Alien Panic escrita por Metal_Will


Capítulo 17
Crise 17 - Acabou o fermento




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/645979/chapter/17

Crise 17 - Acabou o fermento

Estava um pouco ansioso, ou melhor, muito ansioso. Mesmo assim, fiz isso. Sim, toquei a campainha. O som delicado de um sino soou por todos os cantos e logo a porta se abriu. Era ela. Mabi estava ali, bem na minha frente.

– Bom dia - disse ela, sorridente e meiga como sempre - Fico feliz que tenham vindo!

– B-Bom dia - gaguejei.

– Obrigada pelo convite - agradeceu Estrela, que estava ao meu lado, de modo cortês, mas não muito caloroso.

Sim, estávamos na casa da Mabi. Ultimamente tenho feito muitas visitas para colegas de escola, não é verdade? Se bem que dessa vez eu estava lá por vontade própria. Mas você deve estar se perguntando o motivo de estarmos ali. Bem, tudo começou no meio da semana, antes de um feriado prolongado, quando Mabi nos convidou para almoçar em sua casa e também ajudá-la a se preparar para um concurso que haveria naquele final de semana. Mabi era uma descendente de uma família italiana (Maria Gabriela Fontana, não podia ser diferente) que, por tradição, sempre participou de um concurso de pizzas entre famílias que é realizado anualmente na nossa região. Naquele ano, ela finalmente iria participar preparando a pizza da família. E parecia bem ansiosa com isso. Para tornar as coisas mais divertidas, ela convidou a mim e Estrela para ajudar com o preparo, embora não soubéssemos quase nada de culinária.

– Eu que agradeço por terem vindo - disse Mabi, puxando-nos logo para dentro. Nunca tinha vindo na casa de Mabi, então tudo era bem novo para mim. O lugar era bem grande (não tanto quanto a casa de Bruna) e tinha um pequeno jardim muito bem cuidado. Mas, pelo visto, o cômodo mais bem trabalhado era a cozinha. Sem dúvida, era onde a família passava a maior parte do tempo. A cozinha já era visível assim que entramos pelo corredor principal da casa. Nunca fui na casa de Mabi, mas pelo que eu me lembro, ela tinha uma irmã mais nova e um irmão mais novo, além de seus pais serem ambos descendentes de italianos. Só que a casa parecia vazia naquele dia.

– Fiquem à vontade - prosseguiu Mabi. Agora que eu havia percebido que ela estava usando um avental e estava com um pouquinho de farinha no nariz (isso só a deixava mais fofa) - Minha família toda saiu para aproveitar o feriado, mas eu tenho que fazer a pizza desse ano me deixaram aqui.

– Sério? Não vai ficar muito sobrecarregada? - questionei, enquanto entrava na casa.

– Eu cozinho desde pequena. Mas nada que exigisse tanta responsabilidade - disse ela - É a minha chance de mostrar como melhorei. Se eu ganhar o concurso, melhor ainda!

Mabi sempre trazia algumas coisas que preparava para a escola e sempre era muito bom. Acredito que ela tem muitas chances de ganhar o concurso. Estrela não dizia nada, mas Mabi fazia de tudo para deixá-la à vontade.

– Não faça cerimônia, Estrela. Fique à vontade. Eu já estou preparando a massa. Desculpem aparecer assim cheia de farinha.

– Farinha? Oh, entendo, é esse pó branco que está na sua cara, não é?

– É - disse Mabi, meio que estranhando a reação de Estrela - Farinha é o que não falta nessa casa.

– É um ingrediente bem arcaico, sem dúvida - comentou Estrela, pensativa com as mãos no queixo.

– Como? - estranhou Mabi.

– Não é nada, não - tentei desconversar - Mas e aí? Como você pretende fazer a pizza?

– Bom, estou fazendo a massa primeiro - disse ela - Depois eu jogo o molho, o queijo e coloco para assar. Mas ainda preciso decidir o sabor.

– Bom dia - disse outra voz conhecida, se aproximando dali. Uma voz que eu preferia que não estivesse ali, mas estava. O que eu podia fazer? Ele precisava estar ali! Sim, estou falando do namorado dela, o Eduardo.

– Amor. Conseguiu achar? - disse Mabi.

– Sim. Realmente estava na gaveta de ferramentas lá do fundo - disse Eduardo, mostrando uma espátula.

– Sabia que ela estava lá. Essa espátula é muito boa. Ainda acho melhor do que essa nova - complementou Mabi.

– E aí? Como vão? - perguntou Eduardo. Estrela apenas acenou com a cabeça. Eu ofereci minha mão, que foi apertada gentilmente.

– Então também veio ajudá-la a preparar a pizza? - perguntei.

– Eu? Apenas posso ajudar em algumas coisas. Cozinhas é especialidade da Mabi. O melhor que posso fazer é não atrapalhar.

– Afinal, o que podemos fazer para ajudar? - perguntei.

– É que posso precisar de uma ou outra coisa enquanto preparo - falou Mabi - Mas cozinhar é comigo mesmo. E também é mais divertido cozinhar com mais gente em volta.

– É compreensível, afinal, cozinhar não deixa de ser uma tarefa altruísta - comentou Eduardo.

– Como? - indaguei.

– Via de regra, as pessoas cozinham para outras pessoas também apreciarem o que foi preparado. Cozinhar bem significa preparar um prato que o maior número de pessoas goste. Você faz algo pensando no prazer do próximo.

Nunca tinha pensado por esse lado. De fato, é bem melhor comer algo gostoso do que simplesmente comer por comer ou para matar a fome. E Mabi parecia ser o tipo de pessoa que gostava muito de cozinhar. Isso era perceptível no modo com que ela trabalhava na cozinha.

– É verdade. Amo quando as pessoas gostam do que eu cozinho - disse Mabi, concentrada em preparar a massa da pizza - E pizza é um dos meus pratos preferidos. Se eu ganhar esse concurso, aposto que meu sonho vai ficar bem mais próximo.

– Seu sonho? - perguntei.

– Quero abrir meu próprio restaurante. E se for uma pizzaria, melhor ainda! - disse ela.

– Que demais! - falei, entusiasmado. Isso me fez admirá-la ainda mais, afinal, eu ainda não tenho um sonho. Na verdade, não tenho muita ideia do que quero fazer da vida. Mas meus pensamentos foram interrompidos por Eduardo.

– Creio que uma pizzaria faria bastante sucesso - comentou ele - Pizzas são pratos apreciados pela humanidade há muitos anos.

– Imagino - comentei, embora já soubesse que aquele comentário não iria acabar tão cedo.

– A maioria das pessoas considera a pizza uma invenção exclusivamente italiana, mas civilizações antigas como egípcios e fenícios já assavam misturas de trigo, amigo e água, além de já colocarem alguma cobertura, quase sempre carne e legumes em cima delas. Mas é verdade que a pizza como a conhecemos hoje foi popularizada na Itália.

– Oh, entendo - disse Mabi, que havia parado de mexer a massa para ouvir o namorado - Quase nunca algo é totalmente novo, né?

– Sim, isso mesmo - continuou Eduardo - Vocês já pararam para pensar que toda ideia nova nunca é completamente nova? Toda ideia sempre é originada de relações estabelecidas entre aquilo que você já viu ou vivenciou. Uma ideia sempre deve alguma coisa para o passado. Mas, é claro, isso não desmerece a criatividade das pessoas. Alguém precisa estabelecer relações das coisas que já existiam pela primeira vez.

– Acho..que entendi - falei, embora quase sempre fosse muito difícil de acompanhar o que Eduardo falava.

– Mesmo assim quero ter ideias novas - disse Mabi - Uma outra vontade que eu tenho é criar uma sabor de pizza novo. Algo diferente, que as pessoas gostem. Espero que encontrem ingredientes novos para isso.

– Interessante - balbuciou Estrela - Essa busca por novidades é que faz a população de um planeta se desenvolver.

– É? Não pensei algo tão profundo assim. Só queria ver algo novo mesmo - disse Mabi. Lembrando que Mabi não sabia que Estrela era uma alienígena. Eduardo conhecia nosso segredo e sorriu para mim ao ouvir aquilo. Eu só queria que as coisas continuassem tranquilas. Foi aí que Mabi soltou um grito de espanto ao abrir o armário.

– O que aconteceu? - respondi, preocupado, quase caindo do banquinho onde estava sentado.

– Acabou...o fermento - disse ela. Ah, então era isso? Não era tão grave assim.

– Que coisa! Eu jurava que ainda tinha - reclamou ela - Preciso comprar mais.

– Não se preocupe, amor - disse Eduardo (preferia não ter ouvido a palavra "amor" aí, mas...) - Podemos ir comprar mais.

– Sim. Pode deixar com a gente.Você só precisa de um potinho, não é?

– Na verdade, um tablete. Uso fermento biológico para massa de pizza - disse ela.

– Fermento biológico? - repeti.

– Há uma distinção entre fermento biológico e químico - disse Eduardo, mais uma vez iniciando um de seus discursos - Fermentos químicos são constituídos de substâncias químicas que agem no crescimento da massa enquanto ela é aquecida. Já fermentos biológicos são constituídos de fungos microscópicos que possibilitam o crescimento da massa antes de ser levada ao aquecimento. Pizzas costumam usar fermento biológico, que costuma ser vendido em tabletes.

Pelo que entendi, o fermento que eu estava pensando não é usado nas pizzas. De qualquer maneira, só precisávamos ir ao mercado comprar o tal fermento, não é isso?

– Vocês fariam esse favor por mim? - disse Mabi - Acho que é a única coisa que preciso. Enquanto isso, vou arrumando outras coisas na casa.

– Não quer que eu fique aqui para ajudar? - falei (espero que não tenha soado oferecido). Ora, preciso aproveitar as oportunidades, não é?

– Não precisa - disse Mabi - Além disso, vai ser legal para você e a Estrela conhecerem o bairro.

– Ah, então tá - falei, meio desapontado. Não demorou muito para estarmos no caminho do mercado. Eduardo parecia sorridente e tranquilo como sempre.

– Estava pensando. Se civilizações antigas já faziam pizza de um certo modo, será que pizza também é algo que existe em outros planetas? - disse ele. Embora não olhasse para Estrela, era óbvio que estava falando com ela.

– Sim. Embora o nome possa variar dependendo da localização, o padrão é o mesmo. Mas tem todas tem formato de disco. Algumas podem ter formato cilíndrico ou esférico. Depende muito da tecnologia gastronômica aplicada.

– Tecnologia gastronômica? - perguntei.

– A tecnologia também influencia na culinária. Basta pensar na evolução dos fogões de lenha para os fornos a gás e depois para os fornos de microondas - disse Eduardo - Imagino que a culinária em outros planetas deva ser bem interessante.

– Não só isso. Os ingredientes também são bastante variados - disse Estrela - Aliás..

Estrela havia parado. Eduardo e eu, que estávamos na frente, nos viramos para trás.

– O que foi? - perguntei.

– Mabi mencionou que tem o sonho de criar uma pizza com um sabor único, não disse? - dizia Estrela, pensativa, com as mãos no queixo - Ao invés de comprarmos um fermento comum, talvez possamos encontrar algo em um Mercado Intergaláctico.

– Mercado Intergaláctico? - perguntei - Está pensando em..

Ela mudou o celular para o Portal Gun e continuou.

– Esses mercados possuem ingredientes de várias partes do universo - disse ela - Certamente encontraremos um fermento muito melhor do que qualquer fermento terráqueo por lá.

– Mas isso não seria trapaça? Se esse ingrediente não existir na Terra e ela vencer, não será uma vitória justa - comentei.

– Entendo seu ponto - disse Eduardo - Mas confesso que adoraria experimentar uma pizza feita com um ingrediente de outra parte do universo.

Não sei bem o motivo, mas acho que ele iniciou essa conversa só para ter uma oportunidade como essa. Já eu, estava mais preocupado com o que aconteceria com Mabi no concurso.

– Ora, o ingrediente é apenas parte do processo. Se o cozinheiro for ruim, não importa de onde venham os ingredientes, o prato sairá ruim de qualquer maneira - comentou Estrela - Além disso...

– Além disso? - repeti, atentando para a pausa dela.

– Faz tempo que não como uns doces do planeta Sweetia e que vendem muito barato no Mercado Intergaláctico.

Sabia que deveria ter algum outro interesse por trás.

– Tá...tá legal. É seguro ir nesse mercado?

– É bem mais avançado que a Terra. Claro que é mais seguro - disse ela, sem perder uma oportunidade de avacalhar com nosso planeta, é claro.

– É uma oportunidade e tanto, não acha, Vitor? - perguntou Eduardo.

– Mas voltamos logo, não voltamos? - perguntei.

– Temos uma Portal Gun. Distância não é problema - confirmou Estrela. O que eu podia fazer?

– Ah, tá bom, vai. Vamos nessa.

– Decidido - Estrela usou o Portal Gun, abrindo um buraco de minhoca para o tal mercado. O que será que encontraremos por lá?


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!