Sons of Theolen escrita por Live Gabriela


Capítulo 25
Nipples - Refém


Notas iniciais do capítulo

As falas entre [ ] estão na língua subterrânea.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/642142/chapter/25

— Oh, Pélor... – sussurrou Nipples ao ver Charly se distanciar dele para ajudar no combate contra os drows com seu arco curto.

O serviçal aflito levou uma das mãos ao peito enquanto a outra apoiava na árvore a sua frente, que o fornecia certa cobertura e lhe servia de esconderijo. Ele observava atento a luta na Planície Roxa e sentiu um grande medo lhe tomar conta quando ele viu Dorothy ser enredada pelos galhos de uma árvore, além de gramas e raízes do chão.

— Oh não... – cochichou temeroso – Alguém precisa ajudar a minha senhora.

Procurou então alguém que pudesse fazê-lo, e logo olhou para Arlindo que estava bem próximo da paladina, mas o clérigo estava enfrentando os próprios adversários e nada pôde fazer pela garota. “Eu tenho que tirá-la de lá!”, pensou Nipples “Talvez se eu me esgueirar até atrás daquela pedra sem que ninguém me veja e assim eu seja capaz de cortar aquelas raízes com a adaga que ela me deu.”.

O serviçal então tirou a grande mochila das costas e começou a vasculhá-la atrás da adaga, quando ouviu o som de passos rápidos sobre a grama, bem próximo a si. Ele olhou em volta então viu um drow correndo em sua direção, ele carregava uma besta na mão e estava perfurado por uma flecha no lado direito do peito e tinha um corte grande que vazava sangue no braço. “Oh, céus, oh céus!”, pensava Nipples desesperado, revirando a grande mochila atrás da lâmina, derrubando-a no chão antes do elfo o alcançar.

— [Parado...] – falou Huln ofegante em subterrâneo, enquanto apontava sua besta para o serviçal.

— Oh, meu senhor, por favor, não atire! – pediu com as mãos para o alto.

— [A mochila] – disse o drow para Nipples, que o olhou confuso – A... [Droga, como se diz isso em comum?!] – resmungou o drow apoiando as costas na arvore e em seguida olhado para a flecha em seu peito – [Não consigo pensar direito com isso aqui...] – falou para si mesmo.

— [Não consegue pensar direito de jeito nenhum.] – falou uma voz feminina vindo detrás da árvore.

Nipples então viu uma drow sair dali, enquanto ela olhava cuidadosamente seu entorno. Ela tinha um manto num tom de verde escuro e os cabelos brancos e curtos, com uma comprida franja lateral, cobertos por um grande capuz. Ela se aproximou de Huln e então o ajudou rapidamente a tirar a flecha do peito, enquanto lhe dava na boca uma poção de cura que carregava consigo. Em seguida a elfa negra deu um rápido beijo nos lábios do drow e se virou para Nipples com seus olhos vermelhos e brilhantes.

— Você vem conosco. – ela disse — Pegue a mochila, estamos indo embora.

— Oh, minha senhora, eu sinto muito, mas... – falou o serviçal assustado – Eu não posso sair daqui, eu tenho deveres e responsabilidades para com--

— Você não tem escolha. Pegue a mochila e mexa-se, ou prefere morrer? – ameaçou ela o interrompendo.

Nipples engoliu um pouco de saliva assustado e olhou para seus companheiros enfrentando os inimigos. Por um momento ele desejou poder lutar como eles e sair daquela situação, mas ele não tinha a habilidade ou o treinamento para isso, então fez apenas o que sabia fazer.

— Não, minha senhora. – respondeu tristonho, balançando a cabeça e se preparando para sair dali obedientemente.

Em alguns breves instantes eles saíram detrás da árvore e começaram a ir em direção à floresta com Nipples como refém. Ao ver que eles demorariam minutos até chegar a ela, a drow parou os dois e se virou para Huln.

— [Eles estavam lutando muito bem, apesar da desvantagem numérica. Se a batalha acabar logo eles poderão nos seguir.] – disse ela em subterrâneo.

— [O que quer que eu faça?] – perguntou o elfo.

— [Nada. Vou nos deixar invisíveis, assim se eles nos procurarem enquanto ainda estivermos nessa Planície não nos verão].

O drow balançou a cabeça positivamente e ela logo conjurou a magia sobre ele. Nipples levou um susto ao ver a mulher tocando o elfo e ele desaparecendo imediatamente em seguida, ela então se virou para o serviçal já conjurando a ilusão.

— Oh, Pélor, por favor, me proteja... – sussurrou ele apertando os olhos.

— Cale-se criatura. Isso apenas te deixará invisível. Aliás... – ela se interrompeu – Huln amarre-o em você pelo braço com uma corda, para não perdermos ele. – disse e então se voltou para Nipples – Se fugir de nós, Huln irá atrás de você como um cão caçando uma lebre, então é melhor não correr se não quiser sentir suas presas.

Trêmulo, Nipples apenas concordou com a cabeça. Ele logo sentiu seu pulso sendo amarrado e ao ser tocado pela elfa viu seu corpo desaparecer por completo, incluso sua mochila e roupas. Era uma sensação totalmente nova para o serviçal, embora ele já tivesse tido outras bem incomuns, aquela era para ele realmente confusa, pois ele não podia se ver apesar de poder se sentir, mas logo seu devaneio foi interrompido, quando ele foi puxado pela corda.

Seguiram então invisíveis e apressados para a floresta enquanto Nipples era puxado pela corda e tropeçava no caminho, desacostumado ao ritmo dos elfos. Correndo, conseguiram chegar até ela ainda pouco antes de o efeito da magia acabar e eles ficarem visíveis novamente. Huln caminhava na frente, os guiando rapidamente por algum tipo de trilha que só ele conseguia enxergar e depois de alguns minutos andando a passos apressados eles pararam brevemente para recuperar o fôlego.

O drow começou a falar algo em subterrâneo para elfa, enquanto Nipples nada entendia. “Será que é uma boa ideia pedir para que eles falem numa língua que eu entenda? Eles parecem parcialmente razoáveis, ao menos a moça, apesar dela ter sido um tanto indelicada comigo”, pensou o serviçal e então se voltou para os drows:

— Meus senhores, eu não desejo interromper, mas por obséquio e questão de educação, será que poderiam falar na língua comum? – pediu nervoso.

Os dois drows se viraram para o pequeno homem assustado e o encararam de cima para baixo, enquanto uma pequena gota de suor escorria pela lateral do rosto dele.

— [Como é?!] – resmungou Huln em subterrâneo cruzando os braços.

— O que? – perguntou a drow para seu companheiro – Não vejo problema em falarmos em comum. [Além disso, em breve teremos que conversar com ele e será proveitoso retirarmos as informações depressa e sem relutância. Se ele confiar um pouco em nós, podemos conseguir isso], agora comece a falar em comum. – concluiu ela.

— Eu... Não falar muito "bom". Muito tempo sem falar essa língua. – gaguejou o drow olhando para a ela e em seguida para seu prisioneiro.

— Oh, meu senhor, não se preocupe, posso te ajudar com isso. Tenho orgulho em dizer que sou muito versado nesse idioma, possuindo um vocabulário adequado e polido. – disse Nipples de forma atenciosa.

A drow deu uma leve risada enquanto olhava para o elfo negro, ele apenas revirou os olhos e se preparou para continuar caminhando. A elfa foi até Nipples e agachou em sua frente. Ela puxou uma adaga de uma pequena bainha escondida em suas costas e segurou em frente ao serviçal que logo arregalou os olhos caramelados.

— Me chamo Syum. – disse ela com sua voz levemente rouca – E você?

— Oh, sou Nipples, o serviçal, minha senhora. – respondeu ele ofegante.

— Nipples? – perguntou Huln um tanto descrente ao se lembrar de que havia uma palavra em élfico muito parecida com o nome do serviçal, mas que na verdade significava mamilos.

Syum olhou para Huln erguendo umas das sobrancelhas sorrindo e então se virou para o serviçal novamente.

— Eu já o avisei para não escapar, certo Nipples?! – perguntou ela fechando a cara e ele logo fez sinal positivo com a cabeça – Ótimo. – disse a drow cortando a corda que o prendia a Huln. – Então vamos embora.

Eles começaram então a caminhar por entre a floresta. Nipples tentava prestar atenção em todo o caminho, para caso ele tivesse que voltar em algum momento ele soubesse para onde ir, mas infelizmente sua memória espacial não era das melhores e sem pontos de referências, os troncos compridos dos pinheiros pareciam sempre os mesmos.

— [Então... O que acha que ele é?] – perguntou Huln em subterrâneo para Syum.

— Em comum. – ela falou logo em seguida – Vai ser um bom treino pra você. – completou.

— Ahrg... – resmungou o elfo e então se voltou para Nipples – O que você "ser"? Anão? Um goblin gordo?

— Oh, meu senhor, permita-me primeiro corrigi-lo. O correto seria perguntar “O que você é” e respondendo a sua pergunta, não, não sou um goblin ou nenhum tipo de goblinoide! – respondeu sentindo-se levemente ofendido.

— Um anão então. – continuou o elfo.

— Ele por acaso parece um anão?! – falou Syum — Olha essas pernas, são finas demais, assim como o nariz. Além disso, ele não tem barba e nem fede como um anão. – fez uma careta de desprezo.

— Oh, muito obrigada, minha senhora. Eu realmente tento cuidar ao máximo da minha higiene, mesmo nessas situações precárias pelas quais venho passando. – afirmou Nipples feliz com o elogio, embora não o fosse um – Porém há anões sem barba sim, apesar de ser extremamente raro encontrá-los. – continuou e se direcionou para Huln – E se há tanta dúvida quanto à minha raça, posso esclarecer afirmando minha humanidade.

— Humano? – questionou Huln – Muito pequeno e estranho. Humanos "ser" altos.

— “São”, meu senhor. O correto é “são”, mas há vários tipos de humanos, assim como vários tipos de elfos. – explicou Nipples.

— Hum... – disse Huln dando de ombros – [Também nunca vi humano tão feio.] – deu risada olhando para sua parceira.

— [Como se algum deles fosse belo...] – completou Syum também rindo. – Agora volte a falar em comum, você ainda tem muito que reaprender.

— Eu "falou" bem o suficiente! – retrucou Huln.

— Eu não quero o aborrecer senhor, mas o certo seria “eu falo”, “falou” está no pretérito perfeito simples. – corrigiu Nipples erguendo timidamente o indicador e notando a cara de confusão do elfo — Quer dizer que está no passado. — simplificou.

Huln suspirou e passou a mão por entre os cabelos levemente compridos e raspados nas laterais, então começou a dar atenção para seus ferimentos causados pela paladina e o clérigo, na pele escura e arroxeada que não estavam totalmente fechados.

— Com licença, senhorita Syum. Se me permite perguntar, pra onde estamos indo exatamente? – perguntou o serviçal.

— Você conhece essa floresta? – perguntou ela.

— Não, minha senhora. É a primeira vez que caminho por ela. – respondeu ele.

— Então não faz diferença para onde estamos indo.

— Tem razão minha senhora. – disse Nipples que rapidamente pensou em outra abordagem – Acho que minha pergunta foi ineficaz, pois o que eu realmente queria saber é se estou indo em direção a algum tipo de prisão ou--

— Temos uma cela para você. – respondeu ela o interrompendo em um tom seco.

Nipples rapidamente começou a divagar, imaginando como sua cela seria. Em sua mente ele estava indo para um lugar terrível com barras de ferro enferrujadas, um cômodo úmido com fungos, uma cama com um colchão sujo, velho e pulguento... Um verdadeiro pesadelo para o serviçal que foi brevemente interrompido pela elfa negra.

— Você provavelmente ficará lá até realizar a tarefa para qual foi escolhido. – continuou ela tentando provocar a curiosidade no prisioneiro.

— E que tarefa seria essa, minha senhora? – perguntou temeroso.

— Uma simples. – ela respondeu o olhando de canto de olho – Apenas deverá abrir uma caixa para nós, uma que carrega nessa mochila.

Nipples concordou com a cabeça em silêncio fazendo com que um sutil sorriso aparecesse no rosto da drow, então começou a lembrar-se de todas as caixinhas que havia naquela mochila. Não teve que pensar por muito tempo, pois logo se recordou de ter visto Dorothy mostrar uma pequena caixa para Arlindo na noite anterior. Apesar de não ter prestado atenção na conversa dos dois, ele tinha quase certeza de tê-los escutado dizer que não sabiam como abrir aquilo e que provavelmente havia uma magia muito forte no objeto.

“Será que eles acham que eu posso abrir aquela caixinha para pegarem o que há dentro?”, pensou consigo “Mas se nem minha senhora Dorothy conseguiu, quem dirá eu, o pobre serviçal! Além disso, aquilo é um objeto pessoal da senhorita Leon, eu realmente não posso mexer nas coisas dela assim, sem permissão.”. Olhou então para os drows caminhando com passos rápidos ao seu lado, Huln tinha a cara fechada e parecia estar bem atento aos arredores, Syum andava com uma expressão que ele podia entender tanto como tédio ou como sendo apenas sua expressão habitual, que logo ela deixou levemente desconfiada ao notar estar sendo observada por ele.

“Talvez se eu explicar minha situação e disser a eles que não sei como abrir a caixa eles me soltem...”, pensou otimista. “Oh, a quem estou enganando?! É claro que ele não vão acreditar, e se acreditarem eu serei dispensável para eles e poderão até me ma--Oh, não, não pense nisso! Apenas se mostre útil a eles e então terão um lugar pra você!”, concluiu, decidindo em seguida conversar com os dois, na esperança de que talvez eles vissem sua utilidade como serviçal ele pudesse ficar vivo e quem sabe fosse liberto em algum momento.

— Senhor Huln. – disse com o coração acelerado — Não sei se disse a vocês, mas eu sou um excelente trabalhador quando se trata de eliminar sujeiras. De fato, posso eliminar até as manchas mais profundas e aqueles que dizem que sangue não sai do tecido simplesmente não sabem do que estão falando!

Huln franziu o cenho levemente confuso e olhou para Syum, ela também olhava para o serviçal, curiosa.

— É muito simples de fato. – continuou Nipples nervoso – Precisa fazer um soro, como aquele usado em doentes. Algumas colheres de açúcar, uma ou duas de sal e um litro d’água. Depois é só deixar a peça submersa e o sangue vai todo embora! – afirmou, fazendo os drows se entreolharem e erguerem as sobrancelhas, levemente impressionados com a nova informação. — Oh, e eu já mencionei a vez que consegui imediatamente retirar uma mancha de geleia de amora da blusa de Sir Rutherford?! – perguntou dando, em seguida, continuidade a história.

E então por cerca de cinco minutos Nipples contou detalhadamente seus segredos de remoção de manchas em diferentes tipos de tecido. Nos minutos seguintes ele resolveu se vangloriar de outras habilidades de organização e limpeza, não se limitando apenas à remoção de sujeira de roupas, mas também englobando a colocação de talheres, a dobradura de roupas e guardanapos, a limpeza de quinas e cantos e por fim como ele havia conseguido deixar seu grupo confortável durante as refeições, usando alguns métodos que os remetiam a familiaridade de uma mesa de jantar comum, até o momento em que foi violentamente interrompido por um dos drows.

— Ahrg! [Cala essa boca!] – gritou Huln enfezado. Ele já não aguentava mais ouvir sobre as peripécias rotineiras do serviçal.

— Desculpe, mas eu não entendi meu senhor. – falou Nipples assustadíssimo com o berro.

— Fale em comum Huln. – pediu Syum apática.

— [Eu nem ao menos sei xingamentos o suficiente para falar nessa língua!] Eu vou matá-lo! – gritou o drow extremamente nervoso já misturando os dois idiomas – [Eu já estou farto desse falatório inútil, minha cabeça está doendo e] isso é culpa sua! – virou-se para Syum que imediatamente parou de andar arregalando os olhos, confusa, enquanto Nipples se encolhia assustado.

— Como é?! – perguntou a elfa.

— Isso é culpa sua! Essa [situação insuportável] com esse demônio! Eu não "conseguir" mais ouvir "meu" pensamentos na cabeça! – queixou-se o drow. – Como posso me recuperar desses [ferimentos assim?! Sem paz nenhuma!]

— E como exatamente isso seria minha culpa?! – Syum perguntou já brava com o tom de voz de Huln.

— Você [trouxe ele]! Você quis! [Nós deveríamos ter pegado] a garota, como Slyn tinha ordenado!

— Sua irmã não sabe liderar corretamente um grupo! Você sabe disso! Se tivéssemos feito o que ela mandou estaríamos mortos agora! – exclamou Syum irritada.

— Ela é a capitã! [Nós deveríamos ter pegado a garota]! – gritou o elfo negro batendo o punho no tronco de uma árvore.

— Por que queria tanto a garota aqui, hein?!

— [Porque se tivéssemos ela, eu não estar tão irritado!] – gritou em subterrâneo.

— Ah! Sinto muito, eu não sabia que ela te oferecia tanto conforto assim! – ironizou a drow tirando o capuz da cabeça com raiva.

— Do que você tá falando? – perguntou o elfo confuso enquanto gesticulava com as mãos perto na altura do rosto.

— Estou falando da humana e seu busto enorme! – gritou Syum, fazendo Nipples arregalar os olhos e corar imediatamente ao ouvir tais coisas sobre Dorothy. — [Acha que eu não vi vocês lutando que nem rivaizinhos?! Eu também vi você brigando com o macho dela, tudo pelo que? Um par de peitos gigantes?! É, isso não é?! Só pode ser!] – esbravejou a elfa, agora abandonando completamente a língua comum e gritando em subterrâneo.

— [Você está louca?!] – exclamou o drow. – [Ela quase me matou!].

E rápido assim uma grande discussão se iniciou, deixando Nipples totalmente estupefato quanto à situação. “Oh, céus, será que eu provoquei isso? Eu deveria apartá-los?! Ora, claro que não! Não seja tolo, você não serve a eles!”, pensou consigo “Eu devo ficar quieto, isso, não devo me meter em assuntos pessoais como esses e—Ah! Uma abelha!”, estremeceu ao ouvir o zumbido do inseto passando ao seu lado. Nipples olhou para o animal e então reparou não ser uma abelha comum e sim uma abelha atroz, tão grande quando um canário.

Ele permaneceu estático por alguns instantes esperando a abelha ir embora, então reparou que apenas cinco passos dali, logo acima de um declive íngreme e fundo havia uma colmeia gigantesca presa ao tronco de uma árvore, cujo um cipó passava em volta. “E se eu puxasse esse cipó?! As abelhas atacariam os dois e eu poderia correr. Eles demorariam algum tempo até atravessar o declive e se livrar das abelhas...Não! Pare com essas ideias inconsequentes! Você não é nenhum tipo de herói, é claro que isso nunca daria certo, você deve aguardar pacientemente e esperar até que seus senhores venham te resgatar!”, pensou concordando com a cabeça.

Então virou-se para os drows discutindo, eles gritavam palavras em subterrâneos enquanto faziam gestos violentos, estavam incrivelmente agressivos e mal davam atenção para seu refém. “Oh, o que estou pensando?! Nem meus raptores se importam comigo, quanto mais a Escolhida em busca de um dos Doze de Theolen! Eles nunca se arriscarão por um mero serviçal! Eu vou morrer nessa floresta suja e isolada! Oh, Pélor, por favor, me ajude!”, implorou olhando para cima.

De repente os pensamentos de Nipples foram interrompidos por ele ter sido empurrado para trás com o peso de Syum sendo jogada em sua direção, por ela ter antes acertado um tapa no rosto de Huln. O serviçal cambaleou alguns passos, parando na beira do declive e se segurando no que via para não cair de lá. Então ao agarrar o cipó, Nipples perdeu completamente o equilíbrio e foi lançado junto com a planta, para o outro lado do pequeno vale.

O cipó, sem aguentar totalmente o peso do serviçal se arrebentou o jogando no chão do outro lado, mas não antes de se mexer o suficiente para enfraquecer a base da colmeia de abelhas atrozes, a qual estava preso, e com isso fazer com que parte dela se deslocasse de modo violento o suficiente para que os bichos saíssem furiosos de dentro dela.

Huln e Syum, que ainda estavam discutindo, calaram-se ao ver as abelhas se aproximando e seu prisioneiro já há metros de distância deles. A elfa rapidamente deu um passo para trás xingando algo em sua língua natural e então começou a fazer uma sequencia curta de gestos rápidos com as mãos enquanto conjurava uma magia de fogo. O drow, surpreso com as abelhas gigantes, puxou o sabre da bainha e cobriu o rosto com um dos braços, ele sabia o quão dolorida podia ser a picada de um bicho daqueles.

Nipples se levantou do chão com os joelhos ralados então olhou para trás. O enxame de abelhas atrozes estava por todo aquele espaço, era até mesmo difícil enxergar claramente com os animais voando em sua frente. Syum tentou resolver esse problema ateando fogo nas abelhas com suas mãos flamejantes, que estavam assim devido à magia que havia evocado, e embora ela tenha matado várias delas, não matou todas.

— Volte para cá imediatamente! – gritou ela para a silhueta de Nipples do outro lado do declive. – Lembra o que eu disse sobre fugir? Se fizer isso agora vamos caçá-lo e eu garanto que não serei boazinha como tenho sido até aqui!

Cobrindo o rosto contra as abelhas o serviçal olhou para o longo caminho livre de drows que o aguardava e depois olhou para trás, onde estava a maior parte do enxame. Uma abelha voou em sua direção e o picou com seu grande ferrão em sua panturrilha.

A dor foi tão aguda e inesperada que fez com que Nipples tomasse sua decisão depressa. Ele tinha de escolher entre continuar com os drows e torcer para sobreviver quando descobrissem que ele não sabia abrir a caixinha de Dorothy ou encarar a floresta, fugindo dos elfos na esperança de reencontrar seus amigos.

Ele pensou em voltar para os drow, uma escolha sem riscos imediatos, até o momento dele ver Huln pegando a besta e mirando nele enquanto cochichava algo em subterrâneo com Syum. Ali ele notou a expressão vingativa no rosto do drow e imaginou que qualquer que fosse o rumo que ele escolhesse tomar, Huln provavelmente seria um inimigo que apareceria em seu caminho. Então Nipples olhou para o sol entre as folhas das árvores e disse baixinho "Obrigado!", se virando e saindo correndo logo em seguida.

— [Atire!] – gritou Syum furiosa enquanto tomava duas picadas de abelhas atrozes e se preparava para fazer a magia de fogo novamente.

Huln concordou com a cabeça e rapidamente mirou nas pernas de Nipples, pois eles ainda precisavam dele vivo, ele preparou o virote na besta e se não fosse uma abelha picando sua bochecha naquele exato momento, ele teria acertado o serviçal.

Correndo em grande desespero, Nipples viu pelo menos quatro virotes tentando atingi-lo, mas a floresta acabava por protegê-lo com seus terrenos irregulares e suas árvores distribuídas de forma aleatória. Algumas abelhas também o seguiram por um curto período de tempo, mas felizmente nenhuma conseguiu picá-lo novamente e por fim acabaram deixando-o ir embora.

Depois de cerca de quarenta minutos correndo, com breves pausas para respirar, Nipples estava completamente exausto, e notou que muito de seu cansaço se devia ao peso de sua grande mochila. Apesar de não estar sendo seguido naquele momento, ele decidiu se livrar dela, ao menos temporariamente, para poder correr mais, por isso procurou por um esconderijo onde pudesse deixá-la. Achou alguns troncos podres, mas todos pareciam sujos demais, então optou por guardá-la num grande arbusto que encontrara depois de uma boa caminhada.

Tirou de dentro da grande mala, a mochila de Solomon e de Charly e separou algumas roupas dos dois. Pegou também o mapa, a adaga que Dorothy o havia lhe dado, e um pouco de ração e água, além da mochila da paladina para carregar consigo. Pensou em levar os talheres, os pratos e os copos também, mas seu peso era o que mais afetava sua fuga, então os deixou para trás.

Com a mochila de Dorothy nas costas ele se aproximou do arbusto, erguendo sua própria mochila e a posicionando em cima da planta para esconde-la ali no meio, e foi aí que Nipples levou um susto. Um grande buraco se abriu no topo do arbusto e ele pode jurar ver pequenos dentes puxando a mochila para o dentro dele.

Nipples imediatamente largou a mochila e caiu assustado para trás, viu então o arbusto se mexer novamente, dessa vez mostrando dois tentáculos que saíram de dentro de si, que aparentavam muito serem cipós. Confuso e assustado, Nipples viu a criatura ficar ereta, revelando ser maior do que ele e mostrando sua agressividade ao tentar acertar o serviçal com um de seus dois tentáculos. Ele então se levantou rapidamente do chão e se pôs a correr novamente.

O monstro sem cabeça ou rosto começou a rastejar numa velocidade surpreendente alta para um arbusto e em alguns segundos disparou seus compridos tentáculos contra sua presa, enrolando as pernas do serviçal e levando-o ao chão em seguida enquanto ele era puxado para perto de seu fim. Nipples se debateu e tentou ao máximo se soltar enquanto gritava por ajuda, mas não tinha força o suficiente para se livrar do monstro planta.

“Oh, Pélor! Por favor, me ajude! Sei que não sou seu fiel mais importante, mas, por favor, envie um raio de luz para me proteger...” pediu em silêncio olhando para os poucos feixes de luz que atravessavam as copas dos pinheiros. Sentiu então uma forte claridade atingir seus olhos, algo quase divino, mas que não vinha de cima. Ele olhou para os lados e viu a luz amarelada refletida de um grande machado vindo em sua direção. Assustado, gritou e fechou os olhos com força, sentindo em seguida o impacto de o machado cortar algo e atingir o chão em seguida.

Ao abrir os olhos Nipples sentiu sua perna livre, ele não estava mais preso aos tentáculos do monstro. Ele olhou para o céu e agradeceu novamente à Pélor por ter sido poupado, então se levantou rapidamente e deu alguns passos para trás, vendo a luta violenta que ocorria entre a criatura e o homem que o salvara de uma terrível morte.

Depois de levar vários cortes do machado de cabo comprido e de ter um dos tentáculos decepado, a criatura arbustiva fugiu dali, deixando Nipples e o homem para trás. Foi quando o serviçal se aproximou do humano para agradecer.

Ele não era muito alto, tinha a pele clara com algumas sardas espalhadas. Seu rosto era levemente arredondado com uma barbicha de bode no meio do queixo. Suas feições tinham algo meio selvagem em si, embora ele parecesse estar sempre com um sorriso largo e amigável estampando sua face. Seu cabelo era curto, cacheado e ruivo, com duas entradas na frente e pequenas costeletas na lateral. Ele usava na orelha um brinco pequeno de argola e no corpo, uma regata cinza feita de uma malha muito usada junto de uma calça escura e botas curtas de couro. Seu corpo era forte, e os braços largos enquanto um de seus ombros era protegido por uma ombreira de couro cuja faixa que a segurava atravessava seu tronco de um lado a outro, mas ainda assim, com esse aspecto de combatente, ele carregava consigo uma pequena barriga saliente.

— Você está bem, pequeno homem? – perguntou ele sorrindo para Nipples, que se aproximava tímido e assustado. – Não precisa ficar com medo, não farei mal a você. – continuou, guardando o grande machado de uma só lâmina nas costas.

— Mu-muito obrigado por me salvar, senhor. Eu sou Nipples, o serviçal e ficarei feliz em retribuir o favor de algum modo. – falou abaixando sutilmente a cabeça em sinal de respeito, enquanto torcia em silêncio para que aquele homem não fosse uma má pessoa.

— Sou Vaalij Momeh. – disse ele mostrando seu largo sorriso. – E não precisa retribuir nada, foi apenas uma coincidência eu estar passando e ouvir você gritar. Deveria tomar cuidado ao andar por aqui, é uma floresta perigosa.

— Oh, meu senhor, acredito que estou descobrindo isso a cada minuto dentro dela... Oh, e eu quase me esqueci, eu devo continuar meu caminho agora! Estou sendo perseguido por dois drows terríveis!

— Drows? – perguntou Vaalij erguendo uma das sobrancelhas — Não precisa mais se preocupar com eles. Eles não virão para cá.

— Como pode ter certeza senhor Momeh? O senhor lutou contra eles também? – perguntou Nipples.

— Não exatamente. – respondeu – Mas eles não vêm para esse lado da floresta. Aqui é o chamado Bosque do Javali, e está fora do território deles.

— Oh, entendi. – disse juntando as mãos.

Apesar de curioso do porquê os drows não irem até ali, Nipples preferiu não comentar isso, estava mais interessado em saber se havia alguma cidade ali próxima. Ele sempre achara que o norte era totalmente abandonado, mas agora que encontrara outro humano, isso lhe dava esperanças de havia algum tipo de vila pela região.

— Senhor Momeh...

— Apenas Vaalij está bom. – falou o homem em tom simpático, enquanto olhava em volta.

— O senhor vive em alguma cidade por aqui? Eu acabei me perdendo dos meus senhores e seria muito proveitoso arranjar um lugar decente e seguro para dormir enquanto eu não os encontro.

— Não, eu moro sozinho. – disse em um tom soturno – Mas se quiser pode descansar essa noite em minha casa e sair para procura-los de manhã. – sorriu.

— Isso é muito gentil de sua parte senhor Vaalij... – disse Nipples hesitando em acompanhá-lo, afinal, não conhecia o homem e ele parecia ainda mais perigoso que os drows, mas no fim, resolveu segui-lo, do contrário teria de passar a noite na floresta e ele sabia que isso provavelmente não acabaria bem.

Os dois então caminharam pelo bosque rumo à casa de Vaalij, que ficava em meio a uma pequena clareira a cerca de uma hora dali. Nipples ficou a maior parte do caminho em silêncio, apesar de curioso achava rude ficar perguntando coisas pessoais à desconhecidos, então apenas respondeu quando Vaalij puxou conversa com ele, querendo descobrir mais coisas sobre o serviçal e o que ele fazia ali.

— Bem, eu sou de Theolen, da capital. E recentemente fui designado para acompanhar a senhorita Leon e sua pequena comitiva para uma missão aqui em Thorrun, mas infelizmente eu fui separado de meu grupo por dois drows no ultimo confronto que tivemos. Felizmente eu escapei deles com vida e aqui estou agora. – respondeu o serviçal.

— Esses drows estão ficando mais ousados. Por acaso sabe o que queriam com você? – perguntou o homem ruivo.

— Não posso afirmar com certeza, meu senhor. – falou Nipples, tentando ao máximo evitar o assunto da caixa.

— Hum... E quantos são em seu grupo exatamente?

— Comigo, cinco, meu senhor, por que a pergunta?

— Acha que virão até aqui te procurar? – perguntou agora sem o sorriso.

— Oh, isso não sei... Eu sou apenas o serviçal, mas eu tenho esperanças de reencontrá-los, sim. – respondeu Nipples, levemente desconfiado e temeroso com as perguntas.

— Certo, acho que posso te ajudar amanhã. Conheço boa área dessa floresta e sei como evitar as criaturas daqui, como aquele arbusto errante que você encontrou. – falou dando uma leve risada – Aquela é uma das piores plantas carnívoras que existem!

— Ah, seria ótimo evitar esse tipo de criatura! – exclamou Nipples.

Vaalij sorriu tranquilamente e acendeu um pequeno cachimbo de ervas enquanto eles seguiam sua caminhada até o que ele chamava de lar. A casa não era muito grande, feita toda de madeira e barro, muito semelhante às cabanas de lenhadores. Do lado de fora havia o que parecia uma ferraria primitiva e um pequeno celeiro.

— Sinta-se a vontade. – disse Vaalij – Só peço que se tiver alguma arma, não entre com ela em casa, deixe-a no celeiro.

— Sim, senhor. – respondeu Nipples, indo prontamente se desfazer da adaga que carregava consigo.

Depois de conhecer a casa, Vaalij deu a Nipples o que comer e lhe ofereceu um colchão para dormir. O serviçal aceitou alegremente toda a hospitalidade do homem e os dois conversaram por mais uma hora sobre aquela parte de Thorrun, local que Vaalij parecia há muito conhecer.

— Veja isso. – disse o homem pegando um grande livro de uma prateleira e colocando sobre a mesa de quatro lugares em que Nipples estava – Eu venho anotado nos últimos anos todos os animais que encontrei desde o Pântano há algumas horas ao norte até a Floresta da Ninfa. Me ajuda bastante a saber o que vou encontrar quando ando por aqui.

Nipples olhou para o livro, em sua capa de couro marrom a letra manuscrita em vermelho apresentava o título: “O Livro dos Monstros”. Ao abrir, se deparou com várias páginas escritas e desenhos de criaturas que ele nunca nem havia visto.

— Uau, é um grande trabalho, meu senhor. – disse impressionado.

— Obrigado. – agradeceu Vaalij, então olhou preocupado para a janela, vendo o sol se pondo. – Pode ler se quiser, vai ajudar você já que vai procurar por seus amigos amanhã.

— Sim, sim! – disse folheando até parar na página de um javali. – Hum... Há muitos desses por aqui, senhor Vaalij?

— Alguns. – respondeu.

— Oh, é por isso que o bosque leva o nome desse animal? – perguntou curioso.

— Não exatamente. É mais por ter um grande javali atroz por aqui.

— Uh, isso parece perigoso.

— E é, mas já estou acostumado. – respondeu se levantando da cadeira, deixando o sorriso que parecia permanente em seu rosto se esvair — Agora eu devo sair, vou... Caçar alguma coisa para comermos amanhã.

— Agora meu senhor? Não está tarde para isso?! E você não precisa se preocupar, eu tenho minha ração, posso comer dela e—

— Eu... Prefiro assim. É um passatempo. – disse rapidamente – Voltarei ao amanhecer. Aproveite para descansar e tranque bem as portas e janelas, há animais perigosos lá fora.

— Oh, muito bem, meu senhor. – concordou Nipples um tanto preocupado.

Vaalij então saiu da cabana deixando Nipples sozinho aquela noite. Sem muito que fazer, o serviçal logo começou a limpar a casa de seu anfitrião, como agradecimento por ele ter salvado sua vida e só foi terminar quando estava muito tarde.

Cansado Nipples arrumou seu colchão no meio da sala e se preparou para dormir. Já deitado ele viu com a iluminação da lua entrando pela janela as várias trancas da porta devidamente fechadas. Então quando estava prestes a fechar os olhos para finalmente descansar ele ouviu um som muito alto e assustador que fez seu coração disparar. Uma espécie de grunhido que ecoou pela noite no bosque. Ele pensou em sair da casa para ver, mas achou que seria muito perigoso, então apenas se levantou e olhou pela janela. De lá ele pode ver no topo de uma colina distante dali uma silhueta humanoide.

Curioso, foi até a lamparina sobre a mesa e a acendeu a colocando para fora da janela. A luz do fogo não o ajudou a enxergar muito melhor, mas a iluminação da lua cheia revelou a ele a silhueta de uma criatura assustadora.

Uma sombra de cerca de dois metros de altura, com pelos curtos e avermelhados de tronco levemente curvado, extremamente forte e musculoso. Suas pernas eram levemente curtas em comparação com o corpo e ele tinha cascos no lugar dos pés. Sua cabeça era grande com um comprido focinho suíno e poderosas presas que saiam de sua boca.

Nipples rapidamente fechou a janela e apagou a lamparina, olhando fixamente para o chão escuro. Ele voltou para o colchão amedrontado e se cobriu com a coberta até a boca. “Espero que aquele não seja o terrível javali desse bosque! Oh, se ele andar por aí nessa floresta, que os deuses protejam a senhorita Leon e todos os outros senhores se eles estiverem por aqui! E o senhor Vaalij! Ele deve tomar muito cuidado para não encontrar com...”, pensou, então parou por um instante lembrando-se de algo muito característico de seu anfitrião.

Nipples se levantou e foi até a janela novamente, mas dessa vez não levou a lamparina, apenas forçou sua vista por entre as frestas de madeira e olhou na direção da criatura. Ele observou distante e trêmulo enquanto via a luz branca da lua desenhar a silhueta do humanoide bípede. Seus pelos, suas presas, suas garras, tudo remetia Nipples a antigas lendas sobre homens que sob a luz da lua cheia se transformavam em bestas descontroladas e amaldiçoadas pelos deuses.

O serviçal observou a criatura atentamente e então a viu se virar em outra direção, com isso ele pode notar algo muito sutil que não havia reparado antes, um pequeno brilho em sua orelha, vindo do reflexo de uma argola de metal que ele havia somente notado em uma pessoa que conhecera ali: Vaalij Momeh.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E nós finalmente descobrimos o que aconteceu com o Nipples, mas e agora?
Comentem aí o que acharam do capítulo ^^