April escrita por Minerva


Capítulo 1
Lover, you should've come over.


Notas iniciais do capítulo

O título do capítulo único é uma música do Jeff Buckley.



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O sol bateu no seu rosto, os raios banhando seus ombros e clavículas, enquanto você ficava sentada na minha janela, com os cabelos para trás, os olhos fechados, um sorriso de satisfação. Tudo que eu consegui imaginar naquele instante era o quanto eu gostaria de ver a claridade destacar as poucas sardas em seu nariz. Eu as achava lindas, embora você as odiasse e, por isso, as escondia embaixo da camada de maquiagem.

Não me leve a mal, mas eu sempre te achei infinitamente mais bonita saindo do banho, de cara lavada. Você não, pois – desculpe a palavra, já discutimos quando a chamei assim antes – pode ser um pouco complexada, vez ou outra.

Sua pele é clarinha, quase translúcida, e qualquer coisa deixa uma marca. Sempre odiou os pontos vermelhos que eventuais marcas de espinha deixavam em seu rosto, bem como suas sardas e qualquer vermelhidão deixada pelo sol, não é? Queria uma pele uniforme, não dando a mínima se meio frasco da tal base, de uma dessas marcas que eu nunca soube, fosse usado no processo. Tudo porque você odeia ser marcada.

Mas você nunca perguntou se eu odeio ser marcado, e agora lhe digo: eu odeio, April. Acho que pra você nunca fez diferença, afinal.

Eu odiei quando me disse que era vegana. A primeira coisa que eu pude pensar era que você fosse uma dessas ativistas obcecadas. E, de fato, você amava a causa e acreditava até o último fio de cabelo naquilo que pregava. No entanto, nunca me deu sermão ou tentou mostrar-se superior, e só exibia os motivos da escolha se eu pedisse. Mas eu odiei mais ainda quando teus princípios, assim em silêncio, me convenceram.

Eu odiei quando sentou na janela do meu apartamento e olhou para as janelas dos outros edifícios, ditando uma história para cada um dos moradores, como se soubesse quem eles eram. Como se fosse algum tipo de rainha, a quem aquele mundo pertencia. Mas eu odiei muito mais quando esse se tornou nosso passatempo favorito.

Eu odiei quando me fez comer todo dia aqueles biscoitos veganos de canela apenas para acompanhá-la. Nunca gostei muito deles, não mais do que qualquer outro biscoito, já você os carregava como sua declaradamente maior paixão se tratando de gastronomia. E ainda assim, eu sempre odiarei muito mais que o cheiro de canela agora me remeta a ti aonde quer que eu o sinta.

Odeio que tenha deixado tantas marcas em mim.

Odeio o fato de que enfiar as mãos no meu peito, sujar de sangue até os punhos, marcar as suas digitais no meu clichê coração, não tenha sido suficiente. Para você, nunca era. Você teve que apertá-lo, esmagá-lo, girá-lo, quebrá-lo em fragmentos.

Eu devia ter percebido quando a vi queimar fotos do seu ex; ou quando estraçalhou um vaso de flores porque estava enjoada de tê-lo em sua sala; ou quando atirou na rua, para serem recolhidos pelo caminhão de lixo, os quadros medíocres que pintou quando pensou que poderia ser artista.

Ah, April, você nasceu para destruir.


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Notas finais do capítulo

Estou tentando voltar a escrever agora que tenho mais tempo. É como voltar andar de bicicleta... Estou precisando dar umas pedaladas antes de recuperar o jeito hahaha



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