See The Light escrita por Junebug


Capítulo 4
Capítulo 4




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Maybe I’m crazy

Talvez eu seja louco

Maybe you’re crazy

Talvez você seja louco

Maybe we’re crazy

Talvez nós sejamos loucos

Probably

Provavelmente

(Crazy – Melanie Martinez)

– Você vai me dizer aonde estamos indo?

Nico preferiu deixar que a próxima esquina que viraram respondesse a pergunta.

– Uau! Gostei!

Eles tinham chegado a uma rua de prédios antigos e imponentes que fazia frente para um parque cobrindo toda sua extensão. Do outro lado, o parque se transformava numa espécie de mirante para o mar e a área portuária da cidade.

– Não chega a ser nenhum Central Park, mas é simpático – retrucou Nico.

– Tacos – Will olhou desejoso para quiosque pelo qual passavam no meio do parque.

– Ei, não estamos aqui a passeio.

– Você veio mesmo aqui para procurar um deles? Por quê?

Nico finalmente avistou a silhueta corpulenta que procurava, sentada sozinha num banco ao lado de um caramanchão, virado para o lado da rua. Era um rapaz de pele escura e jeito intimidador, mas tinha um olhar perdido que parecia não enxergar o lugar bonito e todas as pessoas à sua volta.

Nico se aproximou e dirigiu-se a ele bem discretamente:

– Oi, posso falar com você?

O rapaz o olhou, demorando alguns segundos para reconhece-lo.

– Você – ele disse. Falava sem demonstrar qualquer emoção.

Ele puxou um Iphone da jaqueta jeans e disse:

– Tenho que ir para o lago daqui a meia hora para cuidar de alguém que vai ter um infarto fulminante.

Nico se sentou, então, ao seu lado. Will o encarava com os olhos arregalados. Ele, claro, não tinha ideia de com quem Nico estava falando. Nico apontou para o lugar do seu outro lado e disse:

– Sente-se Solace e finja que estou conversando com você. Não vai demorar.

Will, claramente, tinha muitas perguntas, mas abriu a boca, fechou e acabou sentando-se resignado, olhando para Nico, que continuava sua conversa com o rapaz misterioso, olhando para frente, para disfarçar.

– Eu preciso saber se tem algo que você pode fazer por um espírito suicida. Ela era um espírito vingativo, mas acabou mudando...

– Está falando da garota que se atirou da ponte, não é?

– Sim. E desde quando um espírito pode mudar assim?

– Ela era só uma garota... Tomou uma decisão precipitada e depois descobriu que não tinha mais volta. Você não devia se impressionar com isso.

– Certo, e tem algo que você possa fazer, sabe, para leva-la embora?

O rapaz só respondeu depois de um tempo. Nico chegou a virar o rosto na direção dele para ver se ainda estava ali. Seu olhar vazio parecia estar calculando possibilidades.

– Acho que se você conseguir tirá-la de lá, eu posso leva-la – ele disse, por fim. - Não posso faze-la chegar em nenhum lugar muito especial, mas ela vai estar melhor.

– E como eu vou conseguir isso? - Nico perguntou, já sabendo que não ia gostar da resposta.

– Vai ter que convence-la... Acalmar seu espírito o suficiente para que possa ser resgatada.

Nico suspirou. Depois, de certa forma para afastar os pensamentos daquela perspectiva, comentou:

– Eu vim procura-lo, mas não sabia se você ainda estaria aqui. Quanto tempo falta?

– Não sei. Só vou saber quando o tempo chegar.

Então ele ficou de pé.

– Se você conseguir com a garota, eu vou saber e chegarei lá – ele disse, à frente de Nico.

Nico o encarou. Aquele cara com seu porte de boxeador e olhar perdido misterioso o fazia sentir curioso.

– Vou indo – ele completou como despedida, começando depois a se afastar.

– Espere – pediu Nico. O jovem se virou, do seu jeito inexpressivo. – Eh... esse aqui é o Will. – Nico virou um pouco a cabeça para indicar e quase riu da expressão no rosto de Solace, mas continuou: – Ele... por algum motivo, quando... quando me toca, faz os fantasmas se afastarem. Você... você tem alguma ideia do motivo?

O rapaz olhou Will rapidamente antes de dizer:

– Tem uma aura interessante o seu amigo, talvez isso tenha a ver com o motivo, mas eu não sei explicar. Não sei muito sobre os vivos.

– Ah... ok. – Mas ele já estava se afastando.

Nico o observou desaparecer à distância antes de voltar-se de novo para Will. O garoto tinha a boca meio aberta. Seus olhos azuis tentavam captar alguma coisa na direção em que Nico estivera olhando.

– Ele já se foi – Nico falou, fazendo um som de riso com a garganta.

– Quem era?

– Da primeira vez que o vi, ele disse para chama-lo de Auxiliar. Ele não lembra mais o nome que tinha. Ele não lembra de nada da época em que estava vivo... Eu o encontrei por acaso aqui no parque já faz mais de um ano e ele me contou que fez um acordo para auxiliar em questões de morte aqui na Terra por um tempo para poder realizar um desejo pessoal ou algo assim. Ele nem se lembra qual é o desejo. Ele só sabe que deve ser bem importante, porque quis sair de um lugar que era tipo o paraíso em que estava para tentar realiza-lo...

– Ele fez um acordo? Com quem?

– Ha, ele disse que não tem autorização para contar. Qual seria a graça se tivesse, não é?

– Isso é... – Will olhava à volta como se enxergasse tudo sob uma nova perspectiva.

– Maluquice.

Will riu meio nervoso.

– É, eu sinto que estou ficando meio maluco sim... eh.. sem ofensa. O que ele respondeu sobre eu afastar os fantasmas?

– Ele disse que você tem uma aura interessante.

– O que isso quer dizer?

– Sei lá.

– E quanto a Amanda Philips?

Will, percebendo que Nico se preparava para começar a contar algo complicado o interrompeu antes que começasse:

– A gente pode conversar comendo um taco.

Não era uma pergunta. Nico não teve escolha se não segui-lo até uma das mesinhas ao redor da pequena taqueria.

Só então Nico lembrou que a única coisa que tinha colocado para dentro naquele dia era meia xícara de café de manhã cedo. Tinha consciência de Will, à sua frente, também comendo, mas esperando que ele começasse a falar. Quando começou, estava se dirigindo ao seu próprio taco, já quase todo devorado:

– Quando minha irmã Hazel chegou na cidade ano passado, o espírito da mãe dela que tinha acabado de morrer estava com ela... Decidi vir atrás do Auxiliar, que eu já tinha visto aqui na praça antes. Cuidar de espíritos que permanecem aqui na Terra por qualquer motivo não faz exatamente parte do trabalho dele, mas ele tem algumas respostas e pode ajudar se puder e quiser.

Nico levantou os olhos e viu que Will tinha parado de comer, prestando total atenção ao que ele dizia, mas ao vê-lo encarando-o cuidou de dar mais uma mordida como que para incentiva-lo a continuar.

– Não foi muito difícil cuidar da mãe de Hazel... Ela estava ali por perto e o que a mantinha aqui era mais remorso e preocupação com a filha... Com Amanda a coisa não deve ser tão simples.

Will depositou no prato de papelão o guardanapo vazio, bateu uma mão na outra para limpar e perguntou:

– O que temos que fazer?

Sua expressão séria foi arruinada por um pouco de recheio de frango no canto da boca.

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Nos corredores da escola todos ainda pareciam abalados. Talvez inconscientemente, muita gente usava preto.

Geralmente Nico passava totalmente despercebido, mas nesse dia notou que as pessoas estavam virando para olha-lo e cochichavam. Ele logo achou que sabia o motivo, mas recebeu a confirmação de Will Solace quando tirava os livros do armário.

O garoto se recostou no armário ao lado, dizendo:

– Parece que todo mundo na Academia Argo II assistiu os vídeos que gravaram da sua possessão. Três pessoas já me perguntaram a respeito.

A única resposta de Nico foi um grunhido. Maravilha... Claro que no fundo ninguém ali realmente acreditava na história da possessão. Só não tinham nada melhor sobre o que falar agora que a história do suicídio estava esfriando, mas ainda assim era irritante.

– Você tem sorte de ninguém ter coragem de chateá-lo.

– Eles não têm coragem de vir falar comigo, mas me chateiam do mesmo jeito.

Will suspirou e mudou de assunto:

– E aí, vamos mesmo seguir com o plano?

Nico deu de ombros, resignado.

Will o encarou sério por alguns segundos.

– Você tem certeza?

– O quê? Agora você quer me fazer mudar de ideia?

– Não. Eu só...Acho que é uma atitude bem corajosa e até nobre da sua parte, mas...

Nico revirou os olhos.

– Ai, por favor, você não acha que eu decidi fazer isso pra melhorar seu julgamento sobre mim, não é? Além do mais, não esqueça que tudo vai depender de você conseguir convence-lo a ir.

Will deu um sorrisinho.

– Quanto a isso não se preocupe.

Nico não queria parar para pensar no que tinham planejado, mas a atitude de Will o estava deixando nervoso. No dia anterior, no parque, Nico contou a Will o que tinha visto no enterro de Amanda e que talvez se levassem Percy Jackson até o rio, conseguiriam ajuda-la. Will dissera que já tinha ouvido falar dele e se propôs a falar com o garoto.

A ideia de revelar seu segredo obscuro para o grande herói da cidade, campeão da natação e tudo mais era aterrorizante de um jeito que deixava Nico estranhamente empolgado por querer saber como ele iria reagir. Ele se sentia ansioso uma maneira que não sabia explicar. Claro que não admitiria para Will, mas sabia que aquele era um dos motivos por ter se comprometido com a “missão” de resgatar Amanda.

Não que ele, no fundo, não ligasse para a menina. Apesar de ser verdade o que ele dissera a Will sobre ter aprendido a ser insensível e egoísta em relação aos fantasmas o suficiente para não ficar louco de vez, não podia negar que estar no lugar de Amanda, sentindo o que ela sentia o fazia querer de verdade poder ajuda-la.

– Por que está tão confiante? O que exatamente pretende dizer a ele?

Will deu de ombros e disse, daquele seu jeito despreocupado:

– Isso importa? De qualquer jeito ele vai descobrir toda a verdade no final, não é? Não se preocupe, ok? Não pretendo sequestra-lo nem nada, só convence-lo a aparecer por lá. Então... Qual a sua primeira aula de hoje? – Will perguntou, dando uma olhada no próprio horário.

– Espanhol.

– História... Vejo você mais tarde então.

Nico voltou a encontrar Will Solace no terceiro tempo, em Literatura Americana, e no almoço foi “persuadido” a sentar-se com ele, Lou Ellen, uma amiga dela e mais um garoto do mesmo ano. Pelo visto, Will estava mesmo se ocupando com aquilo de “fazer amizade”.

Nico se perguntou se aquele pessoal não estava aceitando dividir uma mesa com ele só por curiosidade por causa do seu vídeo de possessão viralizado na escola, mas pelo pouco que prestou atenção aos seus companheiros de almoço, estranhamente não parecia o caso. Talvez Will tivesse conversado com eles a respeito ou algo assim.

De qualquer forma, as horas pareciam estar passando mais rápido que o normal. O almoço acabou e, antes que Nico se sentisse preparado, o último tempo da tarde também tinha acabado.

Tinha combinado de encontrar Will quando começasse a escurecer. Pouco mais de uma hora depois do jantar, Nico partia para sua grande missão paranormal altruísta.

Os dois passaram pela Ponte de Ferro, que havia se transformado numa espécie de altar para Amanda Philips. Alguém tinha colocado um retrato num ponto alto bem no meio, e dali estendiam-se para os lados velas, flores e papéis dobrados que deviam ser bilhetes.

Nico se perguntou o que teriam escrito ali. Querida Amanda, eu era um dos que se acabavam de rir quando você passava mal na hora de apresentar trabalhos, mas poxa, não precisava ter se matado! :’( xoxo.

Mas Nico sabia que não tinha o direito de julgar nenhuma daquelas pessoas. Ele também só estava prestando atenção em Amanda agora que ela estava morta.

Eles se dirigiam para o reservatório da cidade, cujas grades de arame ficavam perto da margem do rio. Encontraram um ponto suficientemente iluminado agora que já estava quase totalmente escuro e pararam. Nico passou um tempo observando a forte correnteza, com as mãos nos bolsos do casaco.

– Você contou a ele a verdade?

Will respondeu casualmente, sentado sobre as pernas:

– Mais ou menos... Quer dizer, uma parte. – E vendo que Nico o encarava, querendo saber mais: - Eu expliquei que queríamos ajudar Amanda... Acho que o deixei curioso o suficiente.

– Só espero que ele não apareça com nenhum exorcista ou a ambulância do hospício.

Assim que Nico disse isso, eles ouviram um barulho de motor se aproximando. Os dois olharam na direção de onde vinha, mas tratava-se de um carro normal de passeio que parou a alguns metros deles.

Assim. De repente. Nico tinha esperado (ou temido, ele não tinha muita certeza) que essa parte do plano não fosse dar certo, mas agora ali estava o garoto moreno com seu cabelo bagunçado de um jeito que nele ficava bem. Na luz branca da grade do reservatório, seus olhos verdes brilhavam numa mistura de curiosidade e hesitação enquanto ele se aproximava.

– E então? – perguntou Will, se levantando.

– Eu contei para minha namorada o que você sugeriu. Ela queria saber mais, mas acabou dizendo para eu dar o fora antes que perdesse a paciência – pelo sorriso dele, não dava para saber se era verdade ou só uma piada. Will assentia, como se tudo estivesse indo de acordo com o plano. Percy, então, falou, olhando para Nico, como se explicasse tudo: - Se eu mentisse para Annabeth, ela ia descobrir e ia me matar.

Ao perceber que tinha pronunciado o verbo matar, ele pareceu ficar meio tenso e triste. Deu uma olhada para a parte da ponte que podia ser vista dali e perguntou:

– Então... isso aqui tem a ver com aquele tal vídeo?

E voltou a dirigir-se a Nico:

– Você está mesmo achando que foi possuído?

Nico poderia ter rido da pergunta e da expressão dele, mas estava determinado a ser levado a sério e disse:

– Eu vi você no enterro de Amanda Philips... Parecia uma das poucas pessoas comovidas de verdade. Vocês já tinham se falado?

Uma sombra pareceu descer sobre os olhos de Percy. Ele voltou a olhar para a ponte.

– Eu disse que a ensinaria a nadar... Um dia, um pouco antes das férias de verão começarem, eu a encontrei na praia... Um pessoal estava zombando porque ela estava usando boias de braço... Depois eu perguntei se ela não queria aprender. Ela pareceu animada... Mas, de verdade, eu não tive muito tempo livre nesse verão... – Ele baixou os olhos, esfregando a parte de trás da cabeça.

– Os campeonatos. – Nico tinha assistido pela televisão.

Percy fez que sim, ainda triste. Era um tanto estranho vê-lo sem o seu habitual sorriso. Nico ficou pensando que esse dia na praia devia ter sido um dos mais felizes da vida de Amanda.

– Se eu soubesse... – Percy apertava os punhos com as sobrancelhas franzidas.

– Infelizmente ninguém pode realmente imaginar uma coisa dessas – Will comentou.

– Eu soube que ela morreu afogada – Percy continuou. Ele apontou para a ponte com o queixo. – Quer dizer, aquilo ali tem mais de três metros de altura, mas ela não desmaiou quando bateu na água...

– Ela não conseguiria mesmo se soubesse nadar – disse Nico. – A correnteza é muito forte e ela tem muito medo da água.

Percy captou o uso do tempo presente. Perguntou, olhando de Nico para Will:

– Afinal, vocês vão me explicar direito o que exatamente estamos fazendo aqui?

– Nós estamos aqui para tentar resgatar Amanda Philips – Nico declarou, se aproximando mais da beira do rio e colocando uma mão na água.


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Notas finais do capítulo

Só quero deixar claro que não shippo Pernico, mas acho que a presença do Percy sempre deixa as coisas mais animadas hihi.

Espero que o cap não tenha ficado confuso... Qualquer coisa, podem perguntar!

Até a próxima :*