Contra o Tempo escrita por Giovannabrigidofic


Capítulo 3
Ele: Sobre Lembranças


Notas iniciais do capítulo

Cheguei genteeee! u.u capítulo narrado pelo William (chorem de emoção haha) Boa Leitura



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Salvador, 19 de junho de 1965

Ele

Deixou-se levar pelo sono, tentando esquecer o que tinha visto nas últimas horas.

"Os gemidos e gritos que saiam de sua boca eram horríveis. Ele se contorcia de todas as formas para inutilmente amenizar a dor. Os olhos eram uma mistura de medo."

– Ele era comunista. - Alguém disse.

William abriu os olhos lentamente. Colocou os braços ao redor da cabeça, sabendo que seus movimentos estavam sendo observados pelo colega da cama ao lado.

– Eu sei. - Ele suspirou.

Ele tinha visto rapidamente a tortura ao homem. Entretanto, havia sido o bastante para as imagens do homem sendo torturado, ficassem repetindo-se várias vezes em sua mente. Afinal, além de ser impactante, sua namorada seguia as mesmas propostas - mesmo que em silêncio.

O rapaz não tinha permissão para participar ativamente das seções - para seu alívio -, de acordo com seus superiores, ele ainda era inexperiente. Ele não era frio nem agia sem piedade com as pessoas. Estava lá só para fazer a segurança e ponto.

– Como sabe que eu estava pensando nisso? - William questionou.

– Você tem sorte de eu ser o único militar á te ver espiando pela fresta da porta. Mas acho que com os gritos, todo mundo iria ficar sabendo. - O homem, na faixa dos trinta anos passou a mão pela careca, brilhosa. - Me chamo Lins, Paulo Lins. E você?

– William Borges - ele deu de ombros.

Uma dúvida surgiu em sua cabeça.

– Você participou da execução dele? - Os olhos castanhos dele, olharam o homem com certa curiosidade.

– Não. Pra minha sorte, cheguei esses dias, vim de outra companhia militar, Recife, mas acho que nem percebeu - Paulo sorriu.

– Tem razão.

O peso de culpa por estar ali, novamente preencheu William. Ele estava lá, protegendo as pessoas que matavam outras.

(...)

William balançou a cabeça em negação. Olhou para o corredor vazio e voltou a sua posição. Não era a primeira vez que ele se pegara pensando nela.

Desde que havia sido obrigado urgentemente á ir para o quartel em Salvador, ele não tinha mais contato com a namorada. Ficava imaginando sua preocupação e as perguntas frequentes de Roger.

Não era frio, porém, não chegava perto de ser divertido, muito menos romântico ou dramático. Mas algo além do normal, fazia-o sentir-se especial com ela.

Agora, outro jovem estava sendo espancado.

Agora ele podia comprovar que ela estava certa em odiar o sistema.

***

21 de junho de 1965

Após dois dias de intenso trabalho e treinos, William conseguiu algumas horas extras de descanso. O colega ficaria ainda mais tempo preso no serviço, porém, logo eles poderiam conversar.

William terminou o lanche da tarde e voltou ao dormitório, encontrando outros militares conversando. Ele os ignorou e seguiu até sua cama. Ele se deitou, fechou os olhos, tentando dormir. No entanto, sua dificuldade em se concentrar era imensa; suspirou e pensou em algo bom para pensar.

Ela.

– Soldado Borges? - Alguém o chamou.

William imediatamente abriu os olhos, encarando em seguida um homem fardado. Ele percebeu os olhares dos outros militares em si, mas, não se importou.

– Pois não? - William se pôs de pé, alinhando o uniforme que não havia retirado.

– Militar Alves, vim a pedido do comandante. Onde está o soldado Fernandes? - William franziu a testa.

– Está falando de Paulo? - O militar assentiu. - Ele ainda está em serviço.

– Queira me acompanhar, lhe informaram melhor. - O militar saiu andando para fora do dormitório. William o seguiu.

Na porta dois outros militares aguardavam, com expressões ansiosas. Os quatro atravessaram alguns corredores mal iluminados e sujos. As paredes estavam rachadas, havia urina de rato por alguns cantos do local. William divagava; para ele, aqueles corredores nojentos com certeza eram um dos locais mais limpos que ele já tinha pisado naquele lugar - com exceção da cozinha, dormitórios e o refeitório.

Eles entraram na sala, encontrando mais uma dúzia de outros homens. Todos cochichando.

– Estão todos aqui? - A voz do tenente, era rouca e potente. Era por isso que seu apelido (dado pelas costas) era Trovão. Ninguém o chamava assim diretamente. Joaquim era o tenente mais velho e experiente dentre todos os outros do quartel. William as vezes se pegava pensando no que ele teria e fazia para continuar tanto tempo ocupando seu cargo.

– Falta somente alguns senhor. Irei chamá-los. - Alves disse sem pestanejar.

Alguns minutos de espera e Paulo e outros dois entraram no recinto. Paulo olhou surpreso para William do outro lado da sala e o mesmo deu de ombros.

– Fiquem quietos. Estão parecendo mulherzinhas de fofoca, o que você claramente não são. - O tenente falou. - Chamei-os pois tenho ordens para mandá-los para outra cidade. Minas Gerais está precisando de reforços, mas isso não interessa. Convoquei-os pois achei melhor que quanto mais cedo vocês fossem avisados, melhor. Amanhã mesmo vocês irão para Minas. Arrumem suas coisas, partimos amanhã cedo.

(...)

– Já arrumou sua mochila? - Paulo falou, enquanto William sentava na beliche.

– Sim.

– Está feliz por estar voltando para o mesmo quartel de antes?

– Acho que sim. Não consegui avisá-la de que viria. Acho que a matei de preocupação. - Ele passou a mão nos cabelos cor de mel.

– Quem sabe ela não te perdoa? - Paulo falou, com um sorriso brincalhão nos lábios.

Paulo fechou sua mochila e se jogou contra o colchão coberto pelos lençóis.

" Posso te pedir uma coisa?

– Depende.

– Clara Conrado, minha melhor amiga, a única que me compreende, daria-me a honra de ser minha namorada?"

***

Minas Gerais, 26 e 27 de junho de 1965

Ele

A viagem havia durado dois dias inteiros. De manhã haviam tomado café e passado horas fazendo séries de exercícios.

– Acho que já está bom por hoje - o treinador gordo falou.

William seguiu Paulo até o dormitório, pegou uma toalha e seguiu para um dos boxers do extenso banheiro. Ele tomou uma ducha rápida e colocou seu uniforme.

– O que você tem pra fazer hoje? - Paulo indagou, enquanto caminhavam pelos corredores.

– Recebi uma lista. Daqui uma hora faço a segurança do escritório de um sargento. Depois da troca, vou para as escadas e por fim fico o resto da noite nos dormitórios.

– Qual deles? - Paulo perguntou.

– Enfermeiras.

– Você tem sorte, cara. Ficar olhando aquelas...

– Prefiro nem ouvir. - William adiantou. - Você é um safado.

– Não sou não. Afinal, tenho meus motivos para preferir o dormitório das mulheres. Elas ficam conversando a madrugada inteira, falando sobre todo o complexo. As vezes elas dão gritinhos. Algumas dormem de camisola, outras são mais ousadas e....

– Como sabe de tanta coisa? Pelo que sei, é a sua primeira vez neste quartel.

– Edgar. Edgar Santos.

– Quem?

– Do tamanho de um guarda-roupas, cabelo loiro, olhos azuis. Dizem que ele já ficou com todas daqui.

– Ele está blefando.

– Em que parte?

– Tudo.

(...)

Seu turno já havia acabado fazia dois minutos. William caminhava até o dormitório, os pés pesando no chão.

Cruzou o corredor esbarrando numa garota.

– Militar Borges? - Ela falou, franzindo a testa.

– Sim? - Ele parou de andar.

Ela suspirou e sorriu.

– Que bom que te encontrei, precisamos conversar.

– Pode ser amanhã? Está muito tarde.

– È urgente. Pelo menos pra você.

Ele hesitou por alguns segundos. Não era nem um pouco inteligente confiar numa garota, vestida de jaleco, calça e camiseta brancos e pantufas nos pés.

– Acho que você vai querer ver isso. - Ela tirou um maço de envelopes do bolso e lhe entregou.

– O que é?.

Todas elas estavam endereçadas á ele. Haviam sido mandadas por ela.

– Quando a última carta chegou e procurei por você, fiquei sabendo da sua transferência. Elas - apontou para os envelopes -, não paravam de chegar.

– Agradeço por guardá-las. - Ele disse. Boa noite.

Ele voltou para o dormitório praticamente correndo. Sua respiração estava alterada, seu coração queria pular do peito.

__

Por Clara.

Você deve estar bastante ocupado. Confesso que fiquei bastante receosa em lhe escrever, já que não me mandou resposta. Não quero te atrapalhar. Como está sendo viver ai? Acho que difícil. Ou não. Muitas pessoas morrem? E as torturas? Passamos por muitas coisas, e nunca, nunca mesmo eu desistiria de nós.
Estou com saudades.
Te amamos muito.

__

Toda a culpa, de não ter feito nada para impedir de ir-se embora. Ele queria ter feito mais. Por ela.

Se levantou com as cartas nas mãos, saiu do dormitório e rumou para um lugar próximo ao posto de Paulo.

William, decidido puxou o colega para um lugar mais reservado.

– O que você quer, preciso dormir. - Paulo caminhou. William o puxou pelo colarinho, irritado.

– O que foi? - Ele grunhiu.

– Preciso da sua ajuda. Quero ir embora do quartel. Fugir.


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Notas finais do capítulo

Na minha opnião, um dos melhores caps



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