A Raposa escrita por Miss Weirdo


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Só Deus - e minhas amigas - sabem como eu estava ansiosa pra postar. Espero que seja uma boa leitura =D



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Quando eles invadiram o navio, estávamos eu, o capitão e mais um marujo discutindo uma nova rota plausível para fugir de cobranças de impostos do novo porto de Abaur.

Foi bem rápido, se quer saber. Não que eu já tivesse sido feito de refém antes ou algo do gênero, mas eu imagino que essas coisas levassem mais que um minuto.

Fitamos a porta em confusão enquanto gritos vinham do outro lado, deixando-nos numa mistura de confusão e incredulidade. Quinze segundos depois a nossa porta foi arrombada, nossas mãos atadas e nossos corpos jogados no meio da sala. Eu estava um pouco atordoado com a visão que eu estava tendo. O que eram aqueles homens? Tinham dois conosco, um arrastando uma cadeira até a nossa frente, e o outro na porta. 1,90 de altura, no mínimo. Um deles era negro, e em seus punhos, luvas de ferro. O outro era loiro, esguio, e no lugar de seu braço direito havia um implante de metal, com garras afiadas no lugar das unhas. Aquilo me lembrava uma lenda, histórias que minha mãe me contava antes de eu ir dormir.

A sala em que nos encontrávamos era definitivamente pequena para nós cinco, aquela cadeira e a mesa atrás de nós. O capitão, inconformado, com os braços amarrados, começou a gritar diversos palavrões, o outro marujo, do meu lado, fechou os olhos em pânico, e até hoje eu tenho dificuldade em recordar como eu me encontrava. Provavelmente calmo, como sempre, mas com o cenho franzido, característica minha.

O loiro, na porta, enrijeceu a coluna e fez um sinal incomum, uma espécie de garra com dois dedos da mão direita - a qual ele realmente tinha garras - e passou-os pelo olho direito. O movimento foi repetido pelo negro, encostado na parede. Foi então que eu bufei mentalmente, aquilo era um tipo de reverência, mais uma pessoa estava entrando na sala. Aquilo estava ficando sufocante.

Bem, quem entrou não era nenhum homem gigante com falta de órgãos externos, e sim uma menina. Entortei a cabeça, procurando entender qual motivo traria uma garota até o meio do oceano sem que fosse para dar prazer aos marujos - suas roupas definitivamente não eram de uma prostituta. Nem chegava a ser mulher, ela devia ter uns dezessete anos, com o rosto jovem e os olhos sábios. Trajava saia e botas, uma bandana negra que contrastava com o cabelo ruivo e uma máscara que cobria parte de seu rosto. O capitão também pareceu surpreso com a invasora, mas não deixou de proferir as palavras de baixo calão um segundo sequer, amaldiçoando até a quinta geração da pobre.

Ela se aproximou e sentou-se na cadeira colocada propositalmente a nossa frente, cruzando as pernas. Fez a mesma coisa com seus braços, fitando a todos nós em silêncio. Foi quando houve um estalo em minha mente, sobre quem era aquela menina, quem eram seus marujos, e sobre o porque dela ter nos amarrado. Tinha um leve sorriso nos lábios, algo quase imperceptível, e parecia não se abalar com as diversas ofensas que o não-tão-educado chefe do navio bradava em fúria.

Foi quando ela abriu a boca que eu entendi o motivo.

— Oras, vocês me disseram que tínhamos de nos aproximar mais de Abaur para encontrarmos os estrangeiros, ainda estamos nas águas do Leste - falou para o negro, confusa.

— Deve ser algo com esses marujos - justificou-se. Seus olhos também cobertos por uma máscara preta - podem ser do Oeste e estão voltando para casa.

Ela revirou os olhos, parecendo irritada.

— Vocês não são do lado de cá do mundo, são? - perguntou para o capitão lentamente, como se fosse uma criança, e logo depois soltou uma risada sarcástica - Bem, vamos ter que pular a parte da conversa. Vocês sabem que eu gosto dos discursos, meninos, mas se eles não entendem uma vírgula do que falo, para que gastar nosso precioso tempo? - deu de ombros - é mais divertido quando eu os deixo aterrorizados, estes tolos devem achar que eu sou louca. De qualquer maneira, Cabeça está precisando de… milho? É isso que ele pediu? - perguntou, mas antes que qualquer um pudesse responder, balançou a cabeça - o que estou dizendo, eles que se virem com os suprimentos. Peguem o que puderem, eu vou explodir essa porcaria de uma vez - então olhou novamente para o capitão, parecendo um tomate com o esforço da gritaria, e, sem paciência, disse - argh, pelos deuses, este infeliz poderia parar de falar um segundo. Mohra, lembre-se de joga-lo ao mar… amarrado.

Inclinou-se para levantar da cadeira, mas então percebi que, assim que ela fosse embora, eu e o resto dos marujos morreríamos, e eu realmente não queria tal destino.

— Você é a Sea Fox - falei, no melhor Ocqui que pude pronunciar. Ele estava bem enferrujado, não praticava a tempos, pois faziam anos que eu não visitava o lado Leste do mundo.

— Mas veja só - voltou-se para mim - temos alguém que nos entende aqui, Sailors - sorriu satisfeita, e voltou a reclinar-se na cadeira.

— Você pretende nos matar? - perguntei, mas logo me arrependi com o quão óbvia era a pergunta.

— Primeiro vamos roubar suas coisas, e depois vamos mata-los - concordou, como se assassinar um navio inteiro fosse rotina. Mas, se aquela menina era igual às lendas que eu tinha ouvido, realmente fazia parte da lista de tarefas de seu dia a dia.

— Mas… - tentei reverter a situação.

— Espere, espere um pouco - ela fechou os olhos, irritada - traduza para seu capitão que se ele não calar a boca, você e seu amigo limparão seus miolos da parede.

Olhei para o capitão, praticamente sem ar. Se eu não mandasse ele ficar quieto, ele provavelmente morreria por mau funcionamento pulmonar ou algo do gênero. Direcionei minha visão para meu assustado colega de navio, não entendendo porque eu estava conversando com uma suposta prostituta e seus marujos que mais pareciam aberrações. Traduzi o que ela pediu. Silêncio.

— Ainda assim o jogue ao mar, sim? - falou para Mohra, o negro, e voltou-se para mim - Bem, estava dizendo?

— Eu gostaria de perguntar, se não for muita audácia de minha parte - gaguejei um pouco, procurando as palavras certas. Como eu disse, meu Ocqui estava enferrujado - se pretende passar pelas fronteiras de Maragua.

— Eu não deveria sair contando os planos oficiais de meu navio… - titubeou os dedos por seu queixo, pensativa - Ah, tudo bem, vocês vão todos morrer mesmo - deu de ombros - sim, pretendo.

— E vai saquear navios? - indaguei.

— Aonde quer chegar? - o garoto loiro sibilou, e Fox lançou um olhar de desdém a ele, que voltou a posição inicial de marujo submisso.

— Vamos saquear navios, assim como fazemos aqui - contou, e então puxou uma faca de sua bainha. Começou a cutucar as unhas com ela, distraída.

— Mas você não pode - falei, torcendo para não ser morto por um golpe surpresa da faca que ela tinha em mãos, afinal, eu não tinha ideia de sua estabilidade, ou instabilidade, que seja, mental.

— Não posso? - indagou, sem se importar com o que eu dizia, ainda focada em suas unhas.

— Os marinheiros do Oeste tendem a ser um pouco mais… Agressivos que meu companheiro aqui.

Olhei de relance para o capitão, que encarava confuso nossa conversa.

— Você acha que meus homens não dão conta dos marinheiros que vamos encontrar no Oeste? - falou, ainda sem dar a mínima.

— Esta não é a pergunta certa - ouvi um rugido de desaprovação do loiro, parado na porta, parecendo estressado - você deveria procurar saber como você fará tal feito.

— Eu já ouvi a mesma coisa sobre navios sulistas - olhou de relance para mim - e mesmo assim o Metal Curse continua inteiro, forte, e deixou bons rastros de inconvenientes inimigos por todas as águas que imaginar. Posso nunca ter estado no Oeste, mas o Mohra aqui falou que não é nada demais - o homem negro assentiu com a cabeça.

— Mas o Mohra não é um típico navegante do Oeste, como eu. E nenhum de vocês fala Gher, como eu novamente. Eu sei como abordar um navio de lá, e principalmente as rotas em que eles passam.

— Deixe-me ver se entendi direito. Você está insinuando que quer me ajudar? - ela falou, arqueando as sobrancelhas incredulamente, como se já tivesse ouvido aquela história dezenas vezes antes.

— Aparentemente - concordei.

— E por que você iria querer entrar para um grupo de homens modificados, que matam gente, explodem coisas, saqueiam mercadorias e são temidos por todos? - quis saber.

— Simples: não é minha hora de morrer - falei, balançando a cabeça - e se para cumprir meu destino devidamente eu tenha que ganhar uma prótese metálica e jogar fogo em alguns seres humanos, que seja.

— Bem, se eu te deixar aqui amarrado, jogar seu amigo capitão ao mar, roubar suas coisas, explodir essa espelunca velha e mal cheirosa, assim como pretendo, você morreria, correto? - não esperou por minha resposta - seria esta sua hora de morrer. Você não acha que quem ter o real poder em mãos aqui sou eu? - não apresentava nem uma feição curiosa e nem uma feição irritada pelas interrupções que eu fazia, estava inexpressiva, talvez até animada por travar esta batalha de palavras.

— Não. Você pode ter o controle sobre a situação, mas o destino tem controle sobre você - dei de ombros - resumindo, eu não vou morrer hoje.

— Fox, ele está te enrolando - o loiro falou da porta, já irritado.

— Quieto, Garra, estou tentando pensar - ergueu sua mão para ele, ainda me fitando. Ela passou seus olhos por mim, pendeu a cabeça de um lado para o outro por uns segundos. Eu permaneci calado, apesar de por dentro estar torcendo por ela me deixar viver. Tentei imaginar quais conflitos se passavam em sua cabeça, havia algum debate ocorrendo naquele exato instante, dentro dela, porém aquela menina sabia esconde-los muito bem.

Então levantou-se, caminhou até a porta sem dizer uma palavra, e eu pensei “é, não foi hoje que…”

— Você pode vir conosco - falou, virando a cabeça levemente, o céu noturno sombreando seu rosto. Naquele momento, o sorriso que tinha se feito no rosto de Garra desapareceu - mas se você cometer um deslize, matarei-o eu mesma.

Ainda bem que ela tinha interrompido meu pensamento.

Mohra veio até mim e soltou meus pulsos, mas me deixou no chão para me virar sozinho. Os segui até a porta, e quando cheguei na pequena sacada que desembocava na escada para o deque, eu pude ver 10 homens, bizarros como os dois que me prendiam minutos atrás, todos em fila, fazendo aquela mesma garra de dois dedos pelo olho direito, enquanto Fox pousava as mãos na madeira, olhando-os.

A pirata ruiva desceu a escada circular, passou a frente de todos os seus marinheiros altos, uns 10 centímetros maiores que eu, no mínimo, e ziguezagueou pelo meio dos marujos atados e jogados no chão.

— Vamos, homens! - ela gritou, e parou na frente da ponte estabelecida entre nossos navios. Foi a primeira vez que vi o Metal Curse, e a minha reação deve ter sido bem genérica. Apesar de o navio não ser realmente de metal, e sim de madeira, tinha vários adornos assustadores, e era gigantesco. Eu não estava nem um pouco ansioso para descobrir porque seu nome era “A Maldição do Metal”.

Seus marujos passaram todos à sua frente, enquanto ela esperava pacientemente pelo fim da linha - eu.

Assim que chegou minha vez de subir a escada, ela me impediu. A luz das tochas iluminavam seu rosto de maneira sombria, mas seu sorriso era instigante, e eu queria saber o que ela planejava. O céu escuro me impedia de ver muito mais, e a pouca brisa mexia nossos cabelos.

— Qual seu nome? - ela perguntou.

— Tomeh, Fox.

— Tomei? - ela perguntou.

— Não, Tomé. Você está dizendo Tomei.

— Ah, tanto faz, Tomeh - falou, pronunciando da mesma maneira de antes. Imaginei que teria de me acostumar, vai ver era sotaque Ocquiano - eu pensei que, antes de você entrar no navio, eu deveria avisar: a vida como Metal Sailor não é simples, e se você fizer qualquer besteira, qualquer que seja, te fazemos andar na prancha. E não é uma metáfora.

Engoli em seco.

— E também tenho uma pergunta - ela fez uma pausa, mas logo continuou - você acredita em anjos, Tomeh?

— Sim, Fox - respondi, tentando entender onde ela pretendia chegar.

— Muito bem, então você com certeza acredita no diabo, e ele está bem na sua frente.

Deu as costas e subiu as escadas, me deixando parado, com cara de otário. Balancei rapidamente a cabeça para sair do transe, se eu não quisesse morrer, tinha de ir com eles.

Entrei em seu navio, que estava inteiramente carregado com coisas que eu sabia que eles tinham roubado de onde havíamos acabado de sair.

Cinco minutos depois já estávamos navegando em direção a fronteira de Maragua, e atrás e nós, os destroços de um navio inimigo, espalhados pelas águas.


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Notas finais do capítulo

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