Harry Potter e o Orbe dos Universos escrita por RedHead


Capítulo 41
Adormecido


Notas iniciais do capítulo

Gente, como as terças chegam rápido!!!

Mas antes, um recadinho: Meu aniversário é essa quinta (aceito presentes ♥ hahaha). Ok, dois recadinhos. Hoje darei uma de Game Of Thrones. Não, o inverno não chegou ainda, e nem as tretas. MAS ESTÃO CHEGANDO! E rápido :OOO

Mas enquanto as coisas estão na paz... boa leitura :*



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Como nas outras inúmeras vezes em que Harry se viu naquele corredor, ele começou a andar em direção à saleta circular que ficava em seu fim. Nunca lhe ocorreu tentar o caminho contrário, principalmente depois que ela apareceu em seus sonhos.

— Algo te perturba – a conhecida voz rouca veio do lado esquerdo de Harry. Confuso, e com certeza que a conhecida mulher de olhos bonitos não estava ao seu lado dois segundos atrás, ele nada respondeu, apenas a encarou - Então, finalmente encontrou o que procurava?

— O que eu... – Harry franziu a testa, relembrando vividamente do ataque dos lobisomens. Dos gritos, do sangue, de Gina. – Eu não procurei nada disso.

— Harry Potter, você manteve seu coração aberto, mas seus olhos continuam trancados. – A mulher respondeu, mas em momento nenhum ela olhou para ele. Harry franziu as sobrancelhas, zangado e confuso, mas logo desfez o cenho, intrigado que eles não haviam chegado ainda à saleta circular – E enquanto eles se mantêm trancados, não há nada que eu possa fazer. Abra os olhos, Harry Potter.

Ofegante, Harry abriu os olhos para descobrir que sua mão havia escorregado do braço da poltrona e a manga da blusa que estava usando quase havia sido queimada. Praguejando, ele afastou o braço das chamas que saiam da lareira, examinando a pele para ver se havia se machucado, mas vozes no corredor fizeram com ele parasse no meio do movimento.

— Esse foi o combinado, Sirius! – A voz de James Potter estava abafada pela porta fechada, mas era suficientemente audível – Você só vai entrar aqui de novo se eu ficar com a sua varinha.

Harry não ouviu a resposta de Sirius, mas supôs que ele tivesse realmente dado a própria varinha para James, já que a porta se abriu no instante seguinte.

— Harry! – Disse James, surpreso por vê-lo ali – Achei que Dumbledore estivesse...

— Ele está lá dentro – Harry indicou com a cabeça uma pequena porta levava para a masmorra em si, e se ele mesmo não tivesse sentido a presença do professor atrás das paredes de pedra, ele diria que não havia mais ninguém além dele mesmo ali, devido ao silêncio que reinava atrás da porta. – Lottie me disse que tinham te proibido de vir aqui, Sirius.

— Eu prometi que serei um bom menino – Sirius balançou os ombros, mas Harry sentiu uma certa tensão neles. – Pontas ficou com a minha varinha e tudo mais.

— Mas não pense que mesmo assim não ficarei de olho em você – James apontou para Sirius antes de se sentar em outra poltrona puída que havia no local.

— Foi só um nariz quebrado – Sirius resmungou, escorando-se na tapeçaria, fazendo com que as bruxas saíssem correndo para não serem esmagadas por ele. – Como se você não quisesse ter feito o mesmo.

— Sirius quebrou o nariz do Lupin? – Harry levantou as sobrancelhas, surpreso que Lottie não tivesse contado esse detalhe.

— Nós tentamos conversar com o Rem... Lupin – James se concertou rapidamente, passando a mão pelos cabelos – Tentamos conversar com o Lupin assim que ele acordou, mas ele não respondeu nada... Olhava para o horizonte, como se não nos escutasse, então...

— Então eu fiz com que ele escutasse – Sirius respondeu, cutucando nervosamente uma das bruxas da tapeçaria, que tentava fazer com que ele saísse de cima das ervas cortadas.

— E funcionou? – Perguntou Harry.

— Não. – James disse, sombriamente. – Ele não responde a nada, nem quando tentamos falar com ele sobre nossa época em Hogwarts, nem quando Sirius tentou arrancar alguma coisa dele com os punhos. Ele parece... vazio.

— Vazio ele vai ficar depois que... – Sirius resmungou, finalmente saindo da tapeçaria, permitindo que as bruxas voltassem a seus afazeres.

— Sirius, você prometeu que se comportaria – James ameaçou.

— E eu vou me comportar – Sirius falou com a voz baixa, os olhos presos na porta que os separava de Lupin – Assim que tiver minhas respostas.

James chegou a se levantar para impedir o amigo de invadir a cela improvisada, mas Sirius foi mais rápido em alcançar o outro lado da sala e levantar abrir a porta com toda sua força. No entanto, antes mesmo que Sirius tivesse tocado a maçaneta, Dumbledore saiu de dentro do outro ambiente, fechando a porta atrás de si.

— Imagino as promessas que você teve que fingir que iria cumprir para voltar aqui, Sirius – Dumbledore comentou, como se tivesse pego uma criança travessa tentando roubar um doce antes do jantar.

— Eu só queria fazer umas perguntas, professor – Sirius respondeu, mal-humorado por seu plano ter falhado.

— Oh, eu imagino que sim – Dumbledore suspirou cansado, e com um aceno da varinha fez aparecer uma confortável poltrona, onde sentou o corpo velho – Mas temo que Remus não esteja em condições de responder nada no momento.

— O que o senhor fez? – James perguntou.

— Eu não. Lorde Voldemort. – Um outro aceno de varinha fez aparecer um bule de chá de quatro xícaras. – Remus Lupin está sob o efeito da Maldição Imperius. – Dumbledore completou, assim que percebeu os olhares inquisidores sobre si.

— Como o senhor pode saber isso? – James perguntou, sentando-se na beirada da cadeira onde estava sentado, os olhos com um brilho estranho.

— Experiência, meu caro James – Dumbledore respondeu simplesmente – Senti a magia de Voldemort entranhada na carne de Remus.

— Mas senhor... – Harry sentiu a mão direita formigar muito mais do que estava a um segundo atrás – Como eu fui capaz de reconhecer a magia de Voldemort no diadema e em Litlle Hangleton mas não em Remus?

— Meu caro Harry, por mais talentoso que seja, eu tenho mais de cem anos de experiência na sua frente, e isso apenas em idade – Dumbledore sorriu bondosamente, aceitando que o bule enchesse sua xícara novamente - Reconhecer a magia de um bruxo devido a um feitiço em um outro bruxo é incrivelmente difícil e delicado, visto que a magia do bruxo enfeitiçado esconderá a magia do bruxo que o enfeitiçou em primeiro lugar... Não é incomum que você tenha deixado esse detalhe passar.

— A quanto tempo o senhor acha que ele está assim? – James perguntou, ainda com o brilho estranho nos olhos castanhos. Harry notou que as mãos de Sirius tremiam levemente, assim como as do pai.

— É difícil dizer com certeza – Dumbledore respondeu – Mas eu diria em volta de vinte anos. Se posso fazer um palpite, vinte anos quase exatos.

Harry não precisou ser versado na arte da legimência para saber o que Dumbledore havia implicado. Lupin foi enfeitiçado logo depois que o bebê Potter dessa realidade fora assassinado. Foi como se um balde de gelo tivesse caído em cima de si, congelando-o, e o mesmo pareceu ter acontecido com os outros dois homens na sala.

— Não – Sirius falou, depois de vários segundos em silêncio – Sinto muito Dumbledore, mas isso é loucura. Remus sempre foi ótimo nos treinamentos da Ordem com o Moody, sempre foi um dos únicos que resistia à Imperius...

— Ele tinha um motivo para resistir – Dumbledore fez com que o bule e a xícara desaparecessem, e se recostou novamente em sua poltrona – Tínhamos um objetivo, e a Guerra não havia espalhado tanto. E tenho certeza que o apoio da senhorita Meadowes o ajudava muito. – Harry sabia que já havia ouvido esse nome em algum momento de sua vida, mas preferiu não interromper o diretor para perguntar quem ela era.

— Remus continuava sendo ele mesmo depois do assassinato de Dorcas – Sirius interrompeu, estalando os dedos, visivelmente nervoso – Nós fomos ao enterro, ele estava inconsolável. E depois...

— E depois ele passou a se retrair cada vez mais – James tinha a voz firme, apesar das lágrimas nos olhos – Não conversava direito, evitava responder onde estava trabalhando, se estava trabalhando... Até que desapareceu completamente depois do ataque a Godryc’s Hollow.

— Isso talvez seja culpa minha – Dumbledore pareceu murchar em sua poltrona, e Harry foi capaz de perceber o cansaço de uma vida inteira em cada uma das rugas do homem à sua frente. – Remus veio me procurar logo depois do enterro do bebê Potter. Ele disse que precisava fazer alguma coisa a mais, já que seus esforços pareciam inúteis, já que todos os nossos esforços pareciam inúteis. E eu ofereci a ele um trabalho deveras perigoso, e Remus aceitou com ardor na mesma hora. A influência de Voldemort sobre os povos mágicos crescia cada vez mais, e qualquer aliado que tivéssemos seria um trunfo, por isso...

— O senhor o mandou para conviver com os iguais a ele – Harry completou, e Dumbledore concordou com um aceno de cabeça, o rosto dividido entre o cansaço e o arrependimento.

— Seria um trabalho difícil, lógico, mas quem seria melhor para fazê-lo? – Dumbledore suspirou pesadamente antes de responder – Quando chegou aos nossos ouvidos que Remus estava agindo junto com a alcateia de Greyback, eu pensei que ele houvesse sucumbido à sua própria dor e mudado de lado. Por culpa minha. Mas o fato é que, mesmo que Remus tenha sido controlado todo esse tempo, eu ainda tenho culpa. O sangue ainda está em minhas mãos.

Harry olhou para a própria mão, ainda suja aos seus olhos, incapaz de olhar nos olhos de Dumbledore. Era desconfortante ver o homem que sempre teve todas as respostas se mostrar tão vulnerável, envergonhado. Mas igualmente ruim era observar a sujeira que ainda persistia sob as ataduras em sua mão direita, por isso Harry desviou os olhos, a tempo de ver Sirius andar como um furacão até a porta de madeira, e praticamente arrancá-la das dobradiças.

— Remus, que merda você pensa que está fazendo?! – Sirius berrava a plenos pulmões, segurando o homem sentado em uma cadeira de madeira antiga pelos ombros, balançando-o freneticamente, mas sem respostas – Você é melhor que isso, porra! Vai mesmo deixar aquele filho da puta entrar na sua mente fácil assim? Você é quem sempre resistia às maldições, você quem tomava conta de todos nós, você... Você é o melhor de nós – Nesse momento Sirius já havia parado de sacudir Remus pelos ombros, e estava ajoelhado em prantos na frente do antigo amigo, que ainda parecia não perceber que ele estava ali – Remus... por favor, lute. Você se lembra, eu sei que você se lembra! Você está aí dentro, em algum lugar! Porra! – Sirius gritou mais alto a última palavra, e empurrou o peito de Remus com força, jogando-o no chão, mas novamente ele não reagiu, apenas se ergueu e sentou no chão de pedra.

— Sirius... – James tentou se aproximar do amigo, mas Sirius não deu nenhum sinal que o ouviu.

— Não há o que podemos fazer, Sirius – Dumbledore colocou a mão no ombro do homem mais jovem, obrigando-o a se afastar de Remus – Apenas duas coisas acabam com os efeitos dessa maldição. A morte do bruxo que a fez, ou a força de vontade.

— Vamos voltar – James disse, sério, segurando com força o ombro do amigo, levando-o aos poucos para fora da masmorra – Mas não agora. Primeiro vamos esfriar a cabeça e depois... e depois vamos falar com Lily. Ela está tão preocupada quanto nós.

— Sim... – Sirius se virou uma última vez para olhar para Remus – Lily sempre sabe o que fazer.

— Você se importaria em me acompanhar, Harry? – Dumbledore o olhava intensamente por detrás dos oclinhos de meia lua – Sei que ainda está cansado...

— Na verdade, senhor – Harry o interrompeu – Eu gostaria de ficar mais alguns minutos.

— Não sei se seria prudente... – Dumbledore juntou as mãos, e Harry viu um vinco se formar entre as sobrancelhas do professor, criando mais uma ruga em sua testa.

— O senhor pode ficar com a minha varinha – Harry estendeu o braço, oferecendo à própria varinha ao diretor – Não vou fazer mais nenhum mal a ninguém, o senhor tem minha palavra. Só quero conversar.

— Você sabe que ele provavelmente não irá responder – com um suspiro, Dumbledore abaixou o braço de Harry, indicando que ele poderia manter a varinha. – Nem eu mesmo sei se ele vai conseguir te escutar.

— Eu sei que vai – Harry disse, convicto, e dessa vez Dumbledore não replicou, apenas assentiu levemente, antes de se virar e sair pela porta, deixando Harry sozinho na sela fria com Remus.

Harry teve muita dificuldade de reconhecer Remus por detrás das novas cicatrizes, mas apesar de tudo, ele ainda estava lá. Os cabelos castanho claros estavam menos grisalhos do que Harry se lembrava, e ele também parecia menos magro e menos velho, embora seus olhos verde-claros estivessem completamente opacos e sem vida, combinando bem com a nova coleção de cicatrizes que ele exibia.

— Remus, você quer se sentar? – Harry perguntou, mas o homem mais velho não deu sinal nenhum que o ouvia, ele continuava sentado no chão, com as pernas cruzadas e as costas muito eretas. Cansado, Harry desistiu de fazer Remus se sentar na cadeira onde estava antes de Sirius empurra-lo, e sentou-se no chão frio, em frente ao antigo professor, ignorando a umidade entrando no tecido de suas calças em contato com a pedra. – Eu imagino que Voldemort deve ter te prometido... Ou tentado, porque sei que por mais tentadora que a oferta fosse, você não teria aceitado. Ele deve ter te prometido riquezas, poder, liberdade... A chance de acabar com o preconceito em cima dos lobisomens. Mas embora tudo isso seja sedutor... Não era isso o que você queria. E por você não ter sido corrompido, ele te amaldiçoou. E você, fraco, em luto não encontrou motivos para lutar, e se deixou ser engolido pela boa sensação que o torpor da Imperius dá. – Harry olhava atentamente para Remus, mas ele continuava vazio, opaco, apenas um corpo cuja alma estava perdida em um vácuo, quase longe demais para ser resgatada – Talvez o maior erro de Voldemort foi não ter te oferecido algo que você realmente anseia, algo que você já teve no passado, mas que o início da Guerra alterou. Uma família. – E assim como veio, foi embora. Harry não soube se o brilho nos olhos a sua frente foram fruto de sua imaginação, pois no momento em que ele surgiu, já havia desaparecido, mas ele decidiu se agarrar nessa chance com todas as suas forças – Existe um conceito conhecido como a Teoria dos Multiversos. Ele diz que existe uma infinidade de universos no tempo-espaço, e embora todos tenham começado do mesmo modo, as ações em cada um dos universos que determinarão o futuro daquele lugar. Muitas pessoas não acreditam nessa teoria, mas eu sou a prova viva que tudo isso é verdadeiro. Nossas realidades, a minha e a sua, são semelhantes em muitas coisas, mas um evento em especial nos difere. Na minha realidade, em 31 de outubro de 1981, durante o ataque aos Potter, Voldemort desapareceu. – Harry sentiu o coração pular quando Remus o olhou nos olhos, e ele viu um pouco de vida se mexer por trás dos orbes verde claros. Cuidando que seu rosto não traísse sua ansiedade, ele continuou o relato – Voldemort caiu. Vieram anos de paz para o mundo bruxo. E eu tive a honra de te conhecer, você foi meu professor – Harry apoiou os cotovelos nos joelhos, e sentiu uma onda de felicidade ao perceber que Remus o seguiu com os olhos – O melhor professor que eu já tive. Você ensinou muito a mim, você me ensinou a fazer o Patrono. E quando Voldemort voltou, você lutou ao lado da Ordem mais uma vez, e conheceu... alguém. E se casou. E teve um filho. Você acha que não poderia ter uma família, que é perigoso demais... Mas eu vi tudo isso acontecer, Remus. E eu te garanto que isso é tudo verdade.

Uma eternidade se passou aos olhos de Harry, enquanto ele via a luta interna que se passava na mente de Remus. Gotas de suor criadas pelo esforço brotavam em suas têmporas, e as mãos machucadas, antes simplesmente apoiadas nos joelhos, agora estavam fechadas fortemente em punhos tão apertados que veias saltavam das costas de suas mãos.

— No-nome? – Remus perguntou com uma voz tão rouca que Harry suspeitou que ele não usava a voz em sua forma humana a vários meses – Qual... o nome dele?

— Ted – Harry respondeu, procurando se mostrar o mais calmo possível, embora seu coração batesse forte contra as costelas – Edward Remus Lupin. Ele é um garoto maravilhoso, inteligente, e tem dois enormes e curiosos olhos dourados. O único sinal de licantropia. Único. Você me escolheu como padrinho.

— Ele... ele não é um lobisomem? – Lágrimas escorriam dos olhos de Remus, e Harry não saberia dizer se eram de emoção ou pelo esforço de resistir à maldição.

— Não, ele não é. Mas ele sente muito orgulho do pai que tem, e não se importa com sua condição. – Harry decidiu que naquele momento, omitir que Ted era órfão não seria um grande pecado, afinal Ted realmente venerava Remus, e tudo relativo a ele.

— Você parece tanto com alguém que eu conheci a muitos anos. Mas ele foi assassinado ainda bebê. – Remus falou com menos dificuldade dessa vez, e suas mãos tremiam cada vez menos – Quem é você?

— Eu me chamo Harry James Potter – Harry respondeu, bem devagar.

— Mas você está morto – Aos poucos, a rouquidão na voz de Remus desaparecia – Eu fui ao seu enterro, eu amparei James quando ele não tinha mais lágrimas para chorar, e fiz que prometer que seria forte por Lily e pelo outro bebê... Céus! O outro bebê...?

— Você não se lembra de nada? – Harry perguntou, cauteloso, com medo que o antigo professor voltasse ao estado de torpor que estava antes.

— Eu lembro de flashes – Remus encolheu os ombros e desviou os olhos, focando a visão em uma das pedras da parede – Lembro de viver em casas abandonadas, lembro vozes me dizendo o que fazer. Lembro de pelo e sangue. Muito sangue... e crianças...

— Você não deveria se culpar...

— Você não tem ideia do que eu fiz... Do que eu tive que fazer. – Remus encontrou os olhos de Harry, e penetrou os orbes verdes esmeralda com intensidade – Eu não lembro de tudo, e talvez eu não queria lembrar. Mas eu lembro de crianças, inocentes e indefesas arrancadas de suas casas, sendo mordidas na lua cheia seguinte, sofrendo, chorando, gritando de dor e medo. Crianças morrendo por inanição, por ferimentos. Não diga que não devo me martirizar. Todas as pessoas que eu machuquei, que eu... Se você pudesse ver o sangue nas minhas mãos...

— Você não sabia o que estava fazendo. – Harry sentiu a mão direita formigar novamente – Eu posso não ver o sangue nas suas mãos, mas eu vejo o que mancha as minhas. Eu não sei o quanto você lembra de ontem, mas... – ele suspirou pesadamente, e teve que se esforçar em não desviar o olhar, por vergonha – Eu tenho problemas em controlar minha raiva, principalmente quando envolve pessoas muito próximas de mim em perigo. E ontem, uma pessoa muito especial foi assassinada na minha frente, eu perdi todo meu autocontrole. Eu dizimei pelo menos metade do seu bando. Pessoas que podiam estar sendo controladas, pessoas que não conheciam outra vida...

— Você está se atormentando por ter tirado vidas de lobisomens? – Remus perguntou incrédulo, as sobrancelhas unidas em uma linha reta.

— São vidas, acima de tudo – respondeu Harry, sério – Não me importo se vocês têm um... problema.

— Você é igual ao seu pai – Remus respondeu, com o rosto contraído com o que Harry supôs ser um sorriso – Exceto nos olhos. Você tem os olhos de Lily.

— Eles estão preocupados com você. Principalmente o Sirius...

— Eles estão aqui? – Remus interrompeu Harry, com os olhos arregalados, e seu rosto triste e sujo estava se dividindo entre a animação e o medo.

— Foi Sirius quem te empurrou da cadeira – Harry apontou com o queixo a cadeira de madeira ainda caída no canto da masmorra – E também foi ele quem tentou quebrar o seu nariz.

— Merlim... – Remus levou a mão ao nariz, fazendo uma careta de dor assim que os dedos encostaram na pele machucada – Quanto tempo se passou? – Ele perguntou, depois de alguns instantes em silêncio.

— Desde que você foi atingido pela maldição? – O homem mais velho confirmou levemente com a cabeça – Cerca de vinte anos.

— Vinte... – mesmo sentado, Remus perdeu o equilíbrio e precisou usar as mãos para se apoiar e se manter ereto no chão – Eu dormi por vinte anos da minha vida... Eu perdi meus melhores amigos, perdi a chance de... Vinte anos! – Ele passava a mão pelos cabelos castanho claros, e os olhos verdes ficaram subitamente marejados – As últimas lembranças que eu tenho são do seu enterro, no menor caixão que eu já vi... Você... Ou o seu você nesse universo tinha apenas um ano... E agora vinte anos se passaram! Lily deve...

— Eles não sabem quem eu sou – Harry o interrompeu, já sabendo onde iria chegar – E eu agradeceria se você me ajudasse a manter esse segredo. – Harry suspirou e sentou-se mais confortavelmente no chão, antes de continuar, já que o olhar indignado de Remus deixou claro que ele não entendia porque ele não havia revelado sua identidade – Meus pais perderam o filho ainda bebê. Eu só vim parar nesse universo três meses atrás. E não pretendo, não posso ficar aqui por muito tempo. Eu tenho minha vida em minha realidade, e a mulher mais especial do mundo me esperando para nos casarmos... Por mais tentador que seja ficar com minha família, eu sei que aqui não é o meu lugar.

— Alguém mais sabe da sua real identidade?

— Dumbledore – Harry respondeu, e Remus balançou a cabeça, mostrando que isso já era de se esperar – e Lottie, minha irmã.

— Nós tivemos medo que Lily não conseguisse manter a gravidez depois da morte do... Da sua morte – Remus murmurou – Então ela e James tiveram uma menina?

— Charlotte Orquídea Potter. Você vai adorá-la. – Disse Harry, e ele mais uma vez viu um pouco do homem que ele sabia que Remus poderia ser por detrás da máscara de cicatrizes – Sei que ela adoraria te conhecer.

— Você acha que Lily me deixaria chegar perto dela mesmo depois de tudo o que eu fiz? – A dor na voz de Remus era palpável, e Harry enxergou no homem na sua frente a mesma vergonha que ele estava sentindo e sendo constantemente lembrado pelo formigar no braço direito.

— Antes de você acordar, Sirius e meu pai estavam aqui. Eles tentaram de tudo para te tirar do torpor da maldição. Sirius chegou a quebrar seu nariz. – Harry se alegrou um pouco ao ver um pequeno sorriso surgir no maxilar de Remus – Acredite em mim... Eles estão te esperando de braços abertos.

Harry se levantou e estendeu a mão esquerda em direção ao antigo professor. Remus observava a mão de Harry com atenção, mas seus olhos também mostravam cautela e medo. Foram vinte anos que ele não viu passar, vinte anos de atitudes abomináveis pelas quais ele não era responsável, mas pelas quais Harry sabia que ele se crucificaria para o resto dos seus dias. Mas, apesar de todo o medo, Remus estendeu a mão, e levantou-se, mas não soltou a de Harry.

— Tenho uma dívida de vida com você, Harry. E juro que seu segredo está a salvo comigo – Remus sorriu fracamente, e puxou Harry para um abraço – Obrigado. Por me tirar da escuridão.


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Notas finais do capítulo

Não disse? Bem calmo ;) E emotivo, na minha opinião.

Acho que esse foi o capítulo mais desafiador que escrevi até hoje. Não só pq eu já sabia qual era o destino do Lupin desde que comecei a escrever a história, mas também pela carga emocional... Espero ter ficado bom, ou pelo menos não muito meloso hahahah

Enfim, comentem! Digam se acertei ou se errei feio, mas não me deixem só ♥