See The Light escrita por Junebug


Capítulo 1
Capítulo 1




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I don't wanna your sympathy

Eu não quero sua simpatia

I don't wanna your honesty

Eu não quero sua franqueza

I just wanna get some peace of mind

Eu só quero conseguir um pouco de paz de espírito

(Lazy Bones - Green Day)

Outono. O início da porcaria de mais um ano escolar na porcaria da cidade de Half-Blood Hills. Sério, de onde é que tinham tirado um nome desses para uma cidade? Se a ideia era que ela uma espécie de Beverly Hills da costa leste, não tinha dado muito certo.

Nico Di Angelo às vezes se pegava pensando nisso. Especialmente durante aulas chatas como aquela de álgebra. Álgebra no primeiro dia de aula. Ninguém merece!

O garoto estava em seu lugar no fundo da classe, olhando sem ver os números que iam enchendo o quadro, como formiguinhas. Foi quando começou. Ele primeiro sentiu que alguém se aproximava pelo corredor entre as duas fileiras de cadeiras. Tinha plena consciência de que era impossível que fosse algum dos outros alunos. Todos estavam concentrados anotando o que a professora escrevia. Empolgação de primeiro dia de aula.

No entanto, agora estava bem claro para Nico que alguém estava ali de pé ao seu lado. Ele suava frio. Aquela sensação de que alguém o tinha envolvido numa toalha fria, o arrepio, o sentimento de pânico, nada disso era novidade para ele.

Calma. Ele precisava manter a calma. Aquilo devia ter ficado mais fácil com o tempo, mas parecia só piorar. Foi então que ele sentiu um toque de gelo em seu ombro, causando um calafrio que desceu por sua espinha.

Antes de conseguir se conter, Nico ficou de pé num pulo. Vários rostos se viraram para ele. Ele imaginava que alguns já até exibiam sorrisinhos de “Uooou! Esse primeiro dia de aula promete!”. Afinal, o esquisitão oficial da escola tinha acabado de se levantar na aula de álgebra.

Quando ele já tinha chegado à frente da classe, a professora se virou para ele.

– Sr. Di Angelo... – ela parecia estar encarando um zumbi. Sua cara devia estar feia a esse ponto.

– Enfermaria – ele retrucou rápido e não esperou pelo consentimento dela para sair porta afora.

Saiu correndo pelos corredores vazios e foi parar na escadaria de incêndio na parte de trás do prédio antigo de tijolos vermelhos da Academia Argo II. Ali ele se sentou num degrau, recuperando o fôlego, não sem antes dar uma boa olhada à sua volta para ter certeza de que nenhuma criatura aterrorizante do além vida o tinha seguido até ali.

– Merda! Merda! – ele começou a xingar, dando socos nos joelhos.

Quase 15 anos e ele ainda não tinha aprendido a conviver com aquilo. Claro que não é o tipo de coisa com que alguém quer ter de se acostumar, mas que escolha tinha?

Ele se apoiou na parede atrás de si, fechando os olhos. Um tempo depois, uma campainha para o almoço soou. Ouviu as pessoas agitadas, saindo para os corredores. Nesse momento, uma voz tranquilizadora lhe veio à mente. Sua mãe. Seu rosto e seu sorriso da última vez que ele a vira.

“Você tem um dom, meu filho, e eu tenho orgulho de você”. Nico não podia evitar de bufar sempre que lembrava dessas palavras. Onde que ser perseguido e atormentado por gente morta era um dom? Mas aquelas tinham sido as últimas palavras que ele ouvira de sua mãe.

Ela falecera num acidente de carro quando ele ainda nem tinha dez anos. Quando ela apareceu diante dele para se despedir, Nico chorara e esperneara implorando que ela não se fosse. Por que não podia ficar perto dele como os outros? Só depois ele veio entender que sua mãe não era como eles. Aqueles que o aterrorizavam eram os que não tinham paz. Seus espíritos tinham ficado presos à Terra, na maior parte das vezes por conta de assuntos inacabados, mas também tinha os que permaneciam pagando penitências ou mesmo punindo alguém.

– Nico – ele abriu os olhos e deparou com o olhar preocupado de uma menina de pele escura e cabelo encaracolado castanho claro. Ela se sentou ao seu lado e pegou sua mão. – Me disseram que você passou mal durante a aula...

Nico se mexeu desconfortável e procurou soltar a mão sem ser muito mal educado.

– Você... – continuou sua irmã, Hazel – você viu um...?

Ele apenas assentiu levemente, sem encará-la direito. Hazel Levesque era sua meia-irmã que vivia com a mãe no Alaska até o inverno anterior, quando ela também se tornou órfã e foi trazida para ali para viver com o pai deles. Nico nunca planejara revelar seu segredo a ela. Só que, pra ele, Hazel não chegara sozinha à cidade. Para encurtar a história, uma mulher muito parecida com ela, sua mãe, com o corpo coberto de uma terra preta pegajosa a seguira e precisava de ajuda para partir.

Assim, ele acabou se aproximando de Hazel bem mais do que esperava. Tinha realmente aprendido a gostar dela, só que isso acabava deixando-o confuso às vezes, por se pegar pensando em sua outra irmã, a irmã com quem ele crescera e que ele não via há dois anos, e que por muito tempo fora a única pessoa em quem ele confiava.

– Não se preocupe, Hazel – ele disse, com o tom mais tranquilizador que conseguiu. – Quem quer que seja, não me seguiu até aqui, então acho que está tudo bem.

Ela pareceu tentar acreditar e dar um sorriso.

– Tudo bem então. Vamos almoçar?

– Eu não estou a fim de encarar a gororoba do refeitório hoje. Acho que vou até o café da esquina...

– Mas já está um pouco tarde. Você vai se atrasar pra próxima aula.

– Vai dar tempo. Não se preocupe.

Nico fazia de tudo para não impor sua esquisitice à imagem de Hazel diante do pessoal da escola. Ela era uma garota bonita e simpática que não tinha tido problemas em fazer amigos logo que chegou. Fazia menos de um ano que estava na cidade e já tinha até um namorado do colegial. Em resumo, o melhor que ele fazia era se manter longe.

Nico saiu da escola e foi andando em direção à esquina, mas sem ter real intenção de entrar no café. O problema foi que ainda nem tinha se afastado dos muros de trás do colégio, quando seu pesadelo fantasma voltou a persegui-lo. Primeiro ele tomou coragem e deu uma olhada para trás, querendo ver exatamente do que se tratava. Não podia ser tão ruim, certo? Errado.

Quando viu a coisa, pensou que aquilo só podia ser uma piada. A figura era muito parecida com aquela personagem que caia dentro de um poço num filme de terror cujo nome ele não lembrava.

Ali estava uma garota toda encharcada, os cabelos escuros cobrindo boa parte do rosto, as roupas comuns que usava (suéter leve e calça jeans) sujas além de molhadas. Só que na verdade não era nada engraçado. Pela intensidade dos calafrios que provocava em Nico, o garoto suspeitou de desejo de vingança. Argh, o tipo mais irritante.

Ele decidiu retomar seu caminho e começou a se afastar quase correndo e olhando para o chão, porque ele não queria repetir a experiência que tivera uma vez de estar correndo de um fantasma que de repente reapareceu na direção em que ele corria.

Só que essa sua brilhante tática acabou fazendo com que ele desse um encontrão em alguém à sua frente, felizmente de carne e osso, pelo menos. Na verdade ele logo percebeu que a pessoa com que ele esbarrara não tinha se desviado, de propósito. O garoto agora segurava seu ombro, dizendo:

– Ei, ei! Cuidado. Você devia prestar atenção por onde corre. Sabia que ia atravessar a rua com o sinal aberto? – E apontou com o polegar para o semáforo com a luz verde acesa para os carros.

Como que para dar um efeito dramático ao que o garoto dizia, nesse exato momento um enorme caminhão passou por trás dele, barulhento.

Nico ficou encarando o garoto loiro, seus olhos azuis e sua expressão calma e meio divertida, como se fosse uma pessoa super paciente que tinha encontrado uma criancinha fazendo uma besteira.

Nico se sentia atordoado por dois motivos. Primeiro, assim que ele foi interceptado pelo garoto, a terrível sensação que o fantasma vinha causando tinha desaparecido como que por mágica. Virou o rosto para ver se ainda havia algum vestígio da garota encharcada, mas nem precisava. Segundo, ele detestava ser tocado, ainda mais por estranhos.

Ele deu uma olhada na mão que ainda repousava em seu ombro e estava prestes a afastar-se e reclamar, quando uma súbita hipótese lhe ocorreu e... era um absurdo! Mas... ele vivia num mundo de absurdos.

Observando melhor o rosto do garoto, Nico percebeu que o reconhecia. Ele estivera na sala de álgebra mais cedo. Era um novato da sua classe.

– Você está mesmo se sentindo mal – o garoto concluiu, com a testa franzida. – Sente que vai desmaiar? Tente não respirar muito rápido e colocar a cabeça entre as pernas...

– Por acaso você é um paramédico formado pela oitava série?

– Nossa. Você está bem pálido – o garoto o ignorou completamente. - Venha, acho melhor você se sentar e comer alguma coisa.

O sinal tinha aberto para os pedestres, e Nico foi puxado pelo pulso até o outro lado da rua.

E foi assim que foi parar numa mesa do café da esquina – o lugar tinha um nome, mas todos só o chamavam assim – de frente para o novato. Nico já deveria ter fugido, mas a vontade de saber se podia mesmo ter sido ele o responsável por afastar o fantasma o impediu.

Nico pensava: Por que não? Se havia gente como ele próprio que era capaz de ver e atrair aquelas coisas, poderia também haver outros que as repeliam. A vida era mesmo uma sacana!

– Will Solace, não é? - ele lembrou de quando o garoto foi apresentado. O diretor tinha dito que ele morava na Califórnia.

O garoto assentiu, comendo uma grande colherada do bolo com sorvete.

– E você é Nico Di Angelo.

– Como sabe?

– Eu ouvi um pessoal comentando depois que você saiu da sala... Não vai comer?

Nico olhou para sua própria fatia de bolo com sorvete.

– Gosto mais do de chocolate – ele resmungou, amassando um pouco a bola de sorvete.

Will revirou os olhos e chamou a garçonete. Uma garota vestida toda de preto por baixo do avental preto do café, piercings e uma maquiagem carregada. Antes que Nico pudesse protestar, Will disse a ela:

– Traz mais um desse? De chocolate.

Em poucos minutos o pedido estava na mesa e Will perguntou a Nico:

– E agora, qual é sua desculpa?

– Isso não era necessário – Nico retrucou, mas levou um pedaço à boca.

– Tudo bem. Eu pago.

– Não sou mendigo. Posso pagar minhas refeições.

– Tá. Desculpe. É só que você está com uma cara de fome...

Nico o olhou bem zangado e se irritou que a expressão dele continuasse branda como se não estivesse querendo ofendê-lo. Tudo que Nico queria era dar o fora dali, mas não podia simplesmente se afastar e esquecer o que acontecera. Estava num impasse.

– Você mora aqui há muito tempo? – Will estava querendo puxar conversa.

– Uns cinco anos – Nico respondeu para o bolo.

– Eu cheguei faz menos de um mês. Vim passar um tempo com meus tios.

– Hum.

Enquanto voltavam para a Argo II, Will ainda ficou fazendo perguntas sobre os professores e outras coisas relacionadas à escola como se realmente estivesse interessado. Nico ficava esperando por algum sinal dos fantasmas para descobrir que estava enganado em sua teoria e poder dar um passa-fora no outro, mas isso não aconteceu, para sua sorte ou azar.

De volta à escola, Nico tinha aula de ciências e Will de inglês. Depois veio estudos sociais. Nico estava caminhando pelo corredor para a próxima sala quando a viu de novo, a garota encharcada. Que inferno! Que defunto mais insistente era aquele? Ela estava no fim do corredor como se esperasse para ver em que sala ele ia entrar.

Nico teria ido embora, se não fosse a visão de cabelos loiros à frente entrando na sala para a qual ele se dirigia. Nico apressou o passo. Will conversava com Lou Ellen, sentada à sua frente. Estava distraído e nem percebeu, ou não se importou com Nico sentando-se atrás dele, contrariando sua regra pessoal de só sentar nos lugares sombrios e imperceptíveis do fundo da classe.

A garota morta estava agora diante da porta aberta pela qual entravam muitos alunos rindo e conversando. Parecia estar esperando sua hora de entrar também.

“Por que isso não está funcionando?” Nico pensava, olhando para a nuca de Will no assento à sua frente. Estava se convencendo de que tinha imaginado coisas mais cedo. Tinha esquecido o desejo anterior de estar enganando porque o novato era irritante, agora ele só queria que aquilo fosse embora. Foi quando decidiu tentar uma última e desesperada possibilidade. Levantou uma mão e apertou o braço de Will, perto do ombro.

Provavelmente o gesto foi mais brusco do que pretendia. Will virou-se, um tanto assustado, e viu Nico olhando na direção da porta, com uma expressão estranha que misturava terror e agora alívio, já que o fantasma tinha desparecido completamente.

– Ah, oi, Nico Di Angelo.

Nico ficou olhando sua mão que tocava Will. Que piada de mal gosto, vida!

– Hã... você está bem? – perguntou Will.

– Claro – Nico retrucou, soltando-o rapidamente.

– Eh... Imagino que você já conhece a Lou...

– Sim – cortou Nico.

A menina o olhava com um sorriso amarelo, sem jeito. Nico só a conhecia de vista, mas ela estudava ali há bastante tempo, não devia ter uma impressão nada agradável a seu respeito.

Nico pensou em sair dali para uma carteira mais apropriada. Só que com uma olhada a sua volta percebeu que todos os alunos já tinham entrado. Não havia mais lugares vagos. O professor acabava de chegar.

Assim que Nico viu a figura rechonchuda e o rosto de querubim do homem que tinha entrado, teve vontade de exclamar em voz alta: “Ah, não!”. Não podia acreditar que ainda teriam de aguentar o Sr. D. dando aulas mais um ano!

O Sr. D. era o diretor da escola, mas quando qualquer aluno queria qualquer coisa preferia ir atrás do vice-diretor, Sr. Brunner, que apesar andar de cadeira de rodas, era mais confiável e eficiente.

Todo mundo sabia que o Sr. D. era um doido varrido. Todo mundo sabia também que ele detestava crianças e detestava ensinar, o que ninguém entendia era por que ele escolhera aquela carreira.

– Silêncio todo mundo – resmungou o professor, sentando em sua cadeira como se fosse um trono. – Suponho que deva lhes dar boa-tarde...

Algumas pessoas deram risinhos e receberam um olhar gélido de volta.

– Certo – o Sr. D. pegou uma squeeze que sempre levava consigo, que deveria ser para água, mas que Nico suspeitava não passaria numa inspeção. – Já que vocês estão ansiosos para trabalhar, vamos começar o período com uma pequena tarefa.

Murmúrios de contrariedade e agitação pela sala. O Sr. D. sacudiu a mão como se estivesse espantando mosquitos.

– Quero que vocês se dividam em duplas. Um dos dois vem aqui na frente, acertar dardos no mapa-múndi com os olhos vendados. Vocês vão escolher um prato de festa do país que acertarem, vão preparar esse prato e trazer para mim na próxima aula. Aqueles que conseguirem trazer uma bebida também terão pontos extras. É isso. Vamos começar. Primeira dupla.

Uma aluna novata levantou a mão de testa franzida e perguntou:

– Professor, o que isso tem a ver com estudos sociais?

O professor dirigiu a ela seus olhos vidrados.

Tudo tem a ver com estudos sociais.

A aluna não voltou a questionar.

O Sr. D. adorava isso de fazer os alunos atirarem dardos. Os muitos buraquinhos no grande mapa-múndi ao lado da mesa do professor sabiam bem disso.

Will provavelmente teria preferido fazer dupla com Lou Ellen claro, mas ela ficou com uma amiga sentada ao seu lado. Então o garoto louro se virou para Nico e disse, sorrindo:

– E aí, vamos nessa, Di Angelo? Parece divertido.


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Notas finais do capítulo

Comecei a escrever essa fic para tentar realizar meu sonho de escrever uma longfic de Solangelo ♥ rs... Digam o que acharam desse primeiro cap!



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