Assis escrita por Éden


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

- Espero que gostem!

... — Mas seria melhor se você estivesse participando. - olho para os lados, coloco as mãos ao redor de concha na boca e tento sussurrar no ouvido do tenente. — Sabe, eu correria daqui até a Austrália se pudesse ver sua bundinha toda soadinha e marcada enquanto você ia na frente! - respondo, me inclinando novamente para trás...



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Assis

— SENTIDO! - gritou o capitão, em meio a sua duzia de solados maltrapilhos. Todos cansados e com aparências nada animadoras. Roupas rasgadas e sujas de barro, os que ainda tinham sapatos, viam uma certa dificuldade em caminhar, afinal, estavam todos com solas gastas e furos pelas laterais. Eu sou um destes soldados e, apesar de todo esse treinamento que fui submetido, continuo com um sorriso no rosto. Tudo para fazer com que um certo ‘machão’ se irrite ainda mais comigo. Chamo -me Marcus, mas conhecido pelo meu sobrenome, Assis. A alguns meses me alistei no exército para garantir que meu futuro funcionaria bem, afinal, mesmo não sendo obrigado, não se alistar pode dar grandes problemas, posteriormente. Pensando que iam me dispensar facilmente, fui alegre e continuei alegre, até que me recebi uma ligação do quartel, dizendo que havia passado no primeiro teste e o treinamento começaria na segunda. Fiquei possesso, mas não tinha como remediar , já era um soldado registrado. Prazer, Cabo Assis.

— Olha só quem não parece cansado! - exclamou meu empecilho, salvador, desejo, amado, querido, adorado, tentado e a única pessoa que me segurava de fazer um barraco até me tirarem daqui: João Pedro, ou como o chamam “Tenente 12”. Olhos mel, tão penetrantes quando um campo de tulipas lilases, cabelos negros e charmosos, mais belos até que os do Tom Cruise, aparados no estilo militar, sorriso devasso de canto de rosto, tão branco quanto leite. Para mim, ele era o carrasco, o juiz e o executor, mas acima disso tudo, aquele que eu queria poder chamar de amor. Infelizmente ele não se agradou nada com minha presença na sua turma de alunos, afinal, talvez eu seja um pouco impertinente, respondão e principalmente galanteador. Aproveito cada segundo que posso para dar uma cantadinha básica, e deixar ele mais irritado ainda. Nada melhor do que isso. — O treinamento foi ruim, borboleta?

— Até que não… - sorrio, olhando o tenente de cima a baixo. — Mas seria melhor se você estivesse participando. - olho para os lados, coloco as mãos ao redor de concha na boca e tento sussurrar no ouvido do tenente. — Sabe, eu correria daqui até a Austrália se pudesse ver sua bundinha toda soadinha e marcada enquanto você ia na frente! - respondo, me inclinando novamente para trás. O tenente ficou possesso, o fogo em seus olhos fora a melhor coisa que aconteceu naquele dia todo. Nem me importei de não estar sentindo minhas pernas de tanto que corri. Fiquei observando o 12 caminhando em frente com uma cara fechada e marrenta. Um dia ele abre essa cara e dá um sorriso, essa vai ser a minha missão enquanto estiver aqui.

— Capitão, eles correram ao redor do campo de treinamento 520 vezes. - disse 12, se aproximando do Capitão Brito, ‘o chefão’ grisalho do acampamento de treinamento. Enquanto os dois conversavam em sigilo, me limitava a sorrir em uma pose de não-estou-nem-ai e olhar para a bunda empinada de 12. Sinceramente, não sou grande fã de bumbuns, mas quando se trata de irritar o tenente, essa é a melhor forma. Ele finalmente percebeu que eu fitava -o, virou -se para o resto dos internos - em sua maior parte, rapazes considerados ‘fracassos’, como gordinhos, magrelos, asmáticos e Gays. Me encaixava no ultimo quesito - com uma expressão nada amigável, apertou bem os olhos querendo parecer desconfiado e me encarou. Continuei com meu sorriso devasso de orelha a orelha, 12 cachoalhou a cabeça e olhou de volta para os fracassos. — Podem ir descansar, daqui a pouco teremos uma dose do meu jogo favorito: Piscina a fora. - e então abriu um sorriso, tão assustador e maléfico quanto o do próprio diabo.

— Parece que vamos ver pessoas sem camisa! Oba! - alfinetei, seguidamente dei as costas com um piscar de olhos momentâneo e caminhei para o alojamento. Pude ver o som de um lápis quebrando, já era o terceiro que 12 quebrava no dia e todos por minha causa.

Já no alojamento - que eu dividia com mais quatro garotos: Um gordinho chamado Luíz, apelidado de Pereba, dois magrelos gémeos e narigudos, apelidados de Tucano¹ e Tucano² e um cara bonitinho, mas muito suscetível aos agentes virais, qualquer coisa fazia o coitado espirrar feito uma cabra gripada, chamado Virose - trocava de roupa, colocando algo mais apropriado para piscina. Uma sunga azul, uma regata branca e uma bermuda de tactel. Vou ser sincero com vocês, posso ser gay, mas se tem uma coisa que não entendo é moda, já que a maioria intende, mas não me importo com isso. Fora do quartel nem assumido eu sou, todo mundo me vê como hetero, ainda não tive coragem o suficiente de me assumir. Eles não costumam desconfiar, já que nem afeminado eu sou, as vezes pergunto -me se sou gay ou confuso, e a resposta sempre chega quando vejo o 12, meu primeiro e único amor.

— E então? O que você disse para o 12 ficar tão irritado? - perguntou o gordinho, colocando com certa dificuldade uma blusa branca. Os outros pararam de se vestir e ficaram com os olhos atentos sobre mim, curiosos. Desafiar o tenente assim era quase assinar uma sentença de morte. Olhei para todos os lados, tímido e por fim, sentei -me na cama dura e rangente que havia recebido, respirei fundo e pus -me a falar.

— Nada demais. - respondi, sorridente. — Apenas falei que adoraria ver a bundinha dele molhadinha de suor. - dei uma leve risada, os jovens a meu redor arregalaram os olhos e encheram a boca para fazer o som de oh-turn-down-for-what. Levantei minhas mãos e coloquei por trás da cabeça, me jogando na cama em seguida, fitando o telhado de ferro brusco do alojamento.

— Bah! Existem bundas melhores por aqui mesmo! - respondeu Davi, o Tucano¹. Um garoto pálido feito gelo, com cabelos cacheados e negros, provavelmente de descendência judia. O irmão, Samuel - Tucano² - limitou -se a encarar o irmão com uma expressão de confusão. Ele não era o mais inteligente da trupe. Davi percebeu a gafe que cometera, arregalou os olhos e encarou o gordinho, que apertava sua bombinha para asma na boca pela terceira vez, o tucano deu -lhe um tapa tão grande nas costas que a bomba voou para longe. — Como o Pereba aqui! - exclamou o rapaz, querendo disfarçar.

— Seja como for, espero que ele entre nessa brincadeira de piscina sei lá o que… - respondi, esperançoso.

— Eu não esperaria muito, Marcus. - disse o gordinho, que em seguida deu mais uma ‘tragada’ em sua bombinha (Ele gostava de chamar de ‘tragada’ para não soar mais nerd do que já era).

— Ué, por quê não? - perguntei, confuso.

— Dizem as boas bocas que ele não entra na água de jeito nenhum. - e novamente ele deu uma ‘tragada’. — Parece que ele adquiriu um trauma ou uma coisa do tipo e não sabe nadar… - respondeu o gordinho, que finalmente guardou a bombinha na bolsa, inclinou o pescoço para trás, causando um estalo bem alto, como se algum osso tivesse quebrado. Todos o encaram, com medo. Ele sorriu tipicamente, ajeitou o óculos que carregava no rosto e começou a corar de timidez. — Com a pratica vocês também conseguem. - exclamou ele, que depois sentou -se na beirada do beliche que dividia com o Virose. O rapaz lá de cima pode sentir o tremor na cama e saltou do mesmo, assustado.

— O que foi isso?! - exclamou Virose, assustado. Todos ao redor começaram a rir incessantemente, deixando o rapaz sem entender o que se passava. Ele se limitou a subir de volta para o beliche e sentar -se de lado, com as pernas por baixo, as balançando para frente e para trás.

— Prontas crianças?! - gritou uma voz máscula vinda de fora do alojamento. 12 entrara sem nenhum tipo de cautela, chutou a porta com toda sua força e caminhou para dentro com as mãos dentro do bolso e um sorriso malicioso no rosto. Todos la de dentro estremeceram e fizeram expressão de medo, com exceção de mim, claro. 12 caminhou perante as camas e parou em frente a minha, onde continuava a fitar -o sem nenhum medo. Ele se limitou a passar a mão da cabeceira e continuar caminhando, indo para frente e para trás, sem dizer uma palavra. — Não disseram nada, então vou aceitar como sim. - e em seguida caminhou em frente, com seus passos firmes, uma agressão a coitada da terra. Todos fomos atrás dele, eu uma fila reta que mais parecia as pinturas do Romero Brito.

Depois de tanto caminhar, chegamos a uma espécie de cachoeira, com um profundo lago por baixo. As águas caiam agressivas no chão, fazendo um estrondoso som, que assustaria qualquer um. Os garotos que acompanhavam se perguntaram ‘Quando foi que colocaram uma cachoeira aqui?’. 12 se limitava a olhar para cima, com um sorriso esperançoso no rosto, mas quando olhava para o lago la embaixo, se estremecia todo e caminhava para trás. Parece que os boatos eram verdadeiros. No barranco, ao lado da cachoeira, equipamento de escalada e uma corda que cobria toda a caída d’água e do fim, uma enorme tirolesa, que ia da ribanceira até o acampamento.

— Então… Jovens. - exclamou 12, virando -se para os alunos, com um sorriso de contentado no rosto. — Foram dois meses aqui, fazendo vocês ficarem com dor, tristeza, desesperança, medo, dor, doenças, sequelas, dor, machucados, traumas, dor, dor, dor e dor. Finalmente chegamos ao ultimo desafio. - e então apontou para cima, os garotos por um momento ficaram contentes e pensaram em comemorar, mas no primeiro dia eles enfrentaram alturas maiores do que essa. Porque uma coisa tão fácil como ultimo desafio? — Mas… - esse ‘mas’ fez toso ficarem arrependidos de terem pensado em comemorar. — Vocês precisam levar a MIM com segurança, junto de vocês… UM A UM, irei avaliar a conduta. Agora, quem quiser desistir… - todos os jovens se entreolharam, assustados. Ninguém tinha coragem de ir, fazendo com que a alegria de 12 aumentasse (E sua tensão diminuísse). Não me aguentei vendo aquele sorrisinho de deboche no rosto dele, empurrei os Tucanos e o Pereba para os lados e tomei a frente, com uma expressão desafiadora. Pela primeira vez encarava 12 com uma expressão de raiva e, ao mesmo tempo, desafio.

— Eu vou. - exclamei, confiante. Todos, incluindo 12, ficaram boquiabertos com minha coragem, arregalando os olhos com medo e se limitando a imaginar as consequências de uma queda daquela altura. Finalmente, abri um sorriso de canto de rosto, me aproximei da ribanceira e comecei a prender -me no equipamento. 12 continuava parado, não conseguiu digerir minhas palavras ainda. — Vai ficar só olhando? - perguntei. 12 chacoalhou o rosto e perdeu a expressão de surpresa, dando lugar há uma de medo. Se aproximou do barranco e começou também a se prender no equipamento. Os fracassos continuavam ali, olhando sem entender nada. A posição que 12 teve que ficar foi bem satisfatória, praticamente uma versão de conchinha nas alturas, abraçando -me com seus braços fortes e cheios de veias. Prensando meu corpo contra a parede de terra da ribanceira, Deus, aquilo me fez sentir muito bem, até esqueci de que estava prestes a escalar uma cachoeira altíssima. Ele me abraçava fortemente, apertando minha pele com suas mãos grandes. As unhas - mesmo estando bem cortadas - eram sentidas arranhando -me, parecia um gato se segurando no dono que queria dar -lhe um banho. Era bom, mas estranho. Nem começamos a subir e ele já estava assim.

— Você tem certeza? - balbuciou 12 em meu ouvido. Suas palavras tremidas, misturadas com sua grossa voz, ao mesmo tempo me davam conforto e medo. Sinalizei com a cabeça, a mexendo para os lados. — Então, pode começar! - e então pude perceber que o tenente havia fechado os olhos, com medo do que podia acontecer. Coloquei então o primeiro pé sobre o barranco, usei de toda a minha força e puxei a corda, começando a escalar, coloquei o segundo, puxei novamente, terceiro, puxei, quarto, puxei. Até agora estava fácil demais, 12 não pesava tanto quanto imaginava. Continuei em frente, com toda a minha perseverança, tentando não pensar em nada se não no fim do trajeto. Até que cheguei a metade do percurso, ouvi a voz de 12 ressoando em meu ouvido, avisando que poderia fazer uma pequena pausa. Parei, cocei os olhos e olhei para meus colegas abaixo, mas tudo que vi foi a mão do tenente colocando minha cabeça de vola para a frente e ele voltava a advertir que olhar para baixo seria perigoso. — Já vimos isso tantas vezes e você não aprende, em borboleta! Você tem que criar maturidade e fazer as coisas de um jeito certo!

Naquele momento, uma imagem veio a minha mente: Um momento a alguns meses atrás, quando tive uma conversa com meu pai, Onório. Ele cobrava -me uma namorada para poder exibir para os amigos e ao mesmo tempo, brigava comigo, pedindo que fosse cuidar de minha vida e o deixasse viver o que sobrava da dele. Meu pai era viúvo e, depois da morte de minha mãe, se tornou um homem muito superficial, passando a pensar apenas o exterior e ‘No que os vizinhos vão pensar’.

— O filho do seu Manoel padeiro tem uma namorada muito bonita! Mulata, com uns olhinhos que mais parecem esmeraldas e um corpo de princesa! - ele olha -me de cima a baixo, me encontrava no sofá, encostado na cabeceira enquanto ouvia o sermão dele. — Mas você aí! Sem ninguém… O que os vizinhos vão dizer?!

— Que eu não quero namorar, talvez? - respondi, afrontando meu pai. Aquele momento finalmente me fez perceber o quão egoísta era Onório, um homem que pensava apenas na própria imagem e não ligava para aquilo que o filho sentia.

— NÃO QUER NAMORAR? - ele gritou, possesso. E encarou -me com aquela expressão de raiva misturada com nojo. — Seu merda! Nunca mais repita isso! Nem parece meu filho! - e bufou de ódio. — Só falta agora dizer que é viadinho. Aí sim você vai estar completamente deserdado da minha família!

— Ah é? - respondi, criando finalmente coragem e levantando minha bunda do sofá, encarando meu pai cara a cara. — Então já pode mudar seu status no facebook para “Viúvo sem filhos”, porque não sou viadinho. SOU VIADÃO! - e dei as costas para Ónorio, que a partir daquele momento só conheceria pelo nome. Por toda a minha vida sempre senti que meu pai não era tão atencioso comigo, esse momento nem foi tão difícil, mas igualmente doloroso.

— MARCUS! MARCUS! MARCUS! - gritava Onório, me vendo passar pela porta com a roupa que tinha no corpo. Ele soltava fogo pela boca, mas não foi capaz de nenhum ato para me impedir de ir embora. No fim, ele deve ter ficado feliz com isso. Sim, eu menti. Eu havia me assumido para uma pessoa, justo aquela que mais me crucificou na vida. E o verdadeiro motivo de entrar nesse pandemônio chamado “Acampamento Militar” era fugir um pouco da vida e me entreter com os desafios dolorosos do treinamento e quem sabe, pensar melhor no que fazer quando sair - isso se não decidir ficar e servir a pátria -. Foi uma escolha boba, eu sei, mas você não faz ideia de como é não poder contar com ninguém na vida, nem com o próprio pai e acaba que na semana que recebi a ligação falando a aprovação, acabei pensando em desistir, mas quando conheci ele… Parei de agir racionalmente e fui de acordo com o que meu coração falava.

— ASSIS! ASSIS! BORBOLETA! MARCUS! - era a voz de 12. Pelo desespero com que ele gritava e a voz tremida, pude perceber que já estava assim a algum tempo. Quando finalmente acordei de meus pensamentos, pude perceber que havia praticamente desmaiado sem dormir, não percebi nada por pelo menos 5 minutos, que foram os mais longos e assustadores da vida de 12, que se encontrava a beira de cair do barranco. O equipamento de segurança que ele colocara havia se soltado e ele estava a ‘um pé’ de despencar de pelo menos 10 metros de altura. A única coisa que o prendia no ar era sua mão, segurando minha perna com tanta força que chegava a parecer que ela estava sendo arrancada. — ACORDA! - gritou ele, a voz dele ressoou tão fortemente em meus ouvidos que finalmente acordei de vez e comecei a me debater assustado, até perceber a situação de João.

— Meu deus, o que aconteceu?! - perguntei, observando a situação do rapaz.

— EU EXPLICO DEPOIS, AGORA ME TIRA DAQUI! - gritou o rapaz. Naquele momento percebi que não era a hora mais adequada para perguntas, então inclinei meu corpo para baixo e tentei agarrar a mão de de 12, mas era impossível, já que ele não largava minha perna de nenhum modo, como um cão e um osso.

— Você precisa soltar! - exclamo, enquanto tento estender mais meu braço, mas era em vão. O equipamento não permitia que me inclinasse nem mais um centímetro. Aquela fora a primeira vez que pude ver 12 desesperado, sua expressão de medo era de dar pena, parecia um gatinho chorando para não entrar na água. Aquilo me mostrou finalmente que até as pessoas mais fortes tem seus momentos de medo, passando a não precisar mais sentir vergonha de me assumir para as pessoas com que convivi a tempos. Então, em um momento de bravura, usei toda a minha força, fazendo com que conseguisse alcançar 12, mesmo com certa dificuldade, peguei em sua mão e comecei a puxar -o para cima, sem parar para pensar em nada. Apenas subindo em frente, não olhava para trás, para a frente, para nada. Fiquei perdido nos pensamentos, lembrando de meu pai e de como era infeliz quando oprimido, pensando em 12, como era difícil amar alguém que nem ao menos te olha com sentimento de amizade, mas sabia que não era por isso que ia deixar meus sentimentos acabarem e, quando finalmente ia pensar em mim, percebi que já me encontrava em cima do barranco, me joguei na grama verde, coloquei as mãos na cabeça e comecei a olhar para o céu. — Está tudo bem, 12? - perguntei, observando uma certa exaustão no olhar do rapaz. Ele virou -se para mim, com um lindo sorriso no rosto, que ia de orelha a orelha. Era a primeira vez que o via assim, feliz de verdade. Limitei -me a sorrir como o rapaz, mas com um olhar de tristeza acabando com minha expressão feliz.

— Comigo sim. Valeu. - ele olhou -me de cima a baixo, percebendo uma certa irritação em meu olhar. — Mas com você não… Se feriu?

— Só em um lugar que nenhum remédio do mundo pode curar: O coração. - respondi, mudando de sorriso feliz para contentado com a vida. Levantei -me e comecei a caminhar brandamente em frente, tentando esconder de 12 a lágrima que escorria de meu rosto e caía no chão. Naquele momento só queria saber de estar em casa, mas que casa?

— Assis! - novamente ouvi a voz máscula de 12 vinda de trás. Achei que era mais uma das piadinhas sobre gays que ele me reservava, mas ao virar -me para ver o que passava, fui surpreendido por um beijo roubado, tão intenso e apaixonante como uma noite estrelada. Meu sentimentos se embaraçaram novamente e pude sentir um alívio de consciência, tanto em mim quando nele. Os lábios de 12 me deram um conforto que nada no mundo havia me dado, pela primeira vez não tinha medo de nada, mas ao mesmo tempo tinha medo de tudo. Era como um girassol que florescia em pleno inverno, corajoso e assustado, ao mesmo tempo. O beijo fora intenso e duradouro por pelo menos 3 minutos, senti o calor da pele e a força das mãos de 12 me apertando contra seu corpo, até que quatro vozes familiares ressoaram no ar a nosso redor, Pereba, Tucano¹, Tucano ² e Virose tinham escalado o barranco e se ajudavam a terminar a subida. Por mais incrível que pareça, 12 não parou de me beijar, pelo contrário, continuou mais selvagem do que nunca, o problema é que já estava me sufocando então precisei dar uma pausa para respirar, foi quando soltamos nossas bocas e pudemos ofegar de cansaço misturado com adrenalina. Os fracassos aplaudiam de pé o nosso beijo, 12 se limitou a sorrir, nunca o vi tão feliz no tempo que estive aqui.




— Hoje é o dia mais esperado na vida de muitos de nossos militares: A Formatura. - discursava Brito, no microfone a cima do palco. Na plateia, pouco mais de 30 pessoas, a maior parte delas pais dos fracassos e militares aposentados de meia idade. Eu e os rapazes estávamos nos bastidores, esperando nossos nomes serem chamados. Aproveitava a visão para olhar direito para a platéia, a procura da pessoa que eu menos esperava encontrar ali: Onório.

— Tudo bem Marcus? - perguntou 12, percebendo a minha tensão. Ele pegou em minha mão e estendeu seu braço sobre meu ombro, tentando me confortar. — Eu já disse que não precisa se preocupar… Assim que se formar você vai morar comigo… É uma casa simples, mas é boa, para um começo! - exclama o rapaz, dessa vez mais arrumado. SEM FARDA, pela primeira vez e com um terno de setin azul alugado. Nem parecia o jovem machista de um tempo atrás, agora que havia se assumido.

— Não é isso… - respondo, em tom piano. — É que, sabe… Ainda tinha esperança que ele podia vir!

— Mas ele não veio… - ele pega em minhas mãos e abraça -me fortemente. — Mas você tem a mim… Vai ficar tudo bem! Você tanto não lutou para me conquistar? Não quero te ver com esse olhar triste! - exclama o rapaz.

— Difícil mesmo foi você descobrir o que sentia… Te conquistar foi fácil, fácil! - respondo, em um tom galante. Quando estávamos prestes a nos beijar, percebo a presença de alguém que tanto gostaria de ver na plateia, Onório, com sua cara amarrada de sempre, mas vestido muito bem. — Meu deus! - exclamo. — Ele veio!

— O que?! - 12 olha por cima de meus ombros e percebe um homem de quarenta e poucos anos sentado afastado dos demais expectadores, na hora ele soube que era ele. — Fica calmo amor… Vai dar tudo certo!

— Eu sei! - respondo confiante. — Agora eu tenho minha vida e ele vai ter que respeitar!

— É assim que se diz! - respondeu 12, que antes de poder dar -me um beijo, fora cortada pela voz de Brito, ao microfone.

— Chamamos ao palco os discentes: Davi Alencar, José da Costa, Luíz Almeida, Marcus Assis e Samuel Alencar! - a cada nome que brito dizia, o aluno equivalente saia dos bastidores e entrava no palco. Assim que pus meu primeiro pé naquele chão de madeira, pude sentir um friozinho na barriga, fechei os olhos e fui em frente, ficando em fileira com meus amigos. Brito pegou uma caixa de medalhas, espetando -as nos uniformes dos alunos e curvando -se como cumprimento. Quando ele terminou de entregar, voltou ao centro do palco, pegou o microfone e continuou a falar. — A todos vocês, apelidados de “Fracassos”, que mostraram do que são capazes verdadeiramente, um obrigado. Aos que eram meninos, agora se tornaram homens. Aos que eram fracos, ficaram fortes e aos que tinham medo, agora são corajosos. Por favor, aplausos! - e em seguida começou a bater as mãos constantemente, querendo mostrar o quão orgulhoso estava de seus alunos. A platéia vibrou e ficou de pé para aplaudir, com exceção dele, Onório.

Com a concessão do Sargento Brito, 12 entrou no palco, carregando consigo um buquê de tulipas e girassóis - não me pergunte como ele conseguiu tulipas -, entregando -o para mim e em seguida fixou seu olhar profundo no fundo de meus olhos. Retirou uma caixinha do bolso, se ajoelhou e abriu, continham duas alianças.

— Marcus de Assis, você aceitaria namorar com esse tenente, machista, irritante e antiquado? - perguntou o rapaz, com os olhos cheios de água. Pude perceber meu pai saindo da platéia com uma expressão nada boa, não me importei, era o momento mais importante para mim, me abaixei, peguei nas mãos de meu amado e sorri.

— Aceito, aceito, aceito, aceito! - exclamo, beijando -o em seguida. Nosso beijo se estendeu do chão até a cima, ficamos grudados por pelo menos 2 minutos. Todos ao redor ficaram emocionados, em especial Brito, já que lágrimas masculinas escorreram de seus olhos. Quando finalmente nos soltamos, pude perceber a presença de Onório no palco, provavelmente veio para me fazer criar vergonha na cara e ir embora.

— Filho… Me desculpe… Eu sei que sempre fui frio com você… Mas fiquei viúvo muito cedo, nunca soube ao certo como ser um pai… Sempre fiz tudo, pensando em não te magoar, mas logo no momento que você mais precisou de mim, não pude te ajudar… - e retirou seu chapéu, estilo ‘seu madruga’, mostrando para todos a sua careca (Coisa rara de acontecer), a única coisa que pude pensar e fazer naquele momento foi correr e abraçar meu velho, como uma criança que acabava de receber um presente muito importante, no caso, o meu presente foi o amor de meu pai, que finalmente conseguiu sentir o que eu sinto. Todos da platéia vibraram, até um senhorzinho de uns 100 anos, que passou metade da formatura dormindo, acordou e gritou de alegria.

No fim, todos nós, antes fracassados e agora vencedores, fizemos um grande abraço grupal. Todos contentes, ninguém queria soltar o abraço, até que o Virose atacou novamente, vomitando bem no centro do círculo, que todos desfizeram em seguida e resolveram se abraçar separadamente. Quando achei que já havia abraçado todo mundo, sinto alguém cutucando meu ombro.

— Assis?







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Notas finais do capítulo

- O que acharam? Comentem, adoro ouvir opiniões!