Nova fase' escrita por HungerGames


Capítulo 16
Cinco anos depois...


Notas iniciais do capítulo

VOLTEI!
Esperando comentário de vocês lá embaixo ein? rsrs...



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Eu acordo com pulos na cama e uma enorme gritaria, meu lençol é puxado e antes que eu abra os olhos Lucca e Theo estão em cima de mim.
— Tem um monte de neve lá fora!
— Acorda pai, anda logo! - eles sacodem meu rosto e mesmo quando já estou de olhos abertos ainda não se acalmam.
— Tá tudo branco!
— Eu quero ir lá fora! – Lucca fala ficando em pé na cama.
— Eu também! – Theo se apressa em falar enquanto está ajoelhado no meu travesseiro, a um centímetro da minha cabeça e pela animação que ele se balança acho mais seguro me afastar e acabo sentado.
— Ô pai, a gente podemos fazer um boneco de neve? – Lucca pergunta se jogando sentado no meu colo.
— Muito grande e com duas cabeças – Theo completa arregalando os olhos ansiosos.
— Duas não, três! – Lucca acrescenta e eles me olham esperando a resposta.
— Três? Vamos fazer quatro logo – eu falo e eles comemoram levantando as mãos e gritando animados.
— Ô mãe, ô mãe, a gente vamos fazer um boneco de neve com dez cabeça – Theo fala pulando da cama e correndo até o banheiro onde Keyse está.
— Eu escutei seu pai falar quatro e não dez! – ela fala aparecendo na porta enquanto enxuga o rosto.
— Você nunca sabe de nada – ele fala e levanta os ombros como se estivesse exausto.
— Ei, olha como você fala com a sua mãe, ein – eu aviso e ele solta o ar e se vira pra ela.
— Desculpa, você sabe sim – ela solta um sorriso agradecido e então Lucca que pula da cama.
— Anda pai, vamos lá fora!
— Depois que vocês tomarem café e colocarem pelo menos uns dez casacos, por que essa madrugada eu ouvi o senhor tossindo, seu Lucca! – Keyse avisa e os dois jogam a cabeça pra trás ao mesmo tempo e isso nos faz rir.
— Podem rir, mas não vai ter ninguém gripado nessa casa, então... CASACO! – eles fazem uma expressão de cansaço e antes que iniciem uma reclamação eu me adianto.
— Quem tá afim de ir tomar café na casa do vovô? – pergunto e agora eles abrem um sorriso gigante.
— Eu vou pedir pro vovô fazer três panquecas pra mim – Lucca fala mostrando mais dedos do que apenas três.
— E eu quero bolo de chocolate, dez pedaços e dez pão de queijo e dez morango!
— Ele cismou com o numero dez hoje – Keyse fala sentando na cama ao meu lado enquanto eles continuam dizendo tudo que irão comer, eu sorrio e aproveito a distração deles pra dar um beijo um pouco mais demorado nela.
— Que nojo! – Theo é o primeiro e reclamar fazendo uma careta exagerada.
— A gente já podemos ir? – Lucca apenas pergunta entediado.
— Vamos, tem que trocar de roupa!
— Eu não vou tomar banho – Lucca cruza os braços já se afastando dela.
— Você vai tomar banho, não agora, mas vai tomar banho depois, por que ontem você dormiu sem banho! – ele solta os braços, bate os pés e começa se sacudir – Pyter, ele tá batendo os pés e fazendo pirraça – Keyse avisa e assim que eu o olho ele para e fica me olhando.
— Vai continuar? – ele nega e abaixa a cabeça – Então vai com a sua mãe trocar de roupa! AGORA – ele concorda e quando Keyse oferece a mão ele aceita rapidamente e vai sem reclamar, Theo vai correndo logo atrás deles, eu acabo sorrindo.
Tanto Theo quanto Lucca tem temperamentos fortes e isso tem custado muita conversa e alguns castigos, semana passada mesmo Lucca ficou sem seu brinquedo preferido que é um caminhão de controle remoto, por que ele gritou com Keyse e jogou a camisa que ela tentava colocar nele longe, então eu tive que dar uma bronca nele e lhe tirei o brinquedo, mas ontem ele saiu do castigo, por isso me obedeceu tão rapidamente agora. Eu também mudo minha roupa ficando o mais aquecido possível.
— Ô pai o Lucca pisou no meu carrinho – Theo entra pelo quarto ameaçando chorar.
— Foi sem querer – Keyse vem logo atrás, mas ele já iniciou o choro enquanto segura nas mãos as duas metades do carrinho agora tragicamente quebrado.
— Desculpa pai, eu não vi!
— Não foi o meu carrinho que você quebrou, foi o do Theo, então quem merece as desculpas? – ele desvia os olhos de mim e encara o irmão.
— Desculpa, eu não vi seu carrinho – ele fala e passa a mão no cabelo dele – Eu deixo você pegar um dos meus – Theo olha desconfiado e para de chorar por um segundo.
— Eu quero dois então! – eu seguro o instinto de rir.
— Ele quebrou um, então você pega um – Keyse fala e Theo olha pro carrinho e depois olha pra ela.
— Tá! Mas eu quero ir no vovô primeiro – ele fala já colocando o carrinho em cima da nossa cama e esticando a mão pra mim, eu sorrio e seguro sua mão.
Descemos as escadas e as pequenas caixas que estão no canto da sala chama atenção da Keyse.
— Faltam onze dias, acho que estamos no prazo limite pra enfeitar a arvore – Keyse fala enquanto saímos de casa, o vento gelado quase assovia nos nossos ouvidos, nossas botas afundam na neve e os meninos riem e adoram isso, eles estão de touca, luva e pelo menos uma dezena de casacos mesmo assim Keyse não permite que eles andem até lá, por isso levamos eles no colo, eles reclamam e dizem que não são bebê mas ela só dá permissão pra libera-los na varanda da casa dos meus pais e eles logo entram correndo aos gritos de vovô e vovó, ouço eles rindo em resposta e eu e Keyse entramos logo atrás, a casa está quente, a lareira acesa e um delicioso cheiro de pão assando que sempre foi típico aqui, mas engraçado que só comecei a realmente apreciar isso quando não sentia mais esse aroma todo dia, e hoje cada vez que entro nessa casa e esse cheiro me recebe sinto uma onda de nostalgia e conforto que não sinto mais em lugar algum.
Quando alcançamos a cozinha os dois estão sentados em cima da mesa, Lucca já está com a boca cheia e Theo está contando animadamente pra mamãe sobre como ele vai fazer um boneco de neve com dez cabeças.
— Tá com muita neve lá fora? – papai pergunta desviando um pouco a atenção deles.
— Bastante – falo pegando um biscoito de dentro do pote e Lucca reclama que é só dele, Pietro entra na cozinha todo arrumado – Alguém caiu dentro do vidro de perfume ein! – eu falo implicando com ele que empurra minha mão antes que eu alcance seu cabelo.
— Seu irmão disse que tá cheio de neve, não é melhor você remarcar isso? – mamãe fala e ele revira os olhos.
— Mãe, não se remarca um aniversário, qual é? – ele olha pro papai e faz sinal de ajuda.
— Eu posso ir com você? – Theo pergunta já pendurado no pescoço dele.
— Dessa vez não, mas a gente vai sair outro dia, combinado? – ele parece um pouco decepcionado, mas concorda.
— E posso saber onde você vai? – pergunto curioso.
— Pra casa do Tom, é aniversário dele amanhã e combinamos de todo mundo ir pra lá e dormir!
— E vai ter garotas? – ele me olha com um sorriso malicioso – Esse é meu garoto – eu falo puxando ele pra um abraço meio de lado.
— Ei, ei, ei, por que eu não soube dessa parte? – papai pergunta encarando ele que novamente revira os olhos.
— Deixa o garoto ser feliz! – eu peço e mamãe e Keyse já estão achando graça do desespero dele.
— As garotas também vão dormir lá?
— Acho que dormir é a ultima coisa que eles vão fazer né?
— Pyter!!!! – mamãe e Keyse falam juntas enquanto escondem uma risada.
— Relaxa, ninguém vai agarrar seu filhote não, ele vai voltar pra casa puro e virgem né?
— O que é virgem? – Thom pergunta me olhando confuso, eu solto uma risada e Keyse me dá um tapa.
— Quando a pessoa não come muito doce! – ela fala tentando não sorrir.
— Eu nunca quero ser virgem – ele fala e dessa vez ninguém segura a risada.
— E você tá rindo do quê? Isso não é assunto pra você – papai fala pro Pietro que revira os olhos.
— Pai, eu tenho quinze anos e não cinco!
— Eu tenho cinco – Lucca fala mostrando os cinco dedos.
— Sobre ser agarrado ou agarrar alguém...
— Paaai, qual é? Eu não vou ser agarrado – ele fala revirando os olho.
— Agora se ele vai agarrar alguém aí é outra história né? – eu falo colocando a mão no ombro dele.
— Você não tá me ajudando – ele fala mas acaba sorrindo.
— Pietro, pega sua mochila e vai logo antes que seu irmão faça seu pai ter um ataque do coração – mamãe fala e beija a testa dele.
— Eu te levo! – papai fala já se afastando da mesa.
— Acho que consigo chegar até o centro sozinho – ele fala fazendo uma careta, beija o papai, os meninos e grita um até amanhã quando sai de casa.
— Eu quero dez pão de queijo – Theo fala mostrando todos os dedos e papai sorri.
— Onde o Pietro tá indo com tanta pressa? – Pérola pergunta já entrando na cozinha.
— Pegar as novinhas!
— Pyter – mamãe briga e me acerta um tapa na cabeça.
— Ô mãe, meu pai disse que eu não vou poder ir na casa da Lena! – Louise entra reclamando.
— Se seu pai disse não, então é não! – Pérola dá de ombros e Louise sai batendo o pé pra sala, ela já está com nove anos e o gênio cada vez mais forte, Pérola não vai atrás dela, ao invés disso agarra um dos meninos, beijando e mordendo a bochecha – Meu Deus, como você tá gostoso! – ela fala agora fazendo cócegas na barriga – E cadê o Theo?
— O Theo sou eu tia – ele fala botando uma mão na cabeça como se já tivesse cansado de repetir isso.
— Não é culpa minha que vocês são iguais – ela dá de ombro e vai até o Lucca apertando e mordendo também – É sério, já tá na hora de colocar uma plaquinha em cada um, sei lá.
— Eu não vou usar praquinha – Theo fala meio revoltado.
— Ninguém vai usar, vocês não tem culpa se sua tia tem uma cabeça de vento – Pérola me acerta um tapa e então o choro distante alcança a cozinha.
— Você pode, por favor, falar com ela? – Pérola me pede juntando as mãos e fazendo uma cara de desespero.
— Você pode ficar com os garotos na quinta? Eu e Keyse temos um jantar com os Thompsons... – ela me olha avaliando a proposta.
— Eu te odeio, Pyter Mellark! – eu abro um sorriso e a abraço apertado.
— Também te amo! – solto-a e vou pra sala, Louise está encolhida na poltrona, com uma almofada tampando seu rosto e mesmo assim ouço o choro e alguns soluços, me aproximo dela, ajoelho na sua frente e passo meus dedos pelo seu cabelo, o choro para e ela levanta os olhos apenas pra ver quem é, quando me vê, ela solta almofada e estica as pernas ficando cara a cara comigo, os olhos vermelhos e as lagrimas marcando o rosto.
— Todas as minhas amigas vão! Eu nunca posso fazer nada, eu odeio isso, odeio! – ela fala e bate as mãos na almofada.
— Em primeiro lugar, sem dramas por que você sabe que isso não funciona comigo, certo? – ela fecha a cara, viro o rosto e cruza os braços – Ok, não quer conversar, então fica aí sozinha! – falo e me levanto já saindo da sala.
— Espera! – ela pede quando vê que eu realmente vou sair, ela solta o ar e abaixa os braços – Eu quero conversar, desculpa! – eu sorrio e volto a me abaixar na frente dela.
— Agora vamos ao problema... Você quer ir numa festa e seu pai não quer deixar, é isso? – ela concorda – E a festa é de quem?
— Da Lena!
— Lena, não é aquela garota que disse que você tinha cara de esquilo e que derrubou sua mochila? – ela desvia os olhos e dá de ombros – Eu não falo a língua dos ombros, você tem que responder com palavras.
— É, mas ela disse que foi sem querer!
— Bom, eu lembro que você chegou em casa chorando e ficou muito, muito triste um tempão. Ela pelo menos te pediu desculpas?
— Ela disse que foi sem querer
— Isso é um pedido de desculpas? – ela pensa alguns segundos e nega – Então por que você quer ir na festa dela?
— Por que todo mundo vai tá lá!
— Bom, você é minha sobrinha, filha da Pérola e do Ian, neta da Katniss e do Peeta, tem o Pietro como tio, é prima do Lucca e do Theo, então...
— Eu não sou todo mundo! – ela completa e me dá a sombra de um sorriso.
— Exatamente! Então “todo mundo” não vai estar lá e sabe por que? Por que a garota mais linda, inteligente, engraçada, esperta e que não tem cara de esquilo vai estar aqui ajudando eu e seus primos a montar um boneco de neve – dessa vez o sorriso dela é realmente animado – E tem que ter dez cabeças! - Isso é impossível – ela fala e levanta os braços rindo.
— Impossível? Meu amor, eu sou Pyter Mellark, não existe nada impossível pra mim, sabe por que?
— Por que você é incrível – ela revira os olhos mas ri.
— E você está cada dia mais esperta – eu falo e me levanto, ofereço a mão pra ela que sorri e fica em pé na poltrona, ela estica os braços pra mim – Você sabe que eu tô ficando velho né? – ela dá de ombros.
— Achei que você fosse incrível...
— Desafiando meu ego? Uau, você é realmente esperta, gosto disso – sorrio realmente orgulhoso, viro as costas pra ela e em pulo ela está grudada em mim, passa os braços pelo meu pescoço e as pernas ao redor do meu corpo e então eu a levo de volta pra cozinha enquanto ela ri animada, coloco-a sentada na mesa.
— Eu odeio muito você – Pérola fala parando ao meu lado – O que você fez?
— Não posso revelar meus segredos ou como eu vou conseguir babá de graça? – sorrio vitorioso – Mô, a Pérola vai ficar com os meninos na quinta! – falo quando Keyse se aproxima.
— Espero que ele não tenha te chantageado muito – ela fala mas sorri e me dá um beijo rápido.
— Relaxa, depois de todos esses anos, eu meio que acostumei – ela dá de ombros e vai servir o chocolate quente pra Louise, Ian aparece e quando Louise corre na direção dele contando como Lucca conseguiu pular de uma cadeira pra outra, ele olha confuso pra Pérola.
— Pyter – ela fala e corre pra tirar um bolo do forno, ele me olha curioso.
— Não precisa agradecer, só precisamos que vocês olhem os meninos na sexta – Keyse fala se aproximando dele.
— Bom, ela mal tava falando comigo e agora pulou no meu colo, seja lá o que ele disse, posso pagar ficando com eles na sexta!
— Ei, ei... Você disse na quinta – Pérola fala se metendo entre nós.
— Na verdade o Pyter disse pra você na quinta e você aceitou, agora eu disse pro Ian na sexta e ele também aceitou, então... – Keyse dá de ombros e me olha com aquele sorriso malicioso.
— Meu Deus, como eu amo essa mulher e essa mente incrível – falo inclinando ela pra trás e lhe dando um beijo.
— Vocês dois são perfeitos um pro outro... Dois, dois... AHHHH eu odeio vocês dois! – Pérola fala batendo o pé e nós rimos.
— Se odeiem depois do café ou vai esfriar tudo – mamãe avisa e logo a cozinha é uma bagunça de vozes e movimentos.
Quando terminamos o café desocupamos a cozinha, os meninos e Louise insistem em ir montar o boneco de neve e acaba que todos nós vamos para o lado de fora, os meninos gargalham alto cada vez que um deles afunda na areia e Louise ri orgulhosa quando me acerta uma bola bem na cabeça, claro que eu revido e logo estamos numa guerra de bolinhas, eu, os meninos, Louise, Pérola e Keyse. Papai e mamãe apenas ficam sentados na cadeira de balanço da varanda e riem nos vendo, Ian avisa que tem que ir trabalhar mas ainda acerta algumas bolas na Pérola e na Louise, mas logo se despede e segue pro trabalho enquanto nós começamos a trabalhar no boneco de neve, nós pegamos um cachecol, um chapéu e uma cenoura pra fazer a cabeça dele e mesmo não tendo dez cabeças Theo gargalha e pula satisfeito, Lucca posa ao lado do boneco enquanto Pérola bate algumas fotos, logo Louise também está fazendo pose e por algum milagre eles convencem meus pais a também tirarem uma foto com o boneco, na verdade não foi nenhum milagre por que basta qualquer um dos netos pedir algo e eles fazem, quando o pedido vem dos três então é impossível de não ser realizado. Quando entramos em casa um rastro de neve nos segue até os quartos, eu ajudo Keyse a tirar a roupa deles e dar o banho enquanto aguentamos o discurso do Theo de já ser grande e poder tomar banho sozinho e o do Lucca de simplesmente não precisar tomar banho todo dia. Agasalhamos eles e logo eles correm pro nosso quarto e pulam na cama cada um com um jogo eletrônico que ganharam de aniversário, eles tem hora certa pra jogar e adoram fazer isso jogados na nossa cama.
— Você precisa se livrar daquelas caixas que estão no escritório, é a terceira vez que eu falo – Keyse avisa enquanto separa algumas roupas pra lavar, eu reviro os olhos, mas como ela realmente tem razão eu desço as escadas e vou me livrar das caixas, eu separo tudo, junto tentando fazer ocupar o menor espaço possível e levo pro porão, coloco-as no canto e aproveito pra dar uma organizada nas coisas aqui embaixo, as latas de tinta que usamos mês passado pra pintar a sala e o lado de fora da casa ainda estavam largadas no meio do lugar, junto com os pincéis e brochas que usamos, depois que tudo está mais arrumado saio do porão, vou até o escritório e dou uma lida nos papéis do projeto, verifico os documentos e me certifico que tudo está certo, inclusive o valor que será depositado, separo a lista com o nome dos alunos que irão se inscrever para o campeonato do ano que vem, embora ainda estejamos perto do natal, a lista deve ser entregue o quanto antes.
— Será que você pode ir no mercado e na quitanda? – Keyse pergunta colocando apenas a cabeça pra dentro do escritório, eu empurro um pouco a cadeira pra trás.
— Será que eu ganharia um beijo ou talvez dois? – ela abre um sorriso e se apressa pra me alcançar, coloca as mãos na minha coxa e aproxima nossas bocas.
— Só um! – ela fala e sorri e antes que tente dizer mais alguma coisa eu passo meu braço pela cintura dela e a puxo pra mim, ela ri e cai sentada no meu colo com as pernas pra um lado só, ela passa a mão na minha nuca e me beija demoradamente – Eu amo você, sabia? – ela fala enquanto contorna meu rosto com a ponta dos dedos.
— Não consigo pensar em nenhum motivo pra você não me amar – falo fingindo cara de confuso, ela solta uma risada e me dá outro beijo – E eu amo você, com cada pedaço do meu coração! – afirmo olhando direto para os olhos dela, aquele sorriso aparece e me sinto me apaixonando por ela mais uma vez.
— Mas você precisa mesmo ir no mercado – ela fala e me dá um selinho rápido e então pula da cadeira.
— Você me seduziu pra ir no mercado pra você?
— Na verdade eu te seduzi alguns anos trás pra você se casar comigo e então eu não precisar mais ir no mercado – ela dá de ombros orgulhosa.
— Ô mããããããããe... – o grito vem do alto da escada, Keyse vai na frente e eu logo atrás dela – O Theo me deu um chute!
— Mentira, ele que me deu um soco antes!
— Por que ele me fez perder no jogo!
— Ok, vocês sabem regras, me entreguem o jogo! – falo já avançando e subindo a escada.
— Mas pai, foi o Lucca que começou!
— Eu mandei me devolver! Se vão brigar por causa do jogo, então não tem mais jogo – alcanço eles e fico com as mãos esticadas esperando, eles fazem cara feia mas colocam o jogo nas minhas mãos, porém Theo sai batendo o pé e indo pro quarto, eu vou atrás dele – Eu disse que você podia sair? – ele se vira pra mim e me olha sem saber o que dizer – Disse? – ele nega e abaixa a cabeça – Então a próxima vez que você virar as costas pra mim vai ficar uma semana sem encostar nos seus brinquedos, você entendeu? – ele concorda de cabeça baixa – Ótimo, eu vou sair agora e quando voltar não quero ver essa cara feia ou é capaz de eu levar um susto – ele levanta os olhos escondendo um sorriso, mas como ainda está com raiva, apenas se joga na cama e se cobre com o lençol.
— Posso ir com você? – Lucca pergunta já do meu lado me olhando ansioso.
— Eu não vou comprar sorvete!
— Tá, eu nem quero sorvete – ele fala dando de ombros.
— Então pode ir! – falo passando a mão pelo cabelo dele.
— E biscoito? – eu solto uma risada sabendo que ele ia acabar pedindo outra coisa mesmo.
— Vou pensar, mas tem que colocar o outro casaco – aviso e ele concorda.
— Mãe, eu vou sair com meu pai! – ele avisa quando Keyse sobe a escada.
— Ah não vai não, você já tava tossindo, não vai ficar saindo nesse frio não!
— Eu vou usar casaco, mãe – ele fala balançando as duas mãos.
— A gente não vai demorar e eu acho que ainda dá pra sair de carro, a neve não tá tão alta assim – ela olha pra mim e depois pra ele que junta as mãos em suplica fazendo uma cara de choro, ela revira os olhos e levanta as mãos.
— Vão! Mas se ele gripar é você quem vai ficar acordado do lado dele – ela avisa e leva ele pro quarto pra colocar a roupa que ela acha mais adequada, eu pego apenas meu casaco e calço as botas, saímos depois dela me entregar a lista, por sorte o carro realmente consegue passar pela neve e não demoramos pra chegar no mercado, enquanto eu coloco as coisas da lista no carrinho, Lucca vai pegando todos os biscoitos que ele gosta, quando termino a lista e olho no carrinho deve ter pelo menos uma dúzia de pacotes de biscoitos.
— Eu disse um biscoito – ele faz uma cara triste – Se eu chegar com todos esses biscoitos em casa, sua mãe puxa as nossas orelhas e não queremos isso, queremos? – ele nega rapidamente rindo.
— Pode dois? – eu penso alguns segundos mas com esses pares de olhos azuis tão concentrados em mim, fica difícil negar alguma coisa.
— Ok, dois! – ele abre um sorriso satisfeito, mas acaba sendo quase uma maratona ele escolher entre apenas dois, quando finalmente conseguimos, vou direto pagar antes que ele veja alguma outra coisa.
Depois de pagar tudo, levo as sacolas pro carro, ele me ajuda carregando uma e se sente tão importante que eu acabo rindo, deixamos as coisas lá e vamos até a quitanda comprar as frutas que Keyse pediu, enquanto eu escolho umas maçãs ele já está sentado no balcão de uma das barracas com Seu Joel que é um senhor de quase 50 anos e que adora fazer todas as vontades deles, por isso não me surpreendo quando vejo Lucca comendo uma fatia de melancia.
— Ele tá crescendo muito rápido – ele fala quando me aproximo da barraca dele.
— Rápido até demais – concordo olhando pra ele se lambuzando todo com a fruta, termino de pegar mais algumas coisas e então pago por tudo, menos pela fatia da melancia que ele se recusou a aceitar, então apenas agradeço, já estava colocando as coisas no carro quando vejo Lucca tirando o casaco – Coloca isso de novo, não é pra tirar o casaco!
— Mas tá tudo nojento – ele fala fazendo uma careta.
— Se você comesse sem se lambuzar todo né – ele tira e joga o casaco dentro do carro.
— Lucca, coloca o casaco! – exijo e então alguma coisa chama atenção dele.
— BEEEELLA – ele corre entrando no mercadão de novo e passando no meio das pessoas, bato a porta do carro e corro atrás dele, me acalmo quando o vejo abraçando Bella, ao lado da Nathy.
— Espero que isso seja só amizade mesmo, minha filha ainda é muito nova – ela fala sorrindo olhando pra eles.
— Nunca mais corre desse jeito, ouviu? – eu brigo com ele mesmo estando mais calmo.
— Era a Bella e a tia Nathy!
— Mesmo assim, me avisa e então eu te trago
— Desculpa – ele fala já arrependido, eu aceito e só então olho pra Bella, ela é quase um ano mais nova que os meninos e é a mistura exata da Nathy e do Ryan, os olhos castanho claro, cabelos marrom escuro, a pele levemente bronzeada e o mesmo furinho na bochecha que a mãe, eu a pego no colo beijando seu pescoço e a risada dela é tão fofa que entendo perfeitamente a baba que desce cada vez que Ryan olha pra ela, então olho em volta procurando por ele.
— Cadê o Ryan? - Teve que ir na casa da mãe dele, parece que o pai dele voltou a achar desnecessário tomar o remédio pro coração – ela fala mostrando claramente o quanto acha isso idiota – E a Keyse e o... – ela olha pro Lucca com atenção – Theo – eu sorrio batendo palmas pro acerto dela – Eu sou uma ótima madrinha – ela dá de ombros.
— Ficaram em casa! Só vim comprar umas coisas rápidas!
— Nós também, já estamos indo! – ela avisa já pegando na mão da Bella que está conversando animadamente com Lucca.
— O carro tá ali na frente, eu levo vocês – ela aceita e colocamos as crianças atrás, em poucos minutos paro na frente da casa dela, ela desce e tira Bella do carro, eles se despedem e eu saio com o carro, chego na Aldeia estaciono e tiro Lucca do carro, estava abrindo o porta malas pra pegar as sacolas quando ele corre até o boneco de neve que está com a cabeça torta quase caindo.
— A gente temos que consertar – ele fala parando com as mãos na cintura e analisando o que pode ser feito.
— Será que a gente consegue? – pergunto parando ao lado dele com a mesma pose, ele olha mais alguns segundos e então como se tivesse feito uma analise detalhada ele me olha.
— A gente temos que fazer outra cabeça – eu sorrio com a solução dele, então ele logo se abaixo e começa a juntar a neve em um pequeno morro meio desengonçado – Anda, pai, me ajuda – ele fala puxando a barra da minha calça, eu acho graça e me junto a ele, tiramos o chapéu e as outras coisas do boneco e derrubo a cabeça dele, Lucca abre a boca em grito mudo e depois a tampa com as duas mãos, eu o ajudo a fazer a bola de neve maior e coloco em cima do corpo do boneco, depois me seguro ele no colo enquanto ele coloca o chapéu, pendura o cachecol e os óculos, no lugar da cenoura ele prefere colocar uma pedra que achou no chão, pro nariz não ficar tão grande, quando acabamos ele abre um sorriso tão satisfeito que me sinto o pai mais sortudo do mundo, então ele se abaixa junta uma bola de neve e acerta no meu peito.
— Ahhh, você não fez isso né? – pergunto já fazendo duas bolas com as mãos e acertando ele que tenta correr mais acaba tropeçando e cai de bumbum na neve, ele esconde o rosto com as mãos e eu taco mais duas bolinhas nele que gargalha alto.
— Pyter? – olho pra trás e mamãe está na varanda da casa – Tá congelando aí fora – ela avisa e nisso Lucca se levanta rapidamente e me acerta uma bola nas pernas – Ele tá sem casaco? – ela parece realmente surpresa e só então me lembro que ele tirou o casaco.
— Nós já estamos entrando – eu aviso agarrando Lucca e o encaixando embaixo do meu braço, ele ri e se debate tentando se soltar, eu caminho até em casa e só o solto lá dentro, Keyse logo vem até nós – Você tá cheio de neve! Pyter, ele tá cheio de neve e sem casaco – ela parece brava.
— A gente tavamos consertando a cabeça do boneco! – ele explica na maior inocência.
— Por que ele está sem casaco e molhado?
— Ele sujou o casaco enquanto comia um pedaço de melancia...
— E então você achou uma excelente ideia deixar ele sem casaco? – ela cruza os braços e me encara.
— Ele tá com mais umas duas blusas, relaxa
— Relaxa? – ela repete como seu eu tivesse acabado de mandar ela atirar em alguém – Lucca sobe agora que você vai tomar um banho e colocar uma roupa seca – ela avisa e ele começa a fazer uma pirraça – Se você abrir a boca pra reclamar eu tiro todos os seus brinquedos – ele para imediatamente e sobe as escadas, ela me dá uma ultima olhada e sobe atrás dele, eu solto o ar e volto pro carro pra pegar as compras.
Quando termino de guardar tudo em seus lugares Keyse entra na cozinha, ela evita se aproximar muito de mim e é assim que eu sei que ela está furiosa, eu me afasto um pouco e paro próximo a pia, ela enche uma panela de agua e coloca no fogo, então para e se vira pra mim.
— Essa madrugada ele teve algumas tosses, a ultima vez que ele pegou um resfriado eu passei quase uma semana sem dormir direito e era um sacrifício fazer ele comer alguma coisa, então eu não sou louca, eu só... Não quero que ele fique doente de novo! – ela fala e solta o ar como se estivesse prendendo, eu concordo e me aproximo dela, coloco minhas mãos na sua cintura e olho diretamente nos seus olhos.
— Me desculpa! Eu não devia ter deixado ele tirar o casaco e nem ter se enchido de neve, a culpa foi minha! – eu toco seu rosto, segurando seu queixo – Agora você pode por favor não ficar com raiva de mim, por que isso eu não suporto! – ela abre um sorriso e levanta um pouco os pés pra alcançar minha boca, ela me dá um beijo rápido e depois se afasta.
— Eu tenho que fazer o almoço – ela avisa e eu a deixo na cozinha depois de lhe roubar mais um beijo.
Nós almoçamos e já estávamos lavando a louça quando o telefone toca, Keyse vai atender e pela demora devia ser pra ela mesma, por isso eu subo com os meninos pra ajudar eles a escovar os dentes, nós tivemos que fazer uma reforma no banheiro deles e colocamos duas pias com espelho, então cada um tem seu espaço, eu entrego a escova deles e observo, já estavam quase acabando quando Lucca tem uma crise de tosse e suja o espelho todo com espuma, Theo ri e eu limpo com um pedaço de pano logo depois de ajudar Lucca, eles se jogam cada um em sua cama e eu coloco um dos canais de desenho que eles tanto gostam, quando saio do quarto eles já estão gargalhando e comentando entre eles. Keyse me faz ajudar ela a embalar os presentes que já compramos e fazer a lista dos que ainda faltam, nós combinamos e recombinamos como serão as coisas pro Natal, que será em doze dias, ela também me faz reforça o pedido de pintarmos o quarto novamente, mesmo que já tenhamos feito isso em menos de seis meses, eu digo a ela que gosto da cor que está e mesmo assim ela não desiste e garante que se trocarmos a parede principal que está verde, por vermelha, o lugar ficará muito mais bonito e como ela não vai desistir, eu acabo cedendo e ela quase sai saltitando da cama quando eu digo sim, confesso que mesmo um pouco contrariado acabo sorrindo com a empolgação dela.
Ao invés de jantarmos nós fazemos um lanche e os meninos insistem em ficar na nossa cama até pegar no sono, deixamos e eles comemoram pulando no colchão, eles pedem que contemos histórias e eu conto uma e Keyse outra, quando terminamos cada um conta uma também e então os convencemos a ir para o quarto deles, colocamos –os na cama e voltamos pro nosso quarto. Acordo no meio da madrugada com o que parece ser um grito, eu levo uns segundos pra me despertar, me sento na cama e então a voz retorna.
— MÃE! PAI! – o certo desespero nela que me faz pular da cama tão rápido que Keyse se assusta, mas não tenho tempo pra explicar, apenas corro pro quarto ao lado quando chego Theo está na cama do Lucca segurando ele com a cabeça pro lado de fora.
— O que houve? – pergunto já indo até ele, o chão está sujo de vômito assim como uma parte da cama, Theo está com os olhos arregalados.
— Ele tava tossindo muito, aí quando eu ia brigar com ele, ele começou a vomitar mas eu não fiz nada – ele fala e quando eu pego Lucca sinto o corpo dele quente, ele abre os olhos e quando me vê começa a chorar.
— O que aconteceu? – Keyse ainda parece perdida e sobe na cama pra alcançar ele, quando toca sua testa ela me olha assustada, sai da cama, vai até o banheiro, escuto alguns barulhos e então ela volta com um termômetro, coloca debaixo do braço dele e enquanto esperamos ela passa a mão pela testa dele penteando seu cabelo pra trás, ele está suando e parece esquentar cada segundo mais, quando o termômetro apita, ela o tira rapidamente – 40! Anda, levanta ele! – ela exige e eu tento colocar ele sentado, mas ele apenas chora como se sentisse dor, se recusando a ficar sentado e se jogando no meu colo – Ele não pode dormir agora, Pyter, levanta ele! Lucca, olha pra mim, olha pra mamãe, Lucca! – ela pede tentando fazê-lo olhar pra ela, mas ele esconde o rosto no meu peito – Anda, pro chuveiro – eu o pego no colo e já estava chegando no banheiro quando ele começa a tossir novamente, o corpo dele estremece com o esforço, eu tento ajudar de alguma forma então ele simplesmente para de tossir, seu corpo amolece e ele cai com a cabeça no meu ombro.
— Lucca! Lucca! Olha pra mim – eu peço já sacudindo-o.
— Pyter! Pro carro, AGORA! – Keyse fala firme e mesmo conseguindo ver o quanto ela também está apavorada é ela quem me faz agir, ela pega Theo no colo e nós saímos do quarto, pego a chave do carro e corro até ele, ela entra e eu coloco Lucca no seu colo, Theo entra na parte de trás e eu corro o mais rápido que consigo.
— Onde a gente vamos? – Theo pergunta enquanto está assustado no banco de trás.
— No Hospital! – Keyse fala sem desviar sua atenção do Lucca.
Chego no hospital, mal estaciono o carro e pulo pra abrir a porta pra Keyse e pro Theo, eu pego Lucca dos seus braços e corro pra dentro do prédio, uma enfermeira vem ao meu encontro.
— Ele tá com muita febre, tossiu muito, vomitou e então ele desmaiou – Keyse se apressa em falar, a mulher faz sinal e aparece mais um enfermeiro, um outro traz uma maca e colocam Lucca nela e já correm pelo corredor, vou atrás deles e o médico nos encontra pelo meio do caminho, eles falam rápido sobre o estado do Lucca e ele começa a examiná-lo enquanto continuamos seguindo o corredor, até que quando passam por uma porta larga e branca, um dos enfermeiros me barram.
— É meu filho! – eu tento passar por ele, mas ele coloca a mão no meu peito me impedindo.
— Pyter! – a voz vem de trás de mim, Keyse segura Theo no colo e ele está chorando assustado, eu desisto de entrar e o enfermeiro volta pra junto deles, eu e Keyse apenas ficamos parado nos olhando sem dizer nada, Theo se joga pro meu colo e assim que eu o pego Keyse se afasta e sai do corredor, eu o abraço apertado enquanto ele chora baixinho no meu ombro, também saio do corredor e vou pra uma sala de espera que tem do outro lado, não encontro Keyse nela e nem nos corredores próximos, mas como Theo não para de chorar decido ficar aqui com ele, me sento em uma das cadeiras e o deixo encaixado no meu colo enquanto encaro o relógio que parece paralisado.
— O Lucca tá dodói? – ele pergunta quando consegue parar as lagrimas, ele me olha com medo e tristeza, eu o abraço e beijo sua cabeça.
— Ele vai ficar bem! Daqui a pouco ele tá aqui – eu falo pra acalmá-lo e para me acalmar também, eu nunca o vi daquele jeito e nunca senti tanto medo quanto estou sentindo agora, é algo que me paralisa e me apavora de uma maneira que eu nunca nem sequer pensei em sentir, tudo que eu consigo fazer, tudo que eu posso tentar fazer pra não pirar é pensar que tudo ficará bem e esse é o pensamento que se repete centenas e centenas de vezes enquanto continua encarando o relógio e embalando Theo no meu colo.
Quando Keyse aparece ele já adormeceu, ela entra na sala em silêncio, estou sentado em uma cadeira ao lado da parede, metade do meu corpo apoiado nela, Keyse anda até a mim, seus dedos passam pelo cabelo do Theo, seus olhos estão vermelhos e inchados, não preciso fazer uma conta muito difícil pra saber que ela estava chorando.
— Eu fico com ele um pouco! – ela fala já pegando-o do meu colo, eu lhe ajudo e então dou meu lugar pra ela, a sala de espera está vazia, somos os únicos aqui, ela se senta do mesmo jeito que eu estava e mantem Theo colado a ela, enquanto ela afunda o rosto em seu cabelo.
— É culpa minha! – eu confesso e ela apenas levanta o rosto pra me olhar – Você avisou que ele estava tossindo e eu levei ele comigo, eu deixei ele tirar o casaco e brincar com a neve! A culpa é minha, não sua! – eu termino de falar e saio da sala, me seguro até entrar no banheiro e então sinto como se meu peito estivesse queimando e sendo rasgado, é uma dor tão forte, real e profunda que a única coisa que consigo fazer é chorar, chorar como se eu tivesse de novo cinco anos e todos os meus medos tivessem se tornado real, eu choro sentado no chão do banheiro, querendo que tudo isso seja um pesadelo, implorando para que nada aconteça com Lucca, chorando por que a culpa corrói cada pedaço do meu corpo e da minha mente e por que parece que tudo que eu posso fazer é chorar, então eu choro, por tanto tempo que perco a noção dele, então me levanto paro na frente do espelho e não tenho coragem de me encarar, então apenas lavo o rosto e saio daqui. Eu volto pra sala de espera e assim que entro vejo o médico falando com Keyse, me aproximo rápido e ele para de falar quando me vê.
— Como ele tá? – pergunto me controlando pra não sacudir ele.
— Eu estava dizendo pra sua esposa que nós já fizemos tudo que podia ser feito, agora estamos esperando ele reagir, seu filho está com um principio de pneumonia, a febre estava muito alta, as crises de tosse exigiram muito dele e ele acabou ficando fraco, por isso o desmaio, nós o medicamos, porém os medicamentos são fortes e ele deve continuar dormindo por mais algumas horas e tudo que ele precisa é de repouso, ele está sendo monitorado, acompanhado e muito bem cuidado, não há nada que vocês possam fazer agora, então eu indico que vocês voltem pra casa e amanhã de manhã retornem...
— Nós podemos ver ele? – pergunto e ele me olha com um jeito meio irritante.
— Ele realmente precisa descansar – ele fala, faz um sinal com a cabeça e se afasta, Keyse respira fundo e abraça Theo enquanto afunda o rosto no espaço entre o seu ombro e seu pescoço, ele continua dormindo, eu me sento no chão logo ao lado dela, dobro meu joelhos e apoio minha testa neles, fecho os olhos e imploro mais uma vez que tudo acabe bem.
— Eu estava vendo vocês dois – ela fala e eu levanto o rosto pra olhar pra ela que já está me olhando – Eu vi vocês! Eu estava no quarto deles, olhei pela janela e vi vocês dois jogando neve um no outro, o jeito que ele estava rindo... – ela abre um leve sorriso – Seria impossível não ter ouvido as gargalhadas de vocês dois!
— Eu não devia ter feito aquilo, é culpa minha ele estar lá dentro, é culpa minha você ter chorado, é culpa minha o Theo estar assustado e dormindo na sala de espera de um hospital as 3 e meia da madrugada – ela concorda com a cabeça.
— É culpa sua eles serem tão felizes. É culpa sua o modo como eles riem e perdem o fôlego quando estão com você. É culpa sua a alegria que eles tem todo dia em casa – eu já estava a ponto de negar quando ela se apressa e segura minha mão – Eu sei que você não é perfeito, eu sempre soube disso, do mesmo jeito que eu não sou! Nós vamos cometer erros, muitos ainda, mas uma coisa não pode anular todas as coisas certas e boas que fazemos todos os dias. Você É o melhor pai que eles poderiam ter e isso nem eu, nem você e nem ninguém pode negar! – ela afirma olhando diretamente nos meus olhos, eu me ajoelho e abraço ela com Theo no nosso meio, eu beijo a testa dele e lhe dou um beijo rápido na boca.
— Me perdoa...
— Xiii, só me abraça, só isso... – ela pede e eu volto a abraçar eles dois.
Quando o dia amanhece nós estamos sentados no chão, Keyse encostada no meu peito e Theo no dela, um senhor e uma garota entram chorando na sala e Theo acaba acordando, ele esfrego o rosto meio confuso, eu me levanto e ajudo Keyse a se levantar, o senhor pede desculpa e nós dizemos que não tem do que se desculpar.
— Cadê o Lucca? – Theo pergunta olhando em volta.
— Ele ainda tá tomando remédio – Keyse fala e ele parece decepcionado.
— Eu quero ver o Lucca – ele fala se agitando.
— Nós vamos ver, mas antes você tem que comer alguma coisa – eu falo e Keyse concorda, nós saímos da sala de espera e vamos para a lanchonete no mesmo andar, deixo Keyse e ele numa mesa e volto com duas xícaras de café, um suco de laranja e um pão quente com queijo, coloco na mesa e Keyse logo toma um gole do liquido quente e escuro, mas Theo rejeita imediatamente o pão e o suco.
— Eu quero ver o Lucca – ele exige cruzando os braços.
— Você come e pode vê ele!
— Eu quero ver o Lucca – ele repete com ainda mais firmeza que antes.
— Quando você comer, eu falo com o médico e você vê ele – Keyse avisa e ele a encara sem dizer nada, quando eu tento fazer ele beber o suco de novo, ele vira o rosto, Keyse me olha sabendo que vai ser difícil convencermos ele, nós tomamos nosso café ainda tentando fazer ele morder um pedaço do pão pelo menos, mas ele não aceita e isso é raro, por que ele nunca rejeita café da manhã, por isso quando saímos da lanchonete, Keyse decide fazer o que evitamos fazer de madrugada e enquanto ela liga para os pais dela, eu ligo para os meus.
Aguardamos eles na sala de espera e em poucos minutos eles chegam juntos, meu pai, minha mãe e os pais da Keyse, eles nos abraçam, pedem mais informações, contamos tudo que aconteceu, eles reclamam por não termos avisado antes e Keyse explica que não tinha o que ser feito, apenas esperar então optamos por fazer isso de manhã, Theo vai no colo de todos eles mas não fala com ninguém, mesmo com insistência, alguns minutos depois Pérola e Pietro chegam, ela diz que preferiu deixar Louise com Ian, mas que ele pediu pra avisar de tudo, repassamos tudo pra ela e Pietro tenta alegrar Theo, já que ele é sempre aquele que consegue tudo dele, mas dessa vez quando ele o pega e tenta conversar com ele, Theo continua sério e calado.
— Você tá com raiva de mim? – Pietro pergunta e ele se mantem quieto – Você quer tomar café comigo? Eu deixo você jogar no meu jogo – ele insiste e o silêncio continua – Então me conta o que você quer fazer e a gente faz
— Eu quero ver o Lucca! – ele repete firme e decidido, então eu saio da sala de espera e vou até o balcão que tem do outro lado.
— Eu preciso falar com o Doutor Braga – eu peço e logo a mulher está procurando por ele, aguardo alguns minutos e ele aparece, eu explico o que está acontecendo e mesmo parecendo um pouco relutante ele concorda.
— Mas ele ainda não acordou e talvez demore mais algumas hora, os remédios são fortes – ele avisa mas aceito assim mesmo, então volto pra sala e Keyse me olha ansiosa.
— Nós temos 3, no máximo 5 minutos – eu falo e ela quase sorri, mas logo se agita e vem pro meu lado, eu pego Theo do colo do Pietro e voltamos pra junto do médico, ele nos guia pelo corredor e entramos em quarto, em cima da cama que parece grande demais pra ele, está Lucca ligado a aparelhos que bipam a cada segundo, Theo quase cai do meu colo quando o vê.
— Lucca! – ele abre um sorriso e eu me aproximo da cama, com cuidado com os fios eu o coloco sentado ao lado do irmão, ele o olha como se não o visse a muitos dias e com todo cuidado e calma ele passa a mão pelo cabelo do irmão, eu e Keyse apenas ficamos observando, por mais que minha vontade também seja tocar e abraçar e fazer que Lucca acorde, apenas deixamos Theo com ele, então ele olha pro médico que ainda está parado no canto – Ele escuta? – ele pergunta curioso.
— Escuta sim, só está dormindo – o médico fala e então ele se aproxima mais do irmão.
— Lucca, sou eu, o Theo! Acorda, por favor, acorda – o pedido dele aperta meu coração e não consigo segurar a lagrima que escorre, assim como Keyse também não – Lucca, por favor, abre o olho! – ele toca o rosto do irmão e permanece olhando fixamente – Sabia, que a tia Péla até acertou que eu sou o Theo?! – ele fala e dá de ombro – Anda, acorda! – eu já estava indo pegar ele quando a um leve movimento no Lucca e então ele abre os olhos, Theo abre um sorris tão grande que é como se tivesse ganhado o melhor presente do mundo e eu o entendo perfeitamente – Ele acordou, eu sabia que ele ia acordar – ele fala e até o médico parece surpreso, Lucca parece um pouco confuso mas sorri quando nos reconhece.
— Eu preciso de uns minutos pra examinar ele e logo vocês podem entrar de novo – o médico avisa e eu pego Theo no colo.
— Eu vou ficar – Keyse avisa e o médico não reclama – Você vai com papai e daqui a pouco volta, combinado? – dessa vez Theo concorda com um sorriso no rosto.
— A gente já voltamos – ele quase grita mas ninguém reclama, saio do quarto com ele enquanto um enfermeira entra.
— Eu disse que tinha que ver ele – Theo fala como se fosse óbvio que isso resolveria tudo e loucura ou não, eu realmente acredito nele, sorrio e o aperto nos braços fazendo ele rir, quando voltamos pra sala de espera ele está com um sorriso contagiante quando anuncia – Eu acordei o Lucca – todo mundo sorri e parabeniza ele que agora já está relaxado e rindo.
— Agora você aceita tomar café comigo? – Pietro pergunta quando pega ele no colo.
— Eu vou ver meu irmão de novo, depois a gente vamos! – ele fala mas já está abraçando e sorrindo com ele como sempre faz.
Keyse volta depois de alguns minutos e também parece relaxada.
— Ele respondeu muito bem aos remédios, ainda tá um pouco fraco e meio confuso, mas está melhorando! – ela fala e há um suspiro de alivio coletivo, Theo pula pro meu colo quando Keyse avisa que podemos vê-lo de novo, mas apenas nós três.
Dessa vez quando entramos no quarto Lucca está sentado na cama, ainda com os fios presos a ele, mas já é uma cena um pouco melhor, assim que nos vê ele abre um sorriso, coloco Theo na cama junto com ele e dessa vez eu beijo sua testa e sua bochecha.
— Você deu um susto na gente ein – eu falo mas o abraço sentindo o alivio escorrer pelo meu corpo.
— Você vomitou a cama toda – Theo fala fazendo uma careta de nojo.
— Você fez xixi na cama outro dia – Lucca devolve também fazendo uma careta.
— Mas vomitar é mais nojento!
— Não é nada, eu tava doente e você é bebê
— Eu não sou bebê, ô mãe, eu sou bebê? – Keyse nega já sorrindo, então eles voltam a discussão de quem é mais nojento, Keyse se encosta em mim e sorri quando me olha, eu sorrio de volta e beijo sua testa.
A enfermeira volta e traz a bandeja com o café da manhã do Lucca.
— Eu também quero – Theo fala pra ela que sorri.
— Ih, esse é só pra quem tá dodói – ela fala e Theo faz uma cara triste.
— Mas tem o suco e o pão lá da lanchonete que você não quis – eu falo e ele me analisa alguns segundos.
— Tá eu como!
— Então vamos lá – ia pegar ele mas ele se esquiva.
— Traz aqui!
— Não pode trazer comida aqui
— Mas ela trouxe – ele aponta pra moça que sorri.
— Menino esperto! – ela fala e me olha – Eu acho que se ninguém vê... – ela libera um sorriso e sai com o carrinho e ele me olha esperando, então eu vou até a lanchonete, na volta aviso a eles que tudo está bem e volto pro quarto com um saco branco escondido, tiro o suco de laranja e entrego a ele e mostro o pão quente com queijo.
— O Lucca tem mingau, eu também quero – ele fala apontando pro mingau que Keyse está dando pro Lucca.
— Mas o mingau é dele e se você reclamar muito vamos ter que sair do quarto – ele para e morde o pão e tomo um gole do suco.
Um pouco depois do café da manhã Lucca precisa tomar outros remédios, então apenas Keyse fica com ele no quarto, ela me pede pra levar Theo pra casa e dessa vez ele já está mais calmo e aceita, todos nós vamos pra casa, tia Grace e tio Benny, vão pra casa dos meus pais e então todo mundo está fazendo as vontades do Theo e ele se aproveita disso pedindo tudo que quer, deixo ele com eles enquanto vou pra casa, tomo um banho, arrumo toda a bagunça e sujeira do quarto deles, faço uma mochila com roupas pra Keyse e pro Lucca e como ele ainda precisa ficar no Hospital, combinamos de deixar Theo com eles e eu volto pra lá.
A cada hora que se passa Lucca parece melhor e mais animado, ele ainda dorme mais do que o normal, mas quando está acordado, conversa, ri e reclama dos tubos no braço dele, o médico avisa que teremos que passar a noite aqui de novo e dessa vez é Keyse quem acaba indo um pouco em casa e eu fico com ele, conto algumas histórias, dou o jantar pra ele e faço piadas sobre a sopa do hospital ser pior que a da Keyse, ele ri, mas concorda quando eu digo que é segredo, até quando Keyse volta e abre a porta do quarto.
— O papai disse que a sopa daqui é mais ruim que a sua – ele fala rindo e Keyse finge estar ofendida e surpresa.
— Você disse que era segredo – ele ri e dá de ombros – Foi um elogio – eu falo pra Keyse, ela sorri e me dá um beijo rápido, mas quando vai beijar a testa dele, ele se afasta.
— Eca, você beijou na boca dele – ele fala fazendo careta.
— E beijo a sua se eu quiser – ela fala e ele tampa a boca rindo.
Quando amanhece e o médico avisa que ele receberá alta pra continuar o tratamento em casa, é dificil dizer quem de nós três parece mais animado, assim que pegamos todas as recomendações, saímos de lá sem olhar pra trás, assim que entramos na casa dos meus pais Theo é o primeiro a vim correndo até nós, os dois se abraçam e Theo começa a contar tudo que fez enquanto Lucca estava fora, todo mundo vem falar com ele e dessa vez é a vez dele se aproveitar da atenção, papai vai fazer chocolate quente, tia Grace mima ele como sempre faz e todos os outros ficam por perto.
Eu vou até a farmácia comprar os remédios e na volta passo no Ryan, na correria nem falei com ele, quando digo o que aconteceu, recebo uma bronca por não ter avisado antes, mas ele me abraça, diz que estou perdoado e avisa que assim que a casa esvaziar ele vai lá nos visitar, confirmamos os planos pro Natal e então volto pra casa dos meus pais, como Lucca já está sonolento, vamos pra nossa casa e finalmente os outros também se vão.
Os cuidados continuam, os remédios são dados no horário correto, ele te se alimentado bem e Theo nunca se afasta por mais do que alguns minutos e as coisas entram nos seus lugares, por isso só na véspera do natal que conseguimos enfeitar a arvore, Lucca e Theo pulam animados, cantando as musicas natalinas que Keyse colocou pra tocar, eles estão com o gorro vermelho e colocam um em mim e outro na Keyse, pra não ter briga compramos duas estrelas pra pôr no topo da arvore e enquanto Keyse levanta o Lucca, eu levanto o Theo e eles colocam ao mesmo tempo, eles dançam e cantam animados e ainda posam pra foto.
Quando chega a noite meus pais, Pietro, Pérola, Ian, Louise, tia Grace e tio Benny chegam, nós sempre nos reunimos na cada de um de nós e esse ano foi nossa vez de receber eles, a mesa quase foi pequena, mas a alegria transbordava por todos os lados, na hora de abrir os presentes os meninos, Louise até mesmo Pietro quase derrubam a arvore de tanta ansiedade e por sorte conseguimos agradar todos eles, Theo e Lucca quase pulam de animação quando veem a mini bateria e a guitarra que eles já tinham pedido a meses, Louise literalmente grita quando vê o patinete rosa e Pietro exibe pra todo mundo a coleção completa do jogo que ele queria. Depois que todas as crianças abrem e começam a brincar com os seus presentes, os adultos abrem, agradecem, riem e trocam seus presentes.
Quando todos se vão já amanheceu, volto pra sala e Lucca está agarrado a guitarra e dormindo por cima das almofadas enquanto Theo ainda permanece acordado vendo o livro que Pérola deu pra ele.
— Hora de dormir! – Keyse avisa pegando o livro da mão dele.
— Mas tá de dia – ele aponta pra janela.
— Mas você não dormiu a noite – ele faz uma careta, mas levanta, eu levo Lucca no colo e o coloco na cama, cubro e Keyse faz o mesmo com Theo, fechamos a porta do quarto deles e vamos para o nosso, Keyse se joga na cama e eu me jogo ao lado dela.
— Eu até tô com aquela lingerie vermelha, mas não existe a menor chance de você tirar ela hoje – ela fala já se aconchegando em mim, jogando a perna por cima de mim e apoiando a cabeça no meu peito, minha mão sobe por baixo do seu vestido.
— Isso nós veremos assim que eu acordar – eu falo e ela ri, mesmo assim deixo minha mão por baixo do seu vestido, na sua coxa, ela levanta o rosto pra me olhar e eu olho pra ela.
— Obrigada!
— Por?
— Por me dar a família que eu sempre sonhei, aliás, por me dar uma família muito melhor do que eu sonhei! – ela abre um sorriso.
— Eu disse que eu era incrível – dou de ombros e ela ri e se aperta em mim.
— Muito, muito incrível – ela fala beijando meu pescoço.
— OK, agora teremos que resolver antes da hora da soneca - eu falo e em um movimento só fico por cima dela na cama, ela ri e me olha divertida.
— Será que eu posso te fazer mudar de ideia? – ela pergunta com uma sobrancelha erguida.
— Nenhuma chance!
— Ah que pena – ela finge uma decepção – Então parece que eu vou ter que passar por essa tortura – ela fala e sorri, eu também acabo rindo.
— Eu amo você, sabia? – pergunto e ela dá de ombros.
— Eu avisei que também era incrível – nós rimos antes de nos beijarmos e dessa vez minha mão não fica parada, nem a dela.


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