Quer brincar comigo? escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 10
Descanse em paz, finalmente




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Ambulâncias e carros da polícia tinham estacionado no terreno do galpão e Denise estava recebendo os primeiros socorros. Um paramédico tinha colocado soro na veia, outro checava seus sinais vitais. Seu corpo estava desidratado, ela tinha perdido a consciência e precisava de atendimento urgente.

Carmem, Marina e Maria também foram atendidas, embora o estado delas não fosse tão grave. Magali também estava entre elas amuada e triste.

Vários pais tinham ido até lá para abraçar as filhas desaparecidas e dar broncas nos filhos que tinham fugido no meio da noite para enfrentar uma seqüestradora perigosa. Os jovens tentaram falar o mínimo possível, dizendo somente que a mulher tinha fugido assim que eles chegaram e levaram muitas broncas dos policiais por terem agido por conta própria ao invés de chamar a polícia. Afinal, aquilo não era nenhum filme ou mangá.

(Mônica) – Ainda bem que acabou. Só que a gente vai ter um trabalhão pra proteger a Magali... ninguém pode saber que foi ela, senão vai dar rolo.

(Cebola) – Só a Marina e a Maria viram que foi ela e sei que não vão falar. Carmem não viu nada e pensa que a Magali foi raptada. Denise tava desacordada, então não viu nada também. Acho que vai ser tranqüilo.

(Cascão) – Beleza, mas e o corpo da menina? Como a gente vai fazer?

(Cebola) Vai dar um trabalhão, mas vou ver se dá pra fazer alguma coisa. E você mandou bem, viu? – ele deu um tapinha nas costas do Cascão - Eu nem teria imaginado o que tava acontecendo com a Magali. De vez em quando essa coisa na sua cabeça funciona!

– Valeu careca... como é?

– Hahaha!

Eles foram embora dali e Sarah foi muito aliviada por ter conseguido resolver o problema daquele pobre espírito. Que estranho seus amigos não terem visto nada... tudo estava tão claro! Bem, não era hora de pensar nisso. Ela estava muito cansada e só queria encontrar sua querida cama e dormir como uma pedra até o dia seguinte, o que nem ia ser muita coisa porque devia ser perto de duas da manhã. Paciência...

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Magali estava triste, envergonhada e sem saber como encarar as amigas. Mesmo o pessoal tendo falado várias vezes que seu corpo estava possuído e ela não tinha nenhum controle, era difícil aceitar que outra entidade tinha tomado conta do seu corpo sem que ela pudesse fazer nada.

Uma semana tinha se passado e ela ainda não queria ir para a escola. Mônica, Cebola, Cascão e Sarah a visitavam todos os dias tentando animá-la em vão. Marina e Maria Mello também conversaram com ela e disseram que tinha entendido muito bem que ela não estava no controle de si mesma e por isso não sabia o que estava fazendo.

Carmem e Denise nunca ficaram sabendo de nada. Eles tinham decidido deixá-las pensar que tudo foi obra de uma maluca psicopata. Carmem nunca ia entender o que tinha acontecido com Magali e poderia causar problemas. Apesar de ter experiência com fenômenos bizarros, eles não confiavam que Denise fosse capaz de manter a boca fechada. De qualquer forma, quanto menos gente soubesse, melhor.

Pelo menos as meninas estavam se recuperando bem, apesar dos ferimentos e de terem perdido várias mechas dos cabelos. Carmem era a que mais sofria, era como se estivesse em luto por ter perdido um dos seus pais. Maria Mello teve que cortar alguns centímetros dos cabelos para tirar as falhas. Pelo menos a mulher tinha cortado seus cabelos perto do final e não tinha aleijado nenhuma mecha. Marina tinha mandado colocar alguns apliques para suprir as falhas e o cabelo de Denise não chegou a ser cortado. Menos mal.

Apesar de ter sido a primeira raptada, Denise estava se recuperando melhor que o esperado e depois de um tempo só queria pensar na sua grande festa de halloween. Ela era realmente muito forte. Com o tempo, tudo seria esquecido.

Ainda assim Magali não queria sair de casa. Uma depressão forte tinha tomado conta dela. Pelo menos seus gatos voltaram a ficar mansos e estavam aconchegados junto a ela. Sofrer sozinha era muito pior.

– Isso não é justo... – ela murmurou para Mingau. – Será que toda hora algum espírito vai invadir meu corpo? E esse quase matou as meninas, já pensaram que perigo? O pior é que eu não sei o que fazer pra mudar isso!

Primeiro foi a Penha, que possuiu seu corpo e quase matou a Mônica. Depois o Porta-Voz em Sococó da Ema. Apesar de ele não ter machucado ninguém, ainda assim foi muito desagradável ter seu corpo invadido e usado. Por último teve aquela mulher perturbada que além de ter feito mal as suas amigas, ainda pretendia judiar dos seus gatos. Não havia perdão para aquilo.

– Toc toc... – alguém falou em tom bem humorado, lhe dando um pequeno susto. – E aí, posso entrar?

– Cascão! Nossa, eu nem te vi chegando!

– Sua mãe falou que eu podia subir...

– Tudo bem, entra.

– Você ainda tá muito bolada, não é?

Ela fez que sim com a cabeça e o rapaz sentou-se na beirada da cama.

– E a Cascuda? Eu não quero arrumar briga com ela.

– Esquenta a cabeça com isso não que ela tá ocupada com outra coisa. E quer saber? A gente era amigo antes de eu começar a namorar com ela e não vou mudar isso agora!

– Ainda assim...

– Pensa nisso agora não, Magá. Eu só vim aqui pra falar que a Sarah e o Cebola conseguiram fazer com que desenterrassem os ossos da menina pra enterrar no cemitério da cidade.

– Sério? Que bom! Coitada, ela merece ser tratada com mais respeito!

Foi um trabalho difícil, mas felizmente Cebola foi capas de reunir todas as provas e evidências para conseguir que escavassem o galpão a procura dos ossos. Felizmente o lugar era abandonado, o que facilitou um pouco. Os especialistas estudaram os ossos e concluíram que pertenciam a uma menina de dez anos que parecia ter as mesmas características da garotinha que tinha desaparecido supostamente raptada por ciganos. Apesar das dificuldades iniciais, tudo correu bem como se houvesse alguma força sobrenatural guiando tudo.

– O enterro vai ser daqui a pouco. O pessoal vai. Quer vir também?

– Ah... não sei se tô com vontade de sair de casa. Eu não consigo aceitar o que aconteceu!

O rapaz pegou sua mão num impulso e falou com a voz enérgica.

– Você não tem que aceitar mesmo não porque não foi culpa sua. Foi muito chato, eu sei que foi! Mas quer saber? Já passou, as meninas ficaram bem, vão se recuperar e aquela mulher doida não vai mais atacar ninguém. Tenta se animar porque ficar deprê também não vai resolver nada!

Ela hesitou.

– Você acha certo eu ficar tranqüila sabendo que outro espírito doido pode invadir meu corpo e...

– Ih, fica pensando nisso não que é pior! O que a gente pode fazer é tentar arrumar um jeito pra isso não acontecer mais.

– E tem jeito?

– Sei lá! A gente pode pesquisar, pedir ajuda pra Sarah, ela parece manjar dessas paradas. Mas ficar sofrendo aí não vai levar a lugar nenhum. Anda, levanta daí e vamos lá pro cemitério. Depois te levo pra tomar um sorvetão caprichado!

Pela primeira vez o rosto dela se iluminou e ela sorriu. Não pelo sorvete (ainda que lhe agradasse muito), mas pelo jeito bem humorado dele. Cascão estava certo, ficar chorando e lamentando não levava a lugar nenhum. Suas amigas tinham sofrido mais do que ela e estavam seguindo em frente, por que ela também não podia superar? Se fosse o caso, ela tentaria descobrir uma forma de se proteger dos espíritos invasores, mas por enquanto era hora de voltar a viver.

– Ah, tá bom! Então sai daqui pra eu trocar de roupa!

O rosto dele ficou vermelho ao pensar nisso e mais vermelho ainda ao perceber que ainda segurava a mão dela. Magali também ficou encabulada e eles se soltaram rápido.

– Tô te esperando na sala, demora não!

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Era um espaço bonito, bem gramado e ficava perto de um ipê roxo. Um belo lugar para guardar os restos mortais de uma criança que tinha sofrido tanto. Os coveiros terminavam de abrir a sepultura enquanto Mônica esperava junto com Cebola e Sarah.

– E a Magali? – Ele perguntou.

(Mônica) - Ela disse que vai vir. Tomara, viu? Ela tá tão triste que dá dó!

(Sarah) – É difícil pra ela aceitar o que aconteceu e pensando bem deve ser horrível ter o corpo invadido por espíritos mal intencionados!

Victor estava a alguns metros dali observando o grupo e ao lado dele tinha uma garotinha.

– Você gostou do lugar que eles conseguiram?

– É muito bonito! – ela respondeu encantada.

– Como ela está?

– Se recuperando. A sinhá ainda tem um caminho longo.

– Às vezes é difícil se reequilibrar, não é?

– É sim, mas ela vai conseguir. Só espero que aquela moça não continue aborrecida demais com isso, não foi culpa dela!

– Bem... As vezes as pessoas abrem espaço para que esse tipo de coisa aconteça. Eles aproveitam dos seus pontos fracos e foi o que aconteceu com ela.

– Mas quase ninguém tem consciência disso.

Ele concordou. As pessoas viviam totalmente alheia aos diversos níveis de realidade que existiam ao redor delas. Como se defender de algo que muitos pensam nem existir? O caminho da humanidade ainda era longo.

– Ah, olhe! Ela está chegando. Isso é bom! – Victor apontou e a menina sorriu.

– Ainda bem. Ela parece melhor mesmo.

O grupo também viu Magali e Cascão chegando e se alegraram.

(Cebola) – Chegaram bem na hora, já vão enterrar os ossos!

(Mônica) – Ai, amiga, como você tá?

– Eu tô bem agora, Mô. O Cascão me animou um bocado e vai pagar um sorvetão pra mim!

O rapaz deu um sorriso amarelo e quando ninguém estava olhando, se pôs a contar os trocados e ainda pediu algum emprestado ao Cebola. Alimentar a Magali não costumava ser fácil e nem barato, mas ele faria qualquer coisa para vê-la feliz.

Quando os coveiros terminaram de cavar a sepultura, desceram o pequeno caixão com os ossos sob o olhar respeitoso da turma, que observava em silêncio. Mônica e Sarah jogaram várias flores dentro do túmulo. Quando os coveiros começaram a fechar a sepultura, eles decidiram ir embora. Mais tarde voltariam para deixar flores na lápide.

Antes de ir embora, Sarah olhou para trás e sorriu ao ver o Victor lhe acenando de longe ao lado de uma garotinha. Ela parecia muito bem, estava linda e radiante com aquela bonita aura de luz. Por que os outros não enxergavam isso? Era uma pena.

– E aí, galera? Bora tomar sorvete? – Cascão convidou alegremente e todos aceitaram. Depois de tantas angústias, eles mereciam um momento de paz antes da próxima aventura.

Victor e Zefinha observavam a turma se afastando com um sorriso no rosto e logo em seguida desapareceram no ar. Tudo estava tranqüilo.

Por enquanto.


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