Eu de Letras, ela de Irônicas escrita por Sr Devaneio


Capítulo 7
Capítulo 07 – Fim de semana 01


Notas iniciais do capítulo

Olá galera!
Eu ia postar só amanhã, para dar continuidade ao ciclo de três dias, mas não consegui hahaha.
Aqui o nosso sétimo capítulo! Espero que gostem e boa leitura ;)



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Nos dias seguintes, minha rotina seguiu normalmente: aula pela manhã, almoço, trabalho à tarde, lanche e academia à noite. Nada de anormal e sem Annas por perto.

Não que eu estivesse com saudade, porém ela foi a primeira pessoa com quem eu tinha socializado logo que me restabeleci aqui e para ser totalmente sincero, eu estava começando a me acostumar, lá no fundo, com sua presença.

Devido ao seu sumiço, o resto da semana seguiu tranquilamente e eu comecei a cogitar o fato de Anna ser fruto da minha imaginação fértil. Simplesmente eu não havia tido sinal dela, em lugar nenhum. 

De qualquer forma, eu não tinha tempo para ficar pensando no sumiço da maluca. Já estava com três trabalhos para fazer e entregar na semana seguinte, além das tarefas e atividades que deveriam ser feitas para fixação das matérias.

*

No sábado acordei cedo e passei a manhã toda no quarto, sentado à escrivaninha, fazendo deveres e trabalhos. À tarde, minha cabeça estava um tanto cansada de tanta atividade escolar ininterrupta e eu, graças aos céus, estava terminando tudo.

Chad (que eu praticamente não tinha visto desde o primeiro dia) entrou no quarto, segurando livros e cadernos, e me avisou com seu vozeirão: 

— Tem umas garotas querendo falar contigo lá embaixo. 

Aquilo chamou totalmente minha atenção.

— Hã? Garotas? 

Ele apenas assentiu, com uma expressão séria. 

— Ah. Obrigado cara! – falei, fechando o notebook e me levantando.

Desci as escadas sem muita pressa, mas curioso para saber quem poderia ser.

— E aí, moço! — disse uma Anna simpática assim que me viu. 

Usava um short jeans um pouco curto, mas que realçava seu bumbum e deixava bastante de suas pernas à mostra, uma camiseta branca debaixo de uma jaqueta também jeans pequena e aberta, All Stars azuis de cano médio com detalhes de costura e os cabelos presos em uma única maria-chiquinha na lateral da cabeça. Uma bolsinha de alça bastante longa pendia em um de seus ombros, completando o visual. Estava toda um tanto muito sexy.

Eu estava apenas com uma regata, uma bermuda jeans e chinelos.

— Ah... Então você não era coisa da minha cabeça — pensei alto. Por algum motivo, senti uma pontada de felicidade em algum lugar do meu interior.

Ela me olhou confusa por um momento.

— Quê? 

— Nada... é uma longa história. 

— Bem, está com tempo livre agora? —perguntou com um tom sugestivo. 

Levantei uma sobrancelha e cruzei os braços. 

— Talvez — respondi. 

Ela desviou o olhar, focando momentaneamente em alguma coisa em minha roupa. 

— Então você pode nos contar essa longa história enquanto tomamos um sorvete. 

Vi seus olhos descerem, me analisando com atenção. 

— Algo errado? — perguntei, olhando para minhas roupas. 

— Não. É que você é um tanto fortinho... — ela respondeu como se não tivesse acabado de me secar na cara dura (e bem na minha frente, por sinal).

Voltei o rosto para ela, que me encarava de volta sem expressão. Descruzei os braços e dei um sorriso maroto, dizendo: 

— Certo, vamos tomar um sorvete. Mas antes vou trocar essa camiseta, já que ela está te distraindo muito — dei uma piscadela, fazendo seu joguinho contra ela mesma.

Anna apenas arqueou as sobrancelhas com essa atitude inesperada (para ela) e levantou um pouco os cantos da boca.

— Já volto — falei antes de me virar em direção à entrada do Bloco C e voltar rapidamente no apartamento, onde troquei minha camiseta regata por uma camiseta que cobrisse meu corpo mais que a primeira e também combinasse com a bermuda. Substituí meus chinelos pelo meu Vans que combinava com todo o resto.

*

— Oi! Vou querer um cascão comum, de duas bolas sabor pistache e flocos, sem cobertura, por favor — disse Anna quando a garçonete veio nos atender.

Fomos à sorveteria do shopping que estava mais perto da MCU. Neste, as mesas comportavam até quatro cadeiras e as quatro amigas de Anna que já estavam lá tinham pegado uma inteira. Então sentamos à mesa desocupada que estava ao lado.

Viemos de carro, com Anna dirigindo, pois obviamente o carro era dela. Um New Beetle vermelho. Não conversamos muito durante o trajeto de 15 minutos.

A garçonete anotou o pedido de Anna em um bloquinho e olhou para mim, esperando que eu me pronunciasse.

— Boa tarde. Vou querer uma bola de limão, uma de kiwi e outra de flocos também. Também sem cobertura, na taça, por favor.

A jovem loira com os cabelos presos em um rabo de cavalo anotou e sorriu; nós agradecemos e ela se afastou. Então, Anna olhou para mim e perguntou:

— Pode me explicar a longa história sobre eu existir agora?

— Não é grande coisa. Só coisa da minha imaginação...

Ela permaneceu com uma expressão curiosa, então contei que devido ao seu sumiço repentino, me passou pela cabeça que ela poderia ter sido fruto da minha imaginação.

— Desculpe, mas você ia precisar de bastante inspiração pra poder imaginar tudo isso ela falou num tom convencido, mostrando a si mesma com as mãos.

Sorri e ela acrescentou:

— Não ri não. Você sabe que é verdade.

— Sei? — perguntei irônico.

— Sabe, sim.

— Certo, então... — falei desistindo da discussão.

— Enfim. Me fale sobre você — pediu.

— O que quer saber?

— Sua história, como veio parar aqui, como é sua família... Essas coisas.

— Quer me conhecer, senhorita? — perguntei usando um tom sugestivo.

— Quero, “senhorito”. Então por favor, fale mais a respeito do homem que me ajudou a cair em segurança de uma árvore — ela respondeu num tom sincero.

— Devia mesmo querer saber. Você não se machucou porque desabou em cima de mim — falei.

— Não foi tão desagradável. Foi até... Divertido — ela disse com um sorriso travesso. – E de fato caí sobre uma superfície macia — seu sorriso mudou para malicioso.

Suspirei. Que menina danada!

— Bem, eu venho de Orlando. Nascido e criado. Família simples, mãe superprotetora, pai sério que me incentivou a estudar e a ler, motivo pelo qual eu gosto tanto das palavras, e a ser bom aluno. Coisa que fui, o quê... Durante toda a minha vida?! — parei para pensar um pouco. — É. Isso mesmo. Portanto, nada de muito incomum... E você?

Ela prestava atenção, me olhando diretamente nos olhos.

— Bom... — ela começou e logo se interrompeu, me olhando fixamente – Antes, me deixa só arrumar uma coisinha...

Enquanto completava a frase, Anna se aproximou de repente e, apoiando-se sobre o braço esquerdo, estendeu o direito até o meu rosto. Obviamente estranhando sua atitude brusca e repentina, recuei.

— Relaxa! — ela falou. — Eu não vou te machucar.

Relaxei permitindo-me aproximar novamente, mas ainda com o cenho franzido. Então Anna elevou a mão até meu olho esquerdo e mexeu nos meus cílios.

Seu rosto estava, pela segunda vez, bem próximo do meu. Tanto que eu finalmente reparei a maquiagem leve que usava: apenas algo nas bochechas, que as deixava levemente mais vermelhas e um batom quase da cor original de seus lábios. Também reparei no movimento de seus olhos e quando mordeu a pontinha do lábio inferior, tal era sua concentração em meus cílios.

Quando terminou, se afastou apenas o suficiente para observar o resultado e sorriu satisfeita.

A garçonete pigarreou ao nosso lado, chamando nossa atenção. Segurava uma bandeja com os nossos pedidos.

— Com licença e desculpe a interrupção — falou educadamente.

Anna imediata e rapidamente escorregou de volta para sua cadeira e sorriu amarelo para a jovem, que colocava nossos respectivos pedidos à nossa frente.

Agradecemos em uníssono:

— Obrigada!

— Obrigado!

Ela sorriu de forma bonitinha, assentiu e afastou-se novamente.

— Que coisa... — comentou Anna observando a moça se afastar, provavelmente pensando o mesmo que eu.

— Sim... — respondi da mesma forma, um tanto sem graça.

— Bem... Onde foi que paramos? — ela perguntou, voltando-se para mim e dando uma colherada em seu sorvete.

— Você ia me contar sobre sua vida antes daqui.

— Hum! Verdade — ela disse, após engolir o sorvete. — Vamos lá... Nasci em um lugar um pouco mais longe que você. Lá em Brasília, capital do Brasil.

Fiquei surpreso com o início daquela história. Eu cogitava levemente a hipótese dela ser latina, mas não tinha pensado no Brazil. Me surpreendeu de verdade. Acho que pelo fato de ainda não ter conhecido nenhum antes e o país ser muito longe.

Ao ver minha surpresa, ela disse:

— Pois é. Nasci e morei lá com meus pais até completar seis anos. Foi quando minha avó paterna sofreu um ataque do coração e quase morreu, deixando meu pai louco por estar tão longe. Então, ele conversou com a minha mãe, que entendeu, e nos trouxe para cá, para ficar perto dela. A hora dela está se aproximando e meu pai não quer perder esse momento. Além, claro, de ter aquela coisa toda em aproveitar os últimos anos/dias/meses, sei lá... Enfim, depois que chegamos, continuei meus estudos e blábláblá, aqui estamos. Nada muito diferente, também.

—  A sua já é uma história mais interessante — acrescentei.

— Veremos — ela respondeu. E acrescentou logo depois — Certo. E agora que estamos aqui, conte-me a respeito de sua vida universitária.

— Estou no segundo ano de Letras e meu colega de quarto é um cara fechado e sério chamado Chad, de Oklahoma — um ótimo resumo.

Ao ouvir o nome do cara, ela franziu as sobrancelhas e perguntou:

— Chad? Beckerman?!

— Sim.

— Que coisa! Ele é o peguete da Bettie.

Ela disse uma palavra que não entendi. Então, perguntei:

— O que é “pegoette”?

Ela olhou para mim e riu, divertida:

— Desculpe. “Peguete” é um termo que inventaram lá no Brasil. Significa alguém que está saindo com uma pessoa, mas já tem alguma coisa rolando entre eles. Tipo um pré-namorado — explicou.

— Ah, sim. Que curioso... — falei.

— Sim. Mas quer dizer que ele é o seu colega de quarto?! Que coincidência! — ela disse um tanto animada demais.

— É... Mas quem é Bettie? — perguntei. Não me lembrava de ter conhecido ninguém com esse nome recentemente.

— Uma das minhas amigas. Você já a viu, mas ainda não foram apresentados porque naquele dia que almoçamos juntos ela tinha ido almoçar com outra pessoa. O Chad! Ele é um partidão, tenho que admitir. Gente, e ainda é caubói! Adoro! — ela respondeu, animando-se bastante nas últimas frases.

— Hum... – comentei apenas. Como um cara pode responder o elogio da conhecida a outro cara? Exato: não responde nada.

— Vou te apresentar pra todas já, já. Quando nos juntarmos às outras.

— Certo.

— Mas espera... Você disse que cursa Letras. Pretende ser professor? — ela perguntou, mudando totalmente de assunto.

— Não. Quero algo mais literário mesmo. Tipo um editor ou revisor em uma editora. Depois vou me especializar na área escrita, de forma geral — fiquei feliz pelo fato de o assunto ter voltado a algo que eu tinha como responder.

— Quer ser escritor, então?

— Quem sabe? De repente consigo algo já que estarei nesse meio... Mas e quanto a você? Como pretende aplicar o curso de “Irônicas” que você faz em sua futura profissão?

Ela me olhou surpresa.

— Curso de “Irônicas”? – E riu. – Na verdade, moço engraçadinho, estou cursando Moda. Também no segundo ano. Minha mãe tem uma sociedade com umas amigas dela no ramo, então quando acabar irei para lá, “Já que estarei nesse meio” — ela respondeu, repetindo minha frase de propósito.

— Entendi. Você disse que se mudou para cá com seus pais. Foram para onde? — perguntei, mudando ligeiramente de assunto.

— Para Nova Iorque. Inclusive, estão lá até hoje.

— Entendi. E quanto a irmãos e irmãs?

— Tenho um irmão mais novo. Tem 15 anos.

— Legal! Não tenho irmãos ou irmãs. Mas tenho uma prima de 16 que praticamente vive lá em casa, então é como se fosse...

Ela riu de meu relatório sobre Dorothy – minha prima-irmã.

— Mas me diga: o que foi aquilo com os cílios? – perguntei curioso.

— Ah! É uma mania que eu tenho. Não suporto ver cílios desalinhados.

— Sério? Que... diferente.

Ela sorriu e disse:

— Obrigada.

— No começo achei meio estranho — comentei. — Mas aí vi que nós ficamos bem pertinho um do outro, então achei até... Como se diz “maneiro” em espanhol?

— Não sei. Não falo espanhol.

Franzi o cenho:

— Ué... mas você não disse que era brasileira?

— Eu não “era”. Eu sou. E no Brasil nós não falamos espanhol. Pelo menos, não como idioma oficial — ela explicou assumindo um tom ligeiramente exasperado, como se já repetido aquelas mesmas palavras para muita gente.

— Ah, sim. Desculpe... Vocês falam o que, então? — perguntei, sem graça pelo furo que eu dei.

— Não tem problema. Aprendi que é um costume aqui achar que brasileiros falam espanhol por causa dos outros países sul-americanos… — ela respondeu e eu achei que soou mais como um desabafo. — Nós falamos português.

— Ah. Como Portugal?

— Sim. Mas também existem diferenças entre o nosso português e o deles.

— Que confusão... Deve ser por isso que achamos que vocês falam espanhol. É mais fácil — brinquei e ela sorriu.

— Concordo. Talvez um dia eu te leve no Brasil, para você conhecer.

— Adoraria. Obrigado pelo convite — agradeci tentando ser simpático.

— E eu acho que o nosso sorvete derreteu — ela falou observando minha taça com algo que estava mais para suco.

— Melhor acabarmos com isso — falei e ela concordou – Mas antes – acrescentei rapidamente – Como se diz “maneiro” em português mesmo?

— “Maneiro” – ela respondeu.

— Hum... Então, quando você se aproximou eu vi que ficamos bastante perto um do outro e foi até... “manheirro”. – completei a frase.

Ela riu da minha pronúncia (sem disfarçar). Fingi indignação e ela riu mais ainda. Acabei por rir junto.

E depois, pela primeira vez desde que havíamos entrado no shopping, ficamos calados por mais que cinco minutos.

*

Depois do sorvete, nos reunimos e, após eu ser apresentado a Bettie (uma garota bonita de cabelos curtos, escuros e olhos verdes) fomos dar uma volta.

Eu era o bendito fruto entre as mulheres; cinco delas para apenas um de mim. Acabei ficando um tanto intimidado em ser o único homem no grupo, então me mantive na defensiva, falando e respondendo apenas quando me perguntavam algo ou se dirigiam a mim. Em contrapartida, Anna tentava ao máximo me incluir nas conversas e me deixar a par de tudo. Apreciei as tentativas dela.

Paramos em umas cinco lojas de sapatos, umas dez de roupas e umas quinze ou dezessete de sapatos e roupas. Eu não aguentava mais ouvir a pergunta “como ficou?” Muito menos as suas variantes: “Como estou?”, “Ficou bem em mim?” e “O que você acha?”.

Porém, para compensar, as garotas decidiram ir ao Parque Indoor do shopping, onde foram no tapete de dança e... Bem, dançaram bastante. Tudo bem que eu fiquei segurando bolsas e casacos, mas foi mais que divertido assisti-las pulando e rebolando.

Depois brincamos em várias atrações diferentes, marcando um número alto de fichas, que quais trocamos por aneizinhos de plástico coloridos no final. Uma droga de brinde, mas valeu pela diversão.

Quando deu por volta das 18h, as garotas se despediram e voltaram para a MCU. Nós só permanecemos ali porque Anna resolveu voltar para comprar uma blusa que tinha visto mais cedo.

— Você já precisa ir embora? — ela perguntou.

— Não necessariamente. Por quê? — eu respondi.

— Tem problema se demorarmos mais dez minutinhos? Quero aquela blusa — ela disse.

— Não, claro que não. Podemos demorar o quanto você quiser — eu respondi pela segunda vez.

“Afinal, você é a motorista.”

E acabou que os dez minutinhos se converteram em duas horas e quinze, pois quando saímos da loja ela perguntou se eu não estava a fim de ver um filme. Não tinha muita coisa pra fazer na universidade já que meu trabalho estava bastante adiantado, então topei tranquilamente.

Assistimos a “Olhos de Aquarela”. Filme que conta a história de uma menina cega que, ao esbarrar em um completo estranho no meio da rua um dia qualquer, milagrosa e misteriosamente volta a enxergar. Então ela decide ficar perto desse menino para enxergar o tempo todo e um monte de aventuras acontecem com os dois. Um filme até legalzinho; dei boas risadas.

Na saída, Anna ainda comprou um Big Mac (me lançou um olhar cúmplice e um sorriso mais que travesso na hora) para viagem e nós finalmente voltamos para o carro.

O trajeto dos 15 minutos da volta foi cheio de conversas, comentários e risadas.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado. Conhecendo melhor um ao outro, finalmente... hahahaha.
Comentem ^^
*Já comecei a separar os reviews que irão para a minha parede, portanto caprichem, heim?! ;)
Obrigado galerinha!

OBS importante: Olhos de Aquarela não é um filme (caso alguém vá procurar), mas uma fic que eu li aqui e gostei bastante. É da Star e o link é: https://fanfiction.com.br/historia/369670/Olhos_De_Aquarela/
Espero que se divirtam tanto quanto eu, caso leiam. :)