Nova fase' escrita por HungerGames


Capítulo 8
Capítulo 8


Notas iniciais do capítulo

Geeeente, tô viva! Se é que alguém sentiu minha falta né? (Espero que sim rs)
Voltei, por que amo isso, amo vocês, espero que vocês não tenham abandonado a história, não abandonei vocês mas... Não ganhei na loteria ainda então tenho que batalhar... Tá muito corrido, muito difícil, demorei muito pra conseguir esse capitulo pq meu maior medo é decepcionar vocês, enfim... Comentem, saudade de vocês....



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/644677/chapter/8

 

A viagem de volta pra casa foi bem tranquila e assim que o trem parou na estação nós já estávamos com nossas malas em mão, Keyse sorriu assim que descemos do trem.
— Olha, eu nunca pensei dizer isso mas... É bom estar no Doze de novo! – ela fala e eu sorrio já levando nossas malas para um carro, o motorista me ajuda e nem preciso explicar o endereço por que ele já sabe, ele nos parabeniza pelo casamento, elogia as fotos que saíram no jornal, diz o quanto Keyse estava linda e o quanto eu tenho bom gosto, então automaticamente Keyse o considerou o homem mais esperto do Distrito, ele riu e em poucos minutos já estamos entrando na Aldeia, eu pego as malas, o pago, ele nos deseja um casamento ainda mais feliz, eu agradeço.
— Se bem que eu acho muito difícil conseguir ser mais feliz do que eu já estou – Keyse fala passando os braços atrás do meu pescoço e aproximando a boca da minha, daquele jeito que só ela sabe fazer.
— Acho que posso pensar em no mínimo umas dez maneiras pra testar isso – eu falo e ela solta uma risada e então me beija, quando paramos o beijo e olhamos em volta estamos em frente a nossa casa. NOSSA CASA. O sorriso no meu rosto abre no mesmo instante que o dela, então eu a pego no colo e sua risada divertida me deixa ainda mais feliz, eu caminho até a porta e com a chave que já estava no meu bolso, eu abro e entro carregando ela nos meus braços, vou pro meio da sala e só então a coloco no chão, mesmo que nós mesmos tenhamos arrumado a casa ainda parece tudo novo, eu olho ao redor, as paredes que pintamos, os moveis que arrastamos para todos os lados, as almofadas que escolhemos juntos, o tapete, a luminária, tudo dentro dessa casa agora é nosso, faz parte da nossa vida juntos e apenas isso já torna tudo perfeito.
— Nossa casa – ela fala sorrindo e me olhando ansiosa.
— Nossa! – eu repito e afasto o cabelo dela levando minha boca para sua orelha – E esse já é o meu lugar preferido! – eu sussurro e em resposta ela me beija.
— Hum, achei que fosse o quarto... – ela fala com ironia e me olhando daquele jeito provocante, eu sorrio e a beijo rapidamente.
— Vou só colocar as malas pra dentro e podemos testar essa teoria – lhe dou um beijo rápido e corro até o lado de fora, pego as malas e me viro pra entrar em casa.
— Pyt?! – a voz me faz sorrir antes mesmo de vê-lo, confesso que mesmo o garotinho me perturbando o dia inteiro ele faz uma falta grande, eu me viro já sorrindo e ele está no colo do Ian.
— Eu demoro uns dias e você vira um bebezão que anda de colo? – pergunto já soltando as malas no chão e indo até eles, é então que percebo que tem algo errado, algo muito errado, Pérola está segurando Louise ao lado do Ian e seus olhos estão vermelhos e inchados, por mais que ela esteja me forçando um sorriso seria impossível não notar que ela passou a ultima hora chorando, Ian parece cansado e preocupado, e quando olho pro Pietro de novo ele já está chorando e esticando os braços pra mim – O que aconteceu? – me apresso e o pego no colo, ele na verdade se joga pra mim, aperta os bracinhos em volta do meu pescoço e chora com tanta dor que um sentimento apavorante começa a crescer dentro de mim, eu o aperto tentando passar algum conforto pra ele, acaricio seus cabelos e ele já está soluçando – Alguém me diz o que tá acontecendo! – exijo com o máximo de auto controle que eu tenho, embora minha voz saia alta e forte, Ian olha pra Pérola e as lagrimas escorrem dos olhos dela, meu coração parece parar de bater, minha respiração diminui e eu sinto que levam horas até que o Ian respira fundo e me olha.
— É o Haymitch! – o jeito que ele fala o nome, o modo como ele me olha, o choro do Pietro cada vez mais forte, eu começo a sentir um pavor que nunca tinha sentido antes.
— O que tem ele? – pergunto devagar e sinto que minha voz pode nem ter sido ouvida.
— Ele está no hospital! – e é nessa hora que eu sinto parte do meu controle se perdendo. Meu avô no hospital, ele nunca vai pra lá e pra ter ido é por que algo muito ruim aconteceu, eu quero saber, mas tenho medo da resposta.
— Foi eu! – Pietro fala entre a crise de choro e soluços.
— Ei, ei... Não foi você – eu falo tentando fazer ele me olhar, mas ele aperta ainda mais o rosto contra meu ombro.
— Foi eu sim! – ele fala mais alto e seu corpo já está tremendo.
— O que tá acontecendo? – pergunto olhando pra Pérola.
— Eles estavam juntos... – ela fala e eu posso imaginar o susto que Pietro deve ter levado – Quando o papai chegou ele estava desmaiado no meio da sala, bateu a cabeça quando caiu e não acordava, ele levou direto pro Hospital e nós fomos pra lá logo atrás, estamos voltando agora, mas ainda não temos noticias, ele só... Foi levado lá pra dentro e ninguém voltou! – ela fala e sua voz quase não sai mais devido ao choro, Ian a puxa para os braços dele, acariciando seus cabelos.
— Foi eu, Pyt, foi eu! – Pietro repete dessa vez levantando o rosto que já está vermelho.
— Pietro, não foi você, não é sua culpa! O vovô tá dodói, só isso, ele vai ficar bom! – afirmo tentando passar o conforto pra ele.
— Ele falou que tava doendo... – ele fala sem parar de chorar – Eu não gritei o papai! – ele fala e corta meu coração vê-lo assim, eu o abraço apertado.
— Não é sua culpa! Vai ficar tudo bem! – eu garanto beijando sua cabeça e o embalando em mim.
— O que houve? – a voz preocupada me faz virar, Keyse está assustada e parece ainda mais quando vê nossos rostos.
— O vovô passou mal e está no hospital! – eu falo e ela parece não saber o que dizer – Eu preciso saber como ele tá... – eu falo já tentando passar o Pietro pra ela.
— Pyter não – Pérola é quem fala e eu paro confuso, ela se aproxima de mim – Eu sei que você está preocupado, eu também estou, mas ele não falou com ninguém desde que tudo aconteceu – ela fala enquanto desliza a mão pelas costas do Pietro que continua chorando – Nenhuma palavra, ele nem ao menos tinha chorado, ele só chorou e só falou com você! Eu sei que você quer noticias, mas ele precisa de você e se o vovô estivesse aqui iria mandar você ficar... Pelo menos até ele comer alguma coisa e conseguir dormir – ela pede e mesmo que minha vontade seja ir correndo agora mesmo para o Hospital, eu tenho que concordar com ela, Pietro está abraçado a mim, chorando e se sentindo culpado, eu não posso abandoná-lo agora, por isso eu o aperto ainda mais em mim e beijo sua cabeça.
— Eu tô aqui, tá tudo bem! – eu falo no ouvido dele, Keyse se coloca ao meu lado acariciando as costas e o cabelo dele, enquanto dizemos pra ele que tudo irá ficar bem.
— Melhor a gente entrar – Ian fala apontando a casa, eu concordo e nós entramos na casa dos meus pais, eu vou pro sofá e Keyse me acompanha, Pietro diminuiu um pouco o choro, embora eu acredite que seja apenas por falta de força, seu corpo parece cansado, sua respiração ofegante e ele ainda treme um pouco, eu tiro sua camisa que já está molhada e uso para enxugar seu rosto e limpar seu nariz.
— Era pra eu chamar o papai – ele fala me olhando, eu seguro seu rosto entre minhas mãos.
— Você me ama? – pergunto e ele concorda – E eu também te amo, muito! E você sabe que quem ama a gente nunca mente, não sabe? – ele concorda novamente – Ótimo, por que você tem que acreditar em mim que a culpa não foi sua, tá? O vovô tá doente, ele só passou mal, mas isso não é culpa sua, você acredita em mim? – eu pergunto e ele nega com lagrimas rolando.
— Foi eu sim! – as lagrimas rolam mais forte e ele esconde o rosto no meu peito se recusando a me olhar, ele se aperta em mim e tudo que eu posso fazer é acomodar ele, o abraçando e tentando lhe passar algum alivio, olho pra Keyse e uma lagrima escorre dos olhos dela, mas ela me força um sorriso, acaricia as costas dele colocando um beijo no alto da sua cabeça e depois passa a ponta dos dedos pelo meu rosto num gesto de carinho, eu puxo o ar que parece ter desaparecido durantes esses intermináveis minutos.
— Eu vou fazer alguma coisa pra ele comer – ela avisa e se levanta saindo da sala, observo ela saindo da minha vista e então volto toda minha atenção para ele, o choro agora é baixo, cansado e consegue penetrar cada parte da minha alma, eu o afasto um pouco de mim e com a camisa que já está suja eu enxugo novamente o seu rosto.
— Você precisa de um banho – eu falo e ele apenas volta a me abraçar, eu me levanto e vou direto para o quarto dele, entro no banheiro com ele no colo já que ele se recusa a me soltar, coloco a banheira pra encher e volto para o quarto, procuro pelas gavetas e encontro um dos pijamas dele, deixo separado em cima da cama e encontro em cima de uma das prateleiras que ficam na parede lateral um livro de histórias que provavelmente a Pérola deve ter dado pra ele, a capa do livro é colorida e com muitos desenhos, o título “A Floresta encantada” está desenhado com letras que mudam de cor conforme a luz as alcança, Pietro levanta um pouco o rosto do meu peito e olha para o livro – A Floresta encantada – eu leio fazendo uma voz misteriosa, ele se desencosta um pouco mais de mim e alcança o livro na minha mão, ele abre e folheia algumas paginas.
— Você e a mamãe – ele fala e aponta para o desenho onde um garotinho está com um arco e flecha apontado para o alto e ao lado dele uma outra garotinha está também com um arco e flecha pendurado nas costas, eu olho pra ele e sorrio.
— Mas eu tenho certeza que eu e a mamãe somos melhores que eles – eu falo e ele me olha com um pequeno sorriso.
— Eu também posso ter uma ‘frecha”? – ele pergunta voltando a olhar o desenho e escorregando o dedo pela folha.
— O que a mamãe disse?
— Que só quando eu for mais grande – eu sorrio ouvindo esse jeito dele falar.
— Então só quando você for mais grande – eu repito imitando-o e então ele faz o que o verdadeiro Pietro sempre faz, revira os olhos e me olha meio inconformado.
— Mas esse menino também é pequeno – ele aponta pro desenho e eu acabo rindo, por que esse sim é o meu irmão, aquele que sempre tem uma resposta rápida e um jeito único de ver as coisas.
— Bom, então nós vamos ter que conversar sobre isso com a mamãe – eu falo e o seu sorriso se fecha um pouco.
— Ela tá lá no hospital
— Mas daqui a pouco ela chega! Na outra vez que o vovô ficou no hospital eles nem demoraram – eu falo e isso chama atenção dele.
— Ele já foi no hospital outro dia?
— AAH sim! É que você ainda não tinha nascido mas já, algumas vezes – aquela nuvem escura que estava sob seu olhar começa a desaparecer e a curiosidade cada vez mais aparece.
— Por que?
— Ah por que ele nunca obedece ninguém, por isso que a mamãe briga com você quando desobedece! – ele faz uma careta e isso me faz sorrir de novo – Ele tem um dodói na barriga – eu falo e coloco minha mão sobre a barriga dele – E tem que tomar remédios, não pode comer algumas coisas e tem que obedecer...
— Mas ele não obedece – ele completa e eu concordo – Por isso ele não acordava? – ele pergunta parecendo remoer alguma coisa dentro dele.
— Foi por isso sim!
— Não foi minha culpa? – seus olhos se enchem de esperança.
— Não Pietro, não foi sua culpa! Ele só tá dodói!
— Eu quero que ele fique bom logo – eu o abraço e beijo sua cabeça.
— Eu também! – concordo sentindo um aperto quase sufocante no meu peito, mas me obrigo a afastar isso por enquanto, eu volto pro banheiro e fecho a torneira, jogo os sabonetes na agua, aquele liquido que faz espuma que ele gosta e então o coloco no chão, ajudo ele a se livrar do restante da roupa e o coloco dentro da agua, um pouco daquela nuvem escura ao redor dele parece ter diminuído enquanto ele brinca passando os dedos pela espuma e depois enchendo a mão e assoprando, eu o ajudo a lavar o cabelo e ele ri por que diz que faz cocegas, deixo que ele aproveite mais um pouco e quando os dedos dele começam a enrugar eu pego a toalha e o tiro da banheira.
— Eu posso ir ver o vovô? – ele pergunta enquanto eu o ajudo a colocar o pijama.
— Primeiro eu vou lá pra saber se o médico deixa, aí quando ele deixar eu venho te buscar, combinado? – eu pergunto mostrando a mão pra ele bater, ele sorri e bate a mão na minha – Pronto! Tá cheiroso, arrumado, agora só falta comer alguma coisa.
— Você vai me deixar aqui sozinho?
— Sozinho não! Você vai ficar com a Pérola, com Ian e com a Loui... – ele solta o ar parecendo decepcionado e encosta a cabeça no meu ombro.
— Você ficou longe um monte de dias! – ele fala e um pequeno sorriso escapa da minha boca.
— Mas eu voltei e a gente vai ter mais um monte de dias pra ficar juntos, eu prometo! – ele levanta o rosto e me olha.
— Aí a gente vamos no lago? – os olhos dele brilham do mesmo jeito que os meus brilhavam quando a mamãe me prometia isso.
— Aí a gente vamos! – eu o imito e ele sorri animado e beija minha bochecha.
— Eu tô com fome!
— É bom estar mesmo, por que a comida da sua tia Keyse só com muita fome... – eu brinco e ele ri mesmo que eu desconfie que ele não tenha entendido.
Eu alcanço a cozinha e Keyse esta terminando de arrumar um prato, ela se vira e me olha forçando um sorriso.
— Tinha comida pronta, eu só esquentei – ela fala e me entrega o prato com um cozido que está com um cheiro maravilhoso.
— Tá com sorte, garotão – eu falo e ela acaba rindo, eu coloco Pietro sentado e quando ia dar comida na boca dele, ele encheu o peito pra dizer que já é grande e come sozinho, eu e Keyse ficamos sentados ao lado dele, ela com a mão sobre a minha perna num aperto encorajador.
— Eu vim pegar alguma coisa pra Pérola... Ela mal comeu hoje – Ian fala já entrando pela cozinha.
— Eu preparo o prato pra ela e você faz o seu, tenho certeza que também não comeu direito não é? – ele dá de ombros com um semblante cansado, então aceita a proposta da Keyse e quando ela sai da cozinha levando o prato e um copo de suco pra Pérola ele se senta a mesa, na minha frente.
— Como ela tá? – pergunto e ele me olha meio receoso.
— Tentando não se desesperar – ele fala e eu entendo perfeitamente como ela está, por que eu mesmo não sei como ainda estou aqui sentado sem noticias novas.
— Posso comer de novo? – Pietro pergunta e então tenho a minha resposta, é por ele que eu ainda estou aqui, eu forço um sorriso, pego o prato e vou colocar mais um pouco, devolvo o prato e ele come realmente com vontade, então os gritinhos inconfundíveis entram pela cozinha, me viro e Keyse está rindo enquanto Louise tenta morder o nariz dela, eu também acabo sorrindo, ela volta a se sentar do meu lado colocando Louise sentada na mesa.
— Eu cuido deles! Pode ir... – ela fala me olhando daquele jeito que parece ler a minha alma e sim, essa é a minha vontade, sair correndo daqui pro Hospital e receber noticias, saber como estão meus pais, como está o vovô, mas quando olho pra ela de novo sei que eu não vou conseguir fazer isso sem ela, ela é o meu ponto de equilíbrio e eu preciso dela tanto quanto eu preciso de noticias.
— Eu preciso que você vá comigo!
— Então eu vou com você – ela garante e me olha daquele jeito que me dá a certeza que eu posso enfrentar qualquer coisa no mundo.
— Eu já acabei, eu fico com ela – Ian fala e se levanta pra pegar Louise que se joga sorridente no colo dele, então me viro pro Pietro.
— Agora eu preciso que você fique aqui enquanto eu vou lá no Hospital, ta bom?
— Você vai trazer o vovô?
— Eu vou tentar! – falo sem querer mentir ou colocar falsas esperanças nele, mesmo assim isso parece alegrar ele.
— Eu posso ver desenho?
— Ah tem um do dinossauro que a Loui adora... Já deve tá começando – Ian fala e Pietro arregala os olhos animados e corre pra sala – Eu cuido deles! – ele me garante e eu só consigo concordar, ele vai pra sala e Keyse segura minha mão, apertando pra me dar coragem.
Nós chegamos no Hospital e depois de perguntarmos na recepção somos indicados para o segundo andar, em um corredor branco que me causa arrepios, uma segunda recepção nos recebe e dessa vez nos mandam para uma sala de espera a alguns metros dali, assim que entro na sala identifico mamãe agarrada ao papai nas cadeiras no canto da sala, assim que ela me vê se solta dele e corre até a mim.
— Pyter! – meu nome é tudo que ela consegue dizer antes de começar a chorar, e está aqui a coisa que mais me dói e me apavora no mundo, ver e ouvir minha mãe chorar, desde criança eu nunca soube lidar com isso, eu ficava entre a raiva por ver ela desse jeito e o sentimento de impotência que isso me causa, ela sempre está tão forte e segura que quando a vejo assim é quase como se essa não fosse a minha mãe e tudo que eu quero fazer é manter ela longe de qualquer coisa que a machuque, infelizmente eu nunca consigo evitar.
— Eu tô aqui – eu falo a única coisa que posso, enquanto acaricio seus cabelos e a aperto em mim, olho pro papai e ele também parece cansado e preocupado, mas me força um olhar otimista que serve apenas pra me assustar ainda mais, espero mamãe se acalmar e só quando ela para de chorar que eu a solto dos meu braços.
— Desculpa... É só que... – ela solta o ar com força – Eu já estou enlouquecendo aqui – ela fala passando as mãos pelo cabelo – Keyse, desculpa, eu nem te vi – ela fala e abraça Keyse.
— E o que eles disseram? – pergunto nervoso.
— Nada!
— Nada?
— Ninguém diz nada, nós pedimos noticias e apenas nos mandam esperar e esperar e até agora nada – papai fala parecendo cansado e frustrado.
— Eles não podem fazer isso! Eu vou ter noticias – eu aviso e saio da sala de espera a passos rápidos e firmes.
— Pyter, espera... – ouço papai me chamar mas não me viro nem paro pra ouvir nada, apenas avanço até a recepção onde a mesma moça de olhos azuis e cabelos loiros me recebe com um sorriso que só consegue me irritar ainda mais.
— Haymitch Abernathy – eu exijo sem me importar com simpatias.
— Como? – ela parece um pouco confusa.
— Um paciente, Haymitch Abernathy, eu quero noticias... AGORA! – ela parece um pouco atrapalhada e começa a procurar por alguma coisa no computador, digitando e olhando de forma concentrada, então verifica alguns papeis em cima do balcão que nos separa.
— Eu sinto muito senhor, ainda não recebemos nenhuma noticia que deva ser passada... – ela fala e eu solto uma risada irônica.
— Não receberam nenhuma noticia? Que porcaria de hospital é esse? Eu quero noticias, e eu quero agora ou você consegue pra mim ou eu mesmo vou conseguir, de um jeito ou de outro! – eu exijo dando um tapa no balcão, então sinto a mão segurando meu braço, me viro e Keyse está ao meu lado, com apenas um olhar sei que ela me pede calma, mas logo desvia os olhos para a garota atrás do balcão.
— Desculpa, é que nós acabamos de chegar de uma viagem longa e descobrimos que o avô dele está internado, ele chegou aqui de manhã e até agora a família não recebeu nenhuma noticia, será que você pode, por favor, conseguir alguma informação? – ela fala com toda calma e educação que ela deve guardar para momentos como esse, a menina parece tocada, mas já estava a ponto de negar – É que minha sogra... Katniss... Katniss Everdeen... Ela está realmente muito preocupada, e o Haymitch é quase um pai pra ela e o meu sogro... – então os olhos da garota se alertam pra algo que ela ainda não tinha percebido, ela se estica um pouco pra enxergar meus pais logo atrás de nós e então seus olhos quase brilham.
— É... Katniss e Peeta? – a menina quase não tem voz.
— Sim, são eles e nós realmente precisamos de noticias!
— Ér... Claro, eu... Eu vou ver o que posso descobrir – ela fala já pegando um telefone e discando, ela se afasta um pouco e vai falar com quem quer que seja do outro lado.
— Nem sempre força bruta é a resposta! – Keyse fala me olhando com uma leve repreensão, mas passa os dedos pelo meu rosto – Só fica calmo, pode ser? – ela me pede e eu seguro sua mão e coloco um beijo na sua palma, meus pais se aproximam – Ela está tentando conseguir noticias – Keyse avisa e mamãe parece ainda mais ansiosa, papai passa o braço pelo seu ombro e beija sua cabeça, cada segundo parece uma eternidade pra mim e quando a garota se aproxima de novo sinto todo musculo do meu corpo tenso.
— Eu consegui falar com a equipe que o recebeu! Ele está em cirurgia, tiveram que levar ele urgentemente, por isso ninguém conseguiu avisá-los, ainda não sabem informar que horas irão acabar... – ela fala e Keyse segura minha mão – Eu sinto muito, mas agora tudo que eu posso dizer é que vocês realmente devem aguardar, assim que eu conseguir mais noticias eu mesma avisarei a vocês!
— Obrigada! – Keyse é a única que parece consciente e apta pra responder a qualquer coisa, por que mamãe se afundou no peito do papai, enquanto ele sussurra algo em seu ouvido, e quanto a mim, tudo que consigo pensar é no quanto eu gostaria que isso fosse apenas um pesadelo – Vamos... – ela me distrai dos meus pensamentos enquanto encaixa o braço no meu e me guia para a maldita sala de espera, mamãe e papai voltam a se sentar nos mesmos lugares de antes e Keyse e eu nos sentamos na outra ponta, a sala está vazia e o silencio é ainda mais perturbador, Keyse passa os dedos pelo meu cabelo e encosta a cabeça no meu ombro, os ponteiros do relógio parecem um instrumento de tortura.
— Você viu o Pietro? – mamãe pergunta quebrando o silencio.
— Vi! Eles estavam chegando na Aldeia!
— Como ele estava? Ele não falou com ninguém, não disse uma palavra!
— Ele está melhor! Ele chorou, estava muito nervoso, ficava repetindo que a culpa era dele por que ele não chamou o papai rápido, mas eu conversei com ele, está mais calmo, tomou banho, almoçou e o deixei vendo desenho com a Loui e o Ian! – eles respiram mais aliviados.
— E como foi a viagem de vocês? – papai pergunta e imediatamente Keyse abre um sorriso e se apressa em responder.
— Perfeita! – ela fala e mesmo com essa tensão toda sinto um sorriso aparecendo no meu rosto, papai e mamãe também liberam um sorriso.
— Com licença... – a garota entra e nós quase saltamos da cadeira em cima dela – A cirurgia acabou, ele está sendo levado para o quarto!
— E como ele está? Como foi?
— Eu sinto muito senhora, mas apenas o médico saberá informar melhor, ele já deve vim falar com vocês, só quis avisar antes!
— Obrigado – dessa vez papai consegue tomar a frente e a garota sai nos desejando boas noticias.
— Eu não aguento mais esperar – mamãe fala passando a mão pelo rosto.
— Agora falta pouco, pelo menos sabemos que ele está bem!
— Ainda não – mamãe fala e sinto um aperto ainda mais forte.
Cinco minutos se passam, mas sinto que foram horas, quando o médico entra na sala de espera, ele parece cansado, ainda está com aquela roupa verde e uma touca, nós nos aproximamos dele mas ninguém tem coragem de fazer as perguntas.
— Ele chegou aqui com um ataque cardíaco, os sinais dele estavam fracos e a pancada na cabeça também não ajudou muito, tentamos contornar a situação até que o fígado dele entrou em colapso, ele teve uma hemorragia... O fígado estava basicamente sendo afogado por tanto sangue, sem a cirurgia tudo seria em vão, por isso não tivemos outra opção senão correr para a cirurgia, o segundo problema veio quando vimos que uma das artérias dele estava entupida e o coração não estava aguentando manter o ritmo, nós tínhamos que agir rapidamente e por isso não conseguimos mantê-los informados, e eu mesmo peço desculpas por causar toda essa agonia, mas o importante é que fizemos a cirurgia...
— E como foi? – mamãe não consegue mais esperar e eu também já estava a ponto de sacudi-lo.
— Complicada! Colocamos um marca passo no coração dele, desobstruimos a artéria mas o fígado dele... Ele... A situação é bastante delicada, ele teve várias complicações, o fígado está ainda mais saturado do que antes, o mais indicado seria um transplante, colocamos o nome dele na lista, mas não sabemos se ele irá aguentar a espera ou se será aceito, já que o motivo disso foram os anos de bebida, além do mais, um dos rins dele também está falhando, o corpo dele está... Sobrecarregado!
— E o que isso quer dizer? – mamãe pergunta enquanto aperta a mão do papai.
— Que ele tem máquinas ligadas a ele pra que consigam mantê-lo estável!
— E o que acontece se o tirarmos das maquinas? – papai pergunta e quando o medico aperta os lábios eu já sei o que significa.
— Ele não tem muitas chances, sem a máquina, na verdade, nenhuma!
— E com o transplante de quanto por cento estamos falando? – Keyse pergunta parecendo a mais firme de nós.
— Sinceramente... Ele não vai se curar, isso não é algo em questão, o máximo que podemos fazer por ele aqui, é mantermos ele vivo por mais tempo do que ele teria fora daqui e oferecer o máximo de conforto possível, mas apenas isso...
— E se conseguirmos o transplante?
— Sinto muito Pyter, mas é quase impossível seu avô conseguir, existe uma lista, existem regras e infelizmente seu avô não é o paciente mais apto a receber...
— Me desculpa doutor, mas eu não perguntei sua opinião ou se vai ser difícil, só quero saber se isso pode ajudar ele...
— Se tudo desse certo, se o corpo dele respondesse bem, se não houvesse nenhuma rejeição, então bom, ele teria uma chance, talvez, mas não posso te garantir nada!
— Então se ele sair das maquinas, se sair do hospital, sem o transplante... Ele... Ele morre, é isso? – pergunto claramente, ele me olha de um jeito meio decepcionado, mas concorda com a cabeça – Ok, então ele não sai! – assim que eu digo isso mamãe e papai me olham – O quê? Não tem nem o que pensar, é uma matemática simples.
— Eu sinto muito, mas essa é uma decisão dele – o médico fala e minha vontade é de acertar um soco nele.
— Ele quer viver, você pode confiar em mim. Ele fica!
— Quando nós podemos vê-lo? – papai pergunta me cortando.
— Ele ainda está sobre o efeito da anestesia, mas em cerca de 20 minutos vocês poderão entrar!
— Obrigado! – papai agradece com um rápido aperto de mão e o médico se vai.
— Você pode me explicar o que aconteceu aqui? – pergunto um pouco irritado, papai respira fundo e tenta se manter calmo.
— Não é uma decisão nossa, você ouviu o médico! – eu solto uma risada.
— Não é uma decisão nossa? É sério? O vovô está morrendo e você me diz que essa não é uma decisão nossa?
— Eu só estou querendo dizer que ele tem o direito de escolher onde ele quer passar os últimos momentos dele...
— Últimos momentos? Eu vou conseguir esse transplante e ele não sai desse hospital – eu falo com o máximo de certeza que consigo, então saio da sala de espera em direção ao corredor de banheiros e bebedouro.
— Pyter – Keyse me alcança e segura meu braço – Você pode esperar, por favor – ela pede parecendo preocupada, eu paro e me viro de frente pra ela – Todo mundo está preocupado, todo mundo está apavorado, isso não é um privilégio só seu – ela fala me olhando diretamente nos olhos – Brigar, gritar e sair batendo nas coisas não vai mudar nada!
— Cruzar os braços e esperar o tempo passar também não!
— E quem está fazendo isso? – ela me pergunta séria, então me segura pelo braço e me leva pra dentro do banheiro sem nenhuma preocupação, um senhor já estava saindo e nos olha confuso, ela não se importa e me arrasta até a pia – Lava esse rosto, respira fundo e então nós vamos sair daqui e você vai ver o seu avô, entendeu? – eu concordo, então ela mesma abre a torneira, eu molho meu rosto, ela me entrega as toalhas de papel e eu fecho os olhos tentando me acalmar, o toque suave de seus dedos no meu rosto me faz abrir os olhos – Eu estou com você e não vou sair daqui, ok? – antes que eu diga mais alguma coisa, ela coloca um beijo doce na minha boca – E eu amo você! – seus dedos penteam meu cabelo e nossos olhos permanecem fixos um no outro até que um outro homem entra no banheiro e se assusta aos nos ver, ela segura minha mão e nós saímos do banheiro, voltando pra sala de espera.
— Nós já podemos entrar – mamãe fala assim que aparecemos na porta, uma enfermeira está com eles e avisa que teremos alguns minutos, nós quatro a seguimos por um corredor frio e arrepiante, ela abre uma porta e nos deixa passar, deitado em uma cama cercado de maquinas bipando e pulsando está o vovô, acho que nunca o vi tão vulnerável e pequeno quanto ele parece aqui, é como se esse lugar tivesse sugado toda energia e toda vida dele, assim que me aproximo da cama vejo a palidez de sua pele, que na verdade mais se parece com algo cinzento, seus olhos estão fechados, a respiração parece sacrificante, os tubos que saem do seu nariz também parecem atrapalhar, embora eu saiba que o estão ajudando, os braços que sempre estavam prontos pra me receber agora parecem tão fracos quanto eu jamais pensei que fossem, as veias em seu corpo seguem um caminho que me causa um tremor.
— Então você sobreviveu a lua de mel com essazinha – a voz traz apenas uma vaga lembrança da sua voz verdadeira, que saberia exatamente a onda de sarcasmo e ironia, mas que agora já parece esgotada e rouca.
— Até no hospital você consegue ser desagradável – Keyse responde aceitando a ironia dele, enquanto mamãe e eu apenas nos olhamos e tenho certeza que ela está vendo o mesmo que eu, aqui na nossa frente está apenas a sombra de quem ele foi um dia.
— Quem deixou ela entrar? - ele pergunta e tem uma pequena crise de tosse que faz o seu corpo tremer.
— Como você tá? – mamãe pergunta e ele tenta erguer um pouco os braços enquanto faz uma careta.
— Já estive melhor! Quando eu posso sair daqui?
— O médico precisa conversar com você – papai fala parecendo receoso.
— Eu só quero sair desse lugar!
— Eu vou chamar o médico – a enfermeira que estava na porta avisa e sai.
— Você engordou – ele fala olhando pra Keyse mas não há risadas, apenas uma nuvem pesada, como se estivéssemos todos presos a ela, o clima está exatamente assim quando o médico aparece, ele entra e repete e explicação que nos deu, dessa vez com mais detalhes, nós ouvimos com ainda mais atenção, ele fala sobre o transplante, sobre a dificuldade que podemos enfrentar pra conseguir e sobre as chances que ele pode ter, quando termina de explicar tudo, todos os olhos estão em cima do vovô.
— Então eu já posso sair daqui? – ele pergunta e o médico solta o ar como se já esperasse por isso.
— Você ouviu o que o médico disse? – pergunto sem conseguir esconder meu nervoso e minha irritação.
— Que é uma perda de tempo esperar por algo que não vai dar certo? Sim, ouvi perfeitamente – ele fala com a voz rouca e um pouco abafada pelos sons das maquinas.
— Se conseguirmos o transplante você pode ficar bom!
— Se conseguirem achar a fonte da juventude eu posso ficar mais novo também... Só que ela não existe!
— Isso é ridículo... – eu falo com uma risada nervosa – Você não vai sair desse hospital!
— Não é sua escolha, é minha!
— VOCÊ NÃO VAI SAIR! – eu grito com raiva e irritação, todos se calam e apenas os sons das maquinas podem ser ouvidos, todos me olham assustados – Eu vou conseguir a droga do transplante – aviso e viro as costas saindo do quarto, a porta bate forte mas não me importo com isso.
— Pyter... Pyter – Keyse corre atrás de mim e já estava no balcão quando ela me alcança – O que você vai fazer?
— Eu vou salvar a vida do meu avô – afirmo e volto a andar, mesmo sem pedir ela me acompanha.
Nós passamos quase quatro horas seguidas ligando para todo lugar, cada hospital de cada Distrito, não apenas os Hospitais do governo mas também os hospitais particulares, médicos que só agem com uma quantidade surpreendente de dinheiro, mas não me importo com o valor, eu daria cada centavo do meu dinheiro e de tudo que eu tenho pra que ele tenha essa segunda chance, mas embora eu repita pra todos eles isso, que dinheiro não é um problema, ainda assim a resposta é a mesma, “não se pode fazer um transplante sem um órgão novo” e ninguém irá conceder um transplante para alguém com o histórico do vovô, o que eu acho uma verdadeira idiotice, e é exatamente isso que eu acabo de gritar pro telefone, daquele que seria nossa ultima esperança, eu bato o aparelho com tanto força que ele escorrega e cai no chão, a garota próxima a nós se assusta e logo se abaixa pra pegá-lo, Keyse se apressa e a ajuda, pedindo desculpas repetidas vezes junto com um agradecimento que pra mim parece perda de tempo, ela não fez nada, o vovô continua sem um transplante e isso parece que vai fazer minha cabeça explodir a qualquer momento, eu esfrego meu rosto e meu cabelo, tento pensar em mais alguma solução mas nada me ocorre, então quando me viro pro outro lado, vejo vovô numa cadeira de rodas que está sendo empurrada pelo papai, ao lado dele mamãe ajeita a camisa do vovô enquanto ele faz uma cara de dor.
— O que vocês estão fazendo? – pergunto tão alto que todos que estão próximos se viram pra mim, assim como eles.
— Seu avô recebeu alta! – mamãe fala como se isso fosse a coisa mais normal do mundo, eu passo pro outro lado do balcão me aproximando deles.
— Alta? Ele não pode receber alta! Alguém além de mim escutou o que o médico disse? – pergunto com raiva e sem paciência.
— Todo mundo escutou, Pyter! Mas seu avô escolheu ir pra casa! – eu solto uma risada.
— Ele não vai sair daqui! – aviso e avanço pra mais perto, então como se estivesse combinado Keyse surge na minha frente e mamãe também se aproxima de mim parando ao lado dela e me impedindo de alcançar papai e o vovô.
— Não é sua decisão Pyter!
— Eu sinto muito meu amor! – Keyse fala e tenta se aproximar tocando meu rosto, eu me esquivo dela então o elevador aparece, as portas abrem, papai me olha com um pedido de desculpas nos olhos, então empurra a cadeira pra dentro do elevador.
— Não! Não faz isso! – eu exijo tentando passar por elas, mas quando consigo as portas se fecham e a ultima coisa que vejo é o papai sussurrando um “sinto muito” – O que vocês estão fazendo? – me viro pra elas depois de socar a porta do elevador.
— Ele não suportar ficar aqui! Ele odeia esse lugar...
— ELE VAI MORRER! – eu grito e mamãe para de falar e me olha com lagrimas e dor nos olhos.
— Eu também estou sofrendo!
— Que se dane o seu sofrimento, você não tá tentando porcaria nenhuma, só está abaixando a cabeça e aceitando o mais fácil!
— PYTER! – Keyse grita e me olha assustada, eu paro de falar e olho diretamente pra ela, um sentimento de decepção e traição me atinge mais forte do que eu esperava.
— Achei que você estivesse do meu lado!
— E eu estou, meu amor, é claro que eu estou, mas...
— Não tem mas! Ou você tá comigo ou não!
— Pyter, o que a Keyse está tentando dizer é que...
— Não me interessa! Eu não vou desistir de manter o meu avô vivo! – aviso e assim que o elevador do lado abre as portas eu entro, aperto o T, indicando o térreo, e as portas se fecham enquanto as duas me olham com lagrimas, eu soco a parede do elevador e solto um som engasgado de raiva, dor e medo, um medo apavorante de não conseguir. Assim que as portas abrem de novo eu saio correndo, as portas automáticas do Hospital se abrem e eu olho em volta procurando o carro do papai ou eles, mas não os encontro, então xingo mais uma vez e começo a andar o mais rápido possível pra casa, não olho pra nada em volta, ouço vozes me cumprimentando mas não me dou o trabalho nem sequer de olhar pra ver quem é, apenas mantenho meu foco pra não perder o controle antes de chegar em casa, quando passo pela entrada da Aldeia eu vou direto pra casa do vovô onde a porta ainda está aberta, entro sem nenhuma cerimônia, alcanço a sala e não os encontro, já ia subir a escada quando papai aparece no topo dela, ele me olha parecendo que já esperava por isso.
— Vocês não tem esse direito! – eu aviso e subo um degrau.
— Ele tá dormindo! Deixa ele descansar!
— Descansar? Ele tá morrendo fora daquele Hospital!
— Será que a gente pode conversar?
— Eu não quero conversar, quero pegar meu avô e o levar pro Hospital. AGORA!
— Mas a gente vai conversar – ele insiste e desce os degraus me obrigando a recuar também, ele aponta a sala e mesmo não querendo eu o sigo, paramos de frente um pro outro, ele respira fundo, fecha os olhos, joga a cabeça pra trás e então volta a me olhar – Eu sei o quanto isso é horrível, apavorante e cruel, mas não há mais nada que nós podemos fazer...
— Nós podemos levar ele pro Hospital de novo...
— E fazer o quê? Esperar por algo que não vai acontecer?
— Eu posso conseguir o transplante! Eu... Eu posso ir até a Capital, deve ter algum médico, em algum lugar...
— Pyter...
— Tudo se trata sobre encontrar a pessoa certa e... Eu conheci um cara... Um cara na Capital... – nem eu acredito que estou pensando nisso e cogitando a ideia de pedir ajuda aquele cara mas é pelo meu avô e eu estou disposto a tudo.
— Não, Pyter!
— Não? Então a gente não vai tentar nada?
— Nós tentamos! Tentamos por anos, Pyter... Por mais de vinte anos, tentamos por uma vida inteira, tentamos cada dia que pudemos tentar, mas agora não está mais nas nossas mãos...
— Claro que está, você conhece ele... Se a gente insistir, se eu pedir, ele volta!
— Mas é isso que ele quer?
— Ele quer viver!
— E ele viveu!
— E tem que continuar vivo
— Por ele ou por você?
— Pela nossa família!
— Meu filho... eu entendo você, juro que entendo, mas não podemos obrigar ele a voltar lá!
— Por que não?
— Por que quando se ama alguém você respeita a decisão dela... – ele fala e então o barulho na porta nos distrai.
— A gente precisa de dinheiro pro carro! – Keyse avisa e papai se apressa e vai até ela já tirando a carteira do bolso, eu continuo parado no mesmo lugar e Keyse evita me olhar, eles saem pra pagar o carro e eu continuo no mesmo lugar, quando voltam mamãe vem com eles.
— Onde ele está?
— Lá em cima! Ele dormiu! – papai fala e mamãe solta o ar como se estivesse prendendo a horas, ela se aproxima de mim e toca meu rosto.
— Como você tá?
— Eu vou levar ele de volta!
— Você não pode!
— Eu não tô pedindo a permissão de vocês! Eu vou levar ele de volta – aviso e me viro pra subir as escadas.
— Mas você não pode! Ele assinou um documento – papai revela e isso me faz parar e me virar pra eles – Ele sabia que você ia tentar fazer isso, então junto com a alta, ele também assinou um documento que proíbe o Hospital de interna-lo de volta, independente do motivo! – o choque da noticia parece realmente absurda.
— E vocês aceitaram isso?
— Nós não aceitamos 90% das coisas que seu avô faz, mas... Respeitamos seu pedido!
— E o que ele pediu? Pra morrer?
— Pra não morrer em um quarto de Hospital, sozinho e como um invalido! – isso me deixa sem resposta e a sensação de estar perdendo a batalha aumenta ainda mais, eu me sento no degrau da escada, as mãos de cada lado da cabeça apertando e tentando acordar desse pesadelo, até que as mãos por cima da minha me faz abrir os olhos.
— Seu avô não ia suportar voltar pra lá, eu sei que você quer ajudar, que quer ver ele bem, mas... Colocar ele lá de novo não é ajuda!
— Deixar ele lá em cima sem nenhum tratamento também não!
— Ele só quer estar perto de quem ele ama! Ele só quer continuar sendo amado até o ultimo segundo!
— Desculpa mãe, mas eu não vou participar disso!
— Pyter...
— Vocês estão deixando ele se matar e eu não vou participar
— Nós não podemos fazer nada! – papai afirma e eu me levanto.
— Eu passei minha vida inteira olhando pra vocês como heróis mas agora... Tudo que eu vejo são duas pessoas que desistiram antes mesmo de tentar! Isso é covardia e eu nunca vou perdoar vocês por isso! – mesmo o choro da mamãe não me faz recuar no que digo, eu passo por eles, Keyse está parada no meio da sala e me olha como se não me conhecesse, eu passo por ela também, saio da casa e vejo Pérola de mão dado com Pietro e Ian trazendo Louise no colo.
— O vovô voltou? – Pietro pergunta saltitando de alegria, eu olho pra Pérola e ela parece já saber que isso não é bom, mas não me prendo a responder e nem mesmo parar, desvio deles e saio da Aldeia, não faço a menor ideia de pra onde ir, ou o que fazer mas não vou conseguir ficar lá dentro daquela casa, olhando pra eles e simplesmente esperando o pior acontecer, eu não vou fazer isso. Só percebo onde estou quando paro na frente da porta que já está descascada em um tom de azul desbotado, eu bato na porta e depois de uma voz alta soar lá dentro Ryan abre e sorrir assim que me vê.
— Então ela me devolveu você inteiro... – ele me puxa pra um abraço meio estranho e apertado enquanto bagunça meu cabelo, ele está rindo e solta uma piada sobre o quanto eu devo estar exausto mas quando ele ameaça me soltar eu apenas o abraço mais forte – Tava com saudade mesmo eim – ele ri mas todo o peso do dia desaba nos meus ombros, minha garganta arde e se aperta enquanto eu tento me segurar – Cara, tá tudo bem? – assim que ele pergunta um choro preso e sufocado se libera, sinto meu corpo tremer e mesmo tentando parar só consigo chorar mais e mais, as risadas dele param junto com as piadas, ele me aperta nele e mesmo sem saber o que está acontecendo ele permanece comigo, não sei quanto tempo passa mas quando consigo me controlar minha própria camisa já está molhada de lagrimas, ele segura meu rosto e me olha e mesmo um pouco assustado ele se mantem firme, ele me faz um sinal de cabeça e com a mão no meu ombro ele me leva pro quarto dele, eu me jogo na poltrona e ele desparece do quarto, o choro embora tenha perdido a força ainda insiste, eu enxugo meu rosto tentando manter algum controle sobre mim, mas meu corpo parece exausto, eu jogo minha cabeça pra trás encarando o teto, respiro fundo várias vezes e então olho ao redor, na estante ao meu lado está em um porta retrato uma foto minha e do Ryan quando ainda eramos dois pirralhos e ao lado uma recente, do dia do meu casamento, o mais surpreendente é o mesmo tipo de laço que mantemos, os mesmos sorrisos de dois garotos que viviam colocando o outro em alguma roubada, mas que sempre se protegiam e eu acho que foi esse motivo que me trouxe aqui, por que eu sempre posso contar com ele, eu sei que a maioria dos garotos e homens que conheço jamais faria isso de chorar e talvez muito menos de chorar abraçado ao seu melhor amigo, mas é isso que ele é, meu melhor amigo e eu sei que ele jamais vai me julgar por isso, ele é meu irmão e não me imagino procurando outra pessoa num momento desse. Ele volta trazendo uma garrafa de agua e um copo, se aproxima de mim e me entrega o copo.
— Tá sujo! – eu falo antes dele colocar a agua mas ele enche o copo assim mesmo, eu o olho e antes que eu reclame ele se adianta em explicar.
— É açúcar, dizem que funciona – ele dá de ombros fazendo uma careta e eu acabo dando uma risada, eu bebo a agua mesmo sem acreditar que funcione, afinal uma colher de açúcar não pode mudar nada, ele coloca a garrafa no chão ao lado da poltrona e puxa uma almofada grande que nós nos sentamos quando venho aqui jogar vídeo game, ele se joga nela e me olha esperando que eu conte, termino meu copo de agua e respiro fundo antes de começar a contar tudo que houve desde que eu cheguei de viagem, ele ouve atentamente com um ou outro balançar de cabeça até que eu termine toda história.
— Bom, é uma história e tanto! – ele fala tentando aliviar o clima, eu dou de ombros e encho mais um copo com agua – Você sabe que é meu melhor amigo, não sabe? Que é mais do que um irmão pra mim? Que eu nem consigo imaginar como seria minha vida sem você, sem nossa amizade, certo? – dou um aceno com a cabeça indicando que ele continue, por que eu já sei de tudo isso e sinto o mesmo em relação a ele – Mas você foi um babaca! – ele fala e eu não consigo segurar a irritação – Nem adianta ficar puto comigo! Você que me procurou e eu sinto muito, muito mesmo pelo velho, você sabe que eu considero ele como um segundo avô, mesmo com aquele humor azedo dele, mas sempre gostei dele! E eu posso imaginar o que você está sentindo, só que não é só você que tá sentindo... – ele fala o que a Keyse mesmo me disse – Se é difícil pra você imagina como é pros seus pais! Sua mãe perdeu o pai quando era uma criança, depois sua tia, sua vó abandonou ela por anos e depois morreu! Seu pai perdeu a família inteira de uma única vez! Tirando você e seus irmãos, ele é toda família que eles tem e eu nem estou mencionando o fato que ele passou pelo maior pesadelo deles junto com eles, toda história dos jogos, da guerra, tudo... Você tá perdendo seu avô, é horrível, eu sei, mas eles estão perdendo um pai postiço, um mentor, um amigo, a única família que eles tiveram por anos e anos, então me desculpa, mas a sua dor não é maior do que a de ninguém! – as palavras dele tem o poder de me fazer pensar em algo que parecia inexistente pra mim, eu nem posso imaginar como está a cabeça da mamãe agora vendo a vida tirar dela mais uma pessoa que ela ama, por que por mais que eles brigassem a cada segundo eu sei o quanto eles se amam, e o papai, ele não tem mais ninguém além de nós e tá perdendo mais alguém de novo, vergonha não é nem metade do que eu sinto.
— Eu fui um babaca! – confirmo esfregando o rosto e me afundando na poltrona.
— Foi! Mas não tô dizendo que é fácil pra você! Eu sei tudo que seu avô é pra você e se tivesse um única chance de eu reverter isso pra você, eu faria, mas eu não posso, eu só sinto muito mesmo e... Eu tô contigo, pro que você precisar! – ele fala e eu sei que ele estará, eu me levanto e ele também, o puxo pra um abraço e tenho certeza que essa foi a melhor decisão que já tomei.
— Já escureceu – ele avisa como um recado e eu entendo perfeitamente, ele me leva até a porta e me dá um ultimo abraço, sigo pra casa ainda mais rápido do que quando sai de lá, quando alcanço a casa ouço as vozes abafadas na sala, entro e todos se calam, mamãe e papai estão sentados no sofá, ele com o braço envolvendo ela, Pérola está amamentando Louise e Ian está fielmente ao seu lado, então Keyse aparece saindo da cozinha com uma bandeja nas mãos, ela me olha mas rapidamente se concentra na sua tarefa, ela coloca a bandeja sobre a mesinha e pega as canecas servindo um a um.
— O cheiro está ótimo – papai fala depois de inspirar o perfume que sai da caneca.
— Eu coloquei um pouco de camomila misturado no hortelã! – ela fala com um sorriso fraco.
— Obrigada – mamãe fala com o mesmo sorriso fraco que ela.
Depois que serve a todos ela finalmente me olha.
— Eu não sabia que você ia aparecer – ela fala já com a bandeja vazia, antes que eu fale algo ela se afasta e volta pra cozinha.
— Onde tá o Pietro?
— Lá em cima! Assim que seu avô acordou ele se recusa a sair de lá e seu avô não pediu o contrario então... – papai fala com o tom mais natural que ele consegue, eu concordo e então ele me aponta a direção da cozinha com a cabeça, eu concordo e vou até lá, Keyse está guardando algumas coisas no armário e mesmo que eu tenha certeza que ela sentiu minha presença ela não para.
— Eu fui um idiota, grosso, babaca, cego e ignorante, eu nunca. Nunca. Devia ter te tratado como eu te tratei, e eu me odeio por isso! Você tentou me ajudar, me apoiar e a única coisa que eu fiz foi ser um estupido com você...
— Não só comigo – ela fala e se vira pra mim, eu concordo.
— Como todos vocês! – ela concorda.
— Eu não me casei com você só por que você é bonitão e engraçado ou por que eu sei que você tem um futuro brilhante pela frente ou por que eu espero viver os melhores momentos da minha vida do seu lado! Eu me casei com você por que eu espero que no pior momento da minha vida você segure minha mão e fique do meu lado, eu me casei com você por que quando o mundo estiver caindo sobre nós dois nossas mãos continuem entrelaçadas, eu me casei com você pra poder estar do seu lado quando o SEU mundo estiver caindo, por que eu quero ser aquela pessoa que você vai apertar a mão, quero ser quem você não vai excluir, foi por isso que eu me casei com você, por que eu te amo mais do que eu jamais vou conseguir amar alguém e eu daria minha vida pra sua felicidade!
— VOCÊ É minha felicidade – eu me aproximo dela e seguro seu rosto – Eu não posso nem pensar em perder você!
— E você não vai perder, só quero que você entenda que eu tô do seu lado, mesmo quando você achar que eu não estou!
— Eu sei! Me perdoa... Me perdoa, por favor...
— Eu te amo, Pyter! Eu sempre vou estar aqui – ela avisa e me abraça, então é como se magicamente toda aquela dor, desespero, pânico e confusão se acalmasse, como se através do toque dela toda minha vida entrasse nos eixos novamente, nos braços dela eu sinto minha dor ser amenizada e enxergo tudo de bom que ainda podemos viver.
— Eu te amo! – afirmo sem me soltar dela, ficamos apenas abraçados um ao outro por vários minutos.
— Você tem que falar com seus pais! – eu concordo e nós saímos da cozinha, eu me aproximo deles e me sento do lado da mamãe, eu seguro sua mão e olho nos olhos dela.
— Eu não tinha o direito de falar do jeito que eu falei com você! Eu estou com raiva sim, mas não é sua, nem sua... – olho pro papai que confirma com um aceno discreto – Eu não sou ninguém pra julgar tudo que vocês já fizeram um pelo outro, vocês três são os maiores exemplos de força que eu tenho! Vocês não tem culpa de nada e eu só espero que vocês me perdoem... – em resposta ela me abraça e beija meu rosto.
— Ele é seu avô, acho que eu não esperava outra atitude sua! É só que... É uma decisão dele!
— Eu sei!
— Ele já perguntou por você umas dez vezes – Pérola fala e eu concordo mas ainda não tenho coragem de subir e falar com ele, por isso continuo na sala com eles, as horas passam, mamãe e papai sobem pra buscar Pietro pra jantar, mas quando voltam estão apenas papai e Pietro, ele parece um pouco abalado mas não diz mais nada sobre se sentir culpado e quando fala que o vovô disse que ele vai ser o novo dos gansos ele está orgulhoso disso, Pérola começa a chorar por que ela sabe exatamente o que ele está fazendo, como estou perto dela eu a abraço e ela chora com o rosto apertado no meu peito.
— Eu não vou aguentar, Pyter – ela fala entre soluços, eu a levo pra longe do Pietro e enxugo suas lagrimas.
— Nós vamos aguentar! Eu tô aqui com você e você tá comigo, certo? – ela concorda e volta a chorar me apertando cada vez mais, então mamãe desce, seus olhos estão inchados, vermelhos e ela não tenta disfarçar, até por que seria inútil, eu e Pérola a olhamos com expectativa.
— Ele quer falar com seu pai! – assim que ela fala Pérola volta a chorar, mamãe passa por nós e acaricia o cabelo da Pérola e toca meu braço, vai pra cozinha e então papai passa por nós subindo a escada, Ian aparece e Pérola me solta, enxuga as lagrimas e pega Louise dos braços dele, Keyse, mamãe e Pietro também vem pra sala, nós nos sentamos espalhados pelo sofá e poltrona, Pérola coloca em um canal de desenhos e Louise e Pietro ficam rindo com uma dança de um bichinhos coloridos, Keyse segura minha mão me passando algum conforto, mamãe se mantem ocupada limpando e ajeitando qualquer coisa que esteja fora do lugar, ou mesmo as que estão no lugar e ela muda de lugar, quase meia hora depois papai desce as escadas, os olhos tão vermelhos quanto os da mamãe, ela se apressa e se joga nos braços dele.
— Ian e Keyse! – ele fala apontando pra cima, sua voz é embargada e parece segurar todas as emoções possíveis, Keyse me olha nervosa e eu beijo sua testa, ela e Ian se entreolham e sobem juntos, Pérola vem pro meu lado e se agarra em mim.
— Pyter... – é tudo que ela consegue dizer antes de chorar, deixo ela no meu colo tentando passar algum conforto assim como Keyse estava fazendo comigo, eles demoram menos que papai e antes que eles avisassem eu e Pérola nos levantamos, a cada degrau que subimos sinto peço mais urgentemente que tudo isso seja mentira, mas quando alcançamos a porta do quarto dele e eu o vejo na cama toda minha esperança desaba, Pérola aperta minha mão e nos aproximamos dele, sua cor parece ainda mais desbostada, seus olhos estão fundos, vermelhos e em volta começando a ficar arroxeado, sua testa está suada e ele parece estar sentindo dor.
— Vovô – Pérola fala e se joga ao lado dele, o abraçando e chorando.
— Ei minha menina! – ele fala tentando se olhar o rosto dela, ele está sentado apoiado nos travesseiros mas ainda parece desajeitado, Pérola se afasta um pouco, ele passa os dedos enxugando as lagrimas dela – Minha princesa... Eu lembro quando eu te peguei pela primeira vez, acho que foi a primeira pessoa que roubou meu coração sem nem me olhar direito... Não precisa ficar com ciúme – ele fala me olhando, eu tento forçar um sorriso mas não consigo, por que na minha frente, está uma das pessoas que eu mais amo nesse mundo morrendo e eu não posso fazer nada contra isso – Vocês dois... São a versão menos irritante do pai de vocês – ele fala e acaba dando uma risada mas que parece causar dor nele, ele fecha os olhos por alguns segundos e volta a nos olhar – Eu nunca... Pensei em ter uma família de novo, depois... Depois de tudo, eu já tinha decidido ficar sozinho, ai seus pais apareceram e eu achei que já era tudo mas vieram vocês ... – ele sorri e puxa Pérola pra mais perto dele, ele beija a cabeça dela e ela beija sua bochecha, ele me estica a mão e eu aperto – Eu não quero que vocês fiquem chorando por mim... Eu só tô tirando minhas férias dessa loucura, finalmente não vou ter que aturar a mãe de vocês reclamando toda hora e nem cozinhando... – ele ri fazendo uma careta.
— Eu te amo, vô! – Pérola fala e isso parece quebrar a risada dele, seus olhos se enchem de lagrima e ele a abraça, beijando varias vezes sua cabeça.
— Eu também amo você, minha menina! E eu vou amar não importa o que aconteça ou onde eu esteja, eu amo você, você sempre vai ser minha princesa, a mais linda de todo mundo...
— Eu não tenho mais cinco anos, vô! – ela fala meio rindo meio chorando.
— Não, você já é mãe, esposa, dona de casa, estilista e a mulher mais incrível que eu já vi! Nunca esqueça disso! Você merece tudo, merece mais do que tem e merece mais do que um dia você possa ter, não deixa nada, jamais te fazer pensar diferente disso, por que esteja onde estiver eu vou dar um jeito de puxar sua orelha... – eles dois riem e choram juntos – E você... Nunca cresça! É meu único pedido pra você! Não cresça! Seja sempre esse homem com o mesmo espirito e humor daquele garotinho que vinha me fazer catar sapo pra levar pra escola, essa é a sua maior qualidade, sua alma é tão pura, seu coração é tão grande que eu tenho pena de quem não te conhece...
— Eu também – eu falo e ele e Pérola ri.
— Isso! Nunca perca isso – ele pede e eu concordo, ele respira fundo e força um sorriso – Abre a segunda gaveta da cômoda – ele me aponta a cômoda do outro lado, me levanto e vou até lá, abro a segunda gaveta e encontro uma caixa de veludo preta, eu pego e levo até ele – Uma vida inteira dentro de uma caixa – ele fala meio nostálgico talvez, então abre a caixa, varias cartas quase saltam do lugar, outros objetos estão lá, uma tesoura, uma presilha de cabelo, um lenço, um estojo preto e uma caixinha vermelha, ele pega esses dois e volta a fechar a caixa, ele coloca sobre o colchão e nos olha com um sorriso cansado, então pega a caixinha vermelha, e se vira um pouco mais pra Pérola – Eu conheci uma garota... Antes dos jogos... Eu acho que ela foi a mulher da minha vida, eu tinha certeza que a gente ia acabar casando e... Enfim... Não aconteceu! Mas assim que eu recebi minha recompensa dos jogos eu passei no joalheiro mais caro da Capital e comprei isso – ele fala e abre a caixinha, dentro um cordão de ouro cintila como se tivesse sido acabado de ser comprado, na ponta dele o símbolo de um oito deitado brilha com pedrinhas cintilantes – É o símbolo do infinito.
— É lindo vovô! Nossa – Pérola se encanta olhando a joia, ele sorri.
— Que bom que você gostou... – ele tira o colar e se vira pra colocar nela mas ela esquiva.
— Eu não posso! Não... Não posso aceitar!
— Eu comprei pro primeiro grande amor da minha vida, e tô entregando pra ultima!
— Vovô...
— Você não vai negar o presente de um moribundo, vai? – ele fala e mesmo que ela o olhe com repreensão, ele sorri orgulhoso quando ela levanta o cabelo e se vira pra ele prender o colar, ela se vira pra ele e sorri.
— Obrigada, é lindo! Eu nunca vou tirar!
— Ah vai sim! Por que eu quero que você me prometa que quando a Loui fizer 15 anos esse será meu presente dela, até lá você cuida dele, combinado? – os olhos dela enchem de lagrimas e escorrem pelo seu rosto, ela concorda e se inclina abraçando ele.
— Espero que meu presente seja tão bom quanto esse – eu falo aliviando o clima, ele ri, então Pérola me deixa sentar perto dele, ele pega o outro estojo e me olha.
— Infelizmente o seu não é tão caro... – ele fala e eu faço uma careta, ele ri – Meu pai morreu quando eu tinha 12 anos, ele ficou bem doente e não tínhamos muitos recursos... Mas antes dele morrer ele me chamou no quarto e me entregou isso... – ele fala e me entrega o estojo dentro tem um relógio antigo de bolso, ele parece bem antigo mas dentro está gravado o sobrenome dele, eu o olho e ele sorri – Ele me disse que eu devia entregar quando tivesse meu primeiro filho! Bom, isso não aconteceu, mas eu não consigo pensar em ninguém melhor pra cuidar dele e assim ele não sai da família e mantemos a tradição – minha garganta se aperta e as lagrimas escorrem do meu rosto, eu o abraço querendo tirar toda dor, todo incomodo mas tudo que eu consigo é chorar junto com ele, Pérola também se junta ao abraço e por alguns longos minutos nós apenas ficamos abraçados, chorando e rindo enquanto lembramos de alguma história engraçada, só saímos do quarto quando mamãe sobe com um prato de sopa pra ele.
— Eu não vou comer nada que você fez, essa pode ser minha ultima refeição, quero levar uma boa lembrança...
— Em primeiro lugar você é um velho babaca, em segundo foi o Peeta que fez! – ela fala e entrega o prato a ele que ri satisfeito por ter irritado ela.
— A Louise tá chorando, melhor você ver o que é! – mamãe avisa a Pérola.
— Eu vou ver o Pietro e a Keyse! – aviso e deixo eles sozinhos.
Aos poucos cada um vai pra casa e toma banho, troca roupa mas todos voltamos o mais rápido possível, Pietro e Louise são os únicos que acabam dormindo, colocamos colchões na sala e ficamos cada um em um canto da casa, a cada hora cada um vai até o quarto vê como ele está mesmo com ele reclamando que estamos atrapalhando o sono dele, mesmo assim fazemos, até que quando papai sobe, as 4 horas da manhã e aparece no topo da escada todos já sabemos o que significa, ele não preciso dizer uma única palavra estava tudo em seu rosto, seus olhos, as lagrimas que escorrem deles, Pérola chora com tanta dor que me causa um tremor no mais fundo da minha alma, ela se agarra em mim e eu choro junto com ela, choro a morte não apenas do meu avô, mais do homem que mais me ensinou mesmo com todos os defeitos dele, aquele sabia como me encorajar sem usar muitas palavras, aquele que acalmava sem precisar nem abrir a boca, aquele que eu jamais vou esquecer, Haymitch Abernathy pode ter morrido pro mundo hoje mas ele sempre vai estar vivo dentro de mim.

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Nova fase'" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.