See The Light escrita por Junebug


Capítulo 18
Capítulo 18


Notas iniciais do capítulo

Olá!
Quero dedicar esse capítulo (que saiu gigante '-') à minha amiga *Natasha* que fez aniversário essa semana e que eu tenho muito orgulho de ter trazido para o lado semideus shipper de Solangelo da Força (quer dizer, da Força ainda não, mas a gente chega lá). Espero que vc goste ;D



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Well, I, I just wanna see the light

Bem, eu, eu só quero enxergar a luz

And I need to know what’s worth the fight

E eu preciso saber pelo que vale a pena lutar

(See The Light – Green Day)

~

— ...Teve a vez em que Jane Müller quis que eu puxasse uma raiz que tinha invadido seu túmulo e estava arranhando seu rosto... Em troca ela me forneceu informações úteis, como a maneira de pegar comida do armazém de seu pai sem que ele percebesse. Ela também me pediu que sabotasse o casamento de seu ex-noivo... Estou aborrecendo você?

Nico tinha deixado escapar um longo bocejo. Ele estava deitado na cama, com os braços cruzados, ouvindo o falatório de Eve há mais de uma hora.

— Não. Imagina.

Eve vivia fingindo que não percebia o sarcasmo de Nico.

— Por que está olhando tanto para o relógio? – Ela perguntou, vendo-o olhar na direção do despertador no criado-mudo.

— Porque eu vou sair mais tarde. Já falei.

— Vai encontrá-lo, não é?

— Se eu for, não é da sua conta.

Ela soltou uma risadinha irritante vendo seu rosto corar.

Nico tinha mesmo combinado de encontrar Will num Café aquele dia, e as horas estavam demorando a passar.

— Já contei para você sobre o jovem Hugo? – Eve perguntou.

— Não - Nico disse num tom de quem não estava interessado, mas ela continuou mesmo assim:

— Ele era o filho do padeiro. Um dia, resolveu contar para outro rapaz o que sentia por ele... O outro rapaz se afastou, enojado, e gritando para todo mundo o que Hugo tinha dito... O reverendo disse que ia cura-lo. Mandou que rezasse dia e noite, fizesse jejum, pedisse perdão a Deus e rezasse mais e mais... Menos de um ano depois, Hugo se enforcou... Os pais dele me pagaram para tentar aliviar seu sofrimento – ela riu. – Acho que eles pensavam que eu podia pedir para o diabo abrandar as chicotadas...

Com uma olhada na expressão de Nico, ela parou de rir.

— Não me olhe assim. Eu o ajudei! Não sou esse tipo de pessoa... Juro! Você sabe que a única coisa que me incomoda é o problema técnico de eu passar mal quando os dois estão juntos. Mas só queria dizer que você não é o primeiro que eu conheço. Está tudo bem por mim. Tudo vai dar certo... Quer dizer, desde que você tome cuidado com... tudo.

— Será que você pode calar essa boca?

Ela suspirou, depois foi para perto do computador.

— Eu quero terminar de assistir aquele documentário sobre os buracos de minhoca.

 Pelo que Nico podia entender, na cabeça de Eve, os dois tinham firmado um acordo de troca de favores. Ela lhe ensinaria tudo que sabia e ele a ajudaria a aprender mais. Eve realmente gostava de aprender coisas. Tinha “frequentado” alguns dias de aula de turmas do último ano na Argo II, mas ficara fascinada mesmo com a descoberta da internet e os cursos online. 

No momento, ela estava aprendendo chinês e linguagem de programação. O propósito disso, Nico não compreendia. Desconfiava que ela tinha um trauma por ter morrido sem saber sequer escrever o próprio nome. Em todo caso, era melhor simplesmente ligar o computador e mantê-la entretida com qualquer dessas coisas do que tê-la tagarelando sem parar no seu ouvido.

Ela dizia que queria ensinar Nico a lidar com os mortos da maneira certa, que era a maneira como ela lidava quando era viva. Mas até o momento, Nico achava que não tinha aprendido absolutamente nada de útil. O método dela não era muito objetivo.

— O que colocou na sua cabeça que você deveria fazer coisas para eles a troco de nada? – ela tinha perguntado pouco depois de se conhecerem.

— Err... Eu percebi que era a única maneira de eles me deixarem em paz?

Eles precisam de você. Você deve ter controle da situação!

— Tá legal, e quando um deles resolve querer brincar com seu corpo? – Nico perguntou, com um olhar de provocação na direção de Timothy. - É impossível ter qualquer controle. Seu mantra vai para o brejo.

— Não é não. Acho que é você que gosta da idéia de se esconder perto do seu amiguinho... Unir o útil ao agradável, não é assim?

Quando a presença de Eve ficava muito irritante mesmo, ele se perguntava de que jeito poderia fazê-la ir embora. Nico tinha procurado saber se havia algo que pudesse fazer para ajuda-la a alcançar o paraíso ou que fosse, mas a resposta dela foi um risinho debochado e a alegação de que se quisesse ir para o paraíso, certamente não precisaria da ajuda dele.

Talvez a questão fosse que, no fundo, ele não quisesse realmente se livrar dela. Talvez fosse a pequena esperança de que ela pudesse realmente ajuda-lo de alguma forma. Talvez fosse só o fato de que pela primeira vez na vida ele podia falar com alguém que entendia sua maldição, que tinha passado pelas mesmas coisas.

Nico achava que ela também tinha decidido ajudar Timothy. Ele agora não saía de perto de Eve. Era como se ela o tivesse adotado. Quase todas as noites, eles saíam sabe Deus para onde. O fato era que o que quer que Eve estivesse ensinando a ele, parecia estar sendo bem mais eficaz do que no caso de Nico, porque o pequeno Tim parecia mais vivo e ativo, sua imagem já não tinha aquele aspecto doentio que se mantivera depois da morte. A única coisa que faltava era ele começar a falar.

Quando finalmente deu a hora, Nico pulou da cama e correu para sair de casa. No corredor, ele pensou que estava tendo alucinações. Um grande panda de pelúcia estava subindo as escadas. Não. Espere. Hazel estava carregando a coisa escada acima.

— O que é isso? – Nico perguntou.

— Ganhei de Frank... – Hazel falou. – Extra fofo e extra leve... Mas não dá para leva-lo ao cinema... Uma gracinha, não é?

Nico se aproximou e pegou o cartão preso ao laço de presente.

Amo Você.

Frank.

— Own – ele falou, fazendo as bochechas de Hazel corarem. – E por que ele lhe deu isto?

— Porque é dia dos namorados – ela respondeu, como se a pergunta fosse uma pegadinha. – Algum problema? – acrescentou, vendo que a informação pareceu chocar Nico.

Nico conseguiu sacudir a cabeça.

— Mas que droga... – ele estava resmungando para si mesmo quando Frank, que esperava no hall, tentou cumprimenta-lo.

Foi atrás da primeira loja que lhe ocorreu para um presente de última hora. Bombons. Will adorava chocolate. Não tinha como errar com chocolate, não é?

O lugar era pequeno e estava lotado. Para tentar sair logo dali, Nico estava passando os olhos pelas etiquetas dos bombons freneticamente. Will nunca tinha demonstrado preferência por nenhum especificamente, na verdade ele estava sempre querendo provar sabores novos. Mas Nico não podia simplesmente escolher qualquer um.

— Nossa, você parece realmente precisar de ajuda – ele ouviu uma voz ao seu lado.

Uma moça estava sorria para ele. Nico ia dizer que não tinha tempo para conversinhas, mas teve que olha-la uma segunda vez porque sentiu que a conhecia de algum lugar, só não sabia dizer de onde. Se pôs a observa-la com a testa franzida até que ela voltou a falar:

— Está escolhendo algo para alguém especial?

— É... Sim – ele baixou os olhos e notou a plaquinha dourada que indicava que ela trabalhava na loja, embora não usasse um avental cafona como os outros. Ali dizia “Silena Beauregard”, mas aquele nome não dizia nada a Nico.

O sorriso dela aumentou com a resposta. Por algum motivo, a situação dele parecia deixa-la contente.

— Nós temos várias caixas de chocolates temáticos para o dia dos namorados. – Ela pegou uma um pouco adiante na prateleira. – Que tal esta?

Aqueles bombons se chamavam Lava de Amor. Havia a ilustração de um chocolate em forma de coração aberto, de onde escorria um recheio alaranjado identificado como uma mistura de caramelo, pimenta e gengibre.

— Errr... que tal algo um pouco mais... sutil?

O sorriso dela não se deixou abalar.

— Hm... Nós também temos essa linha com temas de beijos... – Silena se dirigiu para a prateleira do outro lado.

— Beijos? – Nico perguntou, seguindo-a.

Ele achou que um dos temas era promissor.

Foi só quando saiu da loja que Nico se lembrou do desenho que Rachel lhe mostrara meses atrás. Com o Auxiliar, Charles Beckendorf, e uma jovem sorrindo um para o outro ali naquele mesmo parque. E Rachel tinha ainda associado a moça no desenho à loja de bombons. Bom... Pelo visto, ela tinha voltado. Nico parou e olhou para trás para tentar vê-la de novo. Só conseguiu distinguir sua silhueta de costas conversando com outra freguesa. Ele se sentia feliz pelo sacrifício do Auxiliar aparentemente não ter sido em vão.

No Café, Will não estava sozinho e era justamente Rachel e seus desenhos que lhe faziam companhia. Eles estavam sentados numa mesa de canto, a mesa em que Nico e Will sempre sentavam, porque Nico gostava de como ela lhes garantia um pouco de privacidade. Praticamente todas as outras mesas estavam ocupadas por outros casais, e havia ainda a decoração especial para o dia. Por isso, os dois formavam uma imagem estranha, Rachel rabiscando um guardanapo, e Will afundando distraidamente o chantili do seu expresso, enquanto observava papéis de uma pasta aberta em cima da mesa.

Ele abriu um sorriso ao perceber a chegada de Nico, que se sentou e teria contado sobre quem encontrara na loja de bombons, mas pensou que preferia não dar motivos para Rachel se demorar muito ali.

A atenção de Nico foi, então, tomada pelo que viu nos desenhos em cima da mesa. Havia representações a lápis de vários cômodos palacianos e um único desenho colorido de uma grande propriedade e um jardim.

Ali estava o palacete que Nico vira em seu sonho meses atrás na casa de Piper. Aquele que a jovem de sotaque francês e cabelo avermelhado tinha dito ter sido um presente de seu amante. A boca de Nico se abriu num “o” minúsculo e Will, que parecia estar avaliando sua reação, respondeu a pergunta que ele não fez:

— O pai de Rachel comprou o lugar.

Nico levantou os olhos para a garota sentada à sua frente.

— Ele pretende transformá-lo num hotel – ela explicou. – Na verdade, já começou a fazer isso. Ele quer que esteja pronto na primavera.

Nico estava impressionado, mas continuou calado, observando os desenhos. Havia também uma foto de um pequeno retrato oval com moldura de madeira entalhada, exibindo o perfil dourado de uma mulher com o cabelo preso num coque sobre um fundo branco.

— Eu estive contando para Will que esse é o único vestígio que resta hoje em dia de sua moradora mais ilustre. A condessa de Pellerin, é assim que os livros se referem a ela. Uma personalidade do século XVIII, eles dizem, mas não dizem exatamente por quê. O lugar pertencia de fato ao general Henry Lugrass, que teria sido amante dela. Não se sabe quando ela teria vindo para cá, mas o château foi construído por volta de 1790... O ultimo proprietário só sabe que sua família o comprou na época da grande depressão, a preço de banana. Ele teve que vender o lugar porque está praticamente falido, mas suas obras de arte vão permanecer num salão para exposição que vai ter seu nome. – Rachel fez uma careta. – Homenzinho detestável. A aura dele quase literalmente fede.

Nico a encarou.

— Você parece muito interessada nisso tudo.

Rachel pensou um pouco.

— É... Acho que fiquei fascinada pelas coisas que descobri. Talvez porque é a primeira vez que acho algo interessante num dos negócios do meu pai... Depois que eu consegui convencê-lo de que seus lucros podiam aumentar se a história da condessa fosse resgatada e associada ao hotel, ele ficou muito satisfeito com essas minhas pesquisas... Pretendo convencê-lo a doar uma parte desses lucros a alguma associação de luta pelos direitos das mulheres ou algo parecido...

— Muito nobre – Will comentou, depois de uma pausa, tomando um gole de seu expresso.

— Bom... – Rachel deu uma olhada para a sacola da loja de bombons no assento ao lado de Nico. – Eu... tenho que ir.

Ela recolheu sua pasta com os desenhos.

— A gente se vê.

— Você contou algo a ela? – Nico perguntou depois.

— Não! Mas acho que ela desconfiou... de tudo.

Will pareceu preocupado com a reação dele, mas Nico não estava a fim de se preocupar com aquilo naquele momento.

— Então... Acho bom você gostar disto – ele falou, passando a sacola para Will.

— Eu achei que você não fosse a favor de comemorar esse tipo de coisa... – disse Will, voltando a sorrir.

— Você sempre pensa o pior de mim – Nico exagerou no tom dramático, ganhando um olhar estreitado de Will. - Eu só... não lembrava – defendeu-se. – Então, você achava isso e planejou me fazer vir aqui só para me fazer sentir mal?

— Claro que não. Eu só queria um expresso.

Nico o observou descobrir a caixa de bombons.

Beijos ao pôr-do-sol?... Hmm, ainda não experimentamos esses...

— Pois é... Eu pensei que devíamos dar um jeito nisso.

— Quer dizer que é um convite?

— Você pode chamar assim...

— Já gosto deles desde agora... – Will falou, provando um dos bombons.

Nico encostou-se no espaldar acolchoado do assento e ficou admirando o modo como o rosto de Will estava iluminado até que o loiro virou o rosto para olha-lo e disse:

— Tem... essa coisa que eu comprei... – ele levou uma mão ao bolso do casaco. - Achei que ia combinar com seu anel.

Nico deu um sorriso ao receber a sacolinha de cetim preto com caveirinhas prateadas.

— Por que sempre me associam com tudo que tem caveiras?

— Por que será?

Mas o que havia lá dentro não tinha nada a ver com caveiras. Era uma corrente com um pingente prateado. O contorno de um sol de raios ondulados.

— Ahn... E o que isso tem a ver com o anel?

Nico segurou o pingente numa mão e deu uma olhada no anel que ganhara de Bianca na outra.

— Eu achei que eles formavam um par legal...

— Olha, Solace, tenho medo que, algum dia, eu comece a ver um sentido nas suas idéias estranhas – Nico falou enquanto prendia a corrente no pescoço.

Longe de parecer ofendido, Will observou, radiante, o pingente de sol no peito de Nico.

Nico sorriu de volta para ele. Ele não teria admitido nem para si mesmo, mas adorava ouvir as ideias estranhas de Will.

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Estava escuro. A lua parcialmente escondida entre as nuvens, mas Nico reconheceu o lugar, o barulho das ondas ao longe e o carvalho, agora desfolhado por causa do inverno. Mas não havia ninguém.

— Chame-a – Eve falou, ao seu lado.

— Condessa – Nico chamou. – Sophie...

Silêncio. Nico não tinha acreditado que aquilo ia funcionar, mas Eve tinha mesmo falado sério quando disse que era possível. Umas poucas luzes externas tornavam possível enxergar o château encostado na colina adiante.

— Ah, então você voltou – ele ouviu, naquele jeito antigo e francês.

Sophie Briand tinha aparecido às suas costas, idêntica ao que Nico lembrava do seu sonho, com seus cabelos avermelhados e o vestido branco. Dessa vez ela estava em pé, com uma mão apoiada no carvalho.

— Não estava esperando visitas... E você ainda trouxe alguém consigo...

— Esta é Eve. Ela me ajudou a chegar aqui...

— Eu sei bem quem ela é.

— Vocês se conhecem?

— Não exatamente. Mas creio que já ouvimos bastante uma sobre a outra.

Pela primeira vez, Eve pareceu não encontrar nada para falar. A presença da condessa parecia deixá-la meio tímida. Sophie voltou então a Nico:

— O que o traz de volta depois de ter me deixado falando sozinha daquela vez?

Nico descobriu que não sabia exatamente como responder àquela pergunta.

— Você tem influenciado a cabeça de Rachel, não tem? – ele perguntou, cruzando os braços. – Eu estou aqui pelo mesmo motivo?

A jovem o encarou.

— Significa que você quer que eu saiba por que você quis vir aqui?

Ela torceu o canto da boca e desviou o olhar, de modo que Nico passou a observar seu perfil de nariz empinado. Ele percebeu a grande semelhança com a foto da pintura dourada que Rachel tinha tirado.

— Imagino que deva estar satisfeita com o rumo que as coisas tomaram. Afinal você conseguiu se livrar do homem que estava morando na sua casa, não é?

A jovem continuou com o olhar distante. Ela não parecia tão satisfeita quanto Nico imaginava.

— Ela perdeu o bebê... – disse a condessa, levando uma mão ao próprio ventre coberto pelo tecido leve e solto do vestido.

— Está falando sobre si mesma de novo?

Ela virou o rosto para o outro lado, e disse com a voz embargada:

— Gostaria que você fosse embora.

Nico ainda pensou em dizer mais alguma coisa, mas acabou voltando-se para Eve, que tomou sua mão, ajudando-o a encontrar o caminho de volta para o quarto onde ele estava dormindo.

Ele despertou assim que chegou, de um jeito brusco, como se tivesse sonhado que estava caindo.

— Você precisa treinar essa sua chegada. Pode acabar tendo um ataque cardíaco.

Nico não queria acreditar que havia mesmo esse risco e ela não tinha dito nada antes.

Ele passou um tempo ali só encarando o teto. Não sabia o que tinha esperando do reencontro com a condessa, mas por algum motivo se sentia frustrado.

— Ela morreu no parto... – Eve quebrou o silêncio. – Um pouco antes de mim... – E ela continuou soltando frases aleatórias entre silêncios: - A condessa de Pellerin... As pessoas diziam que ela tinha enfeitiçado o general... Que a cor do cabelo e o nome dela não eram nada cristãos... – Então, ela inspirou fundo, ou pelo menos produziu um som parecido, e disse: - Está pronto, Timmy? Vamos.

— Afinal, aonde vocês vão todas as noites? – Nico não pôde mais resistir à curiosidade.

— Explorar o pós-mundo – quem disse isso foi o próprio Timothy. Uma voz de criança, mas o tom pedante de Eve estava bem ali. Nico ficou boquiaberto.

— Vê? Isso é um bom aprendiz – disse Eve, com um sorriso orgulhoso.

E eles sumiram além da parede, deixando Nico sentindo que havia um nó em sua cabeça. Ele achava que não compreendia mais nada.

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Nico olhava para sua imagem na frente do espelho e ainda não podia acreditar que tinha sido convencido àquilo. “Vai ser divertido”, Will tinha dito. Nico agora percebia que ele devia estar se referindo ao quanto ia ser engraçado ver Nico vestido de palhaço.

— Eu já disse que está errado! Coloque essa parte maior por cima, depois torça... – Eve estava lhe dando instruções, gesticulando por cima da gravata borboleta em que Nico tentava, sem sucesso, dar nó.

— Argh – ele resmungou por fim, se jogando na cama.

— Vai desistir? – Eve perguntou, com as mãos na cintura e um ar de satisfação.

Era exatamente o que Nico queria fazer, mas depois de uns segundos em silêncio, o que fez foi levantar e ir até o quarto de Hazel.

— Será que você pode tentar dar um jeito nisso? – ele perguntou a ela, como se estivesse falando de uma coisa dez vezes mais grave.

Hazel abriu um sorriso ao ve-lo, e Nico foi logo dizendo:

— Não diga nada!

— Não posso dizer que meu irmão está bonito?

— Não diga absolutamente nada.

Hazel riu e beijou sua bochecha. Nico achava que precisava urgentemente melhorar sua cara de raiva, dada a tendência a receber beijos quando a utilizava ultimamente.

Depois que Hazel, com alguma ajuda da internet, conseguiu ajeitar sua gravata, ele ainda teve a infelicidade de dar de cara com seu pai enquanto descia as escadas.

— Você vai a algum lugar?

“Não, pai. Eu vesti a droga de um smoking para jantar macarrão com queijo na cozinha”.

— O pai de uma... amiga minha vai inaugurar um hotel...

Nico não saberia dizer se o pai parecera mais surpreso com suas roupas ou com o fato de ele usar a palavra amiga. Depois de um tempinho observando Nico com uma expressão curiosa, o homem disse:

— Você devia ter me contado. Eu poderia instrui-lo sobre essas coisas, como fazer contatos para futuros negócios e coisas assim...

Nico bufou.

— Tenho que ir. O transporte está esperando.

Rachel tinha usado essa palavra. Tinha dito que providenciaria “transporte” para Nico e Will. Nico descobriu que era um eufemismo para a limusine que estava parada diante de sua casa.

— Não diga nada!

— Você está incrível. Me faz lembrar aqueles caras de romances góticos da era vitoriana...

Will estava em pé diante do “transporte”, com as mãos nos bolsos. Caramba! Foi o momento em que Nico admitiu para si mesmo que um dos motivos de ter concordado com aquilo tinha sido a perspectiva de ver Will vestindo Black tie.

— Falei para você não dizer nada... – Nico falou, desviando o olhar.

— Eu não disse “nada”...

— Você quer que eu dê meia volta e desista dessa bobagem?

— Ah, vamos lá, pare com isso... – Will deu uns passos para pegar sua mão e arrasta-lo veículo adentro. – Rachel conseguiu para a gente esse transporte fantástico com máquina de capuccino.

Foi a primeira vez que Nico viu de fato, em pessoa, a “Joia do Bosque”. O lugar era mesmo magnífico e estava ocupado por um grande grupo de pessoas elegantes, cheirando a perfumes caros e posando para colunas sociais.

Exceto para essas pessoas, não havia nada de especialmente divertido para fazer. Apenas sentar nos lugares identificados com seus nomes numa das mesas do salão de festas, ouvindo uma banda tocar e comendo comidas muito coloridas em porções ridículas.

Na mesa em que estavam, Nico e Will tinham por companhia adolescentes que gostavam de discutir os resultados das bolsas de valores e que, por sorte, àquela altura já tinham desistido de conversar com os dois.

— Desculpe – Will sussurrou para ele em certo momento. – Eu devia saber como seria. Acho que estava só curioso para conhecer o lugar... E ver você de smoking...

Nico girou os olhos para ele.

— Vou pensar num jeito de você me recompensar... – disse, o que fez Will sorrir.

Nico só queria que alguma coisa interessante acontecesse, nem que fosse o lustre despencar no meio do salão. Logo, logo, ele se arrependeria desse tipo de desejo.

Muitas pessoas já tinham terminado de jantar e vagavam pelo corredor e os espaços de estar além do salão. As conversas aumentavam. Nico e Will estavam vagando pelo salão, tendo decidido experimentar todos os sabores de canapés.

— E aí? Vocês parecem com sono – Rachel tinha levantado da mesa em que estivera sentada com os pais e outras pessoas que pareciam mais importantes que os outros.

— Nós estamos – eles responderam, juntos.

— Esperem só começarem os malditos discursos...

— Gostei da roupa – Will falou.

Ela estava usando um vestido longo de saia transparente que ia por cima de uma calça jeans. Nico meio que esperava que ela levantasse o vestido e começasse a rabiscar os jeans a qualquer momento.

— O máximo da sofisticação no esporte fino – ela riu.

Foi quando Nico viu a figura de branco entrar pelas portas duplas entre os convidados. Aquela tinha sido a casa dela, mas Sophie parecia acuada diante de tanta gente, até que localizou Nico e se apressou em sua direção. Ele não tinha encontrado a condessa desde aquele dia em que conseguira alcança-la por sonho, mas tinha contado a Rachel tudo que sabia sobre ela, inclusive a descrevera para que a garota a pintasse.

— Ela está aqui – Sophie se dirigiu a Nico com urgência. – Eles estão no salão de artes. Eu estou com uma péssima sensação...

— Nico...?

— É a condessa? – Rachel perguntou, olhando vagamente na direção de Sophie.

— Onde fica o salão de artes? – Nico perguntou a ela.

Rachel piscou.

— A exposição ainda não está aberta. Algumas obras ainda precisam ser restauradas e meu pai...

— Mas onde fica?

Rachel levou-os até lá, embora Nico não tivesse explicado direito o que estava acontecendo, até porque ele mesmo não sabia.

As portas do outro salão, que ficava um pouco afastado do burburinho da festa, estavam fechadas, mas eles conseguiam ouvir ruídos de uma discussão acima do barulho de música e conversa ao longe. Nico pôde distinguir o final da frase de uma mulher: “...tudo que eu tinha” e um cara chamando-a de louca.

— Essa é a voz do Allen... - disse Rachel. - É o último proprietário, do qual falei...

Nesse momento, eles ouviram um som que devia ser de uma bofetada, seguido de um silêncio.

Will avançou para a maçaneta, mas antes que abrisse a porta, eles ouviram um som alto e seco, que fez os três correrem para dentro. Seus passos ecoaram pelo piso de mármore do salão.

Uma mulher loira vestida de preto ainda apontava um revolver para o homem com a mão em cima de um buraco no peito de onde espirrava sangue. Ele foi caindo no chão como se estivesse em câmera lenta.

Will correu na direção do homem, como se realmente achasse que ainda podia ajuda-lo de alguma forma. A mão da mulher que segurava a arma foi afrouxando até que ela a largou no chão com um lamento.

— Ele... – Will começou a dizer, ajoelhado ao lado do homem, o rosto branco como papel.

E Will pareceu perceber o que aconteceria a seguir antes mesmo que Nico começasse a se dar conta do perigo, o que foi tarde demais.

Tudo pareceu ocorrer ao mesmo tempo. Nico se abaixou para pegar a arma que caíra não muito longe de seus pés.

— Nico, não! – Will gritou e correu para a frente da mulher loira, que parecia atordoada demais para tentar entender o que estava acontecendo e apenas observava tudo com um expressão chorosa de surpresa.

Encará-la fez o coração de Nico pulsar de ódio. Ele queria agarrá-la pelo pescoço até seus olhos saltarem, mas a arma também estava bom. Suas mãos estavam prontas para atirar, mas havia aquele garoto na frente.

— Nico... – Ele tentava bloquear totalmente sua visão da mulher e estender as mãos para tentar acalmá-lo. Estava claramente muito assustado, mas sua voz saiu quase sem falha: – Nico, por favor, largue essa arma.

“Will, saia daí, seu idiota! Pelo amor de Deus!”, Nico gritava isso, mas sua voz não saía.

— Saia da frente ou eu atiro em você também – foi o que ele acabou dizendo, ameaçador.

No coração. Por que ele teria pena? Não tinha mais nada a perder. Era só atirar.

Nico sentiu lágrimas começarem a cair pelo seu rosto como se fossem o único poder de expressão que lhe restara. Parecia que seu cérebro estava cozinhando. Era como se todo seu corpo quisesse se despedaçar.

— NÃO! – essa única palavra, que era mesmo sua, saiu ferindo sua garganta, enquanto seus olhos fechavam com força, e seu dedo puxava o gatilho.


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Notas finais do capítulo

Eu espero que o cap. não tenha ficado muito bagunçado... Digam o que acharam!
Por favor, não me matem por causa desse final rs... Farei o possível para o próximo ( e último cap T_T) sair logo!
Té lá!



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