Fallen escrita por Milly Winchester


Capítulo 25
A única


Notas iniciais do capítulo

Oi, meus cabritinhos lindos e cheirosos!

Tô com um pouquinho de pressa, então... Bem, aqui está o capítulo. Espero que gostem :) Vejo vocês nas notas finais!



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 I'm alone

'Cause this house don't feel like home

If you love me, don't let go

If you love me, don't let go

Hold, hold on, hold on to me

'Cause I'm a little unsteady

A little unsteady

 

Abri os meus olhos com dificuldade e tentei a todo custo mantê-los abertos, mas minhas pálpebras desabavam sobre as órbitas por uma pura vontade própria. Meu coração batia dolorosamente contra as costelas, em um ritmo descompassado e parecendo inchar cada vez mais em meu peito. Mais uma vez, eu estava amarrada e vulnerável, sentindo a corda — que dessa vez, prendia as minhas mãos acima da minha cabeça, de modo que eu ficasse quase pendurada — roçar e queimar a pele das minhas mãos. Só então a dor deu as caras — pontadas dolorosas e ardentes nasceram em meu ombro, barriga, coxa e palmas das mãos. Eu sentia um gosto metálico na boca e algo escorrendo lentamente por meu corpo. Algo me dizia que aquilo era sangue, e esse mesmo "algo" também me dizia que eu havia sido raptada. De novo.

 

Ofegante, tentei me debater nas amarras, mas estava óbvio que elas não cederiam. Eu sempre me perguntava por que eu era idiota a ponto de tentar esse tipo de ato inútil e sem nexo, mas provavelmente é a tensão do momento que me obrigava. Apertei os olhos com força e fiz uma careta, tentando inutilmente me recordar de como eu fui parar ali e por que estava ali. As memórias do recente acontecimento logo me atingiram como uma flechada e eu respirei fundo, inspirando com exagero como se estivesse desprovida de oxigênio.

Enquanto eu tentava bolar, em minha cabeça, um plano idiota para escapar dali e tentava lidar com a dor, escutei um barulho. Para ser mais precisa, passos leves e ruidosos vindo na minha direção, produzidos por um salto alto, provavelmente. Milhares de possíveis sujeitos percorreram meus neurônios, mas somente duas mulheres me deixaram em dúvida — Helena e Abaddon.

E não é que eu estava certa?

Entrando debaixo do minúsculo lustre acima da minha cabeça — que iluminava somente a mim, visto que o resto do cômodo era coberto pelo breu —, assim que vi os fios loiros e cintilantes, a reconheci no mesmo instante. 

Helena abriu um sorriso desdenhoso, e ao mesmo tempo, zombeteiro, e sibilou como uma víbora:

— Bom dia, Sunshine

20 HORAS ATRÁS

— Você não tem o número dele, não?

Sam revirou os olhos, jogando as ervas com ferocidade no recipiente que estava no chão. O vento parecia querer me levar para longe de tão forte e arrebatador que estava — e parecia estar quase conseguindo. A tangível tensão nos arredores do bunker — onde realizávamos o feitiço invocador — era inutilmente "amenizada" por Dean, que mesmo mal-humorado, não desistia de suas rotineiras piadas. O Winchester mais velho pareceu um pouco ofendido diante da reação do irmão.

— Não, Dean — Samuel bufou, indicando o óbvio. — Nem todos os anjos tem um celular.

— Foi mal — Dean deu de ombros, enterrando as mãos nos bolsos da jeans. — Esqueci que anjos não tem o cérebro completamente desenvolvido. 

O mais novo travou o maxilar, lançando a Dean uma olhadela chamuscante e denunciando sua irritação diante do mau humor do irmão. Ao contrário dos dois, eu estava quieta. Desde o dia anterior, quando os Winchester me resgataram das garras afiadas e pintadas de vermelho de Abaddon, eu não falava com o Dean. Sam não estava aborrecido, mas era evidente que Dean estava. Eu não tentara falar com ele, pois achei que pioraria a situação. Inevitavelmente, eu o encarei, que me encarou de volta com o olhar frio e em seguida, desviou o mesmo.

Suspirei, observando Sam incendiar as ervas dentro do recipiente com o fósforo aceso que lá lançou.

Dean não estava certo, disso eu sabia, mas eu também sabia que não valia a pena me irritar com ele. Eu estava o protegendo, tudo que eu havia feito era para o bem dele, e ambos sabíamos que Abaddon me mataria se eu não aceitasse a proposta, dessa vez impossibilitando de verdade qualquer maneira de derrotar Lúcifer. E mesmo depois disso tudo, eu é que estava errada? Ao menos Sam concordava comigo, e como Dean não era conhecido por ter lá muita paciência, eu decidi não atiçá-lo mais ainda para causar uma discussão desnecessária. Ele provaria a sua sensatez se percebesse que ele é quem estava sendo egoísta. 

Ouvi Dean bufar, provavelmente irritado com o fato de que o feitiço invocador estava demorando para fazer efeito. Cruzei os braços, com uma significante raiva por Abaddon ter pego a minha jaqueta de couro. Eu nem a menos tive a chance de resgatá-la e perder aquela jaqueta era como perder uma perna para mim. As chamas, que dançavam em direção ao céu em um show tremulante e alaranjado, produziram um ruído estranho. Alerta, movi o olhar até as proximidades da pequena e controlada fogueira, pousando-o no arcanjo que as chamas escondiam e que acabara de ser revelado. 

— Elizabeth — proferiu calmamente, piscando as orbes azuis. — Bom tê-la de volta.

— Comece a falar — exigi, contraindo os bíceps e enterrando mais as mãos nos braços. 

Miguel franziu o cenho, as esferas cerúleas cintilando na minha direção. Semicerrei os olhos e observei um pesado bufar abandonar seus lábios. Um semblante de decepção foi desenhado em seu rosto. 

— Helena. Ela o pegou — esclareceu esbaforido. — E ela está aliada à...

— Lúcifer — completei, interrompendo-o. — É, eu sei.

Miguel encarou-me por algum tempo, e depois, deslocou a visão até as chamas que tremulavam diante dos nossos olhos. Sam e Dean permaneciam em silêncio. Arqueei uma das sobrancelhas e fitei o arcanjo com um olhar sugestivo, indicando para que ele prosseguisse.

— Helena está mantendo Castiel em um armazém em seu céu pessoal. Eu tenho permissão de invadi-lo, mas ela trancou-se no tal armazém com Castiel através de símbolos que afastam os anjos. Se ela sair do lugar, ela não pode retornar pois não permite que anjos entrem, e é por isso que preciso da vossa ajuda para resgatá-lo. 

— Com todo o prazer — fiz uma reverência irônica, dando as costas para ele e os meninos. — Partimos em meia hora. Não temos tempo a perder.

Tratei de marchar de volta ao bunker para me preparar para o resgate.

{...}

Assim que ergui a visão, pude contemplar o meu disforme reflexo. Como de costume, bolsas arroxeadas descansavam debaixo de meus olhos e minha pele estava pálida a ponto de se assemelhar com uma folha de papel. Os olhos castanhos quase não tinham mais vida. Um suspiro abandonou meus lábios e ecoou pelo pequeno banheiro. Fazendo uma careta, elevei um pouco o tecido da blusa que eu acabara de vestir e revelei as cicatrizes dos cães do inferno. Castiel havia as curado, mas não a tempo de não deixarem marca alguma. As cicatrizes não eram muito visíveis, mas se analisadas com cuidado, eram perceptíveis. 

Elas definitivamente não superavam aquelas que se encontravam em meu coração.

Tentando afastar o pessimismo que pairava sobre mim como uma nuvem carregada e tempestuosa, sequei os cabelos com a toalha em minhas mãos, apenas tirando o excesso de umidez. Inspirei a fragrância doce que meu cabelo exalava — o que um condicionador não faz? —, respirei fundo e abandonei o banheiro com as mudas sujas de roupa em mãos. Deixei-as em meu quarto e me dirigi às escadas que me levariam ao andar posterior. Meu celular me indicava que já havia se passado trinta minutos e estava na hora. Alcancei o primeiro andar, caminhando até os Winchester e o arcanjo com as mãos descansando nos bolsos da calça jeans.

— Você está pronta? — questionou cordialmente o anjo, com serenidade transbordando na voz.

Mordi o canto do lábio, tentando lembrar-me de algo. Assim que me recordei, gesticulei:

— Quase — fiz um gesto pedindo calma.

Sam me encarou com os olhos caídos enquanto eu rumava à cozinha.

— Miguel e eu esperaremos do lado de fora. 

Miguel e ele?

Eu sabia o que Sam estava tentando fazer.

De punhos cerrados, abri a porta do eletrodoméstico com ferocidade, não me importando com qualquer reação vinda de Dean. Me curvei para enxergar o que se encontrava sobre as prateleiras da geladeira e assim que meus olhos pousaram no frasco de suco de maçã, estendi a mão para pegá-lo. Cerrei a porta atrás de mim enquanto desfilava de volta à biblioteca, me deparando com Dean, me encarando e estendendo uma espada angelical para mim.

Fixei os pés onde eles estavam e de cenho franzido, rapidamente bebi um gole do líquido. Após ingerir, enrosquei a tampa na abertura, comprimindo os lábios e semicerrando os olhos que eu tentava a todo custo não revirar.

— Eu não preciso. Valeu — dispensei, desviando o olhar.

Preparada para ir embora, a voz de Dean ecoando por meus ouvidos novamente me fez paralisar. O que ele disse me fez estremecer:

— Não seja teimosa.

Girei nos calcanhares, revelando os supercílios elevados e integrando uma expressão carregada de ironia. Dean não parecia abalado com a silenciosa intimidação. Não fui capaz de conter-me e rendi-me à vontade de rolar os olhos, ato que não passou despercebido muito menos apreciado pelo Winchester que me encarava. 

— Eu disse que não preciso. Obrigada — repeti, dessa vez com uma sarcástica lentidão. 

— Já não bastava o egoísmo... — ele sussurrou para si mesmo, mas não baixo o suficiente para que se tornasse inaudível para mim.

Suas palavras entraram queimando, penetrando nos meus ouvidos. Senti minha garganta arder. Eu queria enfrentá-lo, e o pior de tudo, é que eu não sentia raiva. Eu queria sentir, mas tudo que eu era capaz de sentir era dor. Dor porque o que eu sentia por Dean havia sido quebrado em mil pedaços depois do dia em que Abaddon me raptou — assim como o meu coração. Dor porque ele estava pintando o meu coração de preto e pisoteando-o com aquelas palavras. Mas ao mesmo tempo, ira. Ira pela sua certa ingratidão. Apertei as unhas contra as palmas, replicando áspera:

— Sabe, Dean, tudo que eu fiz foi para o seu bem. Para o seu e para o de Sam. Não me importo se para isso, tenho que trabalhar para as piores pessoas. Eu tenho uma missão, e sempre haverão obstáculos para atingir o objetivo final. Abaddon é um deles, e para cumprir a minha missão, preciso dela. Pense bem, se eu não aceitasse o acordo, ela poderia me matar e acabar com qualquer chance de derrotar Lúcifer e acabar com o apocalipse que ele pretende trazer — respirei fundo e prossegui: — Então, por favor, da próxima vez que desejar me chamar de egoísta, tenha ao menos alguns argumentos válidos. Eu vou acabar com o Lúcifer, com ou sem o acordo de Abaddon. Fim de papo.

Depois de devolver o suco de maçã para a geladeira, voluteei nos calcanhares e dei as costas para o Winchester, que permaneceu ali, boquiaberto e com os sapatos grudados no chão pelo espanto. Ele não disse ou fez mais nada. Pude sentir meus olhos queimando pelas lágrimas que os inundavam e tudo que me restou foi focar no meu objetivo atual. Salvar Castiel.

Quando deixei o bunker, me deparei com Sam e Miguel, preparados para rumar aos céus. Evitei olhar para Dean novamente, ele já havia me irritado o bastante para somente um dia. Me despertando dos devaneios, o áspero e estático suspiro de Miguel infestou as proximidades, deixando o silêncio ainda mais tenso. Seus lumes azuis percorreram nossos rostos — provavelmente um exercício de concentração — e ele murmurou, sorrateiro, as palavras soprando de sua boca com uma cautela significante:

— Fechem os olhos.

Obedeci de prontidão, expirando suavemente e deixando que minhas pálpebras desabassem sobre os globos. Senti elas pesarem e Miguel dizer algo como "isso será conturbado. Ingressar em um céu pessoal não é uma tarefa fácil", palavras que só entendi com esforço, visto que a voz do arcanjo parecia cada vez mais e mais distante, disforme e desconexa. Pude sentir a típica sensação de teletransporte — como se o seu corpo estivesse sendo comprimido e esticado, tudo em uma mínima fração de segundos — dançando em minhas veias como uma carga elétrica, mas dessa vez, de maneira mais lenta e dolorosa, como se o processo tivesse sido retardado e distorcido. Após a sensação desconfortável se esvair e eu sentir que meus sapatos haviam voltado a pisar em algo sólido e tangível, arrisquei abrir os olhos, tentando ignorar a ardência concentrada nos mesmos que me fazia querer cerrá-los novamente.

O sol que iluminava o lugar estava a ponto de me cegar e éramos cercados por um espesso e alto matagal. Soltei um muxoxo de reprovação, prevendo que Miguel havia errado o lugar e que estávamos no céu de outra pessoa ou algo do tipo, mas assim que eu o encarei, seus olhos brilhavam na direção de algo logo adiante.

Intrigada, segui o olhar do arcanjo, afastando algumas partes do matagal que atrapalhavam a minha visão e inclinando a cabeça para enxergar melhor. Abri a boca ao vislumbrar o lugar que Miguel havia mencionado anteriormente — um armazém velho e provavelmente empoeirado, coberto de símbolos enoquianos de extremidade a extremidade, cujos obviamente serviam para afastar anjos. Uma visão de Castiel machucado e sendo torturado por aquela vadia angelical — finalmente me dei o luxo de chamá-la pelo apelido que ela realmente merecia — veio à minha cabeça, me fazendo automaticamente e inevitavelmente ferir minhas palmas com a pressão de minhas unhas nas mesmas, visto que cerrei os punhos de ódio. Ignorei os chamados de Miguel e Sam enquanto marchava até o armazém, hipnotizada e focada em um só propósito — salvar Castiel. Suas vozes pareciam distantes e abafadas e tudo que eu era capaz de escutar eram as batidas descompassadas do meu próprio coração. 

Assim que subi os primeiros degraus da pequena escada que levava à porta do armazém, estiquei o braço na direção da mesma. A luz cintilante e cerúlea já tomava conta de minhas órbitas e o poder nadava em minhas veias como uma carga elétrica, misturado à ambição e à necessidade de salvar o meu irmão. Diante desses pensamentos e dos meus olhos, a porta voou para longe, acertando uma das paredes do lugar. Adentrei o armazém a passos pesados, não me importando com o perigo que me aguardava. Eu só tinha um foco naquele momento, e ele se estendia bem na minha frente, esbaforido e ensanguentado, preso e acorrentado a uma cadeira com algemas com símbolos em enoquiano — provavelmente surtiam o mesmo efeito que as algemas com pentagramas, bloqueando os poderes do anjo. 

Corri até Castiel, me ajoelhando ao seu lado e tocando o seu rosto. Seus olhos azuis se abriram devagar, revelando cansaço e dor. Eu pude perceber que ele lutava para mantê-los abertos, me encarando com dificuldade. Seus lábios se comprimiram e eu retornei dos devaneios, usando meus poderes para arrancar as correntes que o mantinham em cativeiro. 

— Beth... Me desculpe... — murmurou em um quebradiço fio de voz. 

— Não, não... Shhh.... — eu o tranquilizei enquanto o libertava. — Você não fez nada. Está tudo bem.

Ele suspirou, emitindo um grunhido de dor e melancolia que foi capaz de partir meu coração em milhões de pedaços.

— Sim, foi culpa minha. Eu saí e Helena me mostrou o desenho que você fez, junto com a sua jaqueta, dizendo que estava mantendo você em cativeiro e que ela me queria em troca. Eu acreditei... Fui tolo, e esse tempo todo, você estava bem... Agora, você está correndo perigo de Helena aparecer aqui, e talvez Lúcifer também. Eles estão juntos, e você está suscetível aos dois por culpa minha — balbuciou, meneando a cabeça e amaldiçoando a si mesmo.

— Cas — proferi calmamente e bem devagar, atraindo a sua atenção. — Olhe para mim. Escuta, nada disso é culpa sua. 

Castiel esboçou um sorriso pequeno e triste, ainda tomado pela culpa. Logo, me lembrei do que Cas havia dito. Como diabos Helena tinha a minha jaqueta e o meu desenho?!

— Espera, Cas... Quando você saiu, eu também saí com o Sam e foi capturada por Abaddon...

— O quê?! — ele me cortou, dessa vez, em um tom mais urgente e preocupado. 

Ouvi passos, e por instinto, me virei para saber de quem se tratava. Sam e Dean estavam parados perante à escancarada entrada do armazém, com os olhos fixos em mim e no anjo. Balancei a cabeça e voltei à conversa com o anjo, auxiliando-o a levantar daquela cadeira manchada de seu próprio sangue. Eu pude escutá-lo gemendo devido às diversas, extensas e espalhadas feridas por todo o seu corpo. A raiva só crescia cada vez mais em mim. 

— Eu fui capturada por Abaddon e depois libertada. Ela me torturou e eu fui obrigada a aceitar um acordo no qual ela não tocaria nos Winchester e eu teria que encontrar um certo objeto para ela, do qual não tenho conhecimento. Quando fui resgatada, Abaddon acabou ficando com minha jaqueta. Então, se Helena mostrou a você o meu desenho e a minha jaqueta e os mesmos estavam com Abaddon anteriormente, isso significa que...

— Helena está aliada à Abaddon e ambas estão aliadas à... — Castiel prosseguiu com dificuldade, me interrompendo com a voz falha. 

— Lúcifer — completou Sam.

Eu encarei o Winchester mais novo, capaz de sentir a tensão palpável em seu tom de voz. O pomo de adão descendo e subindo pela garganta só evidenciava isso. Sam, que antes me olhava, desviou seu olhar para um ponto para o qual Dean também olhava. Estranhando, franzi o cenho e o som de palmas lentas que invadiu meus ouvidos me fez girar na direção do ruído.

Toda a raiva que eu sentia anteriormente e que havia se esvaído lentamente, retornara naquele momento, acumulando-se a ponto de me fazer enrijecer e me deixar extremamente vermelha. 

— Olá, Elizabeth — saudou com um sorriso irônico. A loura dirigiu seu olhar à Sam e Dean, e o sorriso foi substituído por uma careta de aversão. — Winchesters. 

O anjo loiro voltou a sorrir e deu alguns passos ao seu redor, as tábuas rangendo sob seus pés e os cliques do salto alto ecoando por meus ouvidos em um ruído irritante, repetitivo e incessante. Precisei me segurar para simplesmente não largar Castiel e saltar no pescoço da víbora oxigenada. 

— Um belo show! — ela elevou os supercílios, fingindo surpresa. — Ótimo raciocínio. Bingo! Abaddon e eu formamos uma dupla perfeita, não acham?

— Dupla com a qual eu vou adorar acabar — sibilei entredentes.

Helena riu amargamente, causando um arrepio em minha espinha. 

— Isso é lindo. Muito sonhador! — ironizou a "anja", a expressão zombeteira se desmanchando e lentamente sendo substituída por uma maligna. — Mas acho que não será possível.

Com os olhos cerúleos — era engraçado o fato de que a maioria dos anjos eram portadores de magníficas íris azuis — incendiados e um sorriso maquiavélico, Helena estendeu o braço, mais do que preparada para golpear-nos, porém, eu fui mais rápida. Em um veloz movimento, empurrei a mão na direção da loura, que voou para longe e obteve uma colisão provavelmente dolorosa com a parede mais próxima. Assim que me certifiquei de que ela estava incapacitada de revidar, cambaleei com Castiel até os Winchester e entreguei o serafim a eles com cuidado, que mesmo sem entender, receberam-no e deram a ele apoio. 

— Vão — ordenei, com o indicador erguido na direção do lugar onde havia uma porta antes de eu escancará-la. 

Sam, aflito e de olhos arregalados, me encarou, confuso.

— Mas Beth...

— Vão embora! — vociferei, ainda apontando para a saída. — Rápido!

Olhei para Dean por um segundo, vendo que uma expressão serena se instalava em seu rosto. Ele não parecia estar mais com raiva, e sim, surpreso e admirado com minha bravura. Ele abaixou a cabeça assim que percebeu que eu também o encarava e junto de Sam, deixou o lugar às pressas. Me coloquei em frente à porta, observando os irmãos e o serafim se encontrarem com o arcanjo que os aguardava e logo, eles haviam sumido. Evaporado, bem diante dos meus olhos. 

Respirei fundo e girei nos calcanhares, me deparando com Helena ainda no chão, esparramada próxima à parede, mas ainda assim, sorrindo ironicamente. 

— Você é realmente ingênua — disse entredentes, dirigindo seu olhar para algo atrás de mim. — Bons sonhos, Bela Adormecida. 

Desconfiada, franzi o cenho e me virei para o que quer que fosse que estava atrás de mim. Quando fiz isso, esbarrei na mulher que parecia mais do que disposta a fazer da minha vida, um sanguinolento e verdadeiro inferno. Seus lábios tingidos de vermelho, combinando com os fios cobre, curvaram-se em um sorriso de canto, e antes que eu pudesse agir, Abaddon ergueu algo parecido com um taco de beisebol. 

Então, tudo que eu senti foi uma forte pancada na cabeça e logo, tudo se tornou escuro e enegrecido. 

AGORA

— Bom dia, Sunshine. 

Engoli em seco, semicerrando os olhos e desafiando-a. Contraí os dedos de raiva, cerrando as mãos em punho e desejando que aquelas cordas não me prendessem para que eu pudesse socá-la. Não vacilei — permaneci encarando-a, e logo, saudei em resposta, forçando um sorriso irônico:

— Helena.

A loura fez uma careta.

— Não é óbvio?

— Helena — disse alguém com uma voz familiar, cuja não demorei muito para identificar. — Não seja tão dura com a pobre coitada. 

O restante das luzes se acendeu, iluminando as partes do lugar cujas antes se encontravam escuras e mergulhadas no breu. Tratava-se de um depósito — deduzi isso pelas paredes feitas de tábuas de madeira e pelos caixotes inúteis ao meu redor, não contando é claro, a poeira que irritava meu nariz. Abaddon sorriu, posicionando-se ao lado da cúmplice. Ver um anjo e um demônio assim, unidos como carne e unha, era de fato, irônico e hilário. Eu até mesmo riria se não estivesse muito ocupada emitindo grunhidos em resposta à dor excruciante e ardente que percorria meu corpo. 

— Vamos ao ponto, Corpus — avançou Helena. Ouvi-la proferir meu sobrenome era, de fato, repugnante. — Castiel não faz parte do acordo. Nós precisávamos de informações que ele possui, e você atrapalhou. 

— Que informações? — arqueei as sobrancelhas.

Abaddon deu um passo a frente e levantou uma adaga, com a qual fez um corte horizontal em minha maçã do rosto. Fiz uma careta quando senti o sangue fazendo uma trilha escarlate por meu rosto, mesmo que o corte não fosse demasiado profundo. Abaddon pareceu apreciar isso, pois não conseguia parar de sorrir enquanto devolvia a faquinha de manteiga à sua bainha. 

— Não interessa — desconversou, observando atentamente as cutículas de suas unhas igualmente tingidas de vermelho. — É o seguinte... Castiel não está incluído, vê? Posso fazer o que eu quiser com aquele anjo idiota, e se você interferir, vou acabar com aqueles energúmenos que você chama de amigos, vulgo, Sam e Dean. Assim, não haverá a minha parte do acordo... Você o cumprirá sem nada em troca.

Soltei uma risada amarga, lançando à ruiva um olhar sugestivo.

— Acordo? Você acha que esta merda ainda está de pé?! — franzi o cenho. — Você trabalha com Lúcifer. O nosso acordo não é mais válido. 

— Ótimo! — o demônio sorriu. — Mais um ótimo motivo para matar aqueles dois vermes insignificantes.

— Para fazer isso, você terá de passar pela filha de Deus — ameacei.

Abaddon me encarou com as sobrancelhas arqueadas. Em seguida, revirou os olhos, aproximando seu rosto perigosamente do meu, de modo que ela me intimidasse — o que obviamente não aconteceu, visto que eu não nutria nem sequer um pingo de medo dela. 

— Isso é ridículo — sibilou, fitando-me diretamente nos olhos. — Você não honra esse título.

— Diga isso no momento em que eu estiver prestes a quebrar o seu pescoço — forcei um sorriso. 

Abaddon paralisou, ainda me olhando. Aproveitei a chance e cuspi um pouco de sangue que havia em meus lábios em seu rosto. O demônio, de boca aberta e ofendido, fechou os olhos, se afastou lentamente e passou os dedos pelo rosto, espalhando o sangue inevitavelmente por ele. Abriu os olhos novamente e encarou os dedos manchados de vermelho, assim como seus lábios. Enraivecida, o demônio rapidamente golpeou minha face com um certeiro e doloroso soco, que provavelmente adquiriria uma coloração violeta em breve. Grunhi e me pus a escutar os rosnados raivosos da ruiva, porém, eles foram interrompidos por uma voz conhecida que rompeu a tensão:

— Meninas, não se aborreçam! Poupemos a raiva e o fôlego para a batalha final, shall we? 

Logo então, o portador da voz familiar adentrou o cômodo, de braços cruzados e com a típica expressão travessa. 

Lúcifer. 

Abaddon e Helena giraram na direção do anjo caído, curvando-se perante a ele e fazendo uma reverência idiota rapidamente. Disseram em uníssono "bem-vindo, mestre" e deram espaço para que o diabo — literalmente — passasse, possibilitando uma visão de mim. Assim que esse tal espaço foi cedido, encarei Lúcifer, que mantinha os lábios curvados no tradicional sorriso de escárnio. 

— Saiam — ordenou calmamente às suas comparsas, sem nem mesmo tirar os olhos de mim.

Abaddon e Helena obedeceram, abandonando o aposento às pressas. Logo, nos encontrávamos sozinhos. O silêncio era mortal e parecia criar uma barreira tênue entre nós dois, cuja seria facilmente rompida por apenas uma palavra. Decidi ser aquela que romperia esse muro:

— O que você quer?

— Me certificar de que aceitou o seu destino — respondeu calmamente, como se aquilo fosse definitivamente, a coisa mais normal do mundo. — Fiquei sabendo que visitou o futuro.

Cocei a garganta e balancei a cabeça.

— Eu vou mudar isso. Você sabe que vou. Não importa se a merda do destino está traçado ou não — murmurei, ainda tentando ignorar a dor nos ferimentos. 

— Isso é encorajador — admitiu, fazendo beicinho. — Muito encorajador. Demonstra o quão sonhadora você é...

— Sonhadora não — praticamente cuspi as palavras. — Realista.

Lúcifer suspirou.

— Não importa agora — concluiu, dando de ombros. — Já que, como você mesma disse, não há mais acordo, deixarei que tudo flua do jeito que há de fluir, certo? Não me importo com aquelas idiotas, ambas só estão sendo iludidas miseravelmente por mim, então trate de manter cuidado e manter não só a si mesma, mas também os seus amigos vivos até a nossa peculiar batalha final — ele passou a mão pelos cabelos antes de prosseguir: — Quero que todos vejam a sua triunfal queda. Quero que todos assistam você morrer. Quero que você assista eu acabando com a sua raça podre e miserável. Quero que você ouça o barulho que ecoará quando eu quebrar o seu pescoço.

Engoli em seco, processando suas palavras. Eu sentia uma gota de suor escorrendo lentamente por minha testa, me torturando e indo em direção ao sangue em minha bochecha para com ele misturar-se. Arfei, observando a bizarra calmaria de Lúcifer. O diabo deu alguns passos na minha direção e segurou meu rosto delicadamente, aproximando ele do seu tanto que nossas testas estavam coladas e nossos narizes também. Prendi a respiração, angustiada.

— E é por isso que não irei matá-la agora — explicou em um áspero e intimidador sussurro. 

Mesmo que eu não quisesse, ele me fragilizava. Mesmo que eu quisesse destruí-lo e mesmo que eu disesse a mim mesma que não, eu o temia. 

— Tudo porque reservo algo muito, muito, mas muito pior para você. 

Não se afastando de mim, ele deslizou suas mãos repugnantes sobre minha cintura, como se ele desenhasse minhas curvas. Espalmou-as sobre minha barriga e bacia, me obrigando a fazer uma careta. Ele não pareceu se importar, e após massagear brevemente as áreas, deslizou os dedos até minha testa, onde pressionou os dedos médio e indicador.

Fechei os olhos e senti todas as dores se esvaindo rapidamente. Ele havia me curado. Por quê?

Os abri novamente e observei-o me desamarrar. Ele havia me libertado.

Eu podia acabar com ele ali mesmo. Podia. Raiva era o que não faltava, mas eu não fui capaz de fazer nada. Fiquei ali, paralisada, imóvel e com os pés grudados no chão. Eu e Lúcifer permanecemos nos encarando por um tempo que mais pareceu uma eternidade, e ele deu alguns passos na direção de um dos caixotes que nos cercava. Só então percebi que ali estava minha jaqueta. 

Lúcifer apanhou-a e enterrou a mão no bolso da mesma, de lá tirando o desenho que fiz. Ele desdobrou o papel amassado rapidamente e revelou o desenho a mim, como se comprovasse que tratava-se mesmo do desenho. Devolveu o mísero pedaço de papel à minha jaqueta e caminhou até mim com a peça em mãos. O anjo, que era bem mais alto do que eu, me disse para virar de costas. Não sei o que havia acontecido, mas obedeci. Devagar, Lúcifer vestiu meus braços com a jaqueta, ajustando-a calmamente em meu corpo. 

Eu não sabia o que estava fazendo, mas despertei do transe quando ele inclinou-se até meu ouvido. Senti sua respiração abafada soprando em minha orelha e enrijeci. Eu estava arrepiada dos pés a cabeça. Não protestei contra sua mão, que delicadamente tirou o cabelo que cobria meu ombro e jogou-o para o outro lado, abrindo espaço para que ele se aproximasse. Lúcifer aproximou mais ainda seus lábios de minha orelha, me deixando ainda mais arrepiada.

Ele roçou os lábios macios contra ela e eu fechei os olhos, horrorizada, permitindo que uma lágrima de desespero corresse por meu rosto. Cerrei os punhos, perturbada, e ouvi-o sussurrar:

Obrigada pela visita.

E tudo encerrou-se com um estalo de dedos.

Me vi em um estacionamento. A brisa agredia meu rosto com força e eu mal sabia onde estava, só sei que soltei um suspiro de alívio quando vi o Impala muito próximo de onde eu estava. Sorri levemente enquanto tinha uma visão embaçada e turva de Sam correndo em minha direção, logo após notar minha presença.

A partir disto, aos poucos, tudo ficou escuro. 


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Notas finais do capítulo

E então? Gostaram?

Lúcifer ousado... Tadinha da Beth!

Enfim, lindos e lindas, prometo que não vou demorar para trazer o próximo. E ah, COMENTÁRIOS, por obséquio!!! Eu não mordo!!!

Beijocas.

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