Crise 80 – Um Futuro Terrível

Coisas muito estranhas estavam acontecendo no nosso colégio durante o festival cultural. Primeiro, o Portal Gun de Estrela é roubado. Depois descobrimos que ele foi recuperado e foi devolvido por alguém que parecia estar se passando por Estrela. Depois disso, descobrimos que também havia alguém parecido comigo. Por fim, descobrimos que essas pessoas parecidas com a gente éramos nós mesmos, Estrela e eu, que vieram do futuro! Mas como isso é possível?

—O que está dizendo? - disse Estrela do presente, com uma expressão surpreendentemente furiosa – Você não pode estar falando sério!

—Infelizmente sim – respondeu a Estrela do futuro.

—O que está havendo? - perguntei para meu eu do futuro.

—Cara, é uma história complicada – disse ele.

—Acalmem-se, eu vou explicar tudo – disse a Estrela do futuro.

—Acho bom mesmo – disse Kevin, que estava ali acompanhando tudo – Vai ser muito difícil esconder todos vocês dos olhos dos curiosos. Já, já entra alguém nesse banheiro e...

—É verdade. Vamos discutir isso em um lugar mais reservado – disse a Estrela do futuro.

Após falar isso, ela se vira para a Estrela do presente e diz:

—Por favor, use seu Portal Gun para nos levar para os fundos do colégio. Com o festival não deve ter ninguém por lá agora. Não posso usar o meu...gastei toda a energia abrindo um portal para o passado.

—Certo – disse a Estrela do presente, embora a expressão dela não estivesse nada contente.

E foi feito. Ela abriu um portal do banheiro e pronto, estávamos ali, no fundo do colégio, um local bem deserto.

—Aqui não vem ninguém mesmo, né? - perguntou Kevin.

—Ah, é bem difícil – explicou meu eu do futuro – Talvez algum casalzinho que queira namorar, mas acho difícil disso acontecer.

Foi só ele terminar essas palavras que, ao nos virarmos para o lado, damos de cara com um desses casaizinhos. A notícia boa é que pelo menos eles eram de confiança. É, estávamos falando de Eduardo e Mabi.

—Vocês! - eu e meu eu do futuro gritamos assustados.

—Estrela? - perguntou Mabi – Ué? Não sabia que você tinha uma irmã gêmea além da Lua.

—Aí é que está, não somos gêmeas – disse a Estrela do futuro – Na verdade...

—Ela é minha versão do futuro – respondeu a Estrela do presente.

—Como é que é? - Mabi fez uma expressão de estranhamento, mas Eduardo deu apenas um leve sorriso.

—Isso é interessante – disse ele – Foi mesmo bom termos vindo para cá, não é, Mabi?

—E-Espera aí, não precisa ficar espalhando essas coisas por aí, amor – disse Mabi, meio encabulada.

Tanto eu quanto meu eu do futuro ficamos desconfortáveis em imaginar que eles vieram ali para ficar sozinhos. É, éramos mesmo a mesma pessoa em épocas diferentes. Ele estava tão enciumado quanto eu. Mas acho que aquela não era a melhor hora para ficar pensando nisso.

—O que importa? - reclamou a Estrela do presente – Quero explicações. Não acredito que você apelou para isso.

—Não tive escolha – respondeu a Estrela do futuro.

—Para começar – Kevin se intrometeu – Como vocês voltou ao passado? Como é que isso é possível?

—É perfeitamente possível – disse Estrela – O Portal Gun é um dispositivo que lida com buracos de minhoca. Esses buracos não ligam apenas regiões do espaço, eles também ligam regiões do tempo.

—Como? - perguntei.

—Não é algo tão incomum – explicou Eduardo – Desde a teoria da relatividade de Einstein sabemos que espaço e tempo são interligados. O que você faz em um pode afetar o outro.

—O problema é que viajar no tempo é um crime mortal pelas leis do Setor Z – disse a Estrela do presente – Se nossos superiores descobrirem isso...

—É alto tão terrível assim? - perguntou Mabi.

—Extremamente terrível – respondeu a Estrela do presente com um olhar sério – Alterar o passado é muito perigoso.

—Entendo...está falando de caos, não é? - disse ele.

—Como assim “caos”? - perguntou Mabi.

—Vocês já pararam para pensar...

Não, agora não, mas...não tinha jeito. Ele iria falar de qualquer maneira.

—...o quanto pequenas ações no presente podem contribuir para grandes efeitos no futuro? - disse ele – Pense assim, imagine que uma folha caia no chão e um garoto se abaixe para pegá-la. Ao se abaixar, ela evita de encarar uma garota que estava passando por ali. No entanto, se ele não tivesse abaixado, iria ver a garota, conversar com ela, se apaixonar, os dois iriam se casar e ter vários filhos. Uma vida completamente diferente iria acontecer se não fosse uma única folha cair no chão.

—Uau, é mesmo! Às vezes fico pensando como seria minha vida se eu tivesse feito uma escolha diferente – considerou Mabi.

—Exato – concordou a Estrela do presente – Voltar ao passado significa alterar totalmente a linha do tempo. É como se todo o futuro fosse mudado. Tem ideia do quanto isso é terrível?

—Bem – a Estrela do futuro não discordava – Você concordaria comigo se soubesse o que aconteceu no futuro.

—Afinal, o que aconteceu? Para Estrela recorrer ao passado algo muito ruim deve ter acontecido no futuro, não? - perguntei.

—Você nem imagina – disse meu eu do futuro.

—Acalmem-se. Vou explicar tudo – disse a Estrela do futuro – Tudo começou quando meu Portal Gun foi roubado quando fui experimentar essa roupa ridícula.

—Mas você ficou linda – comentou Mabi.

—Não faz meu tipo – disse Estrela. De fato, a Estrela do futuro estava usando a mesma roupa e também estava sem sapatos. Espera, então eles fizeram a viagem no tempo...naquele mesmo dia e há poucas horas ou mesmo minutos.

—Tá, tá – interrompeu a Estrela do presente – Pode se concentrar nos detalhes mais importantes?

—Certo – concordou a Estrela do futuro – Bem, não demorou muito para eu descobrir que meu Portal Gun havia sido roubado por aquela amiga da Bruna, a Priscila. Parece que ela queria saber alguma coisa sobre mim e pediu para Priscila pegá-lo por um tempo.

—Que coisa horrível – disse Mabi.

—Até aí vocês já devem saber – continuou a Estrela do futuro, olhando para mim e a Estrela do presente – Mas foi nesse ponto que as nossas histórias se tornaram diferentes.

—E o que aconteceu? - perguntei.

—Bem, foi mais ou menos o seguinte...

Para deixar a explicação mais compreensível, vamos fazer um flashback. Espere, flashback é uma retrospectiva do passado, mas isso aconteceu no futuro, se bem que o futuro mudou por que eles voltaram ao passado, então não é mais o futuro...aaah, isso é muito confuso! É por isso que odeio viagens no tempo, mas vamos lá. O flashback vai dizer o que aconteceu na outra linha do tempo.

* Início de flashback *

—Muito bem, Priscila – disse a Estrela – O que você está fazendo com o meu celular?

Estrela e Vitor (já que eu não sou meu eu do futuro, acho que posso chamá-lo de Vitor) deduziram que Priscila podia estar com o Portal Gun e acabaram encontrando-a mexendo nele.

—Eu...eu não fiz nada – ela tentou se defender – Eu só...fiz um favor para...quer dizer...

—Para a Bruna, não é? - completou Estrela – Admita que está trabalhando para ela.

—T-tá...eu admito – disse Priscila – Foi a Bruna quem pediu para eu fazer isso. Mas eu juro que não vi nada. Seu celular é muito complicado de mexer. Tem um monte de coisas aqui que não entendo.

—Mas por que você obedece tanto aquela menina? - perguntou Vitor – Tá na cara que ela só está te usando.

—Eu sei, mas...ela sabe de algo que quero manter em segredo – confessou Priscila.

—Um segredo? - indagou Estrela – Ele é tão importante a ponto dela te chantagear tanto?

—Sim – disse ela – É algo que não quero falar para ninguém.

Mas, naquela hora, Bruna estava passando por ali.

—Estrela! Quando você vai voltar para a sala, sua palestra é daqui a pouco e...

Ela viu toda a cena, inclusive Priscila segurando o Portal Gun (que para elas, era só um tipo de celular).

—Ah, a Priscila encontrou seu celular. Que bom! - disse Bruna – Nada como ter uma boa amiga, não é?

—Cale-se – disse Estrela – Já sabemos que foi você quem mandou ela fazer isso.

—Eu o quê? - Bruna olhou para Priscila com um olhar de desprezo – Priscila, o que você disse.

—Desculpa, desculpa. Ela me pegou...de um jeito que eu não podia esconder e...

—Você mandou roubar meu celular, Bruna – disse Estrela – De onde eu venho, isso é chamado roubo. Terei que denunciá-la à direção da escola.

Bruna revelou um olhar sério. Aqueles dois lindos olhos de cores diferentes agora estavam bem frios.

—Você só tinha que ver se achava alguma coisa de suspeito. Você só tinha um trabalho e ainda assim falhou. Você sempre me decepciona, Priscila – disse Bruna, revelando uma face de decepção e desprezo – Desse jeito, acho que vou precisar revelar seu segredinho.

—Espera, Bruna. Todo mundo tem direito de guardar segredo – disse Vitor.

—Fala isso por experiência própria? - perguntou Bruna – Não se preocupe, um dia também vou descobrir o segredo de vocês, mas hoje...

E Bruna acionou alguma coisa em seu celular que ativou todos os alto-falantes do colégio.

—Fiz bem em pedir para aquele nerd do terceiro ano instalar esse programa para mim – disse Bruna – Agora o colégio inteiro vai saber em primeira mão quem é sua paixãozinha secreta.

—Não, Bruna. Por favor! - disse Priscila.

—Tarde demais. Devia ter pensado nisso antes de falar mal de mim – disse Bruna – A vingança é um prato que como quente, querida.

E assim, todos os alto-falantes da escola anunciaram, em uma voz claramente editada, as seguintes palavras.

—Atenção a todos. O colégio inteiro precisa saber...que Priscila do nono ano é apaixonada pelo Rogério, professor de matemática. Repito: Priscila do nono ano é apaixonada pelo Rogério, professor de matemática.

O som foi ouvido pela escola inteira, inclusive pelo professor de matemática em questão que, por sinal, estava visitando a feira com sua noiva.

—Ai, ai, essas crianças inventam cada coisa – disse ele.

—Lembro que também era apaixonada pelo meu professor de ciências – confessou a noiva.

—Você o quê? - indagou o professor.

Mas isso não interessa. Vamos voltar para Priscila. A pobre coitada realmente ficou envergonhada.

—Ai, não, não, não – disse ela – Eu...estou tão envergonhada!

E, de fato, ela estava. O vexame que Priscila era mais forte do que imaginávamos. Estrela percebeu isso logo.

—O quê? - disse ela, ao olhar para o Portal Gun.

—O que aconteceu? - perguntou Vitor.

—Isso é estranho...o Portal Gun...está reagindo de modo esquisito – ela abriu um dos aplicativos e percebeu o que estava acontecendo – Não, isso não pode ser verdade.

—Do que estão falando? - perguntou Bruna, agora satisfeita com sua vingança.

—A culpa foi sua, Bruna – disse Estrela – Você...causou um abalo emocional extremamente alto nessa garota.

—E daí? - perguntou Bruna – Ela mereceu por ter me desafiado.

—A questão não é essa. Acontece que emoções humanas estão em harmonia com a frequência natural dos objetos ao nosso redor. Ao criar essa situação constrangedora, juntamente com a frequência do meu Portal Gun e a frequência coletiva de todos do colégio...você causou um desajuste na escola toda. Não, talvez na cidade toda.

—Do que está falando? - perguntou Vitor, realmente se sentido desesperado.

—É uma reação em cadeia...uma vergonha grande, uma frequência desajustada aqui, uma frequência desajustada ali, mudança na estrutura eletromagnética da Terra...é só uma questão de tempo para o campo magnético terrestre se desorganizar e dar margem para tempestades solares, em outras palavras.

—Em outras palavras? - repetiu Vitor.

—A Terra será destruída – disse Estrela – E não há nada que possamos fazer!

—Espera aí! A Terra vai ser destruída por que a Bruna fez a Priscila pagar um mico? Só por isso? - perguntou Vitor, cada vez mais desesperado.

—Foi um efeito dominó. Culpe as emoções humanas por isso – disse ela.

—Mas isso aconteceu por que o seu Portal Gun também estava no meio, não aconteceu? - perguntou Vitor.

—Deixe de apegar em detalhes...agora... - Estrela tentou falar, mas o colégio já estava ruindo.

—O que é isso? Terremoto? - perguntou Bruna.

—O que está havendo?! - Priscila também parecia desesperada.

—Droga. Acho que só tem um jeito – disse Estrela, agarrando Vitor pela mão e ativando seu Portal Gun.

—O que está fazendo? - perguntou ele.

—Isso é ilegal no meu planeta, mas...é o único jeito de salvarmos a Terra. Vamos impedir isso de acontecer..voltando no passado. Dá para fazer isso com o Portal Gun.

—Voltar ao passado? Mas isso...

* Fim do flashback *

—E foi isso que aconteceu – disse a Estrela do futuro.

—Difícil de acreditar – falei. Mas o que estou dizendo? Já devia ter me acostumado com essas coisas.

—Mas foi isso – disse Vitor – Agora estamos aqui para impedir aquele futuro.

—Só que... - Mabi parecia pensativa – Vocês só impediram Bruna de se desentender com a Priscila, mas...o que garante que a Bruna não pode agir do mesmo jeito de novo?

—É – disse Estrela do futuro – Acho que esse é o próximo passo de nossa missão.

—Próximo passo? - perguntou o Vitor do futuro.

—Sim. Vamos destruir o áudio que Bruna tem gravado. É o único jeito de impedir aquele evento – confirmou a Estrela do futuro.

E mais uma vez, temos uma missão.