Entropia escrita por Reyna Voronova


Capítulo 8
VII - Aliança




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VII

Aliança


— ¿Ust dardam kayrnkha Jan? — havia um sorriso desafiador nos lábios. — Você é aquele chamado Jan?

— Da. E você é o grandioso, o justo, o onipotente Faraó, ou devo chamá-lo por Hasir?

O Faraó deu uma gargalhada.

— Nir, meu amigo, não será necessário – ele disse, com traços da gargalhada ainda nos lábios e na fala. – Apenas Faraó, ou, se quiser ser ainda menos formal, pode tratar-me apenas por “você”.

Jan apenas sorriu, e o Hasir disse:

— Que péssimo anfitrião que sou! Sente-se, por favor. — O Hasir levantou-se e ajeitou uma cadeira em frente à que estava sentado anteriormente.

— Neste caso, trud — obrigado. Jan falou com um sorriso tímido no rosto, como de um visitante que, por obrigação dos anfitriões, é praticamente obrigado a se fazer uso de um luxo dos donos da casa. “Não vai incomodar de jeito nenhum, pode ficar tranquilo!”.

— Então… — o Faraó reclinou-se na sua cadeira. — Vejo que está aqui para falar de assuntos importantes, não é mesmo? Afinal, por que um membro de alto escalão da Organização viria até mim senão para falar disso?

— De fato, de fato… Tenho informações que são muito… pertinentes. E acredito que você, principalmente, gostaria de ouvi-las.

— Pois então as diga.

Jan foi direto:

— Um dos meus observadores viu uma pessoa que deveria estar morta andando pelo deserto. E essa pessoa não estava sozinha. Era ut Legionna'ire. Uma Legionária. Acredito que não precisarei citar o seu kayrn, não é?

E Jan nem mesmo queria fazê-lo. A expressão de preocupação misturada com revolta no rosto do Hasir só aumentava. Um homem sábio mantinha-se calado quando o Faraó se indignava. O mais sábio, saía de perto. Jan, no entanto, não tinha tempo para esperar os ataques de raivas do Iehr Hasir, Seu Faraó.

O Faraó negou inúmeras vezes com a cabeça, totalmente descrente.

— Não, não… Não pode ser… Ela tinha que estar morta…! A Legião foi completamente dizimada! Ela não pode ter sobrevivido!! — Ele bateu com os punhos cerrados numa mesinha de madeira à frente. A mesinha quase não sobreviveu. Houve um estrondo forte, Jan achou que os pés da mesa iriam se entortar e, consequentemente, ela fosse se partir, caindo no chão como um cavalo fraturado.

Iehr Hasir estava roxo de ódio. O ódio do Faraó não era um ódio com palavras em excesso e pouca ação; era o oposto, e é desse ódio que deve se ter medo. Poucas palavras, muita hesitação e muita violência surgiam desse tipo de rancor. E era por esse motivo que o Hasir era um homem extremamente perigoso. Não era o único porquê, todavia.

— Você sabe que isso é possível, Hasir. Ela é resiliente.

O Faraó suspirou profunda e longamente.

— Os presságios… — nesse ponto, ele parecia exausto, como se tivesse corrido uma maratona. Ofegava com frequência. Parecia não apenas cansado; também era visível sua preocupação e, ainda mais proeminente, seu medo – estavam certos… Momentos difíceis estão por vir, caro Jan. As estrelas me disseram sobre isso… sobre uma guerra. Rixas antigas…

— A Legião contra a Organização — Jan o interrompeu. Esqueceu-se de que estava falando com o Faraó e que aquela insolência poderia colocar sua cabeça numa bandeja. Mas, apesar de ser temido, o Faraó também era conhecido por ser um homem sem formalidades dignas de um soberano, portanto, aquela interrupção não lhe custou nada além de saliva.

— Vocês perderam aquela batalha.

— Perdemos. E, como vingança, os restantes da Organização caçaram os Legionários. E os matamos.

— E se esqueceram de um. Uma. A mais importante.

— Estamos em busca de vingança também, Hasir.

— E ainda é ela. Ela. Por que justo ela, Jan? — a voz do Hasir estava cheia de rancor. Seus punhos estavam cerrados, com vontade de esmagar a cabeça da Legionária. E talvez colocar a cabeça dela na bandeja que seria a de Jan, caso ele interrompesse mais uma vez. Era aquilo que todos temiam no Hasir. Se houvesse um azarado serviçal ali, talvez a cabeça dele estivesse esmagada, com sangue e cérebro sujando a parede. Por sorte, estavam sozinhos. Ou talvez azar…

— Porque nem tudo é como desejamos. — Jan estava despreocupadamente preocupado. Parecia relaxado. Bastante confortável em sua cadeira, um sorriso debochado no rosto, aparentemente apreciando o ódio que o Faraó estava nutrindo. Mas a verdade era que estava tão preocupado quanto. Preocupado não apenas com a possibilidade de ter a cabeça esmagada pelas manzorras do Faraó, mas preocupado com aquela última revanche. No entanto, não temeroso. Afinal, os Legionários haviam ganhado uma batalha, mas no final, foram dizimados. E agora, era apenas uma. Eles iriam vencer aquela outra batalha. Ele não estava preocupado em perder. Mas preocupado em como iria realizar sua vingança. E não deixaria o Hasir tomá-la de si.

— Ela traiu a mim e depois traiu a própria Legião. Seria melhor para todos se ela estivesse morta! — as veias estavam bastante ressaltadas no pescoço do Faraó. Parecia que iriam estourar a qualquer momento.

— E eu concordo, Faraó. E é mais um motivo para eu estar aqui. Quero lhe propor uma aliança. Unir a Organização e suas forças, Hasir. Seríamos a Aliança. Ah Alianz. Iríamos esmagar o que restou da Legião.

— Alianz… — o Faraó repetiu com um sorriso no rosto. — Gostei de como soa. Ah Alianz krayert ah Legate¹. A Aliança contra a Legião. — E então gargalhou. – Essa é uma ótima ideia! Amigo Jan, você é um gênio! E no final de tudo isso, eu quero a cabeça dela enfiada numa estaca, no topo de minha pirâmide, para todos aqueles que ousarem me desafiar saberem o que acontecem com traidores. Eu quero ter a cabeça de Vaerteyn. Esse nome assassino será finalmente apagado.

— Vaerteyn — pronunciar aquele nome fez Jan sentir a morte. Se ouvi-lo já lhe dava uma sensação de morte, falá-lo fazia-o sentir o gosto e o cheiro dela. O gosto e o cheiro de sangue. O sofrimento infligido. Um nome com gosto podre de corpo em decomposição, de lâmina de faca, de suor, de sangue fresco. Ele pôde sentir o ardor de ter uma lâmina dilacerando sua carne, a dor dos membros sendo espancados, dos ossos sendo triturados. Por um instante, ele ficou na pele de uma vítima dela. Aquele nome realmente tinha muito poder. Quando voltou a si milésimos depois, estava ofegante de cansaço e sofrimento. — O nome realmente faz jus aos seus atos. Teyn. Assassino, na língua incomum. Vaert, sangue. — A pronuncia era cruel. Vaerteyn. Vaer-teyn. Soava raspando na garganta, seco, cruel, assim como ats bayez (seu possuidor, na língua incomum) daquele kra'vstan.

— No final disso, a cabeça dela será minha. A cabeça da traidora. Seu nome… seu kra'vstan… Faz tanto tempo que não o pronuncio… Eu quero a cabeça de Vaerteyn. — O Faraó não parecia nem um pouco conturbado em pronunciar aquela palavra maldita, afinal, ele também era uma pessoa tão cruel quanto. Outro motivo para temer o Faraó. A palavra soava ainda melhor na voz do Hasir: além de seca, sua voz grave e cheia de ódio parecia enaltecer aquele kra'vstan.

Jan observava a tudo aquilo com o sorriso mais dissimuladamente aprovador de todos. Era fato que não queria que a vingança do Faraó se concretizasse. Mas, no final, todos iriam sair ganhando, tanto ele quanto o Hasir. Pois, mesmo que não fosse o Iehr Hasir a segurar a cabeça de Vaerteyn, ela, de uma forma ou de outra, iria rolar, esguichando sangue pelas areias do deserto.

Você quer a cabeça de Vaerteyn no final, a mente de Jan disse, e eu…


…eu quero o sangue.


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Notas finais do capítulo

¹Favor não confundir a palavra "legate", do kra'vstan, com a palavra em inglês "legate". No kra'vstan, ela significa "legião", e no inglês, "legado" (título romano).



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