Antes que novembro acabe... escrita por OmegaKim


Capítulo 21
Vinte - Azul.


Notas iniciais do capítulo

Oi gente!!
Eu devia estar fazendo meu trabalho de química, mas vim aqui postar porque amo vcs e hoje meu dia foi incrível!!! Eu fiquei com tanto bom humor que esse capitulo ficou enorme kkk.
Espero que gostem!!
Ah, e obrigada a Skeeter por ter recomendado a fic!!! OBRIGADA!!! APROVEITE O CAPITULO!!!!
Boa leitura e bem vindos leitores novos!!! :)))



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Vinte – Azul

Mike devolveu meu celular naquele dia, como se ter o celular de volta fosse me trazer algum conforto. “Sei que estou ferrando de vez a sua vida, mas toma seu celular de volta”, era o que ele parecia estar dizendo. Se eu não estivesse todo quebrado tinha jogado aquele aparelho nele de tanta raiva que senti. Mas no fim, me limitei a segurar o celular e ficar o fitando como se não soubesse o que era ou para que servia. Depois resolvi subir para meu quarto e me tranquei o resto do dia lá, sem nada, porque eu estava ocupado demais me sentindo um miserável e a imagem de Will ainda dormindo não deixava minha mente em paz.

Me deitei na cama e fitei o teto, contei as fotos que haviam ali. Observei bem cada uma delas, guardando os detalhes e me lembrando do dia em que foram tiradas e por fim, parei meu olhar numa em que o Will aparecia. Eu mesmo a tinha tirado com a câmera dele. Ele estava sentado a sua mesa de trabalho com vários papeis espalhados a sua frente e o rosto muito sério como se estivesse decidindo o destino do mundo. O loiro nem ao menos tinha me visto com a câmera em mãos ao seu lado de tão concentrado que estava. Fechei os olhos ao lembrar da expressão confusa que ele fez quando o flash alcançou o seu rosto e depois o jeito envergonhado que ele sorriu, dizendo que não era fotogênico e que eu devia apagar essa foto. Não apaguei...

Mike ainda bateu na porta e me chamou para almoçar e mais tarde para jantar e bem mais tarde para comer alguma coisa, mas me recusei. Apenas me encolhi na cama, de olhos fechados e desejando que ele não tivesse feito o que tinha dito que fez. Se essa decisão dele fosse há alguns meses atrás, admito que ficaria feliz e que sairia de Dickson de bom grado. Mas agora... Não, eu não posso deixar Will agora. Não é nem por causa de Dickson, afinal ainda odeio esse lugar. O que me prende aqui é Will e essa coisa que sinto por ele.

— Droga. – resmunguei e cobri minha cabeça com o lençol.

Fiquei um tempo ali repassando as coisas que meu pai tinha dito. O modo sério e quebrado que ele tinha me comunicado que eu teria que voltar para Los Angeles, porque aqui não era seguro o suficiente, porque depois que nos mudamos as coisas não tem sido do jeito como ele esperava e a surra que levei só mostrou que esse lugar não era pra mim e que coisas piores iam acontecer.

Tudo bem, que Mike está preocupado. Que ele é um pai superprotetor e que ele me mandaria pra Marte se lá fosse seguro o suficiente, mas o que ele não entende é que eu não quero ir. Não agora. Não quero voltar pra LA agora. Eu preciso ficar com Will até ele acordar, preciso cuidar dele. Eu preciso ficar... Mas depois do papai me disse, não há argumentos que eu possa usar para fazê-lo mudar de ideia afinal ele fez a coisa mais burra de todos os tempos: Mike cedeu minha guarda para meus avós. E até eu completar 18 anos, não vou poder sair de baixo das asas deles.

— Bosta. – xinguei mais um pouco.

E antes que pudesse continuar amaldiçoando minha vida, meu celular começou a vibrar, o alcancei sobre a cômoda e atendi:

— Alô? – minha voz saindo extremamente mau humorada.

— Noah? Eu não tinha certeza se o seu número estava funcionando, mas pelo visto sim. – falou e quase podia jurar que ela tinha um sorrisinho no rosto.

— O que você quer Elizabeth?

— Humpt. Não me chame assim, está parecendo o Will. – fiquei calado a menção do seu nome, um silêncio chato se pôs entre nós. – Desculpe.

Tudo bem. – me limitei a dizer.

Você quer dá uma volta? Eu acho que te devo algumas explicações sobre o que eu disse na última vez.

Ela devia mesmo. Mas não era o tipo de assunto que eu queria discutir hoje, pra falar a verdade eu queria ficar na minha cama, enrolado no meu lençol e amaldiçoando a minha vida. No entanto, Liz estava me ligando de livre e espontânea vontade e me oferecendo respostas. Meu lado curioso começou a se manifestar antes que eu pudesse impedir.

— Ok. Já estou descendo. – me vi falando e escutei uma risadinha do outro lado da linha.

Estou te esperando.

###

Olhei para o céu. Estava cheio de estrelas e suspirei, apenas para ter como retorno uma pontada de dor. Costelas idiotas. Fechei os olhos e me mantive parado.

Estava deitado no gramado do quintal da casa de Liz. Em frente a piscina, sentada na borda com os pés mergulhados na água, Liz se mantinha quieta. Escutei o som que os pés dela faziam quando se movimentavam contra a água e senti vontade de dormir. Esse era o lugar mais calmo que eu tinha visitado até agora.

— Onde estão seus pais? – perguntei apenas para impedir que o sono viesse.

— Meus pais estão mortos, Noah. – ela respondeu, a voz saindo muito séria. – Essa casa é dos meus tios e eu tive que vir morar com eles depois que o Orfanato foi fechado. – ela suspirou e ficou em silêncio, segui seu exemplo. – Mas eles não estão em casa, estão viajando pelo Caribe ou Europa, não sei...

Voltei a abrir os olhos e fitar as estrelas. Nunca tinha me ocorrido que Liz pudesse ter parentes, depois que ela me contou que viera do mesmo orfanato que Will, eu tinha acreditado que ela tinha sido adotada como ele. Mas pelo jeito como ela falou dos tios, deu para perceber que Liz não tinha sido adotada e também não era tão querida pelos tios assim. Acho que eles apenas tiveram que ficar com ela depois que o Orfanato foi fechado, como algum tipo de castigo.

— Vocês não se dão bem? – soltei e mais uma vez a curiosidade se fazendo presente.

— Digamos apenas que minha mãe tinha bastante dinheiro e como sou de menor não posso mexer nele ainda, então eles é quem tomam conta. – era tanto ressentimento empregado ali que me surpreendi. – Mas isso vai mudar logo, na semana que vem faço 18 e então vou cair fora daqui. – então ela olhou pra mim por sobre o ombro e sorriu e era um sorriso verdadeiro. Nada de ressentimento ou ironia. Era o sorriso mais puro que eu já tinha visto ela dá.

Me forcei a sorrir de volta.

— Sente aqui comigo. – chamou e em forcei a ficar sentado e depois em pé e então fui até ela e sentei do seu lado, mas ao contrário dela não coloquei os pés na água mais porque estava de tênis do que por falta de vontade mesmo.

Observei a água, estava brilhante por causa das luzes dentro da piscina.

— Quer dar um mergulho? – perguntou sorrindo divertida da minha expressão.

— Não posso nadar. – e nem sei, completei mentalmente.

— Entendo. – baixou os olhos e mexeu os pés, agitando a água. – O que aconteceu com Mark?

Fechei os olhos na menção do nome desse idiota.

— Ele fugiu. – contei.

Mark tinha simplesmente desaparecido da cidade depois do que ele fez comigo e com Will. Eu o tinha denunciado à polícia, mas eles não puderam fazer nada de relevante e ainda não podiam já que o dito cujo tinha desaparecido. Mas eu sabia que uma hora ele iria voltar, porque para bem ou para o mal, a sua vida toda estava em Dickson, assim como Emma, que era a coisa que ele mais amava em todo mundo.

— Que droga. – comentou, mas não parecia realmente surpresa.

— Liz, você me trouxe aqui para me dizer o que exatamente? – decidi entrar de vez no assunto, precisava saber o que ela tinha pra me dizer antes que meu pai notasse que sumi e chamasse a polícia.

— Hum. Tudo bem. – ela respirou fundo e continuou a balançar os pés na água. – Eu acho que te devo algumas explicações.

— É. – falei. – Na última vez que conversamos, você insinuou que Will e você foram... – deixei em aberto, incapaz de completar a frase, incapaz de dizer essa palavra em voz alta.

— Sim. – confirmou não só sobre ter insinuado isso, mas sim também sobre o que eu pensava.

E de repente senti uma raiva tão grande dessas pessoas, desses seres humanos que deviam cuidar e dar abrigo para crianças como Liz e Will. Mas no fim só fizeram se aproveitar deles e sabe se lá de quantas crianças antes que fechassem o orfanato.

— Não pode estar falando sério. – tentei negar a mim mesmo, queria que ela dissesse que era tudo uma brincadeira, que ninguém nunca tocou em Will daquele jeito e que ninguém a usou desse jeito.

— Estou falando sério. Não tenho razão nenhuma para mentir sobre isso.

— Mas Will...

Liz piscou algumas vezes ao olhar pra mim e focou seu olhar extremamente verde no meu castanho e eu fui capaz de ver ali, refletido no olhar dela, a verdade. Vi toda a dor que ela carregava e todas as suas cicatrizes e por um momento me perguntei como ela conseguia se manter firme carregando tudo isso, mas aí pensei em Will passando pelas mesmas coisas e carregando as mesmas cicatrizes. “Ele sempre teve mais sorte do que eu”, ela havia me dito. Mas em que sentido? Por ter sido adotado por uma família amorosa, por ter Emma como amiga, por me ter ao seu lado? Por sofrer nas mãos de Mark? Onde estava essa maldita sorte agora que ele está em coma? Onde estava essa sorte quando apanhávamos por gostarmos um do outro?

— William era o preferido Deles. Com os olhos azuis e o cabelo loiro, ele parecia um anjo quando criança e os mais velhos adoravam a aparência inocente dele. – começou a contar antes que eu dissesse qualquer coisa. – Mas Madame Sam, - a dona do orfanato - costumava protege-lo dos mais velhos. Ela sempre o levava pra o seu quarto depois que todos iam dormir. No começo, eu não entendia o que estava acontecendo, achava que ela o estava protegendo e acho que Will pensou o mesmo durante um tempo. – Liz olhou para seus pés mergulhados na água. - Mas então ela começou a leva-lo para passeios e eu senti tanta inveja dele, na minha cabeça oca achava que ele estava se divertindo fora dali e quando os homens começaram a ir no orfanato para vê-lo e para ver outras crianças, acabei ficando com raiva dele achando que logo ele teria uma família e iria embora dali me deixando pra trás.

Imaginei um William mais novo, com bochechas proeminentes e um rosto inocente sendo adorado por adultos doentes, sem entender o que estava acontecendo ou porque recebia tanta atenção. Imaginei Liz mais nova, o cabelo escuro grande e os olhos verdes ainda inocentes, cheios de inveja por Will estar recendo privilégios.

— Ele sempre foi o preferido de todos. – falou com amargura. – Mas isso não lhe garantia segurança. Madame Sam sempre o estava repreendendo, o ensinando como agir, como falar, lhe dando livros e lhe ensinando regras de etiqueta. Ele era tratado como um boneco, sempre bem arrumado e bem educado. Todos os que tinham uma aparecia boa o suficiente eram educados dessa maneira, como se estivessem sendo preparados para algo. Madame Sam me odiava. – ela sorriu para o nada. – Ela dizia que eu era malcriada, uma selvagem porque eu me recusava a agir como uma marionete. E como Will me protegia dela e toda aquela sujeira que eu não conseguia ver, ele acabava sendo punido.

Escutamos um barulho e olhamos ao mesmo tempo para trás, mas não havia nada. Então ela voltou a falar:

— Sabe, Will nem sempre precisou de óculos. Ele costumava enxergar muito bem e lembro que fazíamos disputas para ver quem era melhor e ele sempre ganhava. Will sempre estava vendo coisas primeiro do que eu.

— O que aconteceu com ele? – perguntei mesmo não querendo saber, mas era o que ela esperava que eu fizesse.

— Ele foi castigado por uma coisa que eu fiz. O trancaram num quarto durante o dia inteiro, não sei o que aconteceu lá dentro e ele nunca me contou, sei apenas que no fim do dia, ele não conseguia enxergar nada. Demorou um dia para que a sua visão voltasse, mas ele teve que usar óculos. – Elizabeth fechou os olhos e vi uma lágrima escorregar por sua bochecha. – Foi minha culpa. – ela escondeu o rosto entre as mãos. – Eu devia ter recebido a punição, mas ele se intrometeu e levou a culpa.

— Tudo bem, Liz. – me forcei a dizer depois de engolir em seco. Levantei a mão e toquei o seu ombro, afaguei ali desejando que fosse o suficiente para que a garota parasse de chorar. Mas antes que eu pudesse repetir o tão taxado “Tudo bem”, ela simplesmente se empertigou na minha direção e me abraçou. – Ai. – gemi quando ela me abraçou forte demais.

— Desculpa. – sussurrou contra meu ouvido, a voz dela fazendo cócegas na minha pele. Liz afrouxou mais o aperto, mas não me soltou.

— E quanto ao Mark? – me forcei a perguntar. Ter ela tão perto assim de mim estava me deixando desconfortável. Uma parte minha queria a afastar, a outra quis mantê-la ali só para que ela ficasse calma e parasse de chorar. Eu não sabia lidar com mulheres chorando.

Elizabeth suspirou e então me soltou. Agradeci mentalmente por isso, pois o perfume dela estava começando a fazer cócegas no meu nariz. Provavelmente me alertando que eu sou alérgico.

A morena limpou os olhos e apesar de ela ter me soltado, ela ainda se manteve perto.

— É culpa minha também. – confessou e senti como se alguém estivesse tocando minha nuca com dedos frios. – Eu contei a Mark sobre Will ser gay e contei que Will gostava dele. – não pude impedir que meus olhos se arregalassem.

— Você fez o que? – soltei indignado.

— Ele tinha ido embora do Orfanato e me deixado sozinha com aquelas pessoas. Fiquei com tanta raiva que quando o Orfanato foi fechado e acabei vindo parar aqui, não pude me impedir de arquitetar algo. – disse e mesmo quando dizia isso não mostrava arrependimento algum. – Foi só uma questão de tempo, Noah. Will já confiava em mim e então foi fácil ter sua confiança. E depois quando ele conheceu Mark, percebi que ele gostava dele.

— Por isso vocês se afastaram. – adivinhei. E uma lembrança do que Matt tinha me dito há muitos anos atrás voltou.

“Fizemos coisas erradas, dissemos coisas ruins uns pros outros. Às vezes eu penso em como seria se eu pudesse voltar no tempo e desfazer algumas coisas... Mas estou aqui e ele está ali... Não faz sentido”— Matt tinha me dito naquele dia na arquibancada, quando meus sentimentos pelo loiro ainda estavam muito confusos depois do beijo.

— Eu só queria ferrar com a vida perfeita dele. – explicou e senti na sua voz toda a inveja estampada ali. – Só que as coisas saíram do controle.

Fechei a mão em punho, tentando me impedir de socar o rosto dela.

— O que aconteceu?

Liz sorriu. O sorriso mais sinistro que vi.

— Mark descobriu sobre o que aconteceu com Will no Orfanato.

— Você contou a ele. – constatei e ela sorriu mais. – O que você fez Elizabeth? – perguntei, minha voz cheia de tristeza.

— Contei a Mark como Will gostava de homens, como ele dormia com eles para conseguir dinheiro. Disse a ele como Will era... – não deixei que ela terminasse. Minha mão foi de encontro ao seu rosto antes que eu pudesse me impedir.

Liz segurou a bochecha e me fitou. Os olhos muito verdes de raiva e incredulidade. Me levantei e lhe dei as costas antes que eu fizesse alguma besteira. Não queria ter batido em Liz assim como não queria ter escutado tudo aquilo que ela disse. Apenas me forcei a continuar a sair dali, meio mancando sai porta afora com uma sensação desconfortável no estômago. Eu queria gritar, queria socar alguma coisa, queria me sentar no chão e chorar de tanta raiva que estava sentindo.

— Noah! – a escutei me chamar, mas não parei. Continuei andando.

Como ela pôde dizer uma coisa dessas a Mark? Como ela pôde trair Will desse jeito? Ele foi quem a estava protegendo no Orfanato. Por causa dela, ele tinha que usar óculos! Como ela pôde distorcer a verdade assim? Dizer que ele gostava de ser abusado?

— Espera! – ela me segurou pelo braço. O puxei do toque dela. Dor subiu por meu braço, mas ignorei.

— Como pôde fazer isso?! – me ouvir gritar. – Ele te protegeu! Ele usa uma porcaria de óculos por sua causa!

Dizer aquilo em voz alta era mil vezes pior do que pensar. Como você pôde?

— Ele está numa maldita cama de hospital por sua causa!

— Não! – ela gritou. – Não fui quem espancou vocês! Foi Mark!

— Você começou isso. A culpa é sua. – falei um pouco mais baixo. – E eu nunca vou te perdoar.

— Não preciso do seu perdão. – rebateu, os punhos fechados e a bochecha direita vermelha apenas a deixavam com uma aparência frágil, quase engraçada.

Balancei a cabeça e lhe dei as costas mais uma vez. Recomecei a andar.

— Sabe, Noah, eu tenho pena de você. – ela disse e eu parei, fechei minha mão esquerda num punho e me forcei a não correr até ela lhe acertar o queixo. – Além de gay, é apaixonado por um prostituto. Como acha que o seu pai vai reagir quando souber disso?

Me virei pra ela.

— Eu é quem tem pena de você, Elizabeth. – falei. – Eu ao menos tenho pessoas que me amam e que eu amo de volta, mas e você? Você não tem ninguém. Seus tios te odeiam. Matt só anda com você porque Will não o quer, mas tenho certeza de que se Will dissesse qualquer coisa para Matt, ele te deixaria sem pensar duas vezes. No começo eu realmente pensei que você pudesse ser alguém legal, pensei que você só estava quebrada. Eu realmente achei que pudesse te ajudar. Mas olhando pra você agora... – balancei a cabeça. – Não há nada para ser salvo aí.

Lhe dei as costas mais uma vez e dessa vez ela não veio atrás de mim. A garota me deixou ir sem dizer uma palavra. No começo, eu não sabia para onde estava indo. Primeiro pensei que estava indo pra casa, mas quando não atravessei a rua para minha casa e apenas dobrei na esquina, percebi que estava indo para o hospital. E depois de mais alguns passos, percebi o quanto de dor, eu estava sentindo. Aquele esforço todo estava cobrando seu preço. Assim que entrei no hospital passei pela recepção e segui até o quarto de Will, na UTI, percebi que não havia nada lá. Nada.

A cama estava desarrumada e todos os indícios de que alguém estivera ali, fora removido. Um calafrio subiu por minha espinha e senti como se alguém tivesse me dado um chute no estômago, porque todo o meu ar tinha sido tirado dos meus pulmões. Uma certeza mórbida estava se arrastando por minha mente. Será que... Não! Will não poder ter...

Eu estava hiperventilando muito alto e tudo a minha volta estava começando a girar. Me abracei, porque tudo começou a ficar muito instável ao meu redor e eu precisava me manter em pé, mas a temperatura tinha começado a cair. Não. Não. Não. Não.

— Noah? – escutei, mas a voz parecia muito longe, então não pude mais me segurar e acabei caindo de joelhos no chão. – Céus! – escutei passos e logo Laura estava a minha frente.

— Will. – eu disse quando Laura me segurou pelos ombros e abriu os botões da minha camisa, vi seus olhos se arregalarem.

— Ele está bem. – falou mas seus olhos não estavam em mim. – Você consegue respirar? – perguntou ao mesmo tempo que eu me engasgava. – Droga! Enfermeira! – ela gritou e logo uma mulher loira surgiu no meu campo de visão. Fiz menção de fechar os olhos. – Fique acordado. – e logo eu estava numa maca sendo levado para algum lugar.

###

— Ele deve ter feito muito esforço. – escutei ainda de olhos fechados, minha consciência estava voltando aos poucos. – Os pontos se arrebentaram e os seus pulmões se encheram de sangue. – reconheci a voz de Laura e então abri os olhos devagar. – Ah. Ele está acordando. – ela se voltou pra mim. – Oi Noah, como se sente?

— Como se um caminhão tivesse passado por cima de mim. – comentei e só então notei a figura de Mike ao lado da minha cama. Engoli em seco. Putz. – Oi. – disse a ele.

— Oi. – Mike cruzou os braços e me encarou. Laura percebendo o clima, apenas me deu mais um sorriso e se retirou.

— Antes que você venha com o sermão – comecei e me ajeitei na cama, para que pudesse o fitar direito. – O que aconteceu com Will?

Mike suspirou e veio até a beira da cama e se sentou. Seu rosto antes sério, se suavizou.

— Ele está bem, filho. Tiveram apenas que muda-lo de quarto. Will não está mais na UTI. – o fitei com muita atenção. – William acordou do coma.

Não pude evitar que um sorriso surgisse no meu rosto.

— Eu quero vê-lo. – falei e me apressei em jogar as cobertas de lado.

— Ei. Ei. – Mike me segurou. – Você não vai a lugar nenhum.

— Mas... mas... – comecei, no entanto Mike já estava me empurrando de volta pra cama e me cobrindo.

— Você acabou de sair de uma cirurgia, precisa descansar.

— Estou bem. – falei e tentei me levantar de novo, mas uma careta de dor me traiu.

— Não, não. Vai descansar. – mandou e revirei os olhos. – Noah. – sua voz saindo muito suave. – Precisa descansar se quiser ver Will. Ok? Sei que está ansioso para vê-lo, mas você não acha que Will gostaria de vê-lo bem também?

Parei para pensar nisso e papai tinha razão. Eu devia me recuperar antes de ver Will. Era o que ele ia querer, de qualquer forma. Então resolvi esperar.

Passei duas semana internado. Sem poder sair do quarto e sobre a vigilância constante do meu pai, recebendo apenas boletins de como Will estava. E a cada boa noticia dele, eu me sentia mais feliz e mais motivado a melhorar. Logo me foi dito que eu poderia tirar a tipoia do braço. Meu braço direito ainda estava meio dolorido quando eu tentava fazer certos movimentos, mas a cada dia ele melhorava. Meus pulmões também estavam melhorando assim como minhas costelas quebradas. Eu tinha que fazer exercícios de respiração uma vez por dia para avaliar a melhora deles.

Algumas pessoas vieram me visitar como Emma e a Dr. Martha. Ambas tinham sorrisos no rosto e me contaram novidades sobre a cidade. Emma me falou como estava lidando com a partida de Bianca e de como Will perguntava sobre mim todos os dias, ela até mesmo tinha servido de pombo correio ao trazer e levar bilhetes meus para ele e os dele pra mim. Claro que meu pai não sabia nada sobre esses bilhetes, porque se soubesse ia pedir que eu parasse pois isso estaria prejudicando na minha e na recuperação de Will. Coisa que eu achava uma besteira. Mas tudo bem, esse era meu segredinho com Emma.

A loira vinha me visitar uma vez por dia, sempre trazendo bilhetes e um sorriso no rosto. Em troca por sua boa vontade em me manter informado sobre Will, eu lhe oferecia informações sobre Bianca. Lhe contava sobre as manias da minha amiga e das coisas que ela gostava.

Nos meus tempos vagos, me pegava pensando no que Liz me disse. No modo como ela tinha contado toda aquela verdade como se fosse a coisa mais normal do mundo. Mas acabei decidindo não me incomodar com isso. Assim que Will estivesse bem o suficiente, poderíamos conversar sobre isso e então eu teria certeza sobre o que de fato aconteceu.

Sai do banheiro depois de tomar banho e me trocar. A Dr. Laura tinha acabado de me dar alta. Eu não estava cem por cento, mas estava bem o suficiente para ficar em pé e andar normal, sem mancar nem nada. Havia apenas o desconforto no peito, mas isso logo sumiria assim que minhas costelas sarassem. Fechei o último botão da minha camisa e estava colocando minha jaqueta quando escutei a porta ser aberta.

— Já estou indo pai. – falei pensando que era Mike.

— Acho que sou muito novo para ser seu pai.

Me virei num rompante. Meus olhos se arregalaram e todas as palavras que eu tinha pensado em dizer a ele tinham se evaporado da minha mente. Ele estava aqui, na minha frente, de pé. Você está realmente vivo. É claro que todos tinham me garantido que ele estava bem e vivo, mas ouvir sobre isso é bem diferente de ver com seus próprios olhos. E tudo bem que tínhamos trocando bilhetes, mas até esse momento quando finalmente posso vê-lo, eu ainda não tinha acreditado realmente que ele pudesse estar tão bem. Mas era Will. Vivo e bem. Saudável e com um sorriso no rosto, na minha frente, me fitando com os olhos mais azuis que já vi.

— Oi. – ele falou e dessa vez eu sorri.

— Oi. – dei um passo em sua direção enquanto ele cruzava os braços. Percebi uma cicatriz na sua sobrancelha esquerda.

— Soube que você se meteu em algumas encrencas. – comentou e virou o rosto pro lado.

— Talvez eu tenha feito algumas besteiras. – falei e segurei seu queixo, o fiz olhar pra mim. – Estava com saudade de você. – confessei.

O loiro descruzou os braços e os passou em volta da minha cintura.

— Sonhei com você. – me confessou enquanto deitava sua cabeça no meu ombro. E percebi que ele se referia ao tempo que passou em coma.

Envolvi seu corpo com meus braços e ficamos ali, quietos. A respiração dele batendo contra minha pele e todo o peso daqueles dias sem vê-lo, sendo retirado dos meus ombros.

— Preciso te falar uma coisa. – ele sussurrou contra a minha pele. Eu me afastei para poder olhá-lo. Will parecia um tanto envergonhado e seus olhos não encontraram os meus.

— O que há? – me preocupei.

— É que... – ele me soltou e colocou a mão na nuca, e ainda olhando pro chão continuou. – Quer jantar lá em casa?

Soltei o ar que não sabia que estava segurando e comecei a rir.

— Está me chamando para jantar romântico? – perguntei divertido e cheguei perto dele, mas o loiro se esquivou de mim. Franzi a testa pra isso.

— Na verdade... – ele estava de costas pra mim, então ficou de lado e me olhou de relance. Os olhos muito claros atrás das lentes do óculos. – Meus pais querem te conhecer.

Arregalei os olhos e engoli em seco. Tudo bem, que eu já imaginava que isso ia acontecer em algum momento, principalmente depois que eu aceitei o pedido de namoro do loiro. Mas na minha cabeça, as coisas ainda iam demorar. E escutar essa frase saindo da boca de Will só me fez sentir um desconforto no estômago e dizer:

— Droga.

Escutei William suspirar e só então me lembrei que ele ainda estava ali, por um momento eu tinha me enfiado no meu próprio mundinho de nervosismo e insegurança. Eu definitivamente não estava pronto para conhecer os pais de Will, mas esse passo só mostrava que o quer que fosse que estávamos tendo estava se tornando sólido. Estava se moldando e se transformando em alguma coisa que pudesse durar. Essa constatação me surpreendeu.

— Você contou a eles? – perguntei ao loiro.

Will olhou pra mim e sorriu amarelo.

— São meus pais, não é como se eu pudesse esconder algo como isso deles. – respondeu.

— E como eles reagiram? – dei um passo em sua direção, ele não se afastou quando cheguei muito perto.

— Eles querem te conhecer.

— Tudo bem. – assenti. – Quando vai ser o jantar? – envolvi sua cintura com meus braços e o trouxe para mais perto.

— Não está chateado? – perguntou e notei um pouquinho de insegurança na sua voz.

Eu poderia beijá-lo, mas não o fiz.

— Por que eu ficaria? – enfiei meu nariz na curva do seu pescoço e respirei seu cheiro, o senti se arrepiar.

— Bom... – ele se desconcertou. – Não achei que você quisesse tornar tudo tão sério agora. Sabe, começamos a namorar faz pouco tempo então, eu pensei que...

— Ei. – eu disse baixinho, levantando meu rosto e segurando o dele perto do meu. – Estou com você. Estamos juntos. E se você quer que eu conheça seus pais, tudo bem. Eu vou conhece-los.

Will encostou sua testa na minha e fitou meus olhos. Olhei bem dentro da sua íris. Muito azul. Azul tinha acabado de se tornar minha nova cor favorita. Não porque era uma cor bonita ou porque era a cor dos olhos de Will, mas sim porque era uma cor leve e o tom que os olhos dele adquiriam ao olhar pra mim, era simplesmente belíssimo. Era a cor do céu de manhã cedinho quando o sol está começando a nascer. Me dei conta de que Will estava vendo apenas as coisas boas em mim, ele tinha eliminado as coisas ruins que já eu disse e fiz. Ele estava, para minha surpresa, guardando os sorrisos. Guardando o lado bom. E fiquei tão grato por isso, por ser uma pessoa nova diante dos olhos dele e me dar conta de que, sim, eu estava me tornando uma pessoa nova, que uma coisa tão grande e bonita começou a se expandir no meu peito, que não pude mais me segurar. Simplesmente o trouxe para mais perto e o beijei.

Ele pareceu surpreso no primeiro momento, mas logo depois se deixou levar e quando dei por mim, o loiro estava sorrindo contra meus lábios e eu estava seguindo seu exemplo. E eu teria ficado o dia inteiro ali, naquela bolha de paz e conforto se não fosse pela entrada abrupta do meu pai no quarto.

— Noah, nós temos... – Will me afastou imediatamente, senti meu rosto corar e Will abaixou os olhos. – Er... – até mesmo meu pai parecia terrivelmente desconcertado. Vi os olhos castanhos do meu pai indo de mim para Will, a boca meio aberta sem saber o que dizer ou o que fazer.

Uma parte minha queria empurra-lo porta afora e trancar a porta, a outra só queria se enterrar ali mesmo.

— Olá William. –Mike optou por dizer.

Observei o loiro de canto de olho, ele não olhou para meu pai assim como não olhou pra mim. Suas bochechas estavam muito rosadas e ele mantinha os olhos baixos.

— Oi, Sr. Grace. – acabou respondendo constrangido.

— Você também recebeu alta?

— É. – ele coçou a nuca e tentou um sorriso.

Um silêncio se impôs entre nós três. Ficamos evitando um o olhar do outro por um tempo.

— Bom, pai... – comecei. Era melhor que fossemos embora dali logo. – Temos que ir, não é?

Mike estava num estado até engraçado. Eu teria rido se não estivesse com tanta vergonha. Ele ficava vagando os olhos de mim para Will, como se não pudesse acreditar que estávamos nos beijando ou que pudéssemos fazer isso. Tudo bem que ele sabia e aceitava o fato de que seu filho gostava de garotos em vez de garotas, mas acho que ver isso em ação era bem mais chocante do que saber por alto. Decidi tomar as rédeas da situação.

— Vamos, pai. – andei até ele e segurei o seu braço e sai dali o levando.

— Tchau, Will. – ele ainda disse quando passávamos pela porta.

— Tchau, Sr. Grace. – o loiro respondeu educado sem olhar para ele.

Depois que passamos pela porta e estávamos no corredor, quase perto da saída foi que lembrei de algo.

— Vá na frente. – falei para Mike. – Eu esqueci uma coisa no quarto. – e corri de volta para o quarto antes que ele pudesse dizer algo.

William estava saindo do quarto quando cheguei até lá.

— Oh. – ele disse quando me viu. – O que aconteceu?

— Esqueci uma coisa. – expliquei e ele saiu de frente da porta pra que eu pudesse entrar, mas em vez de entrar. Eu enlacei sua cintura e o beijei ali mesmo, na porta do quarto onde eu estivera internado.

Will agitou os braços a minha volta, totalmente surpreso pelo ato. Mas logo ele estava se entregando e colocando os braços em volta do meu pescoço e me puxando para mais perto. Ter de volta a sensação dos lábios dele contra os meus, era boa demais para que eu desperdiçasse qualquer momento com ele. Beijá-lo era simplesmente viciante. E quando finalmente nos separamos, ele tinha os olhos num tom de azul escuro e os lábios estavam rosados assim como suas bochechas quando viu que tínhamos plateia. Notei a figura risonha de Laura a alguns passos de nós assim como algumas enfermeiras e Emma.

— Posso te ligar mais tarde? – perguntei ignorando todas aquelas pessoas.

O loiro assentiu levemente e eu o soltei. Ainda segurei seus dedos enquanto me afastava, mas logo tive que soltar e lhe dar as costas. Meu coração batendo muito rápido e o sangue correndo por minhas veias como nunca. Eu me sentia tão vivo, tão invencível...

Naquela época eu não sabia o que era aquilo. Eu não conseguia ver o quanto aquilo estava crescendo. Como de praxe, eu estava apenas olhando para Will e nunca para o que estava em volta. Mas o que eu podia fazer? O loiro tinha uma aura tão brilhante e leve, que era impossível olhar para qualquer outra coisa além dele assim como eu sabia que ele não era capaz de olhar para outra coisa além de mim. Do nosso modo estávamos curando as feridas um do outro. Estar com William fazia meus pedaços serem colados novamente. Pouco a pouco, com um sorriso, com um gesto, como beijos, com a atenção que ele me dava, tudo isso fazia um pedaço meu voltar ao lugar certo.

Parei no fim do corredor e olhei para ele por sobre o ombro. O loiro ainda estava no mesmo lugar, ele sorriu pra mim e me deu um tchauzinho básico, fiz o mesmo e depois fiz um sinal de ligação com as mãos e ele riu ao passo que Emma se juntava a ele. Recomecei a andar. Encontrei meu pai no carro. Me sentei ao seu lado no banco do carona e depois que coloquei o cinto, ele perguntou:

— Encontrou o que estava procurando?

— Humrum. – assenti ao mesmo tempo que pensava “não, ele me encontrou”.

Papai deu partida no carro e saímos do estacionamento. Ele olhou de relance pra mim como se estivesse decidindo o que dizer, mas acabou desistindo no último momento porque acabou dizendo outra coisa:

— Sabe, eu estava pensando: o que acha de pizza para o jantar?

— Pizza? – soltei meio surpreso.

— Sim, sim. Pizza. – confirmou. – Podíamos alugar alguns filmes e você podia convidar o Will.

Ergui uma sobrancelha pra ele e o fitei.

— E você podia convidar a Laura. – falei, porque já tinha percebido a quedinha que papai tinha pela ruiva.

Ele sorriu e assentiu ao passo que eu me inclinava e ligava o rádio, colocando numa estação qualquer.

— Parece uma boa ideia. – concordou. Era o jeito dele de dizer que aprovava meu namoro com William.

— Parece uma boa ideia. – confirmei, era meu jeito de dizer que gostava de Laura. Sorrimos um pro outro.

Talvez nós pudéssemos deixar os problemas de lado por um momento, levantar os pés e descansar a mente e aproveitar. Só um pouco.

Observei a paisagem, abaixei o vidro e deixei o vento bagunçar meus cabelos. Estávamos em pleno verão e o céu estava incrivelmente azul.


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Notas finais do capítulo

Gente, eu sei o que o cap começou com um tema meio pesado. Mas precisei falar sobre isso... Agora um pedaço da história do Will já foi revelada. O que sera que vem por aí?!!! Dêem seus palpites!
Ah, quanto a essa parte final. Achei que ficou bem cute cute :))). Eu fique feliz com o resultado!! Quem gostou?
Quem curtiu a introdução de um novo casal? Laura e Mike? Quem gostou da cena fofa do Noah com Will? Ou quem riu da vergonha que o Mike sentiu ao pegar o filho aos beijos com Will? kkkk...
Bjs e até!!



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