Crise 24 - Sistema Virtual de Testes

Sexta-feira. Última aula. Seria uma sexta normal se o professor de química, responsável por essa aula, tivesse vindo. Não veio. Ao invés disso, o professor de informática o substituiu e pediu que fizéssemos uma enorme animação com bonequinhos palitos (bem, não era aula de artes). Acho que nunca comentei com vocês, mas sou péssimo com computadores. Quer dizer, até que sei usá-los bem para entrar na internet ou jogar alguma coisa, mas como ferramenta de trabalho...sou uma lástima.

Estrela, minha amiga de outro planeta, estava do meu lado na sala de informática pesquisando alguma coisa, apenas esperando que eu terminasse. O professor disse que quem acabasse a tarefa poderia ir embora mais cedo. Quase a sala toda havia acabado, menos eu e...o veterano Caio, que também estava em uma máquina próxima fazendo alguma outra coisa. Mas eu precisava me concentrar no meu trabalho. Estava quase acabando.

– Essa aula é um tédio - comentou Estrela - Como vocês conseguem usar computadores tão atrasados? Eles nem tem reconhecimento biométrico. No mínimo, podiam reagir ao movimento dos seus olhos.

Desculpe por não sermos uma civilização hiper-avançada como a sua. Mas eu não podia ligar para isso. Precisava terminar antes do sinal tocar e...é, ele havia tocado.

– Muito bem - disse o professor para os remanescentes - Tempo acabado.

– Ah, mas eu já estava quase terminando... - reclamei.

– Olha, eu preciso sair correndo - disse o professor - Bom, vocês são alunos confiáveis...acho que não tem problema deixá-los aqui na sala até terminar a tarefa, não é? Deixem o arquivo na parte compartilhada quando acabarem, ok? Vou indo nessa. O monitor do horário da tarde deve chegar só depois da uma e meia.

Ufa. Ser um bom aluno tem suas vantagens. Apenas o veterano Caio, Estrela e eu ficamos na sala.

– Tarefa? - perguntou o veterano.

– S-Sim. É o que estamos fazendo agora, não é? - respondi.

– Na verdade, eu passei a aula toda assistindo esses vídeos. Muito engraçado! - respondeu ele, sem um pingo de preocupação. Vi na tela e ele de fato estava vendo videos de animação sem legenda. Além do fato de me perguntar como ele estava entendendo alguma coisa de um vídeo sueco, eu me perguntava como ele era tão calmo.

– Como?! Mas precisamos entregar essa tarefa e...

– Se não me engano, o professor não disse em nenhum momento que valia nota - lembrou Estrela.

– M-mas, mesmo assim...preciso terminar! - era uma questão de honra para mim terminar uma tarefa que comecei. E agora faltava pouco. Assim que voltei meus olhos para o monitor, Mabi e Eduardo entraram na sala.

– Oh, vocês por aqui - disse ela.

– Mabi! - falei, sorrindo de orelha a orelha.

– Como vão? - cumprimentou Eduardo.

– E Eduardo... - cumprimentei, desfazendo meu sorriso de orelha a orelha.

– Não tem nenhum monitor ainda? Precisava imprimir um documento da minha mãe - disse Mabi.

– Talvez seja melhor passar em uma xerox mesmo - sugeriu Eduardo.

– Ah, aqui na sala de computadores seria mais prático - reclamou Mabi - E vocês? O que estão fazendo?

– O professor de biologia faltou e tivemos aula de informática. Estou terminando uma animação que ele pediu - respondi.

– Nossa. Você levou a aula inteira para fazer? Deve ser difícil - falou Mabi.

– Ridiculamente fácil. Mas o Vitor não parece ser bom com computadores - respondeu Estrela.

– Não precisa falar assim - reclamei - Além disso, eu já estou acabando. Falta só salvar na pasta compartilhada.

– Então faça logo isso. Quero ir para casa - disse Estrela.

Salvei e fechei o programa. Agora era só desligar a máquina.

– Vai logo - continuou Estrela.

– Calma. Já estou desligando - mas ao falar isso, percebi que cliquei em um outro ícone da tela, muito próximo do botão Iniciar, que abriu um outro programa - Opa, esperem. Cliquei em outro programa sem querer.

Estranhamente, enquanto o programa abria, a porta da sala fechou sozinha.

– Hã? O que aconteceu? - estranhou Mabi.

Eduardo foi até a porta e tentou abri-la. Não teve sucesso.

– Está trancada - disse ele, tentando forçar a fechadura - Isso é estranho. Nem chave a porta tem.

– Ai, precisamos avisar alguém - disse Mabi - Temos como avisar a secretaria ou a portaria da escola?

– Esperem - disse Estrela, percebendo que seu celular começou a tocar - Tem alguma coisa estranha aqui.

De repente, todos começaram a ouvir uma voz. Era um tipo de voz digitalizada, que não sabíamos direito de onde estava vindo.

– Cinco jogadores. Condições mínimas cumpridas. Inicializando SVT avançado.

– SVT avançado? Impossível! - disse Estrela espantada.

– O que é um "Ésse - Vê - Tê"? - perguntou veterano Caio.

– Sistema Virtual de Testes - respondeu Estrela - E pelo modo que está ocorrendo, é mesmo o que estou pensando.

– Dá para explicar melhor o que é? - perguntei.

– O ícone que você clicou...deve ter acionado o SVT. É mais do que um programa. É uma inteligência artificial alienígena que pode controlar toda a informação em um dado território que, no caso, é esse sala. Droga, de algum jeito essa coisa foi instalada aí.

– E-espera - gaguejou Mabi - Como você sabe tudo isso?

– Resumidamente eu sou uma alienígena que está investigando invasões nesse planeta. Mas não se preocupe, apagarei sua memória assim que tudo isso acabar - disse Estrela, sem o mínimo de cuidado com o psicológico da garota.

– Não podia ser mais delicada? - falei.

– Ai, ai. Achei que podia preservá-la disso - lamentou Eduardo.

– Espera. Você sabia disso? - perguntou Mabi.

– Não contei nada para protegê-la - disse Eduardo - Mas é verdade...alienígenas estão invadindo nosso planeta disfarçadamente.

– E por que vocês não tiveram a memória apagada? - perguntou ela.

– Bem, aconteceram algumas coisas - tentei falar, mas Estrela me interrompeu na mesma hora.

– Não é hora para ficar falando disso - reclamou ela - Estamos com problemas maiores. O SVT travou essa sala completamente.

– E o que diabos essa coisa faz? - perguntei.

– O SVT? Como eu falei, é uma inteligência artificial criada para manipular a informação de um dado território. Uma certa civilização o criou para fins de treinamento militar.

– Treinamento..militar? - repetiu Mabi, já quase chorando de medo.

– Acalme-se - disse Eduardo, abrançando-a - Vamos dar um jeito nisso. Estrela é uma especialista.

– Especialista? Mas ele não tem a nossa idade?

– Sim. Mas sou uma ecologista formada - disse ela - Se bem que, esse problema não é exatamente ecológico.

– Como assim? - perguntei.

– Para uma inteligência artificial chegar aqui, necessariamente tem que haver transmissão de informação. Ou isso chegou até aqui por alguma frequência eletromagnética ou...alguém instalou essa coisa na rede da escola intencionalmente.

– Mas nossa escola teria capacidade de rodar um programa alienígena? - perguntou Eduardo.

– O SVT é uma inteligência artificial, não é um programa qualquer. Ele só precisa aprender como funciona o sistema de informações local e se integra a ele facilmente. Qualquer máquina com um mínimo de poder computacional conseguiria rodá-lo.

– Entendo. No fim, todos os computadores digitais são manipulações de informação binária. Não seria difícil aumentar sua capacidade computacional com uma inteligência apropriada - comentou Eduardo. Aquilo não era hora de falar difícil.

– Mas logo o monitor da tarde vai chegar, não? - falei - Ele vai tirar a gente dessa.

– Você não ouviu o que eu disse? O SVT manipula as informações do local. Se não sairmos do programa, ele não vai deixar ninguém entrar e ninguém sair daqui - disse Estrela.

– E como saímos dele? - perguntei.

– É um programa de testes para militares, então...o programa termina se passarmos nos testes - disse Estrela.

– Não tem um Ctrl + Alt + Del, não? - insisti em perguntar.

– Treino militar exige disciplina, Vitor. Não pode simplesmente desertar - falou Estrela.

– Mas como vamos fazer um treino militar nessa sala? - perguntou Mabi.

– Já vou descobrir - disse Estrela, praticamente me empurrando da cadeira e verificando a tela do computador. Ela clica na próxima tela e a imagem de cinco pessoas de mãos dadas aparece.

– Descobriu alguma coisa? - perguntou Eduardo.

– O teste exige um número mínimo de pessoas, cinco pessoas e é o que temos aqui. O primeiro passo para acessarmos o programa é nós cinco formarmos um círculo. Deem as mãos.

Dar as mãos? Sei que era um caso de crise, mas essa era a oportunidade que eu tinha de...sim, ficar de mãos dadas com a Mabi. Quando isso iria acontecer de novo?

– C-Certo - falei, segurando as mãos de Mabi na mesma hora. Ela sorriu meio nervosa para mim, enquanto já segurava a mão de Eduardo. O problema é que a outra pessoa a segurar minha mão era..

– Não sei bem o que é isso, mas parece divertido. Hehe! - disse Veterano Caio, praticamente esmagando minha pobre mãozinha esquerda.

– Tudo bem. Formamos o círculo. E agora? - perguntou Mabi.

– Agora o programa do SVT vai interligar nossas mentes para acessarmos os testes juntos. Apenas não soltem as mãos por nada e fechem os olhos.

Fechei os olhos e senti como se estivesse mergulhando em grande vórtice de 0s e 1s verdes. Quando finalmente a situação se acalmou, ouço uma voz digitalizada me pedindo para abrir os olhos.

– Por favor, abram os olhos - disse a voz. Faço isso e apareço em uma enorme sala branca.

– O-onde eu estou?! - disse, espantado, ao me ver ali, junto com os outros naquele local misterioso. Que tipo de teste iremos passar ali?