Abnegação escrita por Deusa Nariko


Capítulo 1
Capítulo Único: Abnegação


Notas iniciais do capítulo

Olá, olá e olá =)
...
Era uma vez uma entrevista em que Masashi Kishimoto revelava que havia esboçado flashbacks do nascimento da Sarada a partir do ponto de vista da Karin para mostrar como ela havia superado o Sasuke e como se tornou amiga da Sakura. Mas Masashi Kishimoto é um homem troll muito malvado e decidiu na última hora remover esses flashbacks porque, segundo ele, seria "forçado" mostrar isso.
...
Então, nasceu "Abnegação". Presente para Camille Pezzino que é super fã da Karin. Espero que goste *-* E caso não gostar, não me mate, please T-T
...
Boa leitura!



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Abnegação

Por Deusa Nariko

.

A felicidade do Sasuke... Isso é tudo o que importa para mim❞.

Karin alongou as costas doloridas por estar estagnada na mesma posição há horas com um suspiro. Da última vez que espiou os ponteiros, o relógio a alertara de que já era tarde da noite e de que ela deveria se recolher e empilhar aquelas anotações para o dia seguinte.

No entanto, a porção pragmática do seu cérebro e obcecada por trabalho recusava-se a deixá-la ir, prendendo-a naquele recinto cuidadosamente esterilizado. Houve uma época, a qual ela ainda recordava, em que os esconderijos de Orochimaru lhe davam calafrios. Hoje, ela se sentia mais familiarizada com eles do que ao relento.

Talvez devesse considerar deprimente que o mais próximo que tivesse de um lar fossem aqueles túneis frios. Na verdade a maior parte dos subordinados do Sannin relutava contra esse sentimento; rebelavam-se, planejavam fugas e traçavam planos para um futuro que não envolvesse os covis sórdidos do homem serpente.

Karin, por outro lado, era uma exceção a essa regra. Bem, havia Jūgo também, se ela considerasse sua boa vontade em isolar-se do resto do mundo, protegendo-se e protegendo outrem. Mas Jūgo nunca havia trabalhado para Orochimaru, nunca havia se sujeitado aos seus métodos e pesquisas inumanas, nunca havia colaborado ou o auxiliado nisso. Karin, sim.

Olhando para trás agora, ela, de fato, não se arrependia da decisão de haver se juntado ao seu mestre. Ele lhe oferecera abrigo, cama e comida quentes, e, acima de tudo, proteção. Para uma órfã como ela que perdera o seu lugar no mundo e o seu rumo, Orochimaru havia sido nada mais e nada menos do que um benfeitor generoso.

Deixar que ele fizesse experiências no seu corpo e permitir que ele corrompesse sua mente era um preço pequeno a se pagar pela salvação. Lá fora, Karin sabia, ela seria vítima de atrocidades maiores, levaria cicatrizes mais fundas do que as marcas denteadas que cobriam seu corpo. Talvez nem mesmo estivesse viva àquela altura.

O fato é que abnegar-se da sua humanidade para se tornar cobaia e subordinada de Orochimaru não havia sido grande coisa. Acostumara-se, com o tempo, a ver e entender conceitos como seu mestre via e entendia. Deixou-se ser manipulada e deixou-o sugar o que ainda lhe restava de inocência. No fim, ainda o respeitava.

Sua luz no fim do túnel, um dia, havia sido Sasuke. Karin não se importara na época de ter tubos e seringas presos aos seus membros ou de submeter outras pessoas a esse mesmo sofrimento. A mera possibilidade de cruzar com Sasuke em um dos corredores ou de ouvir seu nome sendo sussurrado pelos lábios de um prisioneiro maltrapilho tornava tudo suportável.

Mas agora, ele não estava mais ali e até onde as fontes de Orochimaru depreendiam, ele podia muito bem já ter retornado para a sua vila natal, para viver ao lado dos seus companheiros de equipe.

Com outro suspiro, desta vez mais pesaroso, Karin lembrou a si mesma porque não deveria estender o trabalho até tão tarde da noite. Seus pensamentos, hora ou outra, sempre desviavam para o passado e para Sasuke, consequentemente.

Tirando os óculos embaçados por um instante, ela se forçou a levantar para fazer o sangue voltar a circular por suas pernas. Limpou as lentes na bainha da blusa, contornando a cadeira e sua escrivaninha com um ar entediado. Pousou os óculos na borda do móvel para massagear as têmporas e pressionar a ponte do nariz.

Apesar da lâmpada de tungstênio zumbir baixinho e continuamente, um som ao qual ela já se habituara, o silêncio imperava no recinto, tal como nos extensos túneis bifurcados. Karin sempre considerou aquela ausência de ruídos reconfortante, mas em momentos como este, em que amargurava sua solidão, o silêncio se tornava uma presença incômoda.

Fez um muxoxo e recolocou os óculos, impaciente. Ela não devia estar ruminando o passado. Decidiu que continuaria o trabalho pela manhã, tudo o que mais desejava agora era atirar-se sobre a cama, na privacidade do seu quarto, e esquecer os sibilos da autopiedade.

Deixou o local com passadas rápidas, parando apenas à porta para apagar as luzes. As câmeras no corredor sempre lhe davam a sensação de ser olhos curiosos e importunos que seguiam cada passo seu. Era acometida por calafrios a cada vez que passava por uma delas.

Mal deu dez passos, no entanto, antes de estagnar, ressabiada. Captou um fluxo de chakra tão dolorosamente familiar que não conseguiu conter o impulso de sair em disparada ao seu encontro. Isolou-o dos demais e não teve dúvidas: aquele fluxo de chakra só podia pertencer a Sasuke; cada efluência era única, como uma impressão digital, e Karin era uma das melhores sensoras para identificá-los.

No meio do caminho, percebeu que havia mais uma presença com Sasuke, vagamente conhecida, mas atiçando sua memória não conseguiu se lembrar a quem ela pertencia. Tudo o que observou a partir da sua fluência inconstante é que estava agitada.

Karin apertou os passos, ouvindo o solado de suas botas baterem contra o piso com cadência. Tomou o caminho que a conduziria até a entrada do esconderijo, seu coração dava saltos no peito, atentando lhe rasgar a garganta apertada. Agora estava próxima o bastante e com a mente limpa o suficiente para determinar que o chakra de Sasuke também não estava exatamente tranquilo.

Cerrou os dentes, indagando-se o que diabos estava acontecendo, e dobrou à direita, desacelerando o passo. Terminou de cobrir a distância que a separava das duas presenças com passadas lentas. Ao longe, distinguiu uma única e volumosa silhueta, que na verdade eram duas pessoas abraçadas.

A luz que provinha da entrada do esconderijo era quase nula, de modo que ambos estavam envoltos na penumbra da noite que se esgueirava pelo longo corredor. Notou as capas e as mochilas que apenas um deles carregava: a figura mais alta que estranhamente andava curvada, possivelmente para dar suporte à pessoa ao seu lado.

Foi só quando se aproximou mais dois metros que Karin reconheceu as madeixas cor-de-rosa (únicas) escapando por baixo do capuz do manto que ela vestia. Mordiscou o lábio quando se deu conta de que o segundo chakra pertencia à Sakura, a companheira de time de Sasuke — que o amava.

Notou que ela se movia com extrema dificuldade, com passos débeis e arrastados. Um braço agarrava-se a Sasuke como se sua vida dependesse disso, o outro envolvia o ventre coberto pelo manto. Karin estacou, decidida a deixar que eles se aproximassem agora e Sasuke, meneando a cabeça para se livrar do capuz e revelando o cabelo preto crescido, foi o primeiro a reconhecê-la ali:

— Karin.

Quantas noites ela sonhou em poder ouvir aquele timbre rouco e enfadado novamente?

— Sasuke — saudou-o com o máximo de indiferença que conseguiu reunir; suas feições estavam cuidadosamente compostas, apesar do olhar crítico que jamais abandonava Sakura. — O que está fazendo aqui?

Nesse instante, ele franziu o rosto e lhe deu a impressão de estar aflito. Ao seu lado, a jovem se encolheu e deixou escapar um gemido baixo mas audível, apertando mais a mão em torno do ventre escondido pelo manto volumoso que usava.

— Preciso da sua ajuda.

A voz de Sasuke demoveu a sua atenção da garota. Karin fitou-o surpresa e ficou mais aturdida ainda quando encontrou com seu olhar suplicante. Ela tencionou se aproximar, mas desistiu no último momento. Deixou que seu olhar recaísse sobre Sakura outra vez, agora ela havia fechado o punho em torno do manto que usava e respirava devagar, uma inspiração de cada vez, soltando o ar devagar através dos lábios apartados.

— O que aconteceu com ela? — perguntou, avaliando melhor o fluxo intranquilo do seu chakra.

— Eu não sei como ajudá-la — Sasuke confessou num tom derrotado, aflito. — E ela não pode fazer isso sozinha.

Sakura soltou um silvo de repente e curvou-se ainda mais; parecia que ficar de pé lhe custava muito. A capa que ela vestia abriu-se nesse momento e revelou a excrecência do seu ventre, o inchaço que aclarava tudo. Karin arquejou sem que percebesse enquanto a verdade era tragada devagar pela sua mente. Então, era isso.

— Por que a trouxe aqui? Por que eu? — Foram as questões que vocalizou, as mais urgentes de todas.

Por que de todas as pessoas e lugares Sasuke havia a escolhido e se dirigido a este esconderijo em particular? Será que intentava esfregar sal nas suas feridas? Seria ele tão insensível assim?

— Aconteceu um imprevisto — ele esclareceu impaciente. — Estávamos a caminho de Shikōku onde pretendíamos ter o bebê, mas Sakura começou a ter contrações fortes demais. Este esconderijo foi o único lugar em que consegui pensar que poderia ser seguro o bastante para ambos.

Shikōku era uma cidade a meio dia de viagem dali, refletiu. Se Sasuke mudou a trajetória para ali é porque, de fato, era uma emergência. Por um instante, Karin pensou que ele havia acabado, mas então Sakura exprimiu outro lamento angustiado, encolhendo-se ainda mais e certamente teria caído se não fosse o braço de Sasuke volteando seu corpo logo abaixo dos seios e mantendo-a em pé.

— Eu não sei o que fazer — admitiu num timbre agoniado, os olhos lhe suplicavam que ela fizesse algo para ajudar (qualquer coisa).

Detestando-se por sequer supor que seu egoísmo poderia falar mais alto em uma situação como aquela, Karin estalou a língua no céu da boca. Ora, o que ela estivera pensando, afinal? Sakura salvou a sua vida uma vez! E das mãos do mesmo homem que a sustentava agora. Karin cerrou os dentes e girou sobre os próprios calcanhares, gesticulando para que Sasuke a seguisse.

— Vem comigo... Rápido!

Esbaforida, ela guiou ambos até um dos recintos esterilizados que dispunham de aparelhagem. Certamente não eram indicados para uma ocasião como aquela, mas Karin saberia improvisar. Ela escancarou uma porta de metal e acendeu as luzes. Havia um monitor desligado no canto, conectado a alguns equipamentos por grandes tubos. Também havia um leito encostado na parede, não era confortável, mas teria de bastar.

— Coloque-a ali em cima — Karin indicou a cama débil assim que Sasuke irrompeu no cômodo, apoiando Sakura.

Ela rapidamente prendeu os cabelos com um elástico, lavou as mãos numa pia de metal ali por perto e revirou as gavetas atrás de lençóis e mantos limpos. Suas mãos tremiam ao apanhar tudo o que precisaria. É fato que jamais havia feito um parto e apenas a constatação disso a deixava nervosa, quase irritada. Não deveria ser tão difícil assim, deveria? Além disso, a própria Sakura era uma ninja-médica talentosa e a guiaria caso surgisse outro imprevisto. Pelo menos, era com isso que estava contando.

Estava ao lado de Sakura num piscar de olhos, já deitada de costas sobre o leito estreito. Estendeu um lençol limpo sobre as suas pernas e pediu a ajuda de Sasuke para retirar as sandálias e as roupas, de modo a deixá-la apenas com o vestido sem mangas que usava. Uma vez feito isso, Karin assumiu seu posto na extremidade do leito e se dirigiu a Sasuke:

— Você pode esperar lá fora.

O olhar duro que ele lhe deu foi claro o bastante para que soubesse que não ia a lugar algum. Sakura dobrou os joelhos e afastou bem as pernas para auxiliar a ninja-sensora. Uma olhada bastou para que Karin informasse o prognóstico:

— Você está com alguns dedos de dilatação já, talvez quatro ou cinco.

Sakura aquiesceu, agora sem o capuz, Karin via claramente o brilho de suor na sua face, a fadiga evidente sob as pálpebras e no rubor das bochechas. Sasuke, apesar de aparentar estar perdido, quase deslocado, ela notou, não tencionou se afastar dela em momento algum.

— A minha... bolsa amniótica — Sakura balbuciou exaustivamente para ela: — Rompa-a — ordenou com firmeza.

Karin assentiu e em seguida buscou pelo avental e pelas luvas de látex que havia separado anteriormente. Tinha apenas um minúsculo bisturi em mãos e isso teria de bastar. Se fizesse da forma correta, bastaria arranhar a bolsa de líquido amniótico para rompê-la.

Com cuidado e extrema delicadeza, ela fez o procedimento e ficou aflita porque depois disso as contrações de Sakura se tornaram ainda mais fortes e constantes, de modo que ela passou a ofegar alto e agarrar o lençol que cobria seu corpo.

Karin já sabia como seguir a partir dali e foram horas intermináveis assistindo o parto de Sakura.

Sasuke não a deixou em momento algum, tendo permanecido plantado ao lado do leito como um homem atormentado pelo sofrimento da mãe do seu filho. Karin achou bom que, pelo menos, ele mostrasse sensibilidade em um momento como esse. Ou talvez não, afinal o que ela sabia do relacionamento de ambos? O que ela sabia de Sasuke desde que a guerra terminara?

Balançando a cabeça a fim de desanuviá-la, voltou a se concentrar na sua tarefa, instigando Sakura a continuar empurrando — o que ela fazia mesmo sem seus incentivos, parecia tão aflita para que tudo acabasse quanto a própria Karin.

Já devia estar quase amanhecendo quando os primeiros vislumbres do topo da cabeça do bebê surgiram e até mesmo Karin demonstrava euforia com os avanços àquela altura. Sakura, mesmo exausta e aparentemente no limite das suas forças, empurrou com maior persistência sob os estímulos de Karin e o toque carinhoso de Sasuke em sua mão.

E então, finalmente, Sakura com um bramido extenuado, completamente drenado de vigor e longo, deu o último empurrão para que Karin escorasse os ombros do bebê e o trouxesse para fora. Karin amparou-o nos braços e olhou para o rosto encrespado do recém-nascido, o tufo de cabelos pretos como os do pai, empapados, as mãozinhas que se agitavam em punhos cerrados e nervosos.

— É uma menina — murmurou extasiada para ambos os pais do bebê. — Uma menina perfeita.

— Posso vê-la? — Sakura pediu entre lágrimas, os braços ansiando para envolver a filha e Karin percebeu que Sasuke olhava para o ser diminuto no seu colo quase em transe.

Despertando daquele estranho estado onírico, Karin intentou aproximar-se da cabeceira do leito, mas se lembrou de que deveria fazer algo mais importante antes, e recuou de novo:

— O cordão umbilical — murmurou consigo mesma e trouxe uma mesinha de metal para perto.

Amarrou o cordão umbilical que ainda ligava o bebê à placenta com um fio e usou uma tesoura afiada para rompê-lo, cortando a ligação. A menina choramingou em desconforto e Karin decidiu envolvê-la em uma pequena manta limpa para cessar seus resmungos. Limpou o que pôde da sujeira na sua testa e cabelos e voltou-se para Sasuke e Sakura.

— Aqui.

O bebê foi amparado pelos braços mais que ansiosos de Sakura que contemplou o rosto da filha pela primeira vez. A adoração era evidente no seu olhar, o calor humano e afeto maternal tão fortes que acalmaram o choramingo da pequena de imediato.

— Anata, olhe para ela! — sussurrava ela, febril de amor pela filha. — É perfeita!

Karin sentiu-se desconfortável por estar no meio de um momento tão íntimo para o casal, mas não conseguiu encontrar forças para se afastar dali. Ainda que algo dentro dela doesse com a adoração e o amor que via tão evidentemente estampados no rosto de Sasuke.

Ela assistiu aos dois cobrirem a recém-nascida de mimos. Depois de algum tempo, limpou a garganta para lembrá-los de que continuava ali.

— Posso limpá-la e vesti-la? — perguntou ao se dirigir diretamente à mãe, que assentiu, grata.

Karin tornou a apanhar a pequena nos braços. Sua mortificação era tamanha que não sabia ainda como deveria se sentir sobre tudo aquilo. Que estranho, pensou, até algumas horas ela estivera ruminando seu passado com Sasuke e agora tinha a filha dele nos braços — com outra mulher.

Ela deitou a menina sobre a mesma mesinha de metal e limpou-a rapidamente. Mal percebeu a aproximação de Sasuke até que a voz dele soou trovejante bem próximo dela:

— Sakura me pediu para te entregar isso — ele levantou a pequena mochila que carregava. — Tem algumas roupas para ela aqui.

— Hã, certo — assentiu, apanhando a mochila dele com estranheza.

Conforme limpava a menina e preparava-a para vesti-la, foi vencida pela própria curiosidade — ou talvez só estivesse desconfortável demais com o silêncio, já que Sasuke mantinha-se por perto da cria como um verdadeiro papai coruja.

— Já escolheram um nome?

— Sarada — Sasuke respondeu de imediato, os olhos pregados à menina mal piscavam.

— Hmm, escolha interessante — comentou mais por cortesia, talvez a mortificação estivesse começando a desvanecer, afinal.

— Não tínhamos certeza se teríamos uma menina ou um menino — ele acrescentou com ares de diversão, como se apreciasse uma piada interna.

— Foi um tanto imprudente estarem fora da vila com Sakura tão perto de dar à luz.

— Estamos viajando há muito mais tempo do que isso — Sasuke esclareceu com as sobrancelhas levemente arqueadas. — E Sakura teve uma gestação bastante tranquila. Sarada é quem decidiu nos pregar um pequeno susto.

Ele estendeu a mão para a menina e Karin não conseguiu tirar os olhos do sorriso que aformoseou os lábios masculinos quando os pequenos dedinhos de Sarada se fecharam em torno do indicador num agarre firme. Há quantos anos ela não o via sorrir assim? Desde que o conhecera no exame Chūnin, talvez, tanto tempo atrás.

Karin sentiu o coração saltar-lhe no peito novamente e decidiu que era hora de levar a menina para a mãe. Pegou-a nos braços e caminhou apressada de volta para o leito, devolvendo-a para os braços já saudosos de Sakura. Resolveu limpar tudo e depois teria que ajudar a ninja-médica a vestir roupas mais confortáveis e trocar os lençóis molhados de suor.

Sasuke voltou ao seu posto, ao lado do leito; ele lembrava Karin um falcão vigiando sua ninhada e talvez o fosse. Karin não tinha dúvidas de que ele faria absolutamente tudo pela família que construiu com Sakura. Uma família! E era isso: ela estava começando a assimilar, de fato, a posição em que fora colocada.

Bobagem, cerrou os dentes e resignou-se a cumprir suas tarefas. Tinha muito a fazer e inacreditavelmente o sono de antes havia a abandonado por completo.

Um tempo depois, tudo estava em seu devido lugar outra vez e Sakura amamentava Sarada pela primeira vez que, satisfeita, por pouco não adormecia no colo da mãe. Karin se reaproximou do casal para perguntar se precisavam de algo e foi nesse momento que Sakura se manifestou, dirigindo-se a Sasuke com preocupação:

— Anata, você deveria descansar um pouco.

— Eu estou bem — ele garantiu, mas Karin não soube dizer se por teimosia (por não querer se afastar da esposa e da filha) ou se por orgulho mesmo.

— Você pode comer algo e tomar um banho pelo menos, Sasuke — ela interferiu monocórdia. — Eu fico com elas.

A própria Karin estava surpresa por haver se voluntariado para tomar conta de ambas, mas ajeitou os ombros e descartou o sentimento. Sakura precisou insistir mais algumas vezes até vencer a teimosia do marido. Uma vez que ele desapareceu de suas vistas, Karin voltou-se para a mulher e descobriu-a já a olhando serenamente; Sarada ainda sugava seu seio, mas parecia mais por capricho do que por fome.

— Obrigada por tudo o que fez por mim e por Sarada.

— Não há necessidade de me agradecer — ela disse, mas Sakura meneou a cabeça, interrompendo-a.

— Eu nunca vou poder te compensar por tudo o que fez, Karin. Significou muito para mim.

O primeiro pensamento de Karin foi recuar e talvez adotar uma postura mais defensiva, mas a sinceridade nas palavras de Sakura desarmou-a por completo; ela não soube o que responder, o que fazer. Então, disse-lhe a primeira frase que lhe veio à mente:

— Cuide bem dele, tudo bem?

— Você nem precisa me pedir — garantiu com ar solene, mas seus belos olhos verdes escureceram de repente e seu tom se tornou brando: — Me desculpe por isso.

Karin soltou um muxoxo, soerguendo uma sobrancelha fina.

— Está me pedindo desculpas pelo Sasuke amar você e não eu?

Sakura enrubesceu e rapidamente balançou a cabeça, desconcertada.

— Tem razão, me desculpe.

Nisso, tanto Karin quanto Sakura riram delicadamente e baixinho para não perturbar a tranquilidade de Sarada. Quando o silêncio caiu entre ambas, foi Sakura a rompê-lo:

— Você me odeia?

— Por que odiaria? Você o faz feliz, você deu a ele uma família. Eu seria uma estúpida colossal se te odiasse por isso, além do mais, Sasuke nunca foi meu.

— Por alguns anos, ele também não foi meu.

— Mas com você é diferente — Karin rebateu. — Com todos vocês... sempre foi diferente para o Sasuke. — E com isso, Sakura entendeu que ela se referia ao Time 7.

Karin observou o bebê aninhado nos braços da mãe e não conseguiu evitar um sorriso.

— Ela é adorável.

Sakura, percebendo que Sarada já havia acabado de mamar, afastou-a do seu seio, cobrindo-se e ajeitando a manta em torno da menina. Ofereceu-a então para a ninja-sensora.

— Quer segurá-la?

Karin hesitou a princípio, mas não demorou a aceitar. Deixou que Sakura lhe passasse a menina, indicando a melhor posição para segurá-la, apoiando sua cabeça coberta por tufos de cabelo negro no antebraço.

— Ne, Sarada-chan, você é tão parecida com seu papai! — entoou num timbre que tranquilizou a menina. Sorrindo com seu progresso, continuou: — Mas, honestamente, espero que você possua o coração gentil da sua mamãe.

Quando as pálpebras cor de lavanda tremeram em meio às feições de porcelana e os pequenos lábios cor-de-rosa se entreabriam, Karin concluiu que pouco importava sua antiga fantasia com Sasuke agora. Aquele bebê delicado que ela ajudara a trazer ao mundo valia mais do que tudo, aquela pequena conexão que ela criara com Sakura e com Sarada era mais preciosa.

— Eu guardei um pedaço do cordão umbilical — ela murmurou alguns minutos depois, sentada à beira do leito de Sakura e ainda ninando Sarada.

Sakura lhe sorriu em resposta:

— Fique com ele.

Karin engasgou um pedido de desculpas, pois achou ter ouvido mal o que Sakura lhe disse, mas, para a sua surpresa, ela reafirmou suas palavras, desta vez mais alto para que não restassem dúvidas.

— Sasuke-kun e eu ainda estamos viajando, eu não teria como carregá-lo comigo. Além disso, quero que você tenha algo da Sarada para guardar de recordação.

— Eu não posso aceitar, Sakura — insistiu, enrubescendo devido ao peso da atitude da ninja-médica. — É uma tradição que a mãe guarde um pedaço do cordão do bebê, como sinal de boa sorte.

— Eu sei — concordou com um aceno de cabeça. — Mas... — mordiscou o lábio e deixou seu olhar cair para a menina que Karin ninava. — Você se consideraria madrinha dela se guardasse um pedaço do cordão consigo? Sei que o Sasuke-kun não se oporia a isso de forma alguma.

Karin começava a insistir que não poderia quando foi interrompida por Sakura outra vez. Depois de recusar o pedido por um pouco mais, acabou concordando, ainda que não estivesse exatamente confortável com a situação.

Sasuke não demorou a voltar depois disso — como esperado — e parecia surpreso com a evidente camaradagem entre as duas mulheres, mesmo que não tenha dito uma palavra sobre isso.

Dias depois, devidamente descansados e recuperados, e com Sarada já pronta para seguir viagem junto dos pais, eles se despediam à entrada do esconderijo, sob um céu claro com nuvens que vagavam a esmo como imensas ilhas errantes.

Sakura havia amarrado um pedaço de tecido resistente em torno do corpo, com um nó firme na nuca, para poder carregar Sarada com mais conforto e segurança. Ela ainda dormitava imperturbável nos braços da mãe.

— Obrigada por tudo o que fez por nós, Karin. — Foi ela a agradecê-la, como previra, enquanto Sasuke apenas lhe dedicara um olhar de gratidão (igualmente significativo) e aquiescia ao som das palavras da esposa.

— Não precisa me agradecer, eu já disse — ela lembrou a mulher com um olhar suave que foi retribuído com outro sorriso amável de Sakura.

— Estamos indo. Até mais, Karin — Sasuke apressou-a e Sakura assentiu, murmurando um “espero vê-la novamente” enquanto seguia o marido que a acompanhava de perto.

Karin os observou se afastarem, suas capas agitando-se sob uma brisa suave, suas silhuetas tão próximas que eles quase se tornavam um. Cruzou os braços sobre o peito e suspirou. Ficou ali até que desaparecessem e muito mais.

Quando estava prestes a voltar para o esconderijo, lembrou-se da caixinha em sua escrivaninha contendo um pedaço do cordão umbilical de Sarada Uchiha. Sorriu consigo mesma e até mesmo se sentiu uma boba pelo rumo que seus pensamentos tomavam.

Perceber que nunca amou Sasuke como havia pensado por tantos anos foi como ter um peso retirado dos seus ombros.

Honestamente, se em algum momento Karin tivesse ao menos suspeitado de que aquele pedaço de cordão umbilical seria o responsável por causar uma confusão infernal onze anos depois, ela o teria escondido melhor. Quem imaginaria que Suigetsu seria tão imbecil? Bem, isso ela tivera certeza desde o princípio, de todo modo.

— Que bom que esse mal entendido pode ser esclarecido então, não é? — O ninja com dentes de tubarão coçou a nuca visivelmente embaraçado por seu erro estúpido.

— Francamente, Suigetsu, você é um caso perdido — ela bufou ao se virar para o monitor que exibia os gráficos da comparação genética do cordão umbilical de Sarada com uma amostra da própria mucosa bucal dela. — Tem o cérebro de um peixe!

— Ei — ele protestou, defendendo-se de seu comentário. — Se ao menos você tivesse me dito antes que aquele cordão era da menina tudo isso não teria acontecido!

— E por que eu deveria te dar satisfações da minha vida pessoal, cabeça de atum?!

— Uh, não precisa ficar tão na defensiva, sua megera!

Karin o ignorou, voltando-se para o monitor novamente. Debruçou-se sobre a mesa e sentiu um arrepio quando o calor do corpo de Suigetsu atingiu-lhe as costas. Ele havia se aproximado demais. O hálito quente no seu pescoço fez seu coração açodar o compasso para uma cadência enlouquecida e, na opinião de Karin, aquilo tudo era ridículo.

— Afinal de contas, por que aceitou fazer o parto da mulher do Sasuke? Será que além de louca você também é masoquista?

— Isso não é da sua conta! — trovejou furiosa, afastando-se dele e do calor que sentia emanar do seu corpo; sempre achou que Suigetsu fosse tão frio quanto aparentava, plácido como a água de que era feito.

— Tá, tá! — apressou-se em dizer, espalmando ambas as mãos. — Não precisa ficar toda nervosinha, tudo bem? Eu só queria saber. Você nunca fez questão de esconder que era maluca pelo Sasuke... Quero dizer, você até negava, mas não convencia ninguém.

Karin apoiou-se à mesa atrás dela, descontente com a conversa invasiva.

— Eu já disse que não devo nenhuma satisfação da minha vida pessoal a você.

Suigetsu revirou os olhos violetas e Karin cruzou os braços num gesto inconsciente de proteção. Ele apoiou a mão no quadril estreito, arrogante. De repente, ele exibia um sorriso prepotente, todo cheio de dentes.

— É você quem sabe — completou num timbre rouco e lhe deu as costas.

Ele parou à porta do recinto para fitá-la outra vez e lhe lançar uma piscadela indiscreta.

— Imbecil — Karin grunhiu, porém sabia que ele não poderia escutá-la mais.

Voltou-se para a mesa, para a caixinha que continha o cordão umbilical de Sarada. Suspirou demoradamente e perguntou-se quanto tempo ela já havia esperado, quanto tempo ela havia feito outros esperarem para tomar uma decisão.

Com zelo, apanhou a caixinha nas mãos e a devolveu à sua gaveta. Maldito Suigetsu por confundir tanto as coisas, praguejou internamente e riu do sentido ambíguo de tudo aquilo. Com uma risada seca, virou-se para seguir pelo mesmo caminho que ele havia tomado.

Talvez fosse o momento de Karin abandonar de vez o hábito da abnegação.

Ora, Suigetsu havia lhe dado provas de que podia lidar perfeitamente com a sua presunção. Por isso, mandou o restante às favas e apressou o passo para alcançá-lo; para trocar farpas e ofensas com ele pelo menos uma última vez.


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Notas finais do capítulo

Leve SuiKa no finzinho porque a Camille ama SuiKa e me convenceu a colocar :v Espero que tenha gostado, minha flor, eu dei meu sangue nisso ;-;
...
Enfim, espero que tenham gostado também e não deixem de comentar, ok? ;)
E ahh, digam não à injustiça com a Karin nas Fanfics SasuSaku! :D
Beijokinhas!!!