Night Visions escrita por Isaque Arêas


Capítulo 3
The River


Notas iniciais do capítulo

Esse capítulo foi baseado em "The River - Imagine Dragons": https://www.youtube.com/watch?v=K6SyQ4XvBxg



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Mais rápido e mais longe.

Mais rápido e ainda mais longe!

Ainda mais rápido e muito mais longe!

Esse era o meu novo dia-a-dia. Já fazia algum tempo desde que eu decidira permanecer na floresta e esta havia sido minha melhor escolha até então. Todos os dias eu me desafiava. Todos os dias eu provava para mim mesmo que minhas habilidades estavam melhores. Desde o dia em que descobri que podia voar meus pés praticamente se tornaram inúteis. Se todos conhecessem a beleza do céu jamais iriam querer voltar para o solo. Acredito que essa era a razão pela qual as copas das árvores pareciam querer me afastar do céu. O topo delas conhecia seu gosto sedutor e sabiam que uma vez que eu provasse não iria querer me alimentar de mais nada.

Eu voava praticamente todos os dias. Praticava pelo menos uma vez por dia. Confesso que no início foi muito difícil. Eu precisava acertar primeiramente o salto. Depois precisava de certa forma controlar a carga de energia que meu corpo liberava e esse processo levou muito tempo até ser de fato efetivo. Após conseguir a estabilidade aérea necessária, precisava lidar com o ambiente à minha volta. As rajadas de vento muitas vezes não correm na direção que desejo e preciso lutar contra elas. O peso do vento não poucas vezes é forte demais e me obriga a descer e caminhar. E ficava tão triste ao caminhar. Sempre que meus pés tocam o solo por conta de um fator climático é como se a floresta me lembrasse de onde vim. Ela me controlava; me mantinha em meu lugar, mas assim que eu percebia que as rajadas de vento haviam normalizado eu voltava a subir. Alcançava o topo das árvores e dali todo o restante.

E não apenas com meus poderes, mas com o tempo também aprendi a lidar com a nudez que já não me incomodava mais. Todos os animais da floresta andavam nus. Eu permaneci nu primeiramente pela recusa em matar. Eu havia matado homens cruéis no dia em que deixei a base de experimentos, mas mesmo sendo cruéis, eram vidas, eram homens como eu e assim como eles, eu era sujeito de corrupção. O sangue dos homens gritava do chão todas as noites e eu podia ouvir seus gritos claramente em meus sonhos. Preferia que os inocentes animais continuassem vivos e com suas peles, não conseguiria me cobrir com elas. Por fim, a recusa em matar me ajudava a manter a sanidade.

No início o que mais me incomodava em estar nu era o frio. Fazia muito frio na floresta, fosse de manhã ou à noite, eram sempre horas geladas. O passar do tempo, porém, adaptou meu corpo. Agora eu acredito que acumulava quantidade de energia suficiente para manter o calor correndo entre os meus ossos e isso me mantinha aquecido, até mesmo enquanto voava. As rajadas de vento deixavam meu rosto, peito e membros gelados e quase anestesiados após um voo mais rápido e longo, mas eu continuava bem.

Era uma relação engraçada a estabelecida entre mim e a floresta após a revelação de minha nova habilidade. Eu agora podia percorrê-la quase que inteira em um dia. Eu podia ir cada vez mais alto alcançando o topo de suas montanhas. “Eu domei a natureza. Eu sou seu senhor”, eu pensava e como se lesse meus pensamentos ela me fazia lembrar o quão ínfimo eu era. Voltava a sentir fome todos os dias, voltava a sentir sede, todos os dias precisava de abrigo e voltava para a gruta. Todos os dias as minhas necessidades me lembravam de que eu era apenas humano. Um humano desafiando no auge de seu egocentrismo toda a grandeza do universo. Todas as vezes eu descia de meu voo para a beira do rio em busca de água para beber e de peixes — ah, a culpa que eu sentia ao comê-los me consumia — para saciar a fome. Acabamos por estabelecer essa divertida relação: eu acreditava que dominava a natureza e ela acreditava que me dominava. Tornamos-nos interdependentes — ao menos eu gostava de acreditar nisso, mas no fundo sabia que ela não precisava de mim para nada.

Dentre todas as faces que a floresta me mostrava a que mais eu amava era o rio. O rio era a personalidade da floresta. Tinha dias em que ele estava mais veloz do que o normal, mas havia dias em que ele estava mais calmo e me passava segurança. Quando chovia ou relampejava era como se a floresta reagisse ao barulho dos trovões através da agitação das águas. Em meu interior eu pedia que o rio se acalmasse e com o tempo tudo ficava bem novamente. A floresta voltava ao seu estado natural e o rio corria pleno. O rio mostrava a essência da floresta e todos os seus sentimentos.

Um dia tive outro pesadelo com o laboratório, na verdade, desde que acordara do coma eu não conseguira sonhar com nada diferente do laboratório e cada novo sonho era mais terrível que o anterior. Nesse dia eu acordei amedrontado e saí da gruta. Caí de joelhos no chão lamacento e chorando gritava minha dor. “Não aguento mais isso!” eu gritava. Após alguns minutos eu senti o vento me direcionando para o rio, mas eu permanecia no mesmo lugar. A verdade é que eu não queria ter as dores aliviadas, eu simplesmente queria senti-las apunhalando a minha alma. O vento continuava soprando como se dissesse “Avance. Alcance, se livrar da dor não é tão ruim quanto parece”. Eu com cautela atendi seu pedido.

Entrei no rio aos poucos. Ele estava muito gelado. Meus dentes bateram até que meu corpo começasse a me aquecer. Desci mais um pouco. E mais um pouco. E me cobri com a água. Sentia cada movimento do rio passando pelos meus braços e pernas. Me senti abraçado pelas águas e elas relaxaram meu corpo. Lá permaneci por um bom tempo. Ao me levantar eu estava renovado. Havia esquecido totalmente o pesadelo, só conseguia pensar no grande abraço das águas. Eu só queria ficar ali ao longo de toda aquela noite. Quando meus dedos começaram a enrugar eu o deixei e gentilmente pedi em pensamento que não me deixasse e não desistisse de mim. Eu sabia que era um problema a mais, afinal, não pertencia àquele lugar, mas escolhera habitar ali. O rio não me respondeu, claro, mas para mim, vê-lo correndo era suficiente. Depois daquela noite, todos os outros dias foram mais agradáveis quando eu mergulhava e sentia novamente o abraço gélido e caloroso, distante para ele e tão próximo para mim. O paradoxo que me fazia tão bem.

***

Naquele dia eu estava voando ainda mais veloz do que no dia anterior. Cruzei as árvores, atravessei o rio. Estava um pouco mais alto que os pinheiros a minha volta. Podia sentir o vento leve batendo no meu rosto. Decidi ir bem alto. Quando alcancei uma cadeia de nuvens me soltei no ar. Enquanto caía eu olhava para baixo, a superfície estava cada vez mais perto e quando cheguei a poucos metros do chão voltei ao ar com um rasante. Via a floresta girando enquanto fazia minhas acrobacias. Meus cabelos sacudiam ao redor do meu rosto. Era um belíssimo dia, mas como sempre o céu voltou a trovejar.

Olhei para o rio enquanto eu voava e o senti agitado novamente. E em um momento de súbita loucura voltei a me sentir o senhor da floresta, deixei que meu ego me dominasse novamente. A cada dia eu quebrava um limite, hoje não seria diferente. Decidi que iria além do clima. Subiria até o ponto mais alto do céu e faria com que os raios de alguma forma cessassem. O vento estaria contra mim, a natureza inteira também, mas eu era louco o suficiente para tentar.

Desci de volta à terra firme para pegar impulso. Com um salto me lancei. Voei até o topo da montanha mais alta e pousei almejando um novo grande salto. O vento agora estava um pouco mais forte e eu podia senti-lo me empurrando para baixo. Minha obstinação falava cada vez mais alto. Tomei impulso. Eu alcançaria o céu dessa vez. Me lancei mais uma vez. A camada de nuvens agora estava mais densa. O vento cada vez mais forte me empurrava para baixo, mesmo assim lutei contra todas as rajadas como se fossem socos no meu rosto e eu desviava de cada um. A chuva já batia no meu corpo. A atmosfera inteira tentava me alertar para que eu recuasse, mas eu me recusava.

Foi aí que a natureza mais uma vez agiu contra o meu ego.

A luz. Era tão intensa. Aquele segundo pareceu um milênio. A energia pulsando. Quando aquele relâmpago atingiu meu corpo foi como se o calor que de vez em quando eu sentia fosse multiplicado por um milhão. Era como se o sol queimasse dentro de mim. Fechei meus olhos e gritei em um impulso. Senti minha mente apagando e meu corpo descontrolado caindo. Eu caía no grande abismo em que eu tinha me colocado. Tentei retomar o controle do meu corpo, mas ele estava anestesiado.

Tentei me manter lúcido, mas parecia impossível e quanto mais perto eu ficava do chão, mais preocupado eu ficava. Não sei se fora a sorte ou meus pedidos interiores para que de alguma forma meu corpo reagisse, mas antes de tocar o chão, consegui retomar aos poucos o controle. Fora suficiente para que eu cobrisse o rosto com os braços evitando que as árvores me ferissem mais e também para conseguir flutuar aos poucos o que não impediu o choque. Quando estava chegando próximo às árvores consegui mais uma vez avistar o rio. Decidi que faria de tudo para cair nas águas. Desviei de algumas árvores e bati em alguns galhos. Fiz um pouso forçado no rio e vi tudo se apagar à minha volta.

***

“Estava louco”.

Acordei algum tempo depois com esse pensamento.

“Como assim? Eu quis lutar com trovões? Será que esqueci que sou apenas um homem?! O que deu na minha cabeça?!”.

Subitamente fui interrompido ao perceber que não conhecia o meu atual ambiente. Me encontrava dentro do rio, mas não fazia ideia de onde estava. Olhei à minha volta. Não estava na mesma parte da floresta, mas o que mais chamou a minha atenção fora um objeto estranho que parecia vivo na minha mente, mas como uma lembrança distante. Eu havia desmaiado abaixo de uma ponte.

Era uma ponte de madeira bem rústica. Consegui me levantar e me escorando nas margens do rio subi até chegar ao lado da ponte. Havia um longo caminho para um lado, outro longo caminho para o outro. Em todo o tempo em que eu havia estado na floresta ainda não havia reparado em caminhos ou ações de outros humanos. Foi então que percebi que mesmo livre eu me prendi ao meu mundo. Troquei uma cela por outra. Toquei a madeira que formava a ponte. Era maciça e parecia antiga. Passei os dedos sobre os pregos. Era como se meu passado distante antes do coma estivesse tentando voltar e por um momento me senti empolgado com aquilo.

Me estiquei e alonguei meu corpo que ainda doía com todo o processo pelo qual passei. Percebi que havia me arranhado nos galhos das árvores, mas o relâmpago não havia feito grandes estragos, talvez fizesse parte de minhas habilidades conter o efeito da energia do relâmpago. Caminhei pela ponte e cheguei ao meio dela. Encostado em sua barricada de madeira eu olhei para o rio que agora corria lentamente. Ele havia me levado até a ponte depois que eu desmaiei. Fiquei debruçado sobre ela por algum tempo tentando reavivar alguma memória antiga, mas nada aconteceu e por um momento voltei a ficar curioso sobre o mundo que eu havia deixado para trás. Será que havia um propósito em ter encontrado aquela ponte? Queria ter pensado um pouco mais, mas fui interrompido por um barulho.

Pulei a barricada e me escondi no rio, abaixo da ponte. Enquanto eu esperava o responsável pelo barulho se aproximar permaneci em silêncio e de prontidão. Não era apenas uma pessoa, animal ou coisa. Eram vários. Vários humanos. Pelas frestas da ponte de madeira eu podia ver o brilho do sol aparecendo e desaparecendo enquanto os vários pés tapavam as frestas enquanto passavam. Meu coração acelerou. Fiquei com medo de que fizessem algo comigo caso me descobrissem ali. Fiquei com medo de que me vissem nu. Fiquei com medo de voltar ao coma. Meus ossos voltaram a esquentar por conta do medo que eu sentia e minha respiração ficava cada vez mais acelerada. Quando terminaram a passagem eu me levantei ainda com os olhos arregalados e o coração pulsando forte e subi novamente até a ponte. Era uma excursão de jovens. “Se eles estão indo para lá, vieram daquele lado...” estavam todos com mochilas e à frente ia um mais velho que parecia cuidar deles. “Estão indo acampar” outro brilho da minha mente. Era incrível como as lembranças ainda estavam ali. Eu sabia tudo do mundo humano, mas por algum motivo só conseguia acessar aos poucos.

Agora eu sabia que para o outro lado estava a cidade. Agora eu compreendi que mesmo que eu houvesse me isolado do mundo ainda fazia parte dele. O mundo podia ter me apagado, mas eu não o havia apagado completamente. A velha curiosidade voltou. A velha vontade de me superar veio com ela e de quebra trouxe minha teimosia, mas não, eu não iria adiante. Se havia uma lição que eu aprendera bem depois da última tempestade é que nem todos os limites podem ser quebrados. Eu não faria nada disso sem me preparar e ponderar, não mais. Deixei a curiosidade se esvair e saltei novamente. Voei em direção contrária ao rio seguindo seu caminho até que ele me levasse de volta para a gruta.

***

Aos poucos eu fui me recuperando dos danos sofridos. Meus braços e pernas já haviam cicatrizado seus arranhões. A água gelada do rio ajudou a aliviar a dor. E eu estava praticamente recuperado após alguns dias. Constantemente eu pensava na ponte e ficava no dilema entre atravessar e não atravessar, mas a floresta era tão cativante que tentava não pensar demais nisso. Na floresta eu estava livre de qualquer amarra. Eu era pleno. Decidi que faria o que costumava fazer todos os dias: procurar comida, voar e me banhar no rio.

Voei pelo entorno da floresta em busca de frutas, mas não conseguia encontrar em canto algum, foi quando avistei uma belíssima criatura. Era um urso filhote. Ele estava à beira do rio tentando alcançar um peixe. Achei a cena notável e parei por um momento para admirá-lo. Havia visto alguns ursos pela floresta várias vezes, mas aquele me chamou a atenção por ser tão pequeno e por estar tão focado em pegar um peixe. Quando ele percebeu minha presença ali correu para longe. Eu teria corrido atrás dele, não fosse pela minha barriga roncando. Estava faminto. Voltei a procurar pelas frutas.

Algum tempo depois de sobrevoar a floresta encontrei um arbusto com pequenas frutas vermelhas. Catei algumas e ali comi enquanto admirava o sol se pôr. Havia um local em especial onde eu adorava me sentar para observar a pintura dos céus. Era uma rocha que ficava no alto do rio. De lá era possível ver todas as nuances possíveis. O azul, lilás, laranja, vermelho e amarelo. As cores do pôr do sol. Eu adorava aquele espetáculo. Depois de comer decidi voltar para a gruta antes que escurecesse e eu pudesse acabar demorando mais do que o necessário para encontrá-la.

Eu sempre voltava seguindo a direção do rio, era o melhor jeito de encontrar a gruta. Durante meu voo pela rota do rio me deparei novamente com o ursinho, mas dessa vez em condições piores do que a anterior. Ele estava preso em uma moita de galhos mais entrelaçados e quanto mais se movimentava menos conseguia se soltar. Eu então decidi ajudá-lo. Me coloquei ao seu lado e tentei movimentar os galhos que eram muito mais resistentes do que aparentavam. Foi quando de repente ouvi pelas árvores um som que me assustou tanto que olhei para trás logo em seguida.

Atrás de mim estava um urso bem maior. Tinha o dobro do meu tamanho e parecia bastante irritado. Provavelmente aquele era seu filhote e provavelmente o animal entendera tudo errado e antes que eu pudesse me explicar — como se fosse adiantar — ele corria em minha direção. Parei o que estava fazendo e voltei a voar. Com um salto desviei por pouco da fera que deu meia volta e vinha para mim novamente. Eu precisava fazer algo para soltar o filhote sem feri-lo e sem deixar que a mãe me alcançasse. Pensei em usar meus raios de energia, mas seriam arriscados, principalmente em uma área com muitas árvores. Decidi então usar apenas em um galho acendendo então uma tocha.

Com um dos braços eu tentava soltar o bebê, com o outro eu agitava a tocha para impedir que a mãe se aproximasse. Mal sabia eu que a mãe era mais corajosa do que eu imaginava. Num momento em que não estava olhando para ela, a mãe urso pulou para cima de mim, jogando minha tocha longe e caindo bem acima do meu peito. O medo tomou conta de mim. Estava face a face com a ursa. Tentei sair rastejando para longe, foi quando ela estendeu a enorme pata e atingiu o meu peito em cheio. Eu gritei por conta da dor. A natureza resolvera me agredir esses dias.

Involuntariamente eu a lancei para longe com uma de minhas ondas. Me levantei achando que havia ferido o animal, mas ela se levantou. Quando a joguei pra longe ela caiu em cima da moita onde o bebê estava e assim ele se soltou. Ambos fugiram me deixando sozinho ali. Observei os dois irem embora e então fui olhar o estrago que ela havia feito. Meu peito era sangue. O corte de suas garras havia sido muito profundo para que o rio me curasse. Eu precisava fazer algo antes que perdesse muito sangue.

Tentei não perder o controle. Procurei respirar. Já havia anoitecido. O que eu faria? Como me curaria sozinho naquela floresta? Então pensei que talvez as pessoas pudessem me ajudar... “Não vão... Vão me prender novamente” eu dizia em minha mente. Eu precisava confiar cegamente, até porque não havia outra opção. Estava entre a cruz e a espada. Naquele momento de dúvida eu precisava me levantar, precisava me decidir. Por fim, decidi que iria atrás de outros humanos pedir ajuda, ainda que estivesse tarde eu precisava tentar.

Voei seguindo o fluxo do rio. Um dos mitos sobre o voo é que ele não é muito mais rápido do que andar. Se eu corria numa velocidade de quatro passos por segundo, meus voos normais seguiam a 8 a 10 passos por segundo. Voar também era como um movimento qualquer do corpo. Cansava igual a andar, mas a dor era sentida por todos os músculos e não apenas pelas pernas, tentando traduzir, era como se você corresse com o corpo todo enquanto o vento ainda se materializava formando uma barreira na sua frente. Não era tão fácil. Voei cambaleante. Coloquei as mãos no peito para estancar o sangue. Segui o rio pensando em todas as minhas atitudes naquela semana. Eu nunca havia me demonstrado muito altruísta, acredito que a única vez em que o fora era quando decidia não matar animais, mas fora isso eu deixava que meu ego me levasse e na primeira atitude altruísta que tomo em tempos isso me acontece.

Eu me sentia totalmente independente de tudo. Dizia para mim mesmo que não precisava de pessoas após declarar minha liberdade, mas a natureza à minha volta parecia querer me ensinar uma lição. Talvez eu precisasse deles. Eu estava à beira da morte voando o mais rápido que eu podia na tentativa de ser salvo. Voei mais alguns quilômetros e quando estava quase desfalecendo cheguei à ponte finalmente. Parei na beira da estrada tentando me recompor. Tossi e percebi que meus lábios haviam ficado úmidos. Pelo gosto havia cuspido sangue. Olhei para os dois caminhos que a ponte apontava e então lembrei do acampamento para onde os jovens iam. Não devia ser tão longe.

Fui voando pela estrada. “Você nem tem certeza de que realmente há um acampamento” eu dizia enquanto voava para meu destino, mas precisava acreditar que havia ajuda lá. Qual era minha escolha? Após alguns metros vi o que pareceu ser fumaça. Provavelmente era uma fogueira. Como eu iria aparecer ali no estado em que eu me encontrava? Estava nu e parecendo um louco. Felizmente não precisei pensar nisso. Havia uma grande cabana logo na entrada, parecia ser um local para pedir informações, assim que a avistei meu corpo pousou. Tentei dar alguns passos, mas estava fraco demais. Caí antes mesmo de chegar à porta da cabana. Fiquei ali deitado no chão durante algum tempo gemendo de dor. Antes que pudesse apagar completamente pensei na vida que possivelmente eu estaria deixando para trás, mas por fim cheguei à conclusão de que esse na verdade era o propósito maior. O rio me levara para a ponte, meu ego precisava ser confrontado e eu precisava chegar até aqui. Tudo corria de acordo com um estranho plano e eu cada vez mais me sentia ínfimo ainda que minhas habilidades me tornassem diferente de todos à minha volta. Usei o último sopro de força que me restava para gritar por socorro e dali apenas me lembro da minha visão enegrecendo e do frio da noite.


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Notas finais do capítulo

Opa! Obrigado por ler mais um capítulo! Se quiser deixe um comentário sobre o que está achando da história ou se há algo a melhorar também :D