o rumo que você deseja. Isso não é hora de bancar a criança mimada, você tem um prazo então levante-se daí e resolva sua vida. - Finalizou e se levantou para sair.

—Ta bom, mãe, vou me decidir. - Confirmei carrancudo e aguardei que ela saísse.

Inicialmente eu não gostei do que ela disse, mas depois começou a fazer sentido. Tenho apenas três semanas para dar uma resposta e, caso seja positiva, organizar uma mudança. Isso significava ter que me decidir o quanto antes, e eu não me decidiria enquanto não conversasse com Ginny.

Respirei fundo, tomei minha decisão e peguei o celular. O número dela sempre esteve salvo nos favoritos então foi rápido fazer a chamada e levar o telefone ao ouvido. Ela também me atendeu rápido, no segundo toque.

—Oi, Harry. - Me cumprimentou sem a mesma descontração de sempre.

—Oi Gin, tudo bem? - Respondi da mesma maneira e esperei ela me dizer que estava bem antes de continuar. - Você tem algum compromisso para hoje?

Se havia alguma dúvida de que eu deveria falar com ela considerando o risco de prejudicar nossa amizade, o jeito que nos cumprimentamos me indicou que não havia mais nada a perder, porque nada mais soava como antes.

—Não, não tenho nada.

—Posso ir até aí para conversarmos? - Só expressar o pedido já deixou minhas bochechas quentes.

—Claro, Harry. Você vem agora? - Confirmou, e seu tom me indicava que ela também estava sem graça.

—Sim. Vou só tomar banho e vou. Até daqui a pouco. - Ficamos com vergonha de mandar beijos, então nos despedimos formalmente e desligamos.

Tomei banho, me vesti e desci as escadas. Meus pais me desejaram sorte quando eu disse aonde ia e eu agradeci, realmente desejando que ela me acompanhasse.

Quando estacionei o carro em frente à casa dela eu ainda não tinha idéia do que dizer quando estivéssemos frente a frente, mas me toquei de que mesmo que eu tivesse um mês para pensar ainda assim não saberia. Então apenas respirei fundo, tranquei o carro e subi os degraus necessários antes de tocar a campainha.

Ela me atendeu rápido, me dando a impressão de que já sabia que eu estava ali e eu tentei não me animar com isso. Eu não sabia que podia ser tão tímido até sentir meu rosto corar quando nos encaramos.

—Oi, Harry. - Me cumprimentou com educação demais, totalmente diferente da informalidade habitual.

Resolvi agir normal e me adiantei antes de apoiar a mão em sua cintura e dar um beijo em seu rosto.

—Oi, Gi.

Esperei ela fechar a porta atrás de nós e se virar novamente para mim.

—Você prefere conversar no meu quarto? - Perguntou passando a mão nos cabelos.

—Pode ser. - Concordei e a segui até lá.

Ginny sempre conversava comigo, Luna e Ron em seu quarto, onde era mais confortável, então esse foi outro detalhe com o qual tentei não me animar.

Ela fechou a porta quando entramos e se sentou próxima à cabeceira de sua cama, me adiantei e sentei na cadeira que ficava em sua mesa de computador, de frente para ela. Ginny quebrou o silêncio por nós:

—E então? - Eu podia notar a ansiedade contida em sua voz, espelhando o tom da minha.

Respirei fundo e comecei pelos últimos acontecimentos:

—Recebi uma proposta para me mudar de cidade. - Ela não me olhou surpresa quando eu contei, indicando que realmente acreditava que eu seria convidado a tal.

—Os convites não seriam feitos apenas no final do próximo mês? - Perguntou em dúvida.

—E serão. Eles querem que eu ocupe uma vaga independente disso. - Expliquei e ela assentiu. - O cargo é mais alto do que o meu atual, é uma oportunidade muito boa.

—Parabéns, Harry. Fico muito feliz com isso, eu tinha certeza que eles notariam logo o quanto você é bom.

Ela me felicitou com um sorriso tão lindo que eu ri também antes de continuar.

—Eu ainda não aceitei. - Falei sem rodeios e ela me olhou confusa, mas não disse nada. Respirei fundo e continuei. - Olhe, Ginny, eu tenho certeza que você sabe o que eu quero te dizer, principalmente depois do que aconteceu no sábado.

Eu parei um momento para dar a ela espaço para dizer algo, mas ela apenas me olhou inexpressiva e não deu indícios nenhum de que havia algo a dizer, então continuei.

—Eu não sei como, nem exatamente desde quando eu percebi isso, mas não quero mais ser só seu amigo, Gin. - Falei com pressa, como se quisesse arrancar de uma vez o curativo.

Ela me olhou por um tempo com um misto de expressões que eu não soube explicar, mas indicando claramente que isso não era o que ela mais queria ouvir no mundo, e então apoiou os cotovelos sobre as penas cruzadas e afundou o rosto nas mãos.

Agora que comecei, eu estava disposto a falar tudo o que sentia. Me levantei de onde estava e ajoelhei no chão a frente dela para ficarmos da mesma altura e mais próximos. Não tentei fazê-la me olhar, mas apoiei ambas as mãos sobre suas pernas antes de continuar.

—Nossa relação já é tão perfeita que quase nada mudaria, mas eu quero ser o cara que vai com você pra casa depois da balada. Quero te beijar daquele jeito e saber que não vou ouvir aquilo de novo, porque aquelas palavras doeram, sabia? - Falei com pressa, tentando dizer tudo de uma vez.

Parei tempo suficiente para organizar meus pensamentos e o que diria a seguir, e então continuei:

— Eu quero namorar você, agradar você ainda mais. Te encher de presentes e de carinho, eu sei tudo que você gosta então seria tão fácil. Até mesmo acordar com você toda espalhada em cima de mim me atrapalhando dormir.

Ela riu um pouco quando citei seu jeito espaçoso, mas não abriu os olhos para me olhar.

—Quero fazer tudo isso, e nós temos tudo para dar certo, Ginny, eu sei disso. - Terminei ansioso e acariciei o local onde minhas mãos estavam. - É só você me dizer que sim, que também quer, e eu recuso tudo para ficar com você aqui.

Ela mal me esperou terminar antes de levantar a cabeça e começar a dizer:

—Pára, Harry, por favor. - Seu tom urgente ao me pedir para parar e a expressão quase brava me fizeram esperar por algo que eu não gostaria de ouvir. - Não fala isso, você não pode e não vai recusar.

—Eu posso sim, e é o que eu vou fazer se você quiser ficar comigo também. - Contestei teimoso. - É só você me dizer que sim.

—Mas eu não quero. - Ela respondeu por fim.

Eu a encarei atônito por um momento, até que ela olhou para baixo e a primeira lágrima escorreu em seu rosto.

—Você está dizendo isso para eu não perder uma oportunidade boa, não é? Pois saiba que eu não ligo para isso, mas se você se importa tanto assim pode vir comigo. - Tentei desesperadamente achar uma alternativa para aquela negativa.

Ela não falou nada, mas negou novamente com a cabeça, então tentei dizer o último argumento, ainda que fraco, que eu tinha e que me havia sido apresentado durante a semana:

—Ron me disse que você era louca por mim quando éramos mais novos. Diz que sim, Ginny, por favor.

O efeito que isso teve foi contrário ao que eu esperava:

—Eu era sim, Harry, louca por você, e o que você estava fazendo enquanto isso? - Perguntou com raiva, me olhando diretamente agora. - Estava dando a mínima para mim, como até alguns anos atrás.

—Você não pode me culpar por algo que eu nem sabia, Gin. - Tentei argumentar, odiando o rumo da conversa e as lágrimas que escorriam em seu rosto enquanto isso.

—E eu não estou te culpando, embora eu tenha certeza que não faria nenhuma diferença caso você soubesse. - Não tive como discordar dela, então só esperei que continuasse. - Mas eu estou te culpando pelo que você está fazendo agora. Anos, Harry, até eu não me importar com quantas pessoas você sai ou com quem está namorando, para não sentir nada quando você me conta sobre a moça do escritório com quem você está dormindo. E sabe o resultado disso?

Diante do tom quase cruel de sua pergunta eu não consegui dizer nada, então apenas esperei:

—Eu consegui. - Frisou apontando para si mesma. - E você não tem direito de bagunçar minha vida agora.

—Não quero bagunçar sua vida, estou aqui dizendo que estou disposto a deixar minha carreira de lado para ficar com você. Quero o oposto disso! - Expliquei com urgência, como se fosse óbvio.

—Você não tem o direito de vir aqui me dizer isso agora para daqui a três meses descobrir que é só uma confusão dos seus sentimentos e ainda me culpar por atrasar seu crescimento profissional, porque é isso que vai acontecer.

—Não quero que você pense na minha vida profissional ao me responder definitivamente, Ginny, quero que pense em você. - Eu sabia o que ela diria, e minha vontade de chorar era devido a isso.

—Estou pensando em nós dois Harry, por isso estou dizendo não. - Ela olhou novamente para baixo ao responder.

—Eu quero uma chance, só isso, e você vai ver que três meses não é nada perto do tempo que eu quero passa do seu lado.

—Não posso. - Negou novamente.

Eu percebia pelo seu tom o esforço para dizer tudo isso e como a expressão no seu rosto dizia o contrário, e por isso eu precisava insistir.

—Eu sei que isso não está sendo fácil para você também, é só ver sua relutância em me olhar e a força que você faz para que as palavras saiam. - Mal consegui conter o equilíbrio da minha voz enquanto dizia. - Por que não facilitar para nós dois?

—Porque hoje eu sou muito mais racional do que aquela adolescente boba que não tinha olhos para nada além amigo do irmão.

—Olhe para mim pelo menos, por favor. - Pedi tentando desesperadamente prolongar aquele momento com ela, mas internamente ciente de que não havia muito que eu pudesse fazer por nós.

—É mais fácil sem te olhar. - Explicou e eu cheguei mais perto, apoiei meu rosto na curva do seu pescoço e inspirei seu cheiro enquanto intensificava o contato de minhas mãos em suas pernas. - E seria ainda mais se você parasse de insistir e fazer isso, por favor.

Eu não poderia me aproximar se ela dissesse não, então me afastei e tentei uma última vez:

—Posso só pedir uma coisa, então? - Perguntei e ela só assentiu sem me olhar, então eu levantei seu rosto para mim antes de dizer: - Me dá um beijo.

Ela não precisou pensar sobre o meu pedido e nenhuma centelha de hesitação passou por seus olhos quando ela afundou os dedos em meus cabelos e me puxou de encontro ao seu rosto.

Senti quando ela descruzou as penas e apoiou os pés no chão, me deixando entre elas, eu apertei sua cintura e a puxei mais para perto, assim ficamos colados um no outro. Foi quase tão quente quanto nosso primeiro beijo, mas com um milhão de significados a mais.

Deixei nossas testas grudadas quando nos separamos, ela continuou com as mãos no meu cabelo e eu apoiei as minhas em seus quadris antes de falar:

—Eu te amo, Gin. Você não me ama mais?

—Isso não faz diferença, Harry. Minha resposta ainda é não.

Eu conhecia Ginny bem demais para saber que não adiantaria mais insistir, mas infelizmente eu não me importei a tempo de conhecer seus sentimentos da mesma maneira para entender o que ela quis dizer com aquele “não importa”.

Pisquei com força para absorver suas palavras e percebi que meus olhos estavam úmidos. Quando me senti confiante para não desabar na frente dela prendi seu rosto entre as mãos e preguei um selinho demorado em seus lábios antes de levantar e sair.

Eu não falei tchau e ela não foi atrás porque nós dois sabíamos que seria mais fácil assim. Cruzei sozinho o caminho tão conhecido de sua casa, entrei no carro e fui embora.

Não consegui conter algumas lágrimas e meus pais, ansiosos para saber o que houve, perceberem isso assim que entrei rápido pela sala e fui direto às escadas.

—Vou aceitar o cargo. - Anunciei a eles antes que me perguntassem e esperei que isso fosse suficiente para que eles entendessem.

A meio caminho ouvi meu pai dizer para que minha mãe me deixasse sozinho um pouco e internamente eu o agradeci por isso.

A dor no meu peito me dizia com clareza que eu nunca havia amado Cristina Keller na primeira série, nem a gêmea Patil durante a adolescência, nem Cho, minha namorada no início da faculdade, nem Alicia, a moça da contabilidade que nunca quis nada sério comigo. E eu sabia disso agora porque não sobreviveria a essa dor mais de uma vez.

Usei o final de semana para pensar em tudo, remoer o que aconteceu e me lamentar o quanto pude o fato de perder tanto tempo a ponto de ser tarde demais.

Na segunda feira pela manhã me vesti e fui ao escritório no horário normal, mas me dirigi à sala da diretora ao invés de minha mesa.

—Entre. - Ela pediu quando bati à porta. - Bom dia, Potter.

—Bom dia, Sra. McGonagall. Não vou tomar muito seu tempo, só gostaria de dizer novamente que agradeço a oportunidade na capital e que eu vou aceitá-la.

—Excelente, Potter. Ficamos felizes com isso, vou informá-los hoje mesmo. - Ela disse de um jeito que me fez acreditar que ela estava feliz de fato. - Eles com certeza me pedirão um prazo, e preciso notificar isso também. Precisamos de pelo menos quinze dias para acertar a parte burocrática do processo, mas não podemos nos alongar por muito mais do que isso. Acredito que posso tentar um mês de prazo, o que acha?

—Não é necessário, posso começar em quinze dias. Quanto antes melhor para mim.

Ela me olhou desconfiada e avaliadora quando falei isso, mas não fez nenhum comentário.

—Ótimo, vou avisá-los então. Até lá fique a vontade para resolver suas questões pessoais, alguém da área de gestão de pessoas entrará em contato quando tudo estiver pronto para assinatura.

—Obrigado, e mais uma vez agradeço a oportunidade.

Saí da sala dela aliviado por fazer o que eu sabia ser certo diante de tudo o que houve. Por um lado eu estava ansioso para começar essa nova fase longe de tudo o que estava acontecendo, mas por outro eu só pedia aos céus que Ginny mudasse de ideia para eu cancelar tudo isso.


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Notas finais do capítulo

Olá, pessoal!
Eu não tenho nada a dizer sobre o capítulo que acabei de postar porque acho que ele fala por si, mas afirmo que é um dos meus preferidos e mais esperados!
Como eu disse no anterior, estruturei toda a história em cima daquela viagem e dessa conversa deles, então podem imaginar minha ansiedade em postá-lo.
Quero mais do que nunca saber o que estão achando sobre tudo e o que suspeitam que esteja passando pela cabeça dela, então não deixem de me dizer.
Espero ver a todos nos comentários.
Beijos, e até semana que vem!



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