Antes que novembro acabe... escrita por OmegaKim


Capítulo 2
Dois - Quando eu tento ajudar.


Notas iniciais do capítulo

Oi. Voltei! o/
Fiquei muito feliz de já ter leitores. É muito bom saber que tem gente lendo isso aqui... Então obrigada.
Boa leitura.



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Dois – Quando eu tento ajudar.

Nunca mais durmo sentado, é a primeira coisa que penso quando me ponho de pé no dia seguinte. Meu pescoço está dolorido assim como minha costa e todos os meus membros. Me espreguiço, alongo meus braços e posso escutar um leve “crack” ao fazer isso.

Vou direto para o banheiro fazer minha higiene matinal. Me demoro um pouco em frente ao espelho antes de começar a escovar os dentes. Estou com uma cara péssima e não é só por causa do corte no meu lábio inferior e os arranhões na bochecha esquerda, é por porque eu realmente dormi muito mal. Existem olheiras em meu rosto fazendo eu parecer mais pálido que o normal e toda a minha face está contorcida numa expressão de poucos amigos. Bufo e trato de me apressar, se não vou me atrasar para o primeiro dia de aula na escola nova.

Assim que desço, meu pai já não está em casa. Ele deixou um bilhete sobre a mesinha de centro. O pego e leio:

“Tive que ir para o hospital, mas volto para o jantar.

Não esqueça que o caminhão de entregas vem as 14:30hs, esteja aqui para recebe-lo e não esqueça de usar o uniforme escolar.

– Papai”.

Reviro os olhos com isso. Mas ainda assim baixo o olhar pra camisa que estou usando. Sim, é o uniforme da escola por baixo da minha jaqueta. Quer dizer, é apenas a camisa da escola. Branca, de mangas curtas e de botões com o brasão azul da mesma sobre o coração. Essa escola permite que se use apenas a camisa em vez do uniforme completo, o que é uma coisa legal porque o uniforme completo é ridículo.

Largo o bilhete de volta em cima da mesinha. Saio da casa, tranco a porta com a minha cópia da chave e sigo direto pra escola. Vou a pé mesmo, porque a mesma não fica a menos de uma quadra de onde estou morando, o que dá mais ou menos cinco minutos andando num ritmo normal e trinta, se eu for me arrastando. Como realmente estou com vontade de acabar com isso logo, apenas ando. Baixo a cabeça e enfio as mãos nos bolsos da minha jaqueta e vou.

A escola não é aquilo que eu esperava que fosse, porque tudo bem que eu já esperava uma escola pública, mas constatar isso foi como levar um soco no estômago. Tudo bem que meu pai já tinha me avisado sobre isso, mas achei que era brincadeira e que no fim, eu ia estudar em alguma escola particular do jeito que era em Los Angeles. No entanto, agora enquanto estou parado na entrada da escola só consigo pensar que meu pai só pode estar querendo me ferrar de vez. Respiro fundo e passo pelos portões enferrujados da mesma.

Não existe ninguém pra me receber quando ganho os corredores da mesma, fato que aprecio bastante porque não estou com paciência pra aturar algum caipira feliz me mostrando a escola.

Eu sigo direto para a secretaria da escola, paro em frente ao balcão peço meus horários. A moça da secretaria sorrir pra mim enquanto verifica minha ficha de matricula e imprime meus horários. Pra não parecer tão mal-humorado, eu sorrio de volta. Depois que ela me entrega o papel com todas as matérias que meu pai fez questão me obrigar a fazer todas, eu saio dali e sigo direto pra minha primeira aula. Cálculo.

A sala não está tão cheia, acho que essa matéria não é muito popular. Dou de ombros e sob os olhares dos alunos que estão ali, me sento na fileira a esquerda encostada a parede, na quarta carteira. Fico quieto apenas escutando a agitação da sala, posso escutar que estão falando sobre mim dizendo coisas engraçadas sobre mim, coisas que eles acham que me trouxeram para a pequena cidade de Dickson. Parece que me tornei a mais nova fofoca da cidade. Ah, se eles soubessem. Mas me limito a ficar calado, só escutando e desejando que tudo isso passe de uma vez.

###

Ergo a lapela da minha jaqueta, encosto a costa na parede e levo o cigarro mais uma vez aos lábios, dou um trago. Sinto o gosto amargo da fumaça na língua, mas a mantenho ali por um tempo. Depois expiro a fumaça pelo nariz ao passo que sinto a nicotina no meu cérebro, dando voltinhas pelas minhas sinapses e me relaxando o corpo. Fecho os olhos com isso.

Estou nos fundos da escola e estamos na hora do almoço, e como não conheço ninguém e não estou afim de conhecer ninguém, então resolvi andar pelos arredores da escola. Acabou que encontrei esse lugar: a parte de trás da escola, lado direito se você se orientar a parti da entrada da escola. É um tipo de vácuo, uma sala inacabada em forma de L, sem porta e sem uma parede. Achei que aqui era um bom lugar para se ficar sozinho, porque 1) ele estava vazio e 2) eu precisava fumar em algum lugar.

– É contra as regras da escola fumar. – alguém diz me tirando do meu transe e assustado, jogo o cigarro no chão e piso em cima do mesmo com a ponta do meu all star.

– Droga! – exclamo e foco meu olhar na garota parada a uns cinco passos de mim, a direita.

Ela ri e diminui a distância entre nós e se encosta ao meu lado na parede.

– Assustei você? – pergunta ainda com um brilho de diversão nos olhos verdes.

Ergo minha sobrancelha em sua direção, porque tenho a impressão de que a conheço. É quando lembro da menina de biquíni preto com bolinhas brancas se admirando em frente ao espelho do seu quarto, que vi pelo binóculo da janela do meu quarto. É a minha vizinha de cabelo roxo.

– Eu sou a Liz. – ela me estende sua mão e eu a aperto. – E sou sua vizinha.

– Noah. – digo apenas e solto a mão dela, que estava gelada. Volto a fitar a parede a minha frente.

Cinza e de concreto, com algumas rachaduras aqui e outras ali.

– Você tem mais cigarros? – Liz me tira mais uma vez dos meus pensamentos.

– Achei que fosse contra as regras. – falo sem olhá-la.

Ela ri mais uma vez e percebo que ela tem os dentes de baixo levemente tortos.

– Não me importo com as regras.

– Eu também não. – concordo e tiro mais um cigarro do bolso interno da minha jaqueta, pego o isqueiro no bolso de trás da minha calça e logo estamos tragando um belo cigarro.

Liz tem as sobrancelhas finas e a cor do cabelo só a deixa mais branca, mas os olhos... eles são de um verde intenso, é quase impossível você não olhar pra eles.

– Você veio mesmo de Los Angeles? – ela pergunta depois que me passa o cigarro, fecho os olhos enquanto trago o mesmo.

Solto a fumaça vagarosamente numa tentativa fajuta de fazê-las tomar a forma de círculos, mas não dá certo. Mas a cada pedaço que lanço no ar, parece uma bolinha acinzentada deformada. Quando termino minha brincadeira, respondo a ela:

– Sim. – sou breve, porque não estou afim de conversar.

Vim aqui nesse lugar para justamente fumar e ficar sozinho, realmente não sou obrigado a contrariar meu objetivo. É, meu mal humor está num grau altíssimo.

Passo o cigarro pra ela.

– Disseram que você roubou uma loja e está se escondendo aqui. – diz antes de levar o vício aos lábios.

Sorrio de lado. Essas pessoas inventam cada coisa.

– É verdade? – solta enquanto a vejo bater o indicador no cigarro pra que as cinzas caiam. Seus olhos não estão em mim, estão concentrados no ato.

– Descubra por si só. – digo apenas e me desencosto da parede e com as mãos enfiadas nos bolsos, saio dali deixando Liz com o resto do cigarro entre os dedos e uma expressão confusa no belo rosto, os olhos desfocados de tanta nicotina.

O resto das aulas passam numa lentidão irritante, depois do meu breve papo com Liz, não falei mais com ninguém da escola ou da minha classe. Todos apenas se limitavam a me olhar nas aulas ou no corredor como se eu fosse um alienígena verde e gosmento. Uma parte de mim sabia o que eles estavam pensando: “esse cara não pertence aqui, olhe como está deslocado” e a outra parte concordava plenamente. As aulas terminaram as duas em ponto e tive que sai da sala meio correndo meio andando, em parte porque não queria dá na telha o quanto queria ir pra longe dali e em parte porque eu tinha que me apressar se quisesse chegar antes do caminhão de mudança, se eu não estivesse lá pra receber os móveis meu pai com certeza me mandaria para uma cidade mais escondida que essa.

Os alunos se aglomeravam no corredor, era uma massa branca e azul – as cores do uniforme. Me enfiei no meio deles e comecei a ganhar caminho por ali, precisava chegar na saída. Esbarrei em algumas pessoas e delas escutei palavras pouco elogiosas. Mas quando finalmente consegui me livrar daquela multidão, sai pelos portões, ajeitei a mochila na minha costa e ganhei o caminho de casa. O problema foi que eu vi assim que dobrei a esquina.

Existia três garotos todos usando o mesmo uniforme que o meu, um estava claramente encurralado na parede de um beco. Era loiro e tinha o olho direito inchado e uma expressão de pura raiva estava estampada em seu rosto, eu podia ver sua mandíbula cerrada e suas mãos fechadas em punho. Os dois garotos eram maiores que esse primeiro, ambos estavam de costas pra mim e de frente pro garoto, eles riam e diziam coisas ofensivas para o garoto. O garoto loiro tentou correr entre eles, mas os garotos maiores o pegaram e o jogaram de encontro a parede. De onde eu estava, pude escutar o baque que o corpo dele fez quando encontrou a parede de concreto. Então não pude mais me segurar.

Tudo bem que eu não gostava tanto dessa cidade assim, que eu não estava nem aí pros caipiras que moravam aqui e que definitivamente, eu devia ir pra casa agora e receber o maldito caminhão. Mas isso não quer dizer que vou ver um garoto apanhar de dois garotos maiores como se fosse a coisa mais normal do mundo, não quando eu posso fazer alguma coisa.

– EI! – gritei da entrada do beco. – Deixo-o em paz!

A parte boa foi que eu consegui tirar a atenção dos grandões do garoto loiro e a parte ruim, era que agora a atenção deles estava focada em mim.

– Isso não é assunto seu, novato. – o grandão número um falou, ele tinha o cabelo castanho como o meu e grandes olhos escuros maldosos, além de um rosto cheio de traços fortes e igualmente raivoso. – Cai fora. – e se virou de pra encarar o garoto loiro.

Peraí, ele ia simplesmente me ignorar?

Não mesmo. Ninguém me ignora.

Andei a passos firmes até ele, a raiva queimando no meu estômago.

– Falei para deixa-lo em paz. – disse com a voz controlada e incrivelmente firme.

O grandão número dois me deu um sorriso cheio de malícia maldosa e antes que eu pudesse prever, o grandão n°1 me deu um soco bem no estômago. Foi como se alguém tivesse arrancado meus pulmões, e de primeiro não senti dor alguma. Existia apenas uma queimação pela falta de ar e um grande entorpecimento, onde deveria estar a dor. Até que ela veio, forte e duma vez só. Eu me inclinei segurando minha barriga e era tanta dor, mas tanta dor que senti minha visão embaçar e minhas pernas fraquejarem.

– Falei pra ficar fora disso, novato. – escutei eles rirem, mas parecia a uma distância muito grande. – E você, - enquanto eu morria de dor percebi que o Grandão nº1 era o chefe, e agora estava falando com o garoto loiro. – se considere avisado.

Então os vi darem as costas pra nós e irem embora.

Puxei uma grande quantidade de ar, numa tentativa de trazer meus sentidos a vida. Me virei de frente pra parede, apoie minha mão ali e simplesmente vomitei. Eu me sentindo tonto e enjoado. Meu Deus, levar um soco daquele cara foi como levar uma tora de madeira no estômago. Limpei minha boca com a costa da mão livre e comecei a voltar a respirar devagar, puxava uma golfada de cada vez. E quando me senti bem o suficiente pra falar e andar sem tanta dor, me desencostei da parede e foquei meus olhos no garoto loiro que estava recolhendo seus pertences do chão e os jogando na bolsa de uma alça só, sem cerimonia alguma. Vi quando ele encontrou seus óculos, estavam com as lentes quebradas. Ele jogou os óculos por cima do ombro com raiva, e os mesmos se quebraram de vez contra o chão.

Fui até ele, me abaixei ao seu lado para ajudá-lo a recolher as folhas de caderno que foram arrancadas do mesmo. Peguei algumas e estendi pra ele.

– Não preciso que me defenda. – ele fala e não pega as folhas que lhe ofereço. Percebo que sua voz está cheia de raiva.

– Mesmo? Porque parecia que você estava apanhando feio. – rebato.

Como ele pode ficar com raiva quando eu levei um soco no estômago tentando impedir que ele apanhasse mais?

– Não pedi sua ajuda. – diz entre dentes e agora estamos de pé, um encarando o outro. Posso ver que seus olhos são azuis e estão tão cheios de raiva que encarar seus olhos é como olhar para o céu em dia de tempestade.

– Ótimo. – digo e jogo as folhas que ainda seguro no chão. – Dane-se.

Me viro e saio dali pisando duro e com tanta raiva dentro de mim que esqueço por um momento a dor no estômago.

Isso que dá quando se tenta ajudar alguém.


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Notas finais do capítulo

O que vcs tão achando do Noah?



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