Alien Panic escrita por Metal_Will


Capítulo 16
Crise 16 - O Quarto Lixeira




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Crise 16 - O Quarto Lixeira

– Diga, Vitor - respondeu Estrela, assim que atendeu o telefone. Não parecia estar de muito bom humor.

– E-Estrela - falei, meio receoso de ter ligado assim tão de repente - Sei que está ocupada com seus relatórios, mas você precisa ver isso aqui!

– Ver o quê? - ela perguntou, já meio impaciente.

– É algo muito fora do comum. Precisamos de você.

– Precisamos? Espera...o que você falou para o Caio? - ela parecia nervosa.

– Não é bem o que eu falei, mas é algo que aconteceu no próprio quarto dele e...ei!

Veterano Caio estava entrando no quarto sozinho, mas tentei puxá-lo.

– Não entre aí antes da Estrela chegar! Pode ser perigoso! - reclamei.

– Mas e se Nárnia estiver do outro lado? - argumento ele.

– Quer que eu vá aí? - perguntou Estrela, ouvindo o que eu acabara de dizer - Afinal, o que está havendo?

– Não adianta. Você tem que vir para cá mesmo. Espere...eu vou te passar o endereço.

Perguntei o endereço para o Veterano, mas ele não se lembrava de cabeça. Por sorte havia uma conta de telefone de três meses atrás ali por perto e pude dar a informação para Estrela. Com isso ela já poderia dar um jeito de achar as coordenadas para chegar até a casa dele. E, de fato, foi o que aconteceu menos de um minuto depois de eu desligar meu celular. Ela realmente usou o Portal Gun para chegar na casa do veterano e o usou bem demais...a ponto de surgir logo acima de mim, quase esmagando meu próprio corpo.

– E-Estrela. Então você veio - falei, embora ela estivesse sentada em minhas costas.

– Calculei mal por alguns milésimos - disse ela - Devia ter caído alguns centímetros à esquerda. Mas, enfim, estou aqui.

Por sorte, Veterano Caio estava distraído olhando para dentro de seu quarto que nem viu Estrela chegando. Mas ao vê-la, não se surpreendeu tanto.

– Boa tarde - disse Estrela, cumprimentando o Veterano Caio sem muita cerimônia.

– Ué? Você é a Estrela da minha sala, não é?

– Sim. O Vitor me chamou para ver o problema. O que está acontecendo?

– Bem, dá uma olhada no meu quarto...

Incrível como ele sequer questionou o fato de Estrela ter chegado, do nada, segundos após eu desligar o telefone. Mas o problema era incomum mesmo. Vamos recordar: Veterano Caio não entra no próprio quarto há meses e, agora que se resolveu entrar, parece que ele havia aumentado por dentro. Era o mesmo esquema da casa de Estrela, mas Caio não tinha a menor ideia de como aquilo pode ter acontecido.

– Então..o seu quarto está bem maior do que deveria - disse ela.

Não só isso. Estava extremamente bagunçado. A quantidade de lixo e tralhas ali dentro era gritante. Como alguém conseguia sobreviver assim?

– O espaço simplesmente dilatou - falei - Isso pode acontecer?

– Não só o espaço. Parece que a quantidade de coisas no quarto também cresceu na proporção do espaço. Muito estranho - disse ela, colocando a mão no queixo de forma pensativa.

– Sei lá - disse Veterano Caio - Só não entro aí há uns três meses e agora está assim. Minha cama ainda está aí?

– Expansão espacial não é algo natural - disse Estrela - Se isso aconteceu, foi por causa de alguma coisa especial...ou alienígena.

– Alienígena? Caraca! Que louco! - disse Caio, já se animando. Não sabia que pessoas com 18 anos ainda se empolgavam com esses assuntos.

– O que você acha que pode ser? - perguntei.

– Não sei, mas pretende descobrir - disse ela, entrando no quarto sem um pingo de medo. Caio também entra animado, enquanto eu, bem, eu devia ser o único dos três realmente com medo.

Conforme andávamos, a luz da lâmpada não iluminava mais. Estrela usou a função lanterna do Portal Gun para iluminar o caminho. Andamos pelo quarto por uns dez minutos e víamos todo o tipo de coisas bizarras. Eram caixas, pedaços de metal, molas, bastões, cadeiras esquisitas. Muita coisa certamente nem era da Terra. Como aquilo tudo foi parar no quarto do Veterano Caio?

– Eita, olha só! Uma cama elástica! - disse ele, assim que viu uma dessas camas jogadas ali no caminho - Sempre quis pular numa dessas.

E ele não demorou muito para experimentar o novo brinquedo. Ele parecia estar se divertindo. Mas Estrela continuou andando.

– Ei, espera! - falei, não sem antes me virar para o veterano - Veterano Caio! Vamos logo! Ou vai acabar se perdendo!

– Ah, que chato. Queria pular mais.

Estrela continuou nos guiando. Só que aquilo estava enorme demais. Parece que a expansão espacial no quarto do veterano não tinha mais fim. O que estava acontecendo?

– Será que isso não acaba, não? - perguntei.

– Precisamos achar alguma instabilidade no ambiente do quarto - respondeu ela - Tenha paciência. Só estamos andando por uma hora.

– Uma hora? Puxa, o tio do veterano vai ficar preocupado - lembrei.

– Relaxa. Se não atendermos na hora que ele nos chamar, no máximo ele vai comer o almoço dele e deixar as panelas em cima do fogão para comermos depois. Ele não perde a soneca da tarde por nada.

– Acha muito? Dependendo da expansão espacial desse quarto podemos andar aqui por milênios e não chegarmos nem na metade da metade.

– É possível fazer isso?! - fiquei espantado.

– Dependendo da fonte da expansão, sim. Mas...

Estrela foi interrompida por um ataque voador. Ao ver isso eu praticamente pulei no colo do veterano. Era uma barata voadora. Tive o desprazer de vê-la com a luz da lanterna.

– Que droga, uma barata - disse Estrela, desgostosa, embora não muito expressiva - Está com medo, Vitor?

– M-medo? Não, eu só...não gosto desse bicho! - reclamei.

Estrela apenas usou o Portal Gun na barata e a mandou para algum lugar. Ainda bem que ela podia usar o portal sem desligar a luz da lanterna ou teríamos problemas.

– O que você fez? - perguntei.

– Apenas mandei ela para alguma região qualquer do universo - respondeu ela, transformando a arma em um celular novamente (Veterano Caio não parecia nem um pouco espantado com isso) - Esses bichos existem em praticamente qualquer lugar que permita vida.

– Sério? Também tem baratas em outros planetas?

– Claro. Inclusive existe um planeta habitado só por elas. Algumas chegam a crescer mais de dois metros. É horrível ter que fazer trabalho de campo lá.

Odiava baratas. Só de saber que elas existem em todo canto do universo já me deixou extremamente incomodado. Mas algo me distraiu desse pensamento. Mais precisamente uma musiquinha. E não era nenhum de nós que estava cantando (por mais que o Veterano Caio cantarolasse alguma coisa de vez em quando, agora não era ele). Estrela olhou para o lado e viu um rato. Sim, um rato. Ele usava um tipo de gravata borboleta e carregava algumas caixas.

– O rato...tá cantando? - perguntei.

– Ah, isso sim é algo novo - disse Estrela. Assim que o roedor percebeu nossa presença, se assustou e derrubou suas caixas.

– Ai, caramba - disse ele, se levantando rapidamente e saindo correndo.

– Droga. Não deixem ele fugir! - disse Estrela, correndo atrás do bicho. O que podíamos fazer? Fomos atrás dele também. Bem, prefiro enfrentar ratos do que baratas.

– Nunca vi rato cantando. Nem sabia que eles podiam cantar - falou Caio.

– Bem, acho que os ratos desse planeta não cantam mesmo.

O ratinho ficou encurralado em uma pilha de pneus (sim, pneus!). Estrela não parecia cansada, ao contrário de mim. Mas o rato não desistiu. Ele agarrou um dos pneus e jogou em nós. Mas Estrela foi mais rápida e usou a função laser do seu Portal Gun para destruir o pneu. O lugar ficou cheirando pneu queimado. O rato estava mais apavorado do que nunca.

– Não, por favor. Não me matem - disse ele - Eu só estava arrumando minha mudança.

– Mudança? - perguntou Estrela - De onde você veio, afinal?

– Meu nome é Morgan, sou do planeta Mouse - disse ele. O nome não pareceu muito surpreendente.

– Mouse? Nunca ouvi falar - disse Estrela. Então tinha muitos lugares do universo que ela não conhecia.

– O custo de vida naquele lugar estava ficando muito caro - disse ele - Eu já estava para ser despejado do meu apartamento, quando, de repente, abriu um portal na minha casa direto para esse lugar. No começo eu desconfiei, mas o mais estranho é que o portal ficou aberto o tempo todo....era quase como um convite para mim. Eu vi esse local por dias e nada mudava. Era como se estivesse vazio. Certo dia eu resolvi xeretar e descobri que tinha ar respirável. Era minha salvação! Comecei a me mudar para cá antes que fosse despejado. Só queria começar uma nova vida em um novo planeta.

– O portal ficou aberto o tempo todo, heim? Entendo...os casos de buracos de minhoca para esse planeta tem crescido cada vez mais - disse Estrela - Mas isso não explica o fato do espaço do quarto ter sido expandido.

– Bom, isso eu também não sei. Só sei que era minha salvação. O lugar é enorme e novas coisas apareciam o tempo todo, incluindo comida - continuou o rato.

– Comida? - perguntei.

– É. Ele tem razão. Saca só esse pedaço de pizza aqui - disse Veterano Caio, mostrando um pedaço mordido de pizza velha.

– Nojento. Deixa isso aí, Caio - falei.

– Ué? Para mim está de ótimo tamanho - argumentou Morgan.

– Porque você é um rato! - reclamei.

– Rato? Sou um mouseano! Tá certo, um mouseano desempregado, mas ainda tenho o meu orgulho!

Estrela parecia pensativa.

– Coisas aparecendo o tempo todo - disse ela, como se falasse em voz alta - A maioria tralhas...oh, sim, claro. Deve ser isso.

– O quê? - perguntei.

– O quarto do Veterano Caio deve ter atingido um nível gigasanitário de entropia.

– Nível giga o quê do quê? - Caio indagou.

– Nível gigasanitário de entropia - repetiu Estrela - Bem, entropia é uma medida para o nível de desorganização de um sistema. O volume total desse quarto pode ter vários valores de entropia para os objetos macroscópicos que você coloca nele, como camas, armários, objetos e coisas do tipo. Mas o Veterano Caio conseguiu alcançar um nível de bagunça ou entropia maior do que qualquer outro lugar do planeta. Se fosse um local aberto até que não seria tanto, mas em um quarto fechado desses...a entropia ficou absurdamente alta.

– E daí? - perguntou o veterano.

– Acontece que algumas empresas espaciais de recolhimento de lixo sempre procuram locais com nível alto de entropia para torná-los novos depósitos. Locais assim são considerados pontos de entropia gigasanitária. Eles usam o sistema de expansão espacial para jogar o lixo lá, afinal, se já está tão bagunçado, um pouco a mais de lixo não faria diferença.

– Então eles procuram lugares já poluídos para poluir mais? - perguntei.

– Sim. Basicamente isso. Eles deixam o lugar maior para jogar cada vez mais lixo. Imagino que o quarto do Caio tenha aparecido para uma dessas empresas por causa dos buracos de minhoca instáveis e eles não perderam tempo em jogar tudo aqui.

– Não tem lugares mais apropriados para jogar o lixo? - indaguei injuriado.

– Bem, o código de preservação espacial diz que o ideal seria jogar o lixo em estrelas como o Sol de vocês ou mesmo em buracos negros. Mas se aproximar desses lugares é perigoso, então eles preferem simplesmente encontrar outras possibilidades.

– Mas justo no quarto de uma pessoa? Não tem milhões de planetas desabitados por aí?

– Sim. Aliás, vários deles também são depósitos de lixo, mas acredito que eles já tenham pensado que o quarto era um depósito de lixo e só quiseram expandi-lo.

– Uau! Meu quarto é mais louco do que eu pensava - disse o Veterano.

– Não se preocupe. Mandando uma mensagem para a central do Setor Z, todas as empresas de recolhimento de lixo espaciais serão comunicadas e terão que cancelar a operação se não quiserem pagar uma multa - disse Estrela, pegando seu celular nas mãos - E você, Morgan...

Mas assim que ela jogou a luz da lanterna, Morgan, o mouseano, havia sumido. Onde ele foi parar?

– Droga. Escapou - disse Estrela.

– E o que a gente faz agora? - perguntei.

– Vou mandar a mensagem - disse ela - Depois disso, basta aguardarmos que a própria empresa mandará um agente autorizado recolher todo o lixo daqui e desligar o sistema de expansão espacial.

– Quanto tempo isso demora? - indaguei.

– Deve demorar pelo menos uma semana - disse Estrela - Não sei até que ponto o quarto se expandiu, mas não deve ser pouca coisa. Não poderá entrar no seu quarto durante esse período, Caio.

– Beleza - disse ele - Tô dormindo no banheiro mesmo.

– Como? - estranhou Estrela.

– Costume da casa - tente disfarçar - Bem, agora o jeito é voltar, né?

– Isso é fácil - disse Estrela - É só usarmos o Portal Gun.

Finalmente uma coisa fácil. Ainda bem que a volta foi bem mais fácil que a ida. Caímos bem no meio do corredor, diante da porta do quarto. Primeiro Estrela, seguido de mim, do veterano e do...Morgan?

– Oi, gente - disse o mouseano, ao cair bem em cima da minha cabeça.

– Morgan! Você não tinha fugido? - reclamei.

– Eu ouvi a conversa de vocês. Se me encontrarem lá, aposto que vão me mandar para o meu planeta e eu não quero voltar lá, não! Prefiro começar tudo do zero aqui mesmo.

– Desculpe, não pode ficar aqui. Esse planeta é atrasado demais para entender criaturas como você - falou Estrela e, de fato, todos iriam confundi-lo com um rato - Vou enviá-lo de volta agora mesmo.

Estrela preparou seu Portal Gun, quando ouvimos a voz de alguém cantando. Dessa vez era o tio do Veterano.

– Cheiro de pneu queimaadooo....carburadoor fracoo...coraçãoo dilaceradooo! - é, ele cantava Ivete Sangalo - Ei, pessoal! Vocês não vão comer, não. O miojo já tá pronto faz o maior tempão!

Essa distração foi suficiente para Morgan escapar pela janela.

– Aquele rato...já fugiu - reclamou Estrela.

– Bom, se virem lá na cozinha. Bom apetite - falou o tio, se dirigindo para o outro lado - Só vim tomar uma água e voltar para a minha soneca.

Que dia! Uma hora inteira andando em um depósito de lixo escuro dentro do quarto do meu colega de sala, conversas com um rato falante, miojo de almoço. Mas o Veterano Caio não parecia ligar muito para isso.

– Caraca, Estrela. Você manja pra caramba dessas coisas do espaço, né?

– Oh, é verdade. Preciso apagar sua memória sobre isso - disse ela.

– Memória? Por quê? Essas coisas vão ensinar na escola de qualquer jeito, não vão? - retrucou o veterano.

– Como? - Estrela fez uma cara de espanto.

– Acho...que ele tem uma visão bem diferente da situação, né? - comentei.

– Entendo - disse Estrela, guardando seu Portal Gun - Apagar a memória dele será desnecessário.

E foi mesmo. No dia seguinte, ele sequer se lembrava do que aconteceu. Depois de eu ter feito o trabalho de geometria sozinho na minha casa (Caio resolveu tirar uma sonequinha depois do almoço e não acordou mais, então acabei indo embora antes), cheguei na escola no dia seguinte totalmente cansado. Mas Caio parecia bem disposto.

– E aí, amigão? - disse ele, batendo nas minhas costas - A gente precisa fazer alguma coisa...só não lembro o quê...

– Err...não seria o trabalho de geometria? - comentei, mostrando o que fiz.

– Cara, você é demais! Eu ia te chamar para ir lá em casa, mas você já fez tudo. Isso que é parceiro!

Realmente, o cérebro dele é bem complicado de entender. Uma semana depois Estrela me avisou que o quarto do Veterano Caio já havia sido arrumado. Parece que tudo deu certo..quer dizer, dentro do possível, não é? Depois desse episódio, nunca mais relaxei na arrumação do meu quarto.


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Notas finais do capítulo

E aí? Como anda o nível de entropia gigasanitária do seu quarto?

É. O Morgan fugiu. Mas espero fazê-lo aparecer em momentos futuros...acho que daria um bom mascote para a história. Hehe.

Até a próxima :)