Bromélia - Caleo escrita por Teddie


Capítulo 1
Capítulo único.


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem, Caleo é um dos meus ships favoritos!



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— Meu santo Zeus, é impossível vocês arrumarem tanta confusão para estarem aqui quase todos os dias. — o diretor estava vermelho, mas o garoto não conseguia identificar se era raiva dele e da sua companheira de bronca, ou se era proveniente do bafo de bebida que saia dele. Naquele dia o diretor parecia estar de bom humor – até aquela hora. Usava sua camisa de leopardo favorita, e ela nem mostrava a ponta da barriga protuberante.

— Tecnicamente, é possível sim — o latino respondeu petulantemente — Até onde eu saiba, o livro de regras é bem grande e dá para quebrá-las vezes o suficiente para vir parar aqui toda semana... — deixou a voz morrer ao ver a expressão furiosa — Mas eu acho que o senhor não está particularmente interessado nisso.

Ele, que já era magricelo, se encolheu ainda mais na cadeira na qual se sentava. Sr. D não parecia ser um cara violento, apenas desinteressado, mas não era recomendável o estressar.

A menina, que até então estava quieta, revirou os olhos e bufou, claramente irritada.

— Você é um idiota, Valdez.

— Tome conta da sua vida, Flor do Dia.

Ela assumiu um tom de vermelho, quase igual ao da blusa simples que usava. Vermelho era a cor favorita de Leo, mas, na hora, ele pouco se importava.

— Não me chame de...

— CHEGA! — exclamou Sr. D, já consumido pela fúria. Os dois adolescentes calaram a boca. — Obrigado. Será que algum dos dois pode me explicar o que aconteceu dessa vez? — os dois abriram a boca para falarem juntos — Um de cada vez. Velasquez, você primeiro.

O menino lançou um sorriso irônico e convencido para a garota, que fingiu vomitar. Ele ignorou também o fato de que seu nome não era Velasquez

— Essa louca — apontou para a colega — Tentou atear fogo em mim com meu maçarico lá na sala na marcenaria.

Era parcialmente verdade.

— Isso é verdade, Srta. Daylight?

Velasquez sufocou a risada. O nome dela também não era Daylight.

— Não exatamente. Eu estava na estufa, que fica do lado da marcenaria, e esse babaca estava brincando com o maçarico pelo corredor, e entrou na estufa. Ele estava colocando fogo nas minhas petúnias.

Era a outra parte da verdade. Leo chegara cedo demais no colégio e nenhum dos seus amigos ainda havia chegado. Ele resolveu passar no Bunker 9, ou clube de marcenaria, para adiantar alguns projetos. O latino possuía uma dislexia fortíssima, e como não conseguia ficar parado, resolveu testar as coisas pelo corredor.

Não é como se ele tivesse a intenção de atear fogo nas flores idiotas da Nightshade. Ele queria ver o quão inflamável elas eram.

Em consequência disso, Calipso tentara tomar o maçarico da mão de Leo, o que quase o queimou.

Não era como se isso não fosse normal. Calipso e Leo iam para a sala do diretor quase todos os dias por qualquer motivo, desde bate boca nos corredores até tentativa de homicídio – foi um dia muito, muito ruim para Calipso. Parar na delegacia por espancar um colega de classe nunca é uma boa pedida.

— Vasquez, isso é verdade?

— Absolutamente, Sr. D. Nightshade está louca.

— Você está me chamando de louca? — a voz de Calipso estava uns tons mais fina devido a raiva, isso sempre acontecia.

— Tem alguma outra Nightshade por aqui? Além de louca é surda?

Ela respirou fundo, e Leo quase sentiu o golpe chegar. Nunca pensou que ficaria aliviado em ouvir o berro do Sr. D.

— Já não mandei pararem com isso? Vasquez, cale a boca.

— Meu nome é Valdez. Leo Valdez!

Leo sentiu que aquela foi a gota d’água. Dioniso bateu os punhos contra a mesa com tanta força que o latino pensou que iria quebrar.

— Eu cansei de vocês dois vindo aqui toda semana por motivos ridículos.

Leo quis argumentar que nem sempre eram ridículos. A vez que foi espancado, por exemplo, não foi exatamente uma bobeira. Ele sentia a dor até hoje, sendo que o acontecido fora dois anos antes.

— Valdivia — Leo bufou — Terá que passar um mês ajudando o clube de jardinagem como punição.

— O QUE? — ele e a garota gritaram ao mesmo tempo e se olharam com fúria.

— Isso mesmo, vocês são retardados e não entendem uma coisa de primeira? Você vai cuidar das plantas que queimou como punição — apontou para Leo e depois para Calipso — E você, sua punição vai ser mentorear esse imbecil. Agora saiam da minha sala.

Os dois se levantaram juntos, travando uma pequena batalha na porta para ver quem saía primeiro, na qual Leo ganhou quando deu um leve empurrão na garota. Na secretária, o latino se surpreendeu ao ver Nico e Will ali.

Nico di Angelo e Will Solace eram o casal mais disfuncional que Leo conhecia. Nico era calado, sério, tímido e centrado, enquanto Will era social, sempre estava com um sorriso no rosto e pronto para ajudar algum amigo. Foi um choque quando anunciaram o namoro, porque nem amigos pareciam ser. Will perturbava Nico sempre que podia, e todos sabiam – embora ninguém se atrevesse a falar – dos sentimentos do di Angelo em relação a Percy, um amigo deles.

Nico e Leo eram melhores amigos, e isso conseguia ser mais esquisito que o namoro do italiano. Leo era... Leo. Simplesmente não combinava em nada. De qualquer maneira, eles eram amigos há anos.

Leo acompanhou o momento mais triste da vida de Nico de perto. Momento esse que, consequentemente, envolvia Calipso.

— Olá Nico, Will — ela sorriu para eles, aparentemente já esquecendo a confusão com Leo logo antes da primeira aula. — Chegaram atrasados?

Will assentiu, mas parecia derrotado.

— Esse tapado acordou atrasado e demorou a ir me buscar — Nico respondeu. Will tinha acabado de tirar a carteira, enquanto ainda faltava um mês para o namorado o fazer. — Falando nisso, me passe as vinte pratas.

Will bufou, mas tirou o dinheiro da carteira, entregando ao parceiro. Leo franziu o cenho, não entendo nada do que estava acontecendo.

— Apostei com Nico que não eram vocês lá dentro fazendo o Sr. D. dar berros que todo colégio podia escutar.

— Acho que mereço uma parte desse dinheiro, então — Leo falou — Afinal, era eu lá dentro.

— Eu também — Calipso se manifestou e os três pares de olhos se voltaram a ela, assustados. Ela não era dada a piadinhas. — Dá uns seis dólares para cada.

— Ninguém vai pegar meu dinheiro — disse Nico, mas logo sua expressão suavizou.

Ele simpatizava muito com Calipso. Suas irmãs mais velhas, Bianca di Angelo e Zoë Nightshade eram melhores amigas e deveriam estar na faculdade. Infelizmente, isso nunca aconteceria.

No último ano delas no colégio, o primeiro dos quatro ali, elas foram a uma festa, nada muito sério. Na volta para casa, de táxi, um caminhoneiro bêbado bateu contra o carro onde elas estavam, e nenhum dos três do táxi sobreviveu.

Nico e Calipso entraram em uma depressão profunda. Leo ajudou Nico o máximo que pode, e respeitou o espaço de Calipso pela primeira vez na vida.

— O que vocês fizeram dessa vez? — Will mudou de assunto.

Leo e Calipso se fuzilaram com olhar, mas logo voltaram para o casal na frente deles.

— Nada demais — Leo foi vago.

— Claro, queimar minha estufa não é nada demais. — a menina foi irônica.

— Você tentou queimar minha cara e eu não estou reclamando.

O casal de namorados trocou um olhar que dizia claramente “eles vão começar de novo”, só que antes que isso acontecesse, Sr. D. botou a cabeça para fora da sala.

— Saiam daqui agora, a voz de vocês me irrita — e notou Will e Nico ali — saiam vocês também.

E bateu a porta da sala.

Os quatro se entreolharam e deram de ombros. Quase imediatamente o sinal tocou, anunciando o fim do primeiro tempo. Nico e Leo seguiram por um corredor, indo para o laboratório de química, enquanto Will ia para a quadra e Calipso para a sala de matemática.

Foi um caminho silencioso, Leo não se sentia muito disposto a falar no momento e o melhor amigo dificilmente puxava assunto.

— Sempre achei que vocês se gostassem. — dificilmente, não nunca.

Leo estacou na hora, olhando horrorizado para o menino pálido. Sabia de quem ele falava e só conseguia achar aquilo um absurdo. Logo voltou a andar, ainda chocado com a declaração do melhor amigo

— Cara, você anda comendo o que? Fralda suja? Você está enlouquecendo de hipotermia devido ao calor debaixo dessa roupa preta, menino-morte — Nico torceu o nariz para o apelido proveniente da funerária de sua família.

— Não me chame de menino-morte — ele repreendeu o latino. — Só estou falando que ninguém pode odiar alguém tanto quanto vocês se odeiam. Além disso, vocês formam um casal bonitinho.

— Você anda comendo merda, sim — chegou a conclusão — Além disso, eu não posso formar um casal. Leo gostoso para dedéu nasceu para todas as gatinhas, não uma só.

Dessa vez, quem parou foi Nico, olhando Leo, enojado.

— Vou vomitar, com licença.

(...)

Leo, às vezes, gostava muito da sua hiperatividade em níveis alarmantes. Quase não notara as aulas passando, apesar de ter certeza que levara bronca de todos os professores.

Não tinha todas as aulas com Nico, mas pode o ver de novo no almoço, onde todos os seus amigos ficavam juntos. Percy, Annabeth e Thalia falavam sobre a festa de formatura – eles eram veteranos. Ele, Nico, Will, Piper, Frank, Reyna, Calipso e Jason – irmão mais novo de Thalia – estavam no terceiro ano. Por fim, havia Hazel, irmã adotiva de Nico, namorada de Frank e a caçula do grupo, ainda no segundo ano.

Todos eles eram muito amigos apesar da diferença de anos. Leo sabia que quem sofreria mais era Hazel, que seria veterana sem os melhores amigos, mas seria um ano só.

Leo se distraia muito fácil e, com todas aquelas vozes no refeitório, quase não falava com ninguém tempo o suficiente para manter uma conversa. Vez ou outra puxava a trança de Calipso por trás de Reyna, que ficara entre os dois para evitar uma briga.

De qualquer maneira, o dia passou rápido e, quando percebeu, Leo estava na entrada da estufa, em silêncio, observando Calipso conversar com algumas outras meninas enquanto plantava algo que ele desconhecia.

Apesar de desconsiderar o que Nico falara, Leo tinha que admitir que Calipso era realmente bonita. Seu rosto era fino e aristocrático, os olhos castanhos eram grandes e amendoados, o nariz era fino e os lábios carnudos. Os cabelos eram em um tom castanho que lembrava os churros que comia no México nas férias, mas que em Nova York nunca encontrava iguais.

Embora fosse linda – e rica (seu pai era do alto escalão do exército), Calipso não era esnobe. Usava sempre jeans e camiseta e sandálias de tiras. Seus cabelos geralmente estavam presos e ela nunca tinha nojo de por a mão na massa. Como agora, por exemplo, que cavava a terra, preparava, colocava a muda e tudo isso com as mãos mesmo, sem luva.

Tinha terra nas roupas, mas Leo achava aquilo muito, mas muito atraente.

Claro, se fosse outra garota além da rainha do drama que Calipso Nightshade era. Ela era geniosa demais, teimosa demais. E de gênio forte e teimosia Leo já tinha bastante consigo mesmo.

Ele pigarreou, chamando a atenção da menina. O sorriso dela se fechou na hora, e ela se despediu das amigas, que saíram para deixá-los sozinho na hora da detenção. Não sabia se ficava feliz ou receoso de ficar sozinho em um ambiente com ela. Provavelmente receoso, não teriam muitas testemunhas se ela resolvesse espancá-lo de novo.

— Está atrasado — foi a primeira cosa que pronunciou.

Ele reprimiu o impulso natural de revirar os olhos e respondeu:

— Estou aqui há uns bons minutos, você quem não reparou.

Ela, ao contrario dele, não se conteve, e seus olhos rolaram nas órbitas.

— Venha, temos bastante trabalho para fazer.

Ela o puxou pela mão e Leo quis soltar, não gostava de contato com Calipso. Tinha vontade de forçar cara de vômito e resmungar algo como “eca, Calipso”, assim como os meninos fazem com as garotas por volta dos oito anos.

Leo nunca foi como eles, gostava das garotas. Gostava até demais.

Elas que não costumavam retribuir.

Calipso o instruiu a regar as plantas, já que cada tipo de flor tinha uma resistência diferente. Aliás, Leo nunca tinha visto tantas flores variadas juntas.

E estufa era de um tamanho médio, e era bem quente. Era também a única parte do colégio toda de vidro. Podia-se ver o céu cinza quase como se estivessem do lado de fora. Era divida em três partes: as flores, as hortaliças e os vegetais.

Calipso mandou que Leo colhesse alguns vegetais, mas ao ver o quão sem jeito e bruto ele era, o afastou e fez sozinha, entregando depois um caixote com batatas, inhames e mais algo que ele não sabia identificar.

— Use esses braços magricelas para levar isso até a cozinha.

O colégio tinha uma política de boa alimentação, então tudo que era plantado na estufa era usado na cozinha depois.

Quando voltou, Leo viu Calipso cantando uma melodia suave e melancólica, enquanto limpava algumas plantas. Nunca tinha visto Calipso tão a vontade quanto naquele momento. Também nunca a tinha visto tão bonita.

Não que isso importasse.

— Sabe, nunca entendi o propósito de ter um clube de jardinagem no colégio.

Calipso abriu a boca para retrucar, mas notou que ele não parecia maldoso como usual.

— Contrariando o que você provavelmente pensa, as flores não são inúteis. Elas estão intrinsecamente ligadas com nosso estado espiritual e de humor. Isso é comprovado cientificamente. No inverno, algumas pessoas costumam ficar deprimidas por conta da falta de luz solar, chamam de Transtorno Afetivo Sazonal, e as flores dão a sensação de primavera, alegrando essas pessoas. Vou dar outro exemplo — falou ao perceber a confusão nos olhos de Leo. — Rosas vermelhas estimulam a vitalidade e deixam as pessoas mais gentis — apontou para as flores escarlates que estavam alguns metros deles.

Leo quis falar que Calipso precisava de um buquê por dia para ser mais gentil com ele, mas ela parecia tão dedicada e apaixonada que ele não quis estragar isso com alguma palhaçada, por mais que sua língua coçasse.

— Já a Prímula — continuou, apontando para umas flores violetas abertas com o miolo em um amarelo vivido. Eram flores realmente bonitas, na opinião de Leo — Ajuda a centralizar e organizar as ideias. Basicamente, as flores têm o poder de transformar momentos e despertar emoções. Cada uma com sua característica especial, deixando cada buquê único.

Ela não olhava mais para ele, fitava as flores espalhadas pela estufa, mas seus olhos brilhavam candidamente, claramente apaixonada por cada uma daquelas flores bobas. Leo viu sua primeira opinião sobre Calipso mudar ali.

Ele não conseguia odiar uma menina que sentia tanto amor por algo que não fosse outra pessoa ou vestimenta. Leo só via um amor daquele jeito quando ele olhava para os amigos que namoravam ou para as máquinas que ele e o pai construíam juntos nos fins de semana.

Leo viu, pela primeira vez, que Calipso não era uma esquentadinha turrona que o tratava como lixo. Ela sabia ser gentil e atenciosa.

Resolveu que pararia de ser um babaca total com ela. Seria tão babaca quanto ele era com as outras meninas amigas dele.

— Está ficando tarde — comentou quando viu o céu começar a escurecer — Vamos?

Ela assentiu, estranhando a voz dele não estar hostil. Ele sorriu para ela, os caninos pontudos encostando-se aos lábios.

— Valdez, você está passando bem? — perguntou por fim.

— Perfeitamente, Flor do Dia — ela revirou os olhos para o apelido, mas não parecia irritada. — Até amanhã. Pretendo incendiar as batatas doces, então esteja preparada.

Ela abriu a boca para xingá-lo, até que percebeu que tratava-se de uma brincadeira. E, para surpresa de Leo, gargalhou.

— Pare de ser estúpido, Valdez.

E seguiu para uma rua oposta ao colégio e ao caminho de Leo, o deixando com cara de idiota na entrada da Goode.

E assim as semanas seguiram.

(...)

Na primeira semana, quando eles não foram nenhuma vez para a sala do diretor, os amigos chegaram a conclusão que seria porque eles queriam evitar estender o tempo da detenção. Naquela semana Sr. D. parecia estar em um mau humor absurdo, pois era aniversário da morte dos filhos dele.

Na segunda semana, Nico já olhava para Leo de maneira diferente, notando pequenas diferenças. A mais clara era que ele não implicava com Calipso maldosamente, como sempre fizera. Fazia agora piadas bobas das quais se via que ela fazia esforço para não rir. Eram as piadas que ele destinava a Piper e Hazel (ele era proibido de fazer piadas com Annabeth, Thalia e Reyna se quisesse manter todos os dentes na boca).

De qualquer maneira, não eram todos que notavam isso. Nico se revezava em olhar os dois, que agora sentavam um do lado do outro sem nenhuma tentativa de homicídio. Lembrava-se da ordem de restrição de cem metros que Calipso tinha que manter de Leo, mas que não dera certo porque o próprio latino não conseguia implicar com ela a distância.

Na terceira semana, parecia que todos já tinham reparado que Leo e Calipso não queriam mais a morte do outro. Era um avanço grande e todos estavam realmente satisfeitos com isso. Estavam fartos de ter que separar as brigas dos dois. Nico, no entanto, ainda estava intrigado com as mudanças. Sentia-se meio mal, uma vez que seu melhor amigo não lhe contara nada sobre a amizade recente.

— Se continuar olhando assim para ele, vou achar que quer me trocar. — ele ouviu a voz do namorado sussurrar em seu ouvido durante o almoço — Sabe, sempre tem esse negócio do cara se apaixonar pelo melhor amigo.

Nico engasgou com o suco que tomava, fazendo todos na mesa olharem para ele.

— Você ta bem, cara? — Leo perguntou, franzindo o cenho. Nico assentiu com dificuldade e o latino voltou a falar com Jason alguma coisa sobre imã de gatinhas.

— Você é tão obtuso, Solace — falou. — Só estou irritado por ele não me contar o que está acontecendo.

— Não se preocupe com isso, Nico — Will respondeu sabiamente — Ele vai falar com você assim que ele entender o que está acontecendo. Não acho que ele ainda o saiba.

— Suponho que não. — e voltou a comer, tentando esquecer que Leo não estava se abrindo tanto novamente.

E assim se fez.

Leo estava fazendo alguma piada idiota sobre plantinhas durante a detenção naquele dia. Calipso fingia que ele estava sendo idiota – o que não era muito difícil, na opinião dela –, mas ria suavemente das gracinhas.

Era o sorriso dela favorito dele: não mostrava os dentes e o canto esquerdo do lábio ficava um pouco mais levantado que o direito. Além disso, o nariz se franzia e ela fazia uma careta fofa.

Não entendia como havia reparado nisso tudo, mas culpava seu TDAH fortíssimo, que se fixava em detalhes bobos como o sorriso da chata Nightshade.

Naquele dia, ela usava um vestido rosa bebê em estilo grego com um cinto dourado, calçava suas habituais sandálias de tiras e o cabelo estava solto, o que a fazia ficar prendendo em um coque toda hora para conseguir cuidar das flores. Tinha uma mecha de cabelo suja terra, o que Leo achou adorável.

Ele estava entediado. Já tinha regado as petúnias, plantado mudas de árvores que ele não memorizara o nome e agora estava sentado no chão tentando não enlouquecer enquanto Calipso trabalhava. Batia os pés incansavelmente contra o chão, torcendo que em alguma hora o fizesse com força suficiente para machucar e ele ter alguma ação.

— Calipso, eu estou entediado. Estou quase querendo que me espanque de novo — brincou.

Ela se virou e em um pulo estava a pouca distância dele. Parecia magoada, chateada e ele não conseguia entender o motivo.

— Você é um imbecil, Valdez. Como pode desejar algo assim?

Ele riu, vendo que ela não tinha entendido a brincadeira. Colocou uma mecha do cabelo dela para trás da orelha, mas preferiu ignorar o fato de que ela ruborizara com o ato.

— Estou brincando, Flor do Dia. Bem, sobre o espancamento, não sobre estar entediado.

Os dois ficaram em silêncio por um tempo. Ambos os olhos castanhos se encarando intensamente, perdidos em algo que nenhum dos dois compreendia direito, mas que estavam relutando da mesma maneira.

Era Leo, o garoto magricela e irritante que guardava suas mágoas em camadas de humor duvidoso. Que nunca parava quieto e que tinha a capacidade de falar as coisas mais erradas nas horas mais erradas.

E Calipso, que conseguia ser teimosa e chata ao mesmo tempo em que era gentil, doce e atenciosa. Que superara a morte da irmã e que era apaixonada por jardinagem.

— Leo, o que mudou?

Ele entendeu que era em relação a amizade deles. Três semanas antes, ele mal conseguiria ficar perto de Calipso sem querer explodir o próprio cérebro e o mesmo valia para ela. Agora, eles eram amigos, gostavam da companhia um do outro. Tinham coisas em comum que nunca pensaram que teriam: como o amor pelas tarefas manuais; as mesmas comidas; e pequenos momentos do dia, tipo uma caminhada para casa ao som da música certa, que transformava tudo em uma cena de filme.

— Eu vi que você não é detestável. Na verdade, você é bem legal. E você ama tanto essas flores. Não consigo odiar alguém com tanto amor no coração assim.

Ela arregalou os olhos, que ficaram ainda maiores, surpresa com a declaração dele. Isso o agradou. Calipso dificilmente era surpreendida, estava sempre com aquele semblante de alguém que conhecia tudo. Logo ela sorriu, o sorriso que Leo mais gostava e o puxou pela mão até um canto da estufa.

Tinham ali várias flores, mas diferente das outras, elas não tinham pétalas delicadas. Suas pétalas eram quase tão rígidas e firmes quanto as folhas verdes. Era de um tom de vermelho forte e se ramificava em várias pétalas finas e longas e em camadas. Seu centro era amarelado, quase laranja. Eram meio estranhas, na opinião de Leo. Não eram suaves ou delicadas como as flores deveriam ser.

— Essas são bromélias — ela começou, apontando para as flores esquisitas — E é assim que eu vejo você.

— ‘Tá me estranhando? — perguntou, mas Calipso apenas revirou os olhos, sabia que Leo estava brincando.

— Homens e sua necessidade de provar sua masculinidade. — bufou — Bromélias representam resistência, inspiração e excentricidade.

— Eu só as achei feias mesmo.

— Leo! — repreendeu o menino, que sorriu e grudou os lábios, fechando-os como um zíper — Quero dizer que é assim que eu o vejo. Você sempre resiste, tanto em coisas como machucados provenientes da marcenaria ou essas cicatrizes que você tem ai — apontou para o coração de Leo, que ruborizou — Não tem como não se sentir inspirada do seu lado, não quando você tenta ao máximo nos alegrar com sua excentricidade e alegria. Você é uma Bromélia, Leo. E isso não poderia ser melhor.

Ele sentiu seu coração se expandir e seu estomago dar um loop, ignorando o almoço que comera. Abria e fechava os lábios sem conseguir dizer algo que parecesse idiotice.

— Eu te vejo como uma rosa vermelha.

Ela levantou a sobrancelha direita, curiosa com a afirmação dele. Leo sentia como se fosse vomitar.

— Por quê?

— Linda, mas se machuca com os espinhos se tocar. — não resistiu a oportunidade de fazer uma piada. Ela fechou a cara e o estapeou, mas não de fato irritada. — Ai, estou brincando, sua louca, não precisa partir para violência. Você me disse, no primeiro dia de detenção, que as rosas vermelhas incitam vitalidade e gentileza. Você é a criatura mais cheia de vida e gentil que eu já conheci, mesmo que, quando comigo, sua gentileza resolva tirar um cochilo.

Ela riu abertamente e isso fez o dia de Leo. Então ele notou: estavam perto demais.

Leo e Calipso tinham exatamente a mesma altura, e o fato dela nunca usar saltos deixava Valdez bem feliz. Os olhares trocados eram intensos e firmes. Leo sentia que seu estômago iria sair pela boca, mas também nunca sentiu tanta certeza de algo na vida.

Deu um passo para frente, deixando seus rostos a poucos centímetros de distância. Repetiu o gesto de por uma mecha do cabelo cor de churros atrás da orelha da menina. Ele chegou o rosto para frente, sentindo seus lábios se roçarem.

Estranho, nunca pensou que acabaria beijando Calipso Nightshade.

— Calipso, você viu o meu... AI MEU DEUS! — os dois se separaram imediatamente, ficando tão vermelhos quanto as pimenteiras que tinham na estufa.

Que irônico que acabara não beijando Calipso.

Thalia olhava para os dois, revezando o olhar assustado e, ao mesmo tempo, malicioso.

— O que está procurando, Thalia? — a voz de Calipso estava ligeiramente trêmula.

Thalia pareceu meio consternada, com dificuldade para articular uma frase coerente:

— Eu... é... estou procurando aquele meu broche enorme do Green Day. Achei que pudesse ter perdido por aqui. Acabei de olhar no Bunker 9 também, não estava lá.

Calipso coçou a cabeça, jogando os cabelos para o lado. Assentiu lentamente, como se ainda tentasse entender como foi parar quase em um quase beijo com seu ex pior inimigo.

Leo estava irritado com Thalia. Por mais estranho que fosse ser, ele estava ansioso para beijar Calipso e a interrupção da Grace o frustrara.

— Claro, claro. Hm... não acho que eu tenha visto por aqui. Você viu, Leo? — ele negou, ainda de cara amarrada. — Eu acho melhor ir com você procurar, Thalia. — mordeu os lábios hesitantemente, olhando para o Leo — Nos falamos depois, tudo bem?

Ele assentiu novamente, vendo a garota sair da estufa junto com Thalia. Bufou, sentando-se no chão, perto das bromélias, sacando o celular.

— Cara — falou assim que a pessoa do outro lado atendeu — Eu estou muito ferrado.

(...)

O quarto de Nico di Angelo era bem mal decorado, na opinião de Leo. As paredes eram pretas, o que automaticamente deixava o quarto mais quente. Nelas estavam espalhados vários pôsteres de bandas de rock que Leo não queria conhecer nunca. Havia uma poltrona rotatória de caveiras, onde Nico estava sentado e brincando de rodar.

Leo estava na cama de casal, jogado de barriga para baixo, a cara enterrada no travesseiro. Esperava sufocar ali, do fundo do seu coração.

— Quando vai chamá-la para sair? — Nico perguntou com neutralidade. Falava como se estivesse perguntando se ele ia à padaria mais tarde.

O latino sentou-se na cama em um pulo. Não era natural. Era Calipso.

— Perdão?

— Não se faça de burro, Valdez. — Nico sempre tão delicado — Quando vai chamar Calipso para sair? Não é algo tão difícil.

— É sim — retrucou — É a Nightshade. Três semanas atrás eu ficava enjoado só de tê-la por perto. Não posso simplesmente chegar e falar “Ei, Flor do Dia, coloque um ovo em cima da ladeira, rola ou não rola?”

Nico o olhou como se ele fosse um extraterrestre.

— É incrível como você consegue falar umas coisas que não fazem absolutamente sentido nenhum.

Leu bufou jogando as costas contra o colchão. Olhou para a mesa de cabeceira e havia três fotos lá. Uma era de Bianca, ela portava o sorriso tímido e contido, mas feliz. Leo lembrava-se dessa foto, ele que tirara. A segunda era dele e Nico, onde ele fazia alguma piada idiota e Nico estava com cara de enterro.

Gostava de saber que era tão importante na vida de Nico a ponto de ter uma foto na cabeceira dele. Leo tinha uma foto igual na cabeceira de sua cama.

A terceira foto era de Nico e Will. O loiro, muito mais alto que Nico, o abraçava pelos ombros e tinha um sorriso maior que o rosto. Nico fazia uma careta, mas tinha o mesmo sorriso contido de Bianca. Nas mãos, ele tinha um girassol de pelúcia.

Por que essas malditas flores o ficavam perseguindo? No caminho para a casa de Nico teve vontade de chutar todos os jardins que encontrara, destruir todas as floriculturas.

— Gostar de alguém, até mesmo amar, é um risco Leo — Nico voltou a se pronunciar, após alguns minutos de silêncio. Não olhava para Leo, mas para a janela, que exibia um por do sol alaranjado. Apoiado no colo dele estava o girassol de pelúcia. — E sei o quão ruim isso é para você, que gosta de tudo funcionando perfeitamente. Só que, Leo, é um risco que vale a pena.

Leo assentiu, sentindo a profundidade das palavras do melhor amigo. Estava ainda muito confuso sobre algumas coisas, mas já sentia a luz clareando sua cabeça.

— E eu pensando que você não podia ser mais sensível do que já é, di Angelo.

Nico exasperou, revirando os olhos e jogando o girassol em cima de Leo.

— Você é um babaca, Valdez.

(...)

No dia seguinte Leo estava ansioso. Andava de um lado a outro da entrada da escola com aquele buquê de rosas improvisado na mão. Calipso não gostava muito de ficar em casa junto com todas as memórias de Zoë, então era sempre uma das primeiras a chegar e uma das últimas a sair.

E ele a viu virando a esquina, seus cabelos estavam presos em um rabo de cavalo. Usava uma calça jeans, uma blusa vermelha de gola V, uma jaqueta e, nos pés, sapatos de salto.

Que droga, pensou. Justo hoje ela precisava estar de salto alto?

Quando ela o viu, arregalou os olhos de surpresa e seu queixo caiu.

Elemento surpresa. Valdez 1 x Nightshade 0.

— Valdez, o que é isso?

Ele respirou fundo, era hora.

— Gostar de alguém é um risco, Nightshade — ele começou, repetindo as palavras de Nico. — Só que é um risco que eu estou disposto a correr. Eu não sei como isso aconteceu, e nem por que aconteceu, mas eu gosto de você. Gosto muito. E é estranho, já que a gente se odeia. Eu sei que eu te odeio, e eu também gosto de você. Não é estranho como as coisas acontecem? Em um dia você me espanca e no outro...

Ele nunca conseguiu terminar o discurso confuso. Calipso se jogou em cima dele em um abraço apertado, o fazendo se desequilibrar e quase deixar o buquê de rosas cair no chão. Ela mal se soltou dele e tomou-lhe os lábios em um beijo.

Surpreso era pouco para definir Leo. Ele correspondeu ao beijo desajeitadamente, mas igualmente romântico. Leo se sentia completamente completo beijando Calipso. Estava onde deveria estar.

Ela se soltou dele, sorrindo do jeito que ele amava. Ele sentia que seu cérebro era apenas um monte de parafusos soltos.

— Eu também gosto de você, seu idiota. E sim, é esquisito. — ela voltou os olhos para as flores. — São para mim?

Ele sacudiu a cabeça, tentando esclarecer os pensamentos.

— Ah, sim, são — ele coçou a cabeça enquanto entregava as rosas para Calipso — Estava pensando no que dissemos ontem sobre as flores e achei que convinha.

Ela exibia um sorriso adorável enquanto cheirava as rosas do buquê improvisado. Então ela franziu o cenho, reconsiderando algo.

— Leo — falou o nome calmamente — Não tem muitas floriculturas abertas essa hora e as flores estão muito frescas. Onde as comprou? — Ele engoliu em seco. Ela arregalou os olhos e Leo pode jurar que viu uma veia saltar na testa da menina — Por favor, me diga que não as colheu da minha estufa.

— Eu não as colhi da sua estufa — ele repetiu e ela começou a sorrir aliviada — Mas seria mentira.

Ela ficou vermelha em uma velocidade incrível e, por mais que estivesse linda, estava assustadora.

— EU VOU TE MATAR!

Leo sentiu que era hora de correr. Partiu para dentro dos portões da escola, desviando de alguns alunos que estavam pelo meio do estacionamento. Logo sentiu uma dor aguda nas costas e não precisou virar o rosto para saber que eram um dos saltos de Calipso.

Entrou na escola virando em um corredor de esquina com o principal. Sentiu algo batendo em seus pés e se desequilibrou, caindo com tudo de cara no chão. Viu o outro salto de Calipso pairado do seu lado.

Pelo menos morreria feliz e teria o bônus de perturbar a amada do além.

Viu uma sombra grande cobri-lo e quando olhou para cima, desejou mesmo morrer.

Qualquer coisa seria melhor que enfrentar a fúria do Sr. D.

Levantou-se em um pulo e viu que Calipso estava do lado dele, claramente com medo do diretor. Estava descalça, descabelada, mas ainda segurava o buquê intacto. Leo quis sorrir com a visão.

Ela era muito linda.

— Posso saber o que está acontecendo aqui? — a voz era contida, mas furiosa — Não são nem oito da manhã e vocês já estão arranjando confusão. Vocês pensam que meu colégio é algum tipo de zona? Algum pardieiro? — os dois se entreolharam e diziam um “sim” sonoro com o olhar — Pois saibam que não é! Para minha sala, AGORA!

Os jovens se encolheram e correram na frente do Sr. D., que resmungava muito sobre como ele odiava adolescentes e as idiotices dele. Parecia muito, muito furioso.

Calipso segurava o riso e Leo percebeu que ele próprio queria rir. Era engraçado, afinal. Talvez tivesse achado todas as brigas com Calipso engraçadas se ele já sentisse o que sentia agora. Até o espancamento seria uma história engraçada para se contar algum dia.

— Ei, Nightshade — ele sussurrou, já que Sr. D. ainda soltava maldições aos dois. — Quer sair comigo qualquer hora dessas?

Ela sorriu e mordeu os lábios.

— Me busque hoje às 19h. Detesto atrasos.

Ele tomou coragem e segurou a mão dela, entrelaçando os dedos com os dela. Deveriam estar parecendo ridículos, vendo de fora. Ela descalça, descabelada e com um buquê de rosas em uma das mãos. Ele, com um hematoma do tombo e todo amassado. O Sr. D. gritando atrás deles coisas desconexas. Calipso apoiou a cabeça no ombro de Leo.

O novo casal não conseguiu evitar uma risadinha.

Eles não se importavam nem um pouco.


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Notas finais do capítulo

O que acharam? Além disso, estou pensando em escrever uma Solangelo paralela a Bomélia, contando sobre os dois e sobre o Girassol de pelúcia. O que acham?

Comentem a opinião de vocês!



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