Ao chegar ao ponto onde começaria a quarta missão, fiquei em dúvida se desistia ou não, pois quando observei os monitores ali presentes, confesso que gelei um pouco.

Um homem com aparência maneira e aventureira. Óculos escuros estilo aviador, colete amarronzado e botas. Seus cabelos castanhos eram cortados rentes à cabeça, de forma que parecesse que havia vindo do exército. Era musculoso e tinha uma expressão despreocupada no rosto. Um homem chamado Ewan. Por mim, conhecido como pai.

Apesar de sermos os primeiros a chegar e que provavelmente os outros ainda estavam a procura do boneco, me recusei a entrar no campo de visão de meu pai. Eu sentia que não estava preparada para isso, sentia que não era o bastante para deixa-lo feliz, que eu era um fracasso.

–- Qual é, Clary, vamos nos atrasar! Alguém pode passar em nossa frente! – Barbara incentivava gentilmente.

–- Clarisse Shadows, você vai entrar nessa droga de missão e nós vamos completa-la. – Aimee estava corando tanto que senti que ela ia explodir. Ela provavelmente ficava vermelha quando tinha raiva. Uma coisa que aprendi: nunca deixe baixinhos com raiva, eles podem explodir.

–- Não posso! Ele vai me olhar daquele jeito! – Eu justificava.

–- Quem? – Gritou Aimee.

–- Meu pai – Mumurei com vergonha. Um homem tão legal e foda (não achei meio melhor para descrever meu pai, perdão) não podia ter uma filha negação como eu. Estraguei a vida deles. Não duvido que seja por isso que ele está aqui agora e não matando medos.

–- O Indiana Jones ali é seu pai? – Aimee perguntou.

–- Pensei o mesmo. Talvez com uma pitada de Han Solo. – Philip se intrometeu.

–- Mas eles são a mesma pessoa! Digo, o mesmo ator... – Aimee justificou.

–- Verdade. Seu pai é o Harrison Ford. – Philip conseguiu arrancar um riso de Aimee com esse comentário. Ótimo. Terei que aturar os dois falando sobre cultura pop.

Suspirei.

–- Voltando ao assunto, Clarisse, vamos te levar a força. – Barbara disse.

–- Tá bom, tá bom, eu entro. – Me emburrei e entrei na arena que era apenas uma clareira cercada com arames farpados.

Ao me ver, papai sorriu e soltou um comentário com algum amigo dele.

–- Oi Clarisse! – Ele foi até mim sorrindo. Logo, cumprimentou meus amigos com um high-five. Eu poderia chamar minha equipe de amigos?

–- Olá senhor Shadows – Barbara diz, educadamente.

–- Por favor, me chamem de Ewan. – Ele sorri, descontraído. – Fico feliz que tenham chegado primeiro, a equipe da minha filha!

–- Você não acha que é coincidência demais ele chamar Ewan? Ben Kenobi com cara de Han Solo... – Philip pareceu abismado.

–- Ewan McGregor – Aimee sorriu.

–- Quem? – Barbara perguntou.

–- Um ator de Star Wars, ele interpreta Ben Kenobi. – Aimee respondeu, como se fosse óbvio, mas não era.

No entanto meu pai parecia entender. Lembro-me de dias em que ele fazia maratonas de todos os filmes de Star Wars.

–- Fui abençoado pela Força, se é que me entendem. – Ele piscou.

Aimee e Philip sorriram. Ele fazia algum tipo de magia para arrancar sorrisos verdadeiros, não era possível sorrir tanto em um tempo menor que cinco minutos.

–- Sem mais delongas, sabem como funciona? – Ele perguntou.

Todos respondem “sim” em uníssono, mesmo não sabendo.

–- Então, preparem-se. Quando eu disser ‘já’, quatro medos de cada vez serão gerados e terão que enfrenta-los.

Ele se afastou e se sentou junto com os caras novamente. Havia uma grande máquina que soltava vapor ao lado deles. Apenas apertou um botão, e quatro medos apareceram de uma vez, ao lado da máquina.

Mas esquecemos de um detalhe importante.

Como Philip ia enfrenta-los?

–- Aimee! Barbara! – Gritei para elas. – E o Philip? – Os medos iam se aproximando.

Aimee entendeu o problema e jogou uma faca, presa discretamente em sua cintura para ele, provavelmente proibida nas regras, mas ninguém ligava para regras.

–- Você terá que enfrentar seus medos! – Eu grito para ele, por cima dos murmúrios das sombras e do barulho do gerador. – Consegue?

Ele olha novamente para os medos se aproximando. Assente timidamente e se prepara.

Ao chegarem perto o bastante, eu e as garotas partimos ao ataque, já Philip, esperou o medo ficar rente a ele para finalmente apunhala-lo com a faca umas cinco vezes até o medo cair no chão e sumir.

Devia ser horrível para ele enfrentar os medos assim.

Mas por outro lado, tive a oportunidade de vê-los lutando; Aimee era feroz, como se estivesse faminta por guerra. Barbara era graciosa e parecia tranquila. Philip... Bem, Philip estava se saindo bem.

Após cinquenta rajadas de medo, finalmente acabamos.

Estávamos esgotados, arfando e doloridos.

–- Muito bem, vocês conseguiram. – Meu pai finalmente tirou os óculos de sol, exibindo os olhos azuis e sorriu mais uma vez. – Me deem a folha...

Sem nem perguntar o porquê, entreguei a folha de missões para ele. Ele assinou logo abaixo da missão, que acabara de ser completada. Entregou-me a folha e voltou para os colegas dele. Trocaram algumas palavras e logo estava voltando a nós como uma mochila.

–- Ótimo, agora podem ir. Nessa mochila contem o segredo do universo. – Ele me olha, sério.

–- Verdade? – Philip se atiçou.

–- Não. Só uma barraca, comida enlatada e mais umas coisas... – Ele sorriu, contagiando a todos novamente.

Disse um breve adeus e “boa sorte”. Neste caso, parecia verdadeiro.

–- Clarisse, lembre-se de que eu e sua mãe te amamos. – Ele sussurrou para mim.

Não pude deixar de sorrir. Como, com tudo que eu havia feito, eles não deixaram de me amar?

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Tinham se passado tanta coisa nesse dia, que nem percebemos que estávamos sem comer.

–- Cara, eu estou com muita fome! – Resmungava Aimee, enquanto procurávamos um local meio escondido para passarmos a noite.

–- Não se preocupe, estou sentindo que estamos perto... – Eu disse.

–- De quê? – Barbara perguntou.

–- De onde vamos ficar. – Respondi.

–- Como você sabe? – Barbara continua questionando.

–- Barbara, cale a boca, se ela diz que estamos perto, não vamos interferir. – Aimee disse.

De repente, um assunto me veio à cabeça.

–- Ei, Philip, sua mãe sabe que está conosco? – Perguntei.

–- Hum, na verdade não. – Ele pareceu meio distante.

–- Então como ela vai autorizar você passar sabe-se lá quantas noites fora?

Ele não disse nada.

–- Philip? – Chamei.

–- Ela... Ela não se importa desde que tenha suas pedras. Quando elas acabarem, só então ela vai vir atrás de mim. – Ele disse, como se fosse um fardo.

No inicio eu não entendi, mas pensando um pouco, entendo que ele quis dizer que ela fosse uma drogada, que não dava a mínima para ele. Senti que não deveria perguntar sobre o pai, então me calo e permito o clima tenso entrar.

–- Que tal ficarmos aqui? – Eu disse, quebrando o silêncio e finalmente arrancando alívios de todos.

Até que era um local bonito. No meio das árvores, sem nenhuma Timores Lignum por perto. Ficava de frente para um rio de tonalidade azulada (é raro ver um que não seja marrom).

Ao abrir a mochila, me deparo com um kit de sobrevivência completo.

Aimee e Barbara pegaram as partes da barraca e começaram a monta-la, rindo de cada erro cometido por elas mesmas, enquanto eu e Philip fazíamos uma fogueira.

Quando tudo estava pronto, nos sentamos ao redor da fogueira e eu peguei a mochila e busquei por comida. Haviam várias latas ali, mas acima de todas, havia um pacote de marshmallows, com um bilhete escrito em um post-it.

Li. Dizia: “Nunca deixamos de te amar, e não sei por que ainda pensa isso. Não foi culpa sua o que aconteceu, e esta é uma pequena prova de meu carinho. Quebrei várias regras ao colocar esses marshmallows aí. Espero que gostem :) - Papai”.

Sorri ao ler aquilo. Depois de tudo, as coisas continuavam as mesmas.

Aquecemos nossos marshmallows na fogueira enquanto contávamos piadas ruins.

Minha vida parecia maravilhosa.