Stella P.O.V

Parece que vai chover. Nem o tempo quer me animar.

Hoje é o nosso primeiro dia de folga em muito tempo. E, como eu estou saindo mais cedo da Big Hit esses dias por causa da Sam, elas chegam aqui depois de mim. E quando chegam, ou eu não estou no dormitório, ou estou dormindo. Eu deveria fazer algo junto com as minhas unnies, mas não estou no clima para isso.

A minha futura viagem de volta para o Brasil depois de pouco mais de um ano assombra a minha mente, o pior de tudo é que eu ainda não disse nada a ele. Tenho medo de sua reação... Como eu posso contar-lhe algo desse gênero sem que ele fique extremamente preocupado? Kook, por que você insiste em se preocupar tanto?

Se tudo isso afetasse só a mim... Não adianta pensar nisso, a situação não vai mudar. Eu só queria... eu só queria não preocupá-lo. Minha família não merece a preocupação dele. Talvez nem eu mereça... Kookie...

Ele ficará muito chateado? Talvez seja melhor finjir que essa viagem nunca acontecerá. Se eu contar, ele poderia acabar inventando alguma desculpa para não ir para à Tailândia. Nada disso! O que eu estou pensando?! Jungkookie nunca largaria o trabalho, ele é muito apaixonado pelo que faz! Ele não largaria nem por mim...

Não está na hora de pensamentos mesquinhos. O que será melhor para ele? Eu o amo tanto... Amar. Que palavra forte. Não combina com o meu vocabulário. Pôr em palavras assim, algo que eu nunca imaginei que faria. Isso me assusta. Será que, quando isso tudo acabar, eu estarei pronta para falar “eu te amo”? É responsabilidade demais, sabe, ter os sentimentos do Jungkook em minhas mãos. Eu não sei lidar nem com os meus!

Stella, foco. Melhor eu pensar nisso depois. Agora eu devo resolver: conto ou não a ele sobre a minha viagem? Por um lado, ele ficaria preocupado durante a viagem da Tailândia inteira, será que ele comeria mal? Ou ficaria doente? A sensação de culpa pesa nas minhas costas antes mesmo de ter decido algo. Isso eu não quero. A única coisa que vai me animar depois de uma viagem tão cansativa vai ser o seu sorriso.

Por outro lado, se eu não contar, tudo vai ficar bem, porém ele pode perceber que tem algo de estranho comigo ou sei lá! Só sei que, caso ele descubra que eu menti sobre isso, ele vai ficar chateado, não só comigo, mas consigo mesmo. Contudo, e se ele não descobrisse?

Aish! Isso é demais para a minha cabeça! Logo no meu dia de folga! Por que tudo tem que ser tão complicado?

Melhor eu tentar pensar em alguma outra coisa, tipo essa merda de dia nublado que só serve para me deixar mais deprimida ainda. Não são nem 16 horas e já está escuro a ponto de termos que ligar as luzes! Ok, isso não é uma boa coisa para se pensar.

Estou desde de manhã sentada em minha cama com meu violão e meu caderno de composições, deixando meus pensamentos, ações e emoções fluírem através dos meus dedos. Pelo menos algo de bom deve surgir dessa confusão mental toda. Isso tudo porque a porra da inspiração só chega quando eu estou deprimida! Se eu vivesse uma vida pacífica, eu poderia dar adeus ao meu emprego. Não sei se isso seria bom.

Também cheguei a anotar algumas letras. Lendo com mais atenção, tem bastante coisa inutilizável, mas tem alguns trechos bons.

“Mil pensamentos me atormentam

Problemas que não se vão

Mas tudo no final volta para o mesmo lugar

Mesmo que eu não queira e tenha medo

Tudo no final volta para ele

E eu continuo preocupada com as minhas próximas palavras”

Ainda preciso acertar umas coisas que não ficaram muito boas, mas vou guardar, talvez dê para usar em uma música.

Caramba, que susto! Meu estômago está roncando tão alto! Nem percebi! Eu acabei pulando o almoço de tão imersa que eu estava nas minhas letras! Melhor eu fazer uma pausa agora. Parece até sincronizado: assim que levanto para buscar algo na geladeira, Chae-ryoung invade o nosso quarto como um furação.

– Sério isso? – Chae pergunta depois de alguns minutos de silêncio.

– Sério o quê? – Jazzie retruca sem desviar os olhos da tela luminosa de seu laptop. Desde quando ela está na cama de cima da beliche? Nem percebi...

– Que vocês vão ficar assim o dia inteiro?! – Chae se revolta.

Eu e a americana nos entreolhamos quando ela tira os olhos do notebook pela primeira vez, e com sorrisos envergonhados respondemos:

– Sim.

Lin esbugalha seus pequenos olhos em sinal de indignação e surpresa.

– Se você quer sair, por que não sai sozinha?

– Nem você, Jazzie? – Chae suplica

– Eu só vou sair se a Teh também for.

– Unnie! – reclamo. – Chae-unnie, se você quer sair, por que não sai sozinha?

– Você acha que eu já não fui na rua?! – ela responde irritada. – Acabei de ir no shopping dar uma olhada nas lojas e comprei o novo álbum do EXO! Tenho que dar apoio aos meninos!

– Não sei se você sabe, mas a SM é concorrente da nossa empresa. Eles competem com o Bangtan.

– E o meu foda-se? Eu gosto de EXO e ponto.

– Ok, unnie, eu não estou afim de entrar nessa discussão. Agora pode sair da porta para eu ir para a cozinha? Eu estou com fome.

– Deve estar mesmo! Não come desde que acordou! Vai lá!

Por mais que ela esteja com raiva agora, tenho certeza que tudo será esquecido em poucos minutos. Chae-ryoung unnie não costuma ficar chateada com coisas tão pequenas.

(Desde que ninguém conte para ela que eu chamei o EXO de coisa pequena).

Abro a geladeira com a ansiedade de um lobo faminto em frente a um cordeiro. Nada... Só tem alguns sucos e vitaminas, que merda. Nada, nem mesmo um petisco que consiga segurar a minha fome.

– Por que vocês não guardaram o kimbap para mim?

– Olha, nós até pedimos o suficiente para nós três, - Chae surge atrás de mim – mas você não saia daquele quarto por nada. Aí a Jazzie comeu a sua parte.

Jazzie! Essa unnie come que nem um avestruz e mesmo assim é um palito ambulante! Alguém por favor me diz qual é a poção para isso?

Ah não é possível! Vou ter que sair? Eu estou extremamente exausta graças a esta semana, meu corpo inteiro dói e clama pela minha cama. Do jeito que estou cansada, eu poderia passar a vida hibernando. Elas não têm pena de mim...

– Chae-unnie! – apelo com o meu melhor aegyo. – Você não poderia ir lá na rua comprar algo para eu comer?

– Não. Se ferra aí – e vai embora.

Parece que dessa vez eu não tenho escolha.

– Vou precisar sair para comprar comida. – Aviso de cara feia para Jazzie quando volto ao quarto. Culpa sua por ter comido o meu kimbap!

Deposito em cima da cama uma calça de moletom preta, um pouco larga demais e uma blusa duas vezes o meu tamanho do Cavaleiros do Zodíaco, e trago ao banheiro, para usar depois do banho.

Então, sigo para o banheiro com meu iPod (sim, eu tomo banho ouvindo música) e coloco no playlist aleatória, começando, assim, meu banho. Too Close For Comfort do McFly toca e tenho flashes do dia anterior. Balanço a cabeça tentando afastar esses pensamentos nada agradáveis da minha mente.

Enquanto lavo meu cabelo, ouço alguns ruídos, vindos de não muito longe. Uma mensagem do meu celular? Risos, talvez? Ah, que raiva! Eu quero ver o que está acontecendo, mas caiu xampú nos meus olhos! Ensaboo o mais rápido possível, porém os ruídos se silenciam antes que eu possa ver o qua está acontecendo. Ao que parece, está tudo normal... Nada fora do lugar.

Penteio meus fios vermelhos levemente ondulados nas pontas. Isso me lembra: preciso retocar o vermelho, está começando a desbotar. Talvez eu troque de cor. Finalmente saio do banheiro, diga-se de passagem, já que eu demorei longos minutos aqui, esperando que a fome passasse e eu não tivesse que sair na rua.

Logo que começo a me trocar percebo que a roupa que estou prestes a botar não foi a que eu separei. Ah, aquelas duas! Isso é vingança, Chae?

– O que é isso? – Pergunto.

– Roupas, ué. Fica tranquila, não tem pó de mico aí não. – Chae zoa.

– HÁ HÁ HÁ. Muito engraçado. Estou morrendo de rir – digo irônica. – Devolvam a minha roupa.

– Não.

– Então eu mesma vou aí pegar!

– A janela está aberta. – Jazzie diz (provavelmente) com um sorriso maldoso estampado na cara. – Se você realmente quiser vir...

– Stella, para de encher e veste logo a roupa! Você vai nos agradecer depois por isso! – Chae reclama.

– Argh! Vocês duas vão se ferrar! – Eu tenho sérios problemas de controle... pego a roupa e visto logo. A roupa é abominável! Vou tacar um sobretudo por cima disso, ainda bem que está frio!

Então eu vejo a roupa em meu corpo pelo espelho. Ela consiste em: uma blusa de manga comprida preta, uma saia xadrez vermelha com pregas, uma meia 7/8 preta e um all star de cano médio vermelho. Saio do banheiro correndo e coloco o sobretudo. Enquanto isso, minhas unnies gargalham do meu desespero.

– Vão se ferrar também! Vocês botaram uma saia! Eu quase nunca uso saia! Assim vocês acabam com a minha dignidade! – Reclamo sem parar com as duas, que se limitam em apenas rir. – E por que vocês estão vestidas assim? – Pergunto.

Minha roupa está claramente mais excêntrica que a delas! Injustiça! As duas se entreolham e começam a murmurar coisas sem nexo. Ter amigas é um negócio difícil, viu?! Uma hora estão deitando e rolando de rir da sua cara, e na outra, sem motivo aparente, enlouquecem!

As duas pegam seus respectivos sobretudos e saem me empurrando do dormitório.

– Mas e o meu almoço? Vocês vão comprar no caminho?

– Almoço? Foda-se o almoço! – Jazzie exclama nervosa. É, o negócio está sério mesmo para ela ligar o “foda-se” para comida... – Esse vai ser o dia mais importante da sua vida, Menechini! Você não pode ter bafo de comida!

– Quando ele mandou a mensagem, todo mundo já tinha saído. Temos que correr se não queremos fazê-los esperar.– Chae diz para Jazzie, que assente e começa a andar mais rápido.

– O que diabos está acontecendo?– Pergunto mal-humorada.

– Você vai descobrir daqui a pouco, por hora, só ande mais rápido. – Chae-ryoung sorri para mim.