Invisíveis como Borboletas Azuis escrita por BeaTSam, tehkookiehosh


Capítulo 31
Verso 30: Interlude




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“Fighting” diz a última mensagem que o Jimin me mandou. Esses dias aqui na Big Hit têm sido bem mais difíceis do que eu imaginava. A Stella e o Bangtan estão em outros países, mas eles não me deixam sentir como se estivessem longe.

“Coma direito” Jin me envia três vezes ao dia, junto a um link do Eat Jin mais novo. A galeria de fotos do meu celular não estampa mais nada além das várias selcas que o J-Hope e o Jimin me mandam diariamente. Não, isso não é verdade. Na galeria, também estão os prints que tirei das músicas brasileiras que o Rap Monster recomendou no twitter.

Sempre mensagens curtas, que não exigem uma resposta imediata. Isso porque ambos os lados sabem que essa não vai ocorrer. Nossas agendas estão muito cheias ultimamente. Mandar uma mensagem, receber uma resposta e iniciar uma conversa decente seria um golpe de sorte.

Até agora, isso só aconteceu uma vez, quando eu e Rap Monster discutimos sobre o significado de Flores, dos Titãs. Por mais que não goste de todas as músicas que mandei, em suas mensagens sempre há um “obrigado”.

Teve uma vez que o Jungkook que mandou uma mensagem. “Essa sua amiga para quem dedicou Papaoutai é a Stella? ”, isso me assustou um pouco. Ele deve estar muito preocupado para perceber até uma coisa dessas. Fez-me prometer que iria ajuda-la depois que voltasse. Sabendo que isso faz com que ele se sinta uma pouco melhor, concordei. Acho que isso significa que sairei toda roxa da Big Hit, lembrando a aposta que fiz com a Stella.

Olho o relógio no meu bolso: tenho que ir logo para a aula de canto! Desde aquele dia, jurei que nunca mais me atrasaria. Todo esse treino enxugou o meu senso de humor. Logo percebi que tenho que levar tudo isso a sério.

O primeiro treino de dança foi até legalzinho. O Son Sungdeuk me ensinou os passos das coreografias e ficamos repetindo a tarde toda. Acho que foram só 4688768151 vezes. Não estou exagerando, eu juro! E lembro que reclamei naquele dia quando cheguei no hotel... Sabia de nada, inocente...

Nos próximos dias, o demônio vestido de gente chamado Son Sungdeuk achou que eu tinha memorizado as coreografias minimamente bem. Porra nenhuma. Essa foi só a desculpa que ele achou para fazer com que eu corresse 5 km cada manhã (enquanto canto!) e passou a olhar cada detalhe da coreografia, “para que fique perfeito, saco de batatas” como ele costuma dizer. Mesmo se meu braço estiver só um pouquinho baixo quando ele deveria estar reto, o desgraçado pede para eu refazer a coreografia TODA. E sempre que eu reclamava dos meus músculos tão doloridos que mal conseguia respirar, ele respondia: “se dói é porque você está fazendo certo”.

Mas trouxas como eu não aprendem mesmo! Costumo jantar com a Hae Won, mas como ela tem escola, só chega tarde. Então durante o almoço eu viro a “excluída da empresa”, sempre sozinha no meu canto.

Ontem, por uma obra de “caridade”, Sungdeuk resolveu fazer o favor de sentar junto comigo no almoço. Enquanto nós conversávamos, perguntou se eu fazia algum esporte, já que a minha capacidade física “é razoável para alguém tão preguiçosa”. Na minha inocência pueril (de um dia atrás), respondi que gosto de basquete desde pequena, já que a minha mãe sempre insistiu que eu fizesse algum esporte para eu não ficar o dia inteiro no computador. Como eu não queria nada que envolvesse a falata coordenação motora dos meus pés, acabei escolhendo basquete mesmo. Não entendo de parte de falta de coordenação motora nos pés ele não entendeu.

Na mesma tarde, ele arranjou uns pesos para amarrar nos pés e me fez pular corda umas 145245745136 vezes. Disse que vai deixar meus pés mais ligeiros – e olha só a desculpa do desgraçado – vou pular mais alto no basquete! Por quê?! POR QUE EU FIZ ISSO COMIGO MESMA?!

E, pelo que parece, a Yang Mi tem andado muito com esse cara. Depois de saber que cantei Papaoutai, ela veio saber se o meu francês de colégio dava conta de Je ne Regrette Rien, da Edith Piaf, música que inspirou as fotos do Hwa Yang Yeon Hwa pt. 2. Bem o meu francês dá conta, o que não dá é a minha garganta! Caramba, ela quer eu cante uma música da Edith Piaf, a lendária Edith Piaf!

Já na sala de canto, faço os inúmeros vocalizes que já decorei de tanto fazer. Foi mais fácil que decorar a tabuada, pelo menos. Depois de treinarmos algumas músicas do show, vamos para a que realmente representa algum desafio – por mais que tenha que treinar (e muito) a respiração para conseguir aguentar todas essas coreografias (infernais).

“Repete” para lá, “repete” para cá, nunca está bom o suficiente. Yang Mi só frisa que a interpretação está bem fraca. Mais uma vez, insisto em cantar Je Ne Regrette Rien. Nota por nota, respiração por respiração, a emoção que vibra nas minhas cordas vocais. No entanto, dessa vez não ouço um “repete” me interrompendo. Não consigo entender... Não é a primeira vez que sou tão cuidadosa, mas algo sempre soa errado nos ouvidos dela. Só que dessa vez, está tudo quieto.

O que é bom é para aproveitar! Canto meus pulmões para fora, como não faço desde que a Stella partiu. A sensação das notas reverberando por toda a sala e, consequentemente, no meu ouvido é mágica! Eu amo a música.

Para falar a verdade, não pensei que conseguiria cantar essa música, entretanto uma confiança estranha me toma. Eu consigo fazer isso. Após sustentar a última nota por longos segundos, palmas quebram o súbito silêncio que se formou.

— Uau. – Supreme Boi surge da porta. – Você é tão boa quanto o Namjoon disse.

Supreme Boi! Meu coração acelera ao ponto de sair pela boca! Mesmo meus músculos não respondem mais por mim. O Homem em pessoa está bem na minha frente, me elogiando! Ele, o ex-integrante do BTS, que participa na produção das músicas, um dos que mais me inspira a seguir essa carreira de compositora! Nunca, mesmo nos meus sonhos mais esperançosos, imaginei que o encontraria pessoalmente, em especial nessa semana que estou tão acabada.

Assim que retomo o controle do meu corpo, meu primeiro reflexo é pentear os fios desgrenhados pela aula de dança, o que não é de muita ajuda já que o cansaço está irremediavelmente estampado na minha cara. Isso não importa agora! Tenho que cumprimentá-lo logo!

— Olá, eu sou a Sam! – apresento-me um pouco mais alto que o calculado. – Sou uma grande fã sua, Supreme Boi! Adoro as músicas que você produz! Espero um dia conseguir produzir tão bem!

— Espera um pouco aí... Você sabe quem eu sou?! – aponta para si mesmo, em sua genuína surpresa.

— Claro que sei! Por que não saberia?

— Namjoon, essa garota está me surpreendendo mais do que você me avisou...

— Namjoon? – estranho a menção do nome do líder. Não é possível que ele esteja aqui!

— Ah, só estava falando comigo mesmo – explica. – O Rap Monster falou muito de você para mim. Realmente, sua voz é maravilhosa.

Minhas bochechas, meu rosto, até minhas orelhas se ruborizam. Coração, você não poderia bombear  mais sangue para algum lugar mais útil? Tipo, sei lá, meu pé? Seria bom para correr caso não consiga esconder o quão envergonhada estou. Ah é, falta de coordenação motora.

— Mas ele não tinha me dito que era tão cosmopolita assim! Uma brasileira que traduz músicas coreanas para inglês e canta em francês! Essa é nova!

— Que isso... – torço uma mecha solta do meu rabo de cavalo com o dedo. – Só parece que é isso. Mal consigo formular uma frase em francês direto! Só tenho aula disso na escola mesmo.

— Estou ansioso para ler a letra que irá escrever. Não vou mais te atrapalhar. Até o show!

— Até... – aceno, observando ele ir tão rápido quanto chegou.

Ah, é! A música! Desde a cafeteria, não tive muita chance de escrever. Tenho que terminar isso logo, ou nenhum desses treinos terá adiantado! Antes de voltar para a aula, anoto na agenda do celular o lembrete.

Não se passam nem dez minutos quando mais um desavisado acaba entrando na zona de combate. Yang Mi reclama com toda sua potência vocal, antes mesmo que a pequena intrusa pudesse se pronunciar:

— Não é possível! Ninguém mais nesse mundo sabe bater na porta?! - Yang Mi reclama com toda sua potência vocal, antes mesmo que a pequena intrusa pudesse se pronunciar.

— Erhm... Me pediram para chamar a Sam. – Hae Won usa a porta como escudo.

— Fala logo! – esbraveja a professora.

— Chamaram a Sam na seção de visual... Falaram que era urgente. – Ela pigarreia para impor sua voz.

— Então vão logo! O que ainda estão fazendo aí paradas? Pelo menos assim eu tenho um pouco de descanso...

Nós duas somos praticamente expulsas da sala. Engraçado, sempre pensei que a Hae Won não falasse comigo porque não sabia inglês, mas, pensando bem, acho que era timidez. Ou ela só é antissocial mesmo.

— Obrigada! Você me salvou daquela sessão de tortura!

Como esperava, ela não responde. Simplesmente, seu sorriso de lado já é resposta o suficiente. Ela já virou cúmplice da minha estupidez.

Chegando numa sala cheia de figurinos, secadores de cabelo, escovas, maquiagem e coisas que nem sei o nome, ela conversa com algumas mulheres, que, ao que parecem, já perderam a paciência de tanto me esperar. Ao voltar, a pequena faz-tudo me surpreende:

— As unnies estão perguntando se você teria problema em cortar o cabelo. – ela pergunta sem exitar, como quam está sendo usada de pombo correio porque as outras não querem falar comigo.

Instintivamente, brinco com uma das minhas tranças que passei a usar depois de tanto exercício físico. Já faz um bom tempo que não corto nem as pontas. Não era nem porque queria deixa-lo crescer, só acabei esquecendo mesmo. Até minha franja já está tão longa que sou obrigada a afastá-la para o lado se quiser enxergar. Está na hora de mudar um pouco!

— Sem problemas. Podem cortar do jeito que acharem que vai ficar legal! – Sorrio para Hae Won, que retrui novamente com seu sorriso de lado.

— E cor? Você coloriria seu cabelo de alguma cor?

— Por que não? Sempre pensei nessa possibilidade, mas nunca tomei coragem. Hoje parece um bom dia.

— Qual é a sua cor favorita?

Reviso toda a minha palheta de cores mentalmente, pensando em qual ficará melhor – ou menos pior. No entanto, um par de asas batem diante dos meus olhos e respondo sem hesitação:

— Azul.

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Hoje foi um daqueles raros dias em que eu me senti bonita. O azul assumiu um tom meio prateado, tornando-se mais bonito do que eu imaginava que ficaria, quase como asas das borboletas que tanto amo. Caminho de volta para o hotel, inalando a noite fria coreana. Da minha boca, minha respiração se condensa em puro ar. Hoje, como em todas as últimas noites, a lua está em seu pico no céu, congelando todos com seu brilho gélido.

Hoje, como em todas as últimas noites, não há nenhuma alma viva nas ruas. Nem ao meu lado.

Desde que o Supreme Boi me lembrou, isso não tem saído da minha cabeça. Deixei para escrever a letra em cima da hora. Faltam poucos dias para o Bangtan voltar...

“Se tivesse um prazo curto, eu estaria te enchendo o saco para escrever qualquer coisa minimamente boa e entregar. Mas esse não é o caso. Essa é uma música especial, não pode ser feita desse jeito. Você tem bastante tempo. Ache alguma inspiração e escreva a melhor letra que você já escreveu. Eu pretendo fazer isso pelo menos.”

Até agora me lembro das palavras do Suga (oops, Yoongi! Ainda não consegui me acostumar). Elas ecoam na minha cabeça como sinos numa igreja. Não quero decepcioná-lo, nem decepcionar a mim mesma.

Se tem um dia em que devo escrever essa letra, é hoje. Estou chegando ao hotel no mesmo horário de sempre (por mais que eu não tenha o costume de olhar o relógio, sei que já passa de meia-noite), mas hoje é o único dia que tenho certeza que posso escrever. Todos os outros dias, cheguei exausta, mal conseguia colocar o pijama. As bruxas devem estar morrendo de medo de mim, de tanto que me vesti ao contrário.

Só que hoje foi diferente. Graças à minha fada (e “fado”) madrinha/padrinho (Hae Won e Supreme Boi), não tive que treinar tanto – até cochilei quando estavam pintando o meu cabelo! De todos os dias, esse é o único que vou ter disposição, não posso desperdiçar essa chance. No entanto, só um milagre para eu ter inspiração justo hoje.

Fazer o quê? Eu acredito em fadas! Como o Jin diria.

A primeira coisa que faço ao entrar no quarto de hotel é tomar um banho bem gelado para espantar o fantasma do sono. Principalmente quando o quarto está tão escuro... e silencioso... e... NÃO! Eu não posso dormir! Tenho que ficar acordada e escrever a música! Jogo água no rosto cada vez mais urgentemente.

Saio do banho sem fazer barulho. Minha irmã já chegou há muito tempo, deve estar no décimo terceiro sono. No caminho, pego uma pequena caixa cheia de remédios. Subo para o pequeno mezanino, onde só cabe o meu colchão. Para compor, preciso da música certa para me inspirar. Como não tenho nenhuma em mente, clico para reproduzir uma música aleatória. Qualquer coisa é melhor que ronco da minha irmã.

Antes de qualquer coisa, passo minutos, tirando os band-aids velhos dos meu joelhos, dedos e cotovelos para substituí-los por novos. Tenho caído muitas vezes nos treinos. Por mais que sejam machucados leves, odeio quando eles ficam me ardendo a qualquer contato.

E então refaço o curativo maior do meu braço, aquele machucado do jogo de basquete. Tenho que trocá-lo várias vezes esses dias, ele abre tantas vezes com a dança que as gazes ficam ensopadas de sangue. Ponho a pomada que o médico receitou religiosamente todos os dias, mas não é milagre. Só espero não ter que levar ponto. Digamos que agulhas não são o meu ponto forte.

Agora acabaram todas as minhas desculpas para demorar um pouco mais. Está na hora de tomar coragem e escrever a música.

Vasculho as minhas coisas atrás do meu caderno de anotações para me ajudar, mas ele nem dá as caras. Que merda! Não sinto meu humor melhorar, espero que consiga escrever assim. Não é possível que eu tenha perdido tudo o que já anotei! Nele, estão todos as minhas músicas, as minhas frases, os meus pensamentos, tudo por água abaixo. Para falar a verdade, não o vejo desde antes de viajar. Tem tantos lugares onde ele possa estar, mas agora, que é importante, eu não o tenho.

Passo minutos apenas encarando o papel de reposição que arranjei, nada de inspiração. Parece que eu acredito em fadas, elas que não acreditam em mim. Faz tanto tempo que não checo as minhas redes sociais... E o celular com o headphone conectado ali, me tentando... Só uma olhadinha não faz mal a ninguém! Quem sabe eu até consiga inspiração por aqui (mentira)!

Adoro ver os comentários da página do canal. Por muitas vezes, foram que me ajudaram a passar por dias difíceis, quando me trancava no meu quarto sozinha. A única fonte de iluminação do cômodo era o celular.

A única fonte de iluminação do meu ser eram aqueles comentários.

Pessoas que nunca me conheceram, pessoas do outro lado do mundo, pessoas que gostavam de mim só pelo que estava gravado ali nos vídeos do canal. Como elas podem ser tão legais comigo só de verem os vídeos? Não sei se mereço isso tudo, mas me deixa tão feliz. Essas pessoas, mesmo sem saber, ajudam a equilibrar uma garota que vive na corda bamba. Sinto que tudo o que posso fazer é retribuir: apenas de não saber muito sobre eles, irei ama-los tanto quanto eles me amam, pois, se eles me dizem que sou a inspiração deles, eles são a minha luz num quarto escuro e solitário.

Após responder todos os comentários que posso na página, dou uma checada nas mensagens. Diferente da página do canal, meu perfil pessoal não é tão badalado assim. Jaz apenas uma solitária mensagem esperando por mim:

Sofia: Sammie, Vc já viu o que aconteceu??????

Tomo um susto e respondo quase que imediatamente.

Sam: Não. O que aconteceu?

Sofia: Ah... Vc ainda não sabe... Me sinto horrível por ser a pessoa que dá as más notícias.

Meu coração pula uma batida. Logo em seguida, ela envia um link de um aparente grupo de Facebook.

Sofia: Eu tentei dizer para elas ñ fazerem isso, mas ninguém me ouviu como sempre. Ah, Sammie, me desculpa... Ñ gosto quando esse tipo de coisa acontece com vc, sempre me deixa arrasada. Vc não merece isso. Queria poder fazer mais para ajudar.

A princípio parecia ser só mais um vídeo meu... Até que eu apareci.


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