A Filosofia do Existir de um Imortal escrita por Teffyhart


Capítulo 1
I




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Ele tinha um sorriso no rosto. - Eu sinceramente não acredito no fim da existência. Eu nunca desaparecerei. - Disse. E antes que ela pudesse perguntar qualquer coisa, esclareceu. - Eu não acredito na morte.

Só de lembrar dessas palavras o fazia rir. Como era jovem. Como era tolo. Ele hoje era ninguém. Hoje era só mais um. Um ser sem razão de viver, sem um motivo para continuar e que a própria existência havia se perdido no tempo.

Não era mais que um moribundo, pelo menos internamente, esperando pelo seu momento de deixar essa realidade. Por vários anos vagara por aquelas terras, hoje que já não eram mais frutíferas. Por vários anos havia morrido junto com aquelas terras e se tornado ruínas junto com os templos.

Olhou para cima, vendo o azul do céu e deixando com que ele o engolisse. O mundo há muito não era mais puro. Assim como não tinha mais necessidade para que ele existisse. Ele, que perdeu sua identidade, seu tempo e sua vivência. Ele que, hoje, não era nada mais que o vácuo contido sob a pele humana.

Seu olhar voltou a cair sobre a estátua coberta de musgo e faltando algumas partes, como detalhes entalhados no mármore branco que haviam sedimentado com o tempo. Aproximou-se com calma e, com uma gentileza que suas mãos calejadas pouco conheciam, ergueu a estrutura não muito grande - porém não muito pequena - a levando até uma fonte próxima.

A água parada da fonte, uma vez branquíssima, não era a mais limpa de todas, mas com toda boa vontade que tinha, usava um trapo limpo para molhar na água e, depois, lavar a estátua, revelando sua cor verdadeira por baixo da poeira, por baixo da sujeira.

Sutil como a brisa da tarde, a mesma que carregava para longe os resquícios das diversas batalhas travadas, porém nunca vencidas, deixou que o resquício de si viesse a tona.

As lágrimas escorreram por seu rosto sujo pela poeira. As mãos tremeram enquanto ele limpava, com cuidado, cada um dos entalhes do rosto de mármore. O homem estava cansado daquilo tudo. Estava cansado de ser o único a carregar aquele fardo.

Levou o pano à água novamente, limpando-o da sujeira que havia retirado da estátua e apertando-o para livrar-se do excesso de água. Sua expressão cansada denotava-se, ainda que por cima de seu rosto jovem. Grandes bolsas negras contornavam seus olhos, fruto de noites em claro, e a pouca esperança transbordava de seus poros.

Deixou a estátua semi limpa, parte de seus trajes ainda estavam imundos, mas apoiou-a ali, naquela borda da fonte, e sentou-se no chão, mantendo-se mais baixo que ela. Riu de si mesmo, mas soube se controlar. Aquele pedaço de pedra era o mais perto de uma divindade que o mundo havia visto em muitos anos.

E ainda assim, lá estava ela, esquecida naquelas ruínas de um templo abandonado.

Recordava-se da época em que haviam sacerdotes, cultuadores, religiosos por todos os lados… Ainda assim… Nenhum deles restara, se não ele próprio. Hoje já não se recordava mais como contactaria o divino. Não sabia nem mais se tinha o direito de. Suas mãos estavam cobertas com o sangue e os pecados de uma eternidade tão longa que nem mesmo ele mais se recordara… Ainda assim estava ali, sentado naquele lugar inóspito, sua única companhia sendo o mármore frio e sua sombra.

Quem era ele para ter direito à eternidade? Quem era ele que vivia por todos esses anos e ainda assim viveria mais eternos outros? Ele não sabia mais.

-Por favor. - Implorou baixo. Tinha medo que o vento carregasse suas palavras. - Por favor. Eu não aguento mais.

E de fato o vento as levara para longe, para algum lugar onde não era escutado. Como uma criança, implorava para aquela estátua por redenção. - Por favor, destrua minha existência ou minha consciência. - Voltou a falar, sua voz era falhada e dolorida. - Não posso mais viver sabendo que não existo completamente.

E o silêncio fora a única coisa que recebera de volta. Talvez realmente tivesse destruído o resto de conexão que ainda tinha com o divino com o passar dos anos. E assim como todos os outros mortais, estava fadado ao silêncio eterno da onipresença que os regia.

Que aliás, ele já nem mais tinha certeza se o fazia ou se os havia abandonado completamente. Levou às mãos ao rosto. Havia feito de tudo, seguido cada uma das ordens e ainda assim… Ainda assim… O silêncio.

Aquele silêncio opressor tão silencioso que parecia ensurdecê-lo. O vento afagava-lhe os cabelos, o mesmo que carregara suas palavras para longe e trazia o cheiro pútrido dos campos de batalha.

Ele estava fadado a viver para sempre. Ele estava fadado a viver sozinho. Não restava outro ser sobre aquelas terras e ainda assim… Ainda assim…

Ainda assim a Deusa que o colocou naquele mundo, que deu para ele uma missão, uma razão para continuar, mantinha-se calada. Mesmo depois de sua razão e sua missão terem-lhe sido arrancadas de si, ela mantinha-se quieta. Nenhuma palavra, nenhum sinal, nenhuma redenção.

Ernasis não mais o respondida.


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