TALK ME DOWN

Sam havia ido dormir há certo tempo. Já Dean bebia mais um pouco de sua cerveja, sentindo a língua doer de leve com o gosto, e buscava por mais aparições estranhas e resultados sobre a Escuridão. Ele não conseguia tirar aquela mulher da cabeça, e apesar de extremamente linda o loiro tinha em pensamentos uma outra espécie de ser, anos antes impossível de existir para os Winchesters.

Os olhos verdes como os da mãe deslizaram do teclado gasto para os nós dos dedos levemente arranhados – culpa de Crowley ao jogá-lo naquele guarda-roupas -, depois caíram para o colo e então os ouvidos captaram o som de correntes.

Dean visualizou a silhueta encolhida e doída de Castiel naquela cadeira desconfortável, em formato de S. Ele sequer conseguia apanhar a coberta que escorregava dos ombros e ia parar em segundos no chão, por conta das algemas. “É para a sua segurança”, alegou Sammy. Apesar de ser verdade, o fato era que Dean não queria machucar o anjo se algo saísse do previsto.

- Dean, não precisa ficar me velando durante a noite – a voz rouca e singular de Cas se fez presente na sala onde as pesquisas eram feitas no bunker. Ele tentou se contorcer para pegar a coberta, mas as correntes que o prendiam ao chão não o permitiam – Você sabe que eu não durmo, de qualquer maneira.

- Você mal consegue pegar uma coberta sozinho e acha que eu vou dormir em paz enquanto você estiver sentado desconfortável nessa cadeira?

Castiel abaixou os olhos. Agradeceu ao Pai mentalmente.

Cause you know that I can't trust myself

and my 3am shadow

- Bem... uh, Cas- eu, você- ah! Você quer deitar no sofá?

Não que anjos não sobrevivessem se estivessem desconfortáveis, mas ele havia acabado de ser torturado e estava com um feitiço tomando conta de seu corpo. Ele aceitaria qualquer coisa mais confortável do que aquela cadeira lisa e dura.

- Seria muito agradável, sim, Dean. Eu agradeço – Castiel deixou os braços caírem ao lado do corpo e fechou os olhos com força quando mais uma aparição repentina de lembranças tomou conta da sua cabeça.

O Winchester mais velho colocou as mãos em seus ombros e o cobriu com a coberta, apertando as omoplatas de leve: - Estou aqui, Cas! Não me dê mais um puta susto de novo, idiota.

O anjo abriu os olhos, levemente irrigados de sangue e os manteve vidrados nos de Dean.

I wanna sleep next to you

But that's all I wanna do right now

So come over now and talk me down

- Eu terei que te manter com as algemas – o loiro disse, cabisbaixo – Sinto muito, Cas.

- Não se desculpe, Dean. Eu entendo você tanto como consigo ver as pedras na profundidade de um córrego cristalino.

Enquanto o caçador tirava as correntes dos pés agora descalços do anjo, ele deu uma gargalhada baixa. Castiel estava aprendendo metáforas mais rápido do que esperava que fosse aprender. O que Dean não sabia era que o anjo via para além de sua existência material, analisando meticulosamente sua alma.

A passos calmos, ambos se encaminharam ao pequeno sofá do outro lado da sala. Dean fez com que Castiel se sentasse antes de cobri-lo mais uma vez.

- Sente-se, Dean.

O caçador suspirou e deixou-se cair no sofá, relaxando os ombros.

As mãos de ambos se roçaram, e Dean se preocupou com a temperatura do anjo: - Você está frio.

- Culpe Rowena.

I wanna hold hands with you

But that's all I wanna do right now

Como se chamasse a magia presa dentro de si para fora, flashbacks voltaram. Crowley desmaiado no chão, “morto” por alguns segundos – até ele se dar conta do que havia ocorrido -. A sensação de ter dos olhos o sangue escorrendo, a raiva que o fazia se enfurecer. Ele queria matar Sam, uma mulher ruiva e sentia que a morte não lhe estava longe.

Naquele momento, Dean via o amigo grunhir, e a sua única reação foi colocar as mãos nos ombros de Castiel mais uma vez. Entretanto, diferente de alguns minutos atrás, ele continuou dentro de seu torpor.

Dean tocou o rosto do anjo: - Cas – sussurrou o apelido -, não faz isso comigo agora, cara.

Na verdade, os lábios imploravam por outro tipo de contato, ao pé do ouvido do anjo. Mas havia o medo da rejeição, e Dean não podia perder mais ninguém, principalmente Sam e Cas.

And I wanna get close to you

Cause your hands and lips still know their way around

Castiel arfou buscando ar, a sensação de estar se afogando tomando conta de seus pulmões – como quando entrou no lago e deixou os leviatãs tomarem conta de si até a sua existência inexistir por alguns dias -.

O caçador, afobado, praticamente se sentou nas coxas de Cas, que urrou de dor internamente. Externamente, ele queria mais calor humano vindo do loiro à sua frente.

- Está tudo bem, Cas? – soltou – Diabos, fale comigo!

- Dean, está tudo certo – Castiel bufou, implicando um pouco – Eu não entendo os seres humanos, tão preocupados. Eu já te fiz tanto mal, não consigo carregar a ideia de como você e Sam continuam a me ajudar.

E Dean o ignorou, pegando seus dedos entre as mãos e sentando-se ao seu lado, ligeiramente magoado.

Quando o moreno se acalmou, os lábios entreabertos e soltando lufadas de ar como quando alguém brinca de fazer nuvens no ar frio, Dean sentiu as pálpebras pesarem. Ele se comparava à uma criança que passara da hora de dormir, e lembrava-se de Sammy na infância. Tão pequeno e indefeso. A única diferença para Dean sempre seria apenas o tamanho.

Cas, por culpa, começou a erguer o tronco:

- Eu sento na cadeira novamente, Dean. Você precisa dormir e eu n-

Winchesters eram conhecidos por suas idiotices, o fato de morrerem e voltarem sempre que querem, se sacrificarem pelos que amam e principalmente por suas atitudes.

Então o caçador deitou-se no sofá e puxou o corpo de Castiel para se deitar ao lado do seu: - Qualquer movimento que não seja o da sua respiração, e eu vou saber que está acontecendo algo.

I wanna sleep next to you

But that's all I wanna do right now

So come over now and talk me down

So if you don't mind, I'll walk that line

Stuck on the bridge between us

Durante alguns minutos, ambos se entreolharam. Os olhos verdes brilhavam, enquanto os azuis irrigados lacrimejavam de desconforto por causa do feitiço. Não haviam barulhos que não fossem os de suas respirações. Logo, Dean dormiu. A respiração compassou, as feições se suavizaram, as sardas tomaram o campo de visão de Castiel.

Ele as contou e recontou, até o amanhecer.

But I wanna sleep next to you

And that's all I wanna do right now

And I wanna come home to you

But home is just a room full of my safest sounds

So come over now and talk me down