Uma das coisas que você aprende quando se está no mar é que nem todos nasceram para essa vida. Corrigindo, nem todos tinham estômago para a vida no mar, e a prova disso estava nas centenas de pessoas que ele indicava chás para enjoos todos os dias, por sorte ali tinha um grande estoque sendo vendido aos passageiros.

Era seu dia de folga, na verdade ele tinha nenhum paciente agendado, por isso fora para o convés sentar-se aproveitando a brisa e ler um de seus livros, bom. Seu plano de relaxar estava indo bem até que duas crianças, aparentemente em seus 12 anos passaram correndo e tropeçaram em suas pernas, rolando no chão com suas espadas de madeira.

– Vocês estão bem? - indagou se aproximando para ver se eles estavam machucados.

– Eu sou o Comoro McCall, o maior caçador de piratas! - dissera um dos meninos se pondo de pé e inflando o peito, algo adoravelmente engraçado. - Um tropeção não me machuca!

O outro garoto se colocara de pé, e logo ajeitou um falso tapa olho, enquanto erguia a espada de madeira pronto para recomeçar o duelo com o seu maior inimigo.

– Nunca vai pegar minha tripulação! - disse o suposto pirata atacando, e foi rindo que Stiles largou seu livro e pegou um cabo de esfregão e o ergueu como se fosse uma espada.

– Veremos se são tão fortes assim, desafio os dois! - dissera, e logo estava sendo atacado pelos dois garotos, claramente se divertindo com um adulto disposto a diversão.

As duas crianças claramente haviam praticado esgrima, pois tinham certa noção do que estavam fazendo com aquelas espadas de madeira, e pareciam achar que Stiles seria uma luta fácil. Entretanto uma das coisas nas quais o homem investira o tempo livre foi praticando esgrima, uma vez que não queria ser um fiasco novamente caso tivesse problemas.

Recuou um passo esquivando/tropeçando enquanto o "comodoro" fazia uma estocada com a espada na altura de seu estômago, e o "pirata" fazia um corte diagonal, que ele conseguiu aparar usando a sua arma improvisada. Aquilo deu tempo para o "comodoro" erguer a espada com tamanha força que tirou o cabo da mão de Stiles.

Rindo, ele se levantou com as espadas passando da altura de seu pescoço para a altura e seu peito, enquanto os meninos sorriam e faziam um cumprimento pela tão merecida vitória.

– Por favor, poupem minha vida, não me abandonem numa,olha deserta! - suplicou com os braços erguidos, algumas pessoas que passavam balançavam a cabeça em negação por tamanha infantilidade, enquanto outros riam da atitude do seu médico.

– Ele vai ser meu prisioneiro e limpar o convés inferior! - dissera um, enquanto o outro passava a retrucar dizendo que queria que o capitão fosse o seu prisioneiro.

Sorrindo divertido, Stiles observou uma ave sobrevoando o navio, um belo gavião, pelo que pôde perceber, ele indagou-se como uma ave poderia voar tanto em mar aberto, e deduziu que ela deveria pertencer a alguém da tripulação, afinal vira a mesma ave no dia anterior.

Foi com espanto que ouviu o grito de cima, de alguém avisando que era um navio desconhecido, de velas negras. Aquilo deixou o rapaz alerta, que logo tocou os ombros das crianças, se abaixando e ficando muito sério.

– Procurem os pais de vocês e fiquem no convés inferior. - dissera, sem dar espaço para que eles retrucassem. - Agora! Podemos estar sendo atacados, vão!

Observando os garotos irem aos tropeços, ele começou a ajudar algumas pessoas a voltarem para o convés inferior, ele berrava ordens para que eles ficassem quietos até que fosse dito que estavam em segurança. Quase riu com a ironia que antes ele teria simplesmente permanecido lá em cima ao invés de tentar salvar vidas.

Entrando em sua sala, ele preparou tudo em sua mala, seu material cirúrgico, medicamentos, bandagens, ele sabia que em um ataque nem sempre se tem tempo para levar o ferido até o médico, por isso ele precisava estar a postos.

Um grande barulho, o barco balançando, e ele soube que havia começado, estavam dentro do alcance do navio pirata, e aquilo poderia significar que seriam abordados ou destruídos, dependendo de quem estivesse realizando o saque.

–x-

– Ganchos, agora! - dissera Derek com a espada em mãos, hoje não era um de seus melhores dias, na verdade estava com um humor terrível. - Adiante suas baratas desprezíveis! Não quero nenhum homem de pé no outro navio!

– AYE CAPITÃO! - bradou a tripulação, a postos nos ganchos e cordas, estavam emparelhados com o outro navio, e logo uma feroz batalha se iniciara no convés.

Anos antes havia sido fácil realizar os saques sem derramamento de sangue, hoje em dia, entretanto, muitos homens eram treinados com armas e postos em cruzeiros e navios mercantes, para evitar ou dificultar os saques.

Derek logo se colocou em uma briga com um homem forte maior do que si, ele não manejava bem a espada, mas tinha força bruta, o que dificultava que fosse derrubado.

Assim que enfiou a espada no coração do homem, entretanto, buscou com os olhos uma jovem em particular, uma que ele mandara ficar na cabine, mas sabia que o desobedeceria. Tal como esperava, lá estava Cora Hale, manejando uma espada usando as típicas vestes piratas, largas demais em si, e os cabelos trançados de tal forma que a faziam parecer um garoto, caso não reparasse bem.

– Mandei ficar na cabine, idiota! - gritara puxando sua pistola de pederneira e dando um tiro em um homem que chegava pelas costas dela.

– Não sou uma garotinha que vai ficar escondida! - retrucou ela fazendo um corte profundo no peitoral de um homem e o empurrando para fora do navio com o pé.

Derek apenas soltou um rosnado baixo enquanto atacava alguns homens para se aproximar de Cora, ela fora enviada até ele para ficar a salvo, uma vez que Laura tivera problemas com seu navio e ficaria em um dos portos piratas no Mar do Caribe atracado.

O número de oponentes diminuíra consideravelmente, mesmo a tripulação sob o comando de Derek estava tendo poucos problemas lutando no convés do barco saqueado. Ele fez um corte profundo no abdômen do inimigo de tal forma que jurava que iria expor as vísceras e se voltou para Cora, que finalizara seu último oponente.

Os marinheiros sobreviventes começaram a se render, julgando que não valeria a pena ter mortes tão cruéis, foi então que aconteceu.

Derek não soube onde o homem havia se escondido, mas só o viu quando estava próximo demais, gritando e descendo a espada na direção de Cora. Ele sequer pensou, somente se jogou na frente da irmã a jogando no convés banhado em sangue, recebendo o golpe da espada no abdômen. Ele ainda viu o marinheiro cuspindo sangue e baixando o olhar para a espada que atravessava seu coração, antes de ouvir a voz de sua irmã gritar seu nome, a sua vista se tornando um tanto embaçada devido a perda de sangue.

– Capitão Hale! - gritou Isaac preocupado vindo em sua direção, mas sua vista escurecera completamente antes que o mesmo pudesse chegar a si e amparar seu corpo que foi de encontro ao chão.

–x-

Stiles ficou de pé assim que viu a porta de sua sala ser aberta, ali estava um marinheiro trêmulo, sendo segurado por um homem negro, alto e forte que lhe era vagamente familiar.

– Solte-o, aqui não tem nada que possa querer. - dissera Stiles avançando um passo, tentando não se mostrar intimidado pelo outro homem.

– Você vem comigo, meu capitão precisa de um médico. - dissera o homem, soltando o marinheiro, que saiu correndo, e adentrando a sala.

– O que te faz pensar que salvarei a vida de um maldito pirata? - arqueou uma sobrancelha e sorriu irônico, mas logo teve uma arma de pederneira apontada para seu peito. - A minha vida pouco me importa, me mate se desejar, isso não vai mudar a situação do seu capitão.

– Você tem razão. - disse o homem, finalmente abaixando a arma, e Stiles relaxou apenas um pouco. - Tem muitas pessoas aqui, salve meu capitão, senão afundaremos esse navio com todos vocês. - o pirata sorriu. - Quer mesmo ser o culpado por causar a morte de todos aqui? Venha, e mais ninguém será morto.

Certo, aquilo era uma boa razão para ele seguir junto com aquele pirata. Respirando fundo, ele pegou a sua maleta e seguiu andando para fora da sala com a cabeça erguida, não perderia a dignidade ali. Pensou que talvez fosse precisar do colar afinal, iria com aqueles piratas e caso não o devolvessem, iria mostrar o colar para que ao menos cumprissem a promessa de deixar a tripulação em paz. final, ao menos de uma coisa tinha certeza: o nome Hale tinha valor, era temido e respeitado.

Ao chegar ao convés entretanto seu coração parou de bater, ao avistar a bandeira tão familiar e lembrar quem era o capitão do dito navio. Cruzou a prancha e foi direto até a cabine do capitão, haviam dois homens na porta que deixaram o entrar, embora receosos.

– Derek seu idiota, o que você fez? - murmurou sabendo que o mesmo não o ouviria, embora pudesse ouvir a surpresa dos que vigiavam a porta e do homem que lhe sequestrara. - Me arrumem água quente e panos limpos! - ordenou se livrando do casaco e do colete, puxando em seguida as mangas da camisa até a altura dos cotovelos antes de afastar as vestes do capitão e analisar o ferimento.

Aquilo estava bem feio, com sorte não infeccionasse, mas precisaria de bastante cuidado, e pelo visto havia perdido bastante sangue. Ele pensou que se o homem dissesse que o paciente era Derek Hale, ele não teria sequer hesitado antes de ir, ao contrário das demais pessoas.

Pois no no fim das contas, ele não permitiria que um idiota como Derek deixasse esse mundo tão facilmente.