O despertador escrita por Yuu Chan


Capítulo 1
Você é minha.


Notas iniciais do capítulo

Eu em.



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[Link da Tirinha]

O cobertor lhe cobre o tórax, mas lhe deixa as costas nuas; Apenas com seus cabelos longos, finos, castanhos recobrindo o teor branco de sua pele. São seis da manhã. Às seis e quinze, meu mecanismo está preparado para alertá-la. Para despertá-la em um novo dia. Mas ela fica tão linda dormindo, não queria acordá-la. Queria poder mirá-la assim, para todo o sempre.

Seis e quinze. Toda a minha estrutura vibra em um som alto e repetitivo. A garota me cobria delicadamente com uma de suas mãos - como se apenas aquele gesto fosse capaz de culminar o barulho. Mas olhe só ela, tão sonolenta que está. Deixá-la dormir um pouco mais, não a fará mal. Desligo o sistema. A minha bela princesa volta em cair em sono profundo.

– Hã? Que horas são?! - Levanta-se de uma única vez, entregando seu olhar diretamente à mim. - Oh, não! Irei me atrasar!... Poxa, já são várias as vezes em que fez isso. - Segurou-me em sua palma, suspirando fundo. - Acho que terei que trocá-lo por um novo.

E saiu do quarto, provavelmente em direção ao banheiro, para o seu banho matinal. Mas aquela última fala havia me deixado um tanto quanto intrigado.

– Trocar, ela disse. Porque ela me trocaria? Eu não sou suficiente para ela? Ela me toca todos os dias! Seus dedos, finos e delicados, estão sempre sob meu corpo! Ontem ela me programou! Hoje mesmo ela estava à me tocar!

– Isso é porque você fica olhando-a enquanto ela dorme. - Um sussurro conhecido me estava direcionado. - Seu trabalho era despertá-la. E hoje ela tinha algo importante à fazer pela manhã, sabia?

Virei-me para o lado. Era aquele idiota do abajur falando. Eu sei tudo sobre minha princesa. Não preciso de imbecis me informando coisas desnecessárias.

– Seu trabalho não era apenas iluminar o local quando necessário? Não se intrometa no que é da sua conta.

O abajurzinho bufou. Parecia que ia falar algo, mas sua voz logo falhou. A minha querida estava voltando a seus aposentos, apagando aquela ideia perturbada, espero.

– Tá 39,90. Putz, não imaginava que um despertador fosse tão caro. Acho que terei de deixar nas mãos de meu celular, mesmo.

Celular? CELULAR? Aquele aparelho inútil de tecnologia exacerbada?! Não acredito que seria capaz de me trocar por algo tão vil!

– De qualquer forma, é melhor eu ir. Já passou do horário, mas acho que posso ajudar no restante da manhã por lá.

Espere! Aonde vai? Não vai me deixar aqui, sem nenhuma explicação concreta, não é mesmo? EM?? AONDE VAI?

– Ela vai te abandonar, lata velha.

Semicerrei o olhar para aquela coluna de ferro recoberta com tinta rosa.

– Fica na sua, sucata.

Aquele abajur era irritante. Cara! Como ele era chato. Sempre incomodando-me com essa história de que ela vai me deixar… De que a culpa é minha se ela não acorda. Quem em sã consciência iria acordar um ser tão belo e puro como ela?! Estou fazendo mais que meu trabalho aqui.

Por vários dias, essa garota vai dormir tarde da noite… Estou apenas cuidando dela… De sua saúde! O que seria dela, sem o despertar tardio de uma manhã repleta de descanso? A culpa é desse ser irritante! Ele é quem a deixa acordado até tarde da noite! Marcando a pele logo abaixo de seu belos orbes castanhos, fazendo-a herdar vestígeos arroxeados, se acordada logo cedo, pela manhã. Sou eu que evito tal formação de olheiras em seu delicado rosto; Deformação esta, causada pelo maldito abajur e sua insistente luz à meia-noite.

Eu faço meu trabalho direito, sabe. - Cismou. - Por isso, nunca sou trocado. Já você…

Agora já chega. Esse abajur está falando asneiras além da conta. Agarrei-me contra a tomada e segurei firme no cabo de energia daquele desgraçado. Atreilei um T em sua tomada. Liguei a TV, o vídeo-game e um notebook ao mesmo canal de energia. O abençoado mal conseguiu terminar sua sentença em desespero.

– E-e-i! O que pensa que está---

Um barulho de pipoco reiterou pelo quarto. Uma fumacinha leve saiu de seu corpo. Uma pequena sobrecarga de energia e sua grande utilidade estava perdida.

Aquele havia sido meu primeiro assassinato. Olhei para o lado e vi o corpo daquela criatura perecer. Que alívio. Finalmente estar à sós em minha mesinha próxima à cama, tão perto do perfume de minha preciosa dama, exaltado por os lençóis negligenciados sob o colchão. Iria ser só eu e… O que é isto?! De onde surgiu este celular?

– Ué? Eu tinha deixado a tv ligada? Que estranho.

Fiquei tão absorto no assassínio que não a percebi entrar no quarto? Como pude deixar de reparar? E essa coisa? Porque esse objeto ridículo está aqui?!

– E aí cara! Beleza? - Linguajar desleixado. Aparência retangular e espessura fina. Pose de moderninho. Esse é o tal do celular? Aquele que PENSA me substituir?

Eu nem pensei duas vezes. O empurrei para fora da mesinha. O barulho de algo quebrando foi o suficiente para ganhar-me um sorriso.

– Fala sério! Meu celular novinho! Tá com a tela quebrada, já?! - A vi pegar aquele aparelho simplório e deixá-lo ao meu lado novamente.

Aquele maldito ainda estava com a luz ligada. Ele balbuciava algumas irritantes para mim - ainda que incompreensíveis. O derrubei novamente no chão. Não era possível que sobrevivesse agora.

Mas ele sobreviveu. A menina o salvou. Porquê? Ele era especial assim para você? Aquilo era inadmissível! Eu estava a mais tempo com ela! Eu sou merecedor de sua companhia e mais ninguém! Eu que cuido dela ao início de todas as manhãs e até o tardar das noites!

*ION ION! PIN, PIN, PIN, PIN! ZYON, ZYON, ZYON! BIOM, BIOM, BIOM! PIN, PIN, PIN! ION ION INO!*

– Que aconteceu com esse despertador?! Ele quebrou?!

Não estava escutando mais nenhuma de suas palavras. Eu só queria que largasse aquele aparelho supérfluo que estava em meu lugar. Nos abraços de sua palma. No calor de seus dedos. Ela era minha! MINHA!

No ímpeto de possuí-la faltou-me a superfície da mesa. No lugar, estava o chão. Havia estilhaços meus por todo o piso. Me sentia fraco. Senti o pressionar do dedo macio do qual conhecia tão bem. Mas ela clicava em um lugar que nunca senti antes. O que estava acontecendo?

– Ih, acho que quebrou mesmo. Melhor tirar a bateria ou pode inoxidar até o o concerto.

Bateria? Inoxidar? Não, espere! Se tirar minha bateria agora, eu…! Eu não poderei mais vê-la! Nunca mais poderei sentir o seu toque…! Ou ouvir sua voz pela manhã! Ou perceber os seus traços, tão formosos! Eu fiz tudo por você! E agora vai simplesmente me desligar de sua vida? Acha isso justo? Minha princesa! Minha…

Tudo ficou tão escuro. Eu nunca mais ouvi sua voz; Ou senti o toque de seus dedos sob meu corpo.

E isso já faz 8760 horas,

525645 minutos

e

...3153659 segundos.


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