Amor à venda. escrita por Nina Olli


Capítulo 24
Capítulo 21


Notas iniciais do capítulo

Olá leitores! Me desculpem pela demora, mas esse fim de semana teve a cerimônia do Oscar e eu nem revisei o capítulo (não que eu tenha ido na festa do Oscar, mas fiquei no sofá assistindo mesmo hahahaha) fui corrigir o cap. só ontem e hoje cheguei em casa e já vim correndo postar! Ahhhh! Quero agradecer os comentários do cap. passado, batemos 100 comentários, vocês são incríveis! Eu não sou de pedir voto/indicação e quando isso acontece espontaneamente eu fico sem palavras! Pois é, Pola e Caroline, vocês deixaram essa escritora aqui sem palavras, só posso agradecer imensamente pelas recomendações LINDAS que vocês enviaram. Eu lia e relia toda hora, de tão feliz que fiquei. Isso me motiva demais, vocês não fazem ideia! Muito obrigada mesmo... Agora bora ler, meus amados!!! ;)



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"A vida só pode ser compreendida olhando-se para trás; mas só pode ser vivida olhando-se para frente". (Soren Kierkegaard)

— Será que eu consigo pular pela janela? — Gil perguntou enquanto olhava para fora, medindo mentalmente a altura.

— Nós estamos no terceiro andar. — Kerya reclamou e apoiou as mãos na cintura.

— Não parece tão perigoso. 

— Gilan Robert! — a irmã esbravejou. — Você não vai pular dessa janela usando um vestido de noiva. — e puxou a caçula pelo braço, a fazendo sentar-se de frente a imensa penteadeira da suíte. — Me deixe terminar a sua maquiagem. Não existe coisa mais deselegante do que uma noiva atrasada.

— E eu que pensava que era exatamente esse o charme dos casamentos. — Gil resmungou, cruzando os braços emburrada.

— Talvez. — Kerya prensou os lábios tentando não rir. — Desde que a noiva apareça no final.

Gil bufou contrariada e se esquivou dos toques da irmã. Andou até a direção da janela e admirou o grande jardim sendo enfeitado para a cerimônia que aconteceria em poucas horas. Precisava admitir, Elaine acertou em cheio quando insistiu que o casamento fosse feito no jardim de sua casa, tudo parecia tão lindo e impecável que Gil quase quis chorar.

Um altar havia sido improvisado no centro do jardim e um número razoável de cadeiras brancas foram simetricamente enfileiradas nas extremidades. Um caminhão acabara de estacionar em frente a residência descarregando diversos arranjos de flores.

Gil fechou os olhos e suspirou. Isso realmente está acontecendo. 

Daqui há poucas horas, ela e Vincent estariam em pé naquele pequeno altar, afirmando os seus votos na frente de todos os seus colegas, amigos e familiares.

— Algum problema, Gil? — Kerya tocou delicadamente o ombro da caçula, num gesto sincero de carinho.

Gil se virou e encarou os olhos preocupados da irmã, nem ela mesma tinha a resposta para aquela pergunta. Durante toda a semana, os seus sentimentos pareciam obedientes e sob controle, mas agora, tinha a impressão de que surtaria a qualquer momento. 

Por conta dos preparativos, trocou poucas palavras com o noivo e até mesmo havia tirado um dia de folga no intuito de descansar antes da cerimônia. E mesmo nos poucos encontros, o chefe a tratou com bastante cuidado, demonstrando um grande interesse sobre qualquer detalhe que tivesse relação com o casamento. 

Isso a deixou mais calma. E segura.

Gil começou a rodear o anel de noivado entre os dedos e lembrou-se das palavras do noivo. Vincent lhe disse o quanto se importava com ela, e nos últimos dias, mostrou que aquilo não era da boca pra fora. Sentia que Vincent gostava verdadeiramente dela, exatamente como havia confessado há tempos atrás, e Gil não poderia pedir por mais.

Exceto que ela queria mais.

Queria se casar por amor. Queria que Vincent a enxergasse além da garota de boas intenções, da funcionária dedicada, da assistente exemplar, da amiga tão fiel que era capaz até mesmo de acobertá-lo nessa grande farsa.

Amiga. Gil estremeceu. 

Jamais queria ser chamada assim por Vincent. Subiria naquele altar e cumpriria o combinado, dividindo com ele o mesmo teto, mas em nenhuma circunstância se tornaria a sua amiga. Seria doloroso demais considerar-se assim.

Quando o contrato acabasse, Gil humildemente se retiraria e procuraria por alguém capaz de lhe oferecer mais que uma cama vazia ao seu redor.

— Problema? Nenhum. — Gil murmurou em resposta à irmã, sentando-se novamente de frente a penteadeira, sem saber o que maquiar primeiro, as olheiras ou as suas mentiras.

xXx

Uma confusão de garçons e cozinheiros ocupavam a cozinha de Elaine e apesar de ser uma grande casa com cômodos espaçosos, Vincent jamais havia visto aquele lugar tão espremido como agora. 

Sua mãe usava um chique vestido de festa com um penteado típico de casamentos. Uma figura finíssima de se admirar, se não fosse pelos berros que saiam daquela boca pequena.

Nem em suas piores broncas na infância Vincent lembrava-se de tê-la visto tão brava. Ele se aproximou devagar e a cutucou com receio.

— O que foi? — Elaine rosnou de uma forma tão intimidadora que Vincent inconscientemente deu dois passos para trás.

Um homem pequeno entrou na cozinha e Elaine ignorou o filho, se virando para o funcionário.

— E o problema da refrigeração? — ela parecia aflita. — Vocês querem que eu sirva bebida quente para os convidados?

— Já estamos cuidando disso, Sra. Parker. — o pequeno homem respondeu com ares de profissional.

Vincent a tocou novamente, porém, uma moça loira vestindo o uniforme do buffet entrou na cozinha, o fazendo girar os olhos. 

— Sra. Parker, tivemos um pequeno acidente com as luzes do coreto. — a loira parecia um tanto apavorada.

— Oh não, mais essa… — Elaine colocou a mão na testa, limpando o suor. — Vamos até o jardim… E aproveitamos para checarmos a decoração da piscina.

Elaine se preparava para deixar a cozinha quando a voz de Vincent ecoou forte pelo cômodo.

— Elaine! — todos pararam os seus afazeres e encararam Vincent. — Eu preciso que a senho- -

— O que você está fazendo aqui, Vincent? — Elaine o interrompeu com o olhar incrédulo, o secando de cima a baixo. — E por que você não está pronto?

— Homens vestem um terno e uma gravata em menos de dez minutos, mãe. 

— Escuta aqui, seu irresponsável! — Elaine apontou o dedo no rosto do filho. — Você vai sumir das minhas vistas e se vestir imediatamente.

Mulheres ficam realmente assustadoras em casamentos.

Vincent a encarou boquiaberto e se apressou em deixar a cozinha antes que a mãe o ameaçasse com algum objeto pontiagudo. 

Antes de subir as escadas, avistou a movimentação no jardim e parou em frente a ampla janela da sala. Se distraiu observando alguns convidados se acomodando nas cadeiras, e com a música agradável que a banda tocava no intuito de relaxar o ambiente. 

E foi então que ele a viu.

Amelia se aproximou do jardim decorado e se misturou entre algumas cadeiras ao fundo. Vincent sabia que o certo seria subir aquelas escadas, ir até o quarto e se arrumar para a cerimônia, mas quando se deu conta, já estava no meio do caminho indo em direção à ex-namorada.

— O que você faz aqui, Amelia? — sua voz não soou nada agradável.

Amelia o olhou parecendo genuinamente surpresa. 

— Por que ainda está vestido assim? Pensando em desistir do casamento? — e sorriu com deboche.

Ele a segurou pelo braço e tentou se afastar discretamente, antes que algum convidado o reconhecesse.

— Eu pensei que tivesse deixado claro no nosso último encontro que eu não a queria por perto. — Vincent praticamente rosnou.

— A única coisa que você deixou claro foi que ainda está magoado comigo. — Amelia retrucou, fazendo Vincent bufar impaciente. — Eu precisava te ver.

— Você já me viu, agora pode ir. — Vincent zombou sem sequer encará-la nos olhos. Ele estava mais preocupado em olhar ao redor e evitar que fossem surpreendidos.

— Venha comigo. — ela suplicou.

Vincent arregalou os olhos e a fitou finalmente. Todo o seu corpo se contorceu com as possibilidades daquele pedido.

— Não seja inconveniente, Amelia. — ele disse simplesmente.

— Eu darei todas as respostas que você quiser, eu direi tudo o que você quiser saber. — Amelia estendeu a sua mão. — É só você vir comigo.

Vincent desviou dos olhos âmbar de Amelia e imediatamente encarou a janela do terceiro andar. Gilan estava lá. A jovem, nesse momento, se arrumava para subir naquele pequeno altar improvisado, disposta a se casar com um homem por quem não sentia nada apenas para ajudá-lo a realizar o sonho de sua mãe.

"Existem coisas que vão muito além de um pedaço de papel". 

Vincent compreendia cada uma daquelas palavras agora. Não era apenas um contrato que o impedia de deixar aquela encenação para trás. Era Gilan.

Ele não poderia magoá-la. Nunca. Ele não poderia deixá-la esperando. Por nada e por ninguém. 

E muito menos, por Amelia.

Só percebeu que o seu silêncio foi longo demais quando uma voz  familiar os interrompeu.

— Vincent não irá a lugar algum, Amelia. — a voz do produtor soava calma, mas as suas feições diziam exatamente o contrário.

— Agradeço a preocupação, Matthew, mas eu não preciso de ninguém me dizendo o que fazer. — Vincent retrucou, e um leve sorriso surgiu nos lábios de Amelia. — E eu sugiro que você se retire, Srta. White, ou serei obrigado a pedir que te acompanhem até a saída.

— Você não seria capaz de me expulsar daqui. — ela afirmou, seu sorriso desaparecendo.

— Eu me casarei daqui há poucos minutos, Amelia. — Vincent a lembrou. — Acredite, eu seria capaz.

A líder de equipe lançou um olhar de soslaio para Matthew, e em seguida, empinou o rosto se afastando devagar dos dois homens, sem sequer dar-se ao trabalho de se despedir.

— Você não parecia alguém prestes a expulsá-la. — o produtor provocou.

—  E você não sabe uma merda da minha vida, Matthew. — Vincent retrucou entredentes.

— Eu sei apenas o que vejo, — Matthew o analisou. — e o que eu acabei de ver foi um homem tentado a abandonar a noiva no altar.

— Está vendo o que intimamente deseja, Matthew. — Vincent riu sem humor. — Quer o caminho livre para ir atrás da minha noiva.

— Seria maravilhoso se Gil simplesmente desistisse desse casamento. — o produtor admitiu. — Mas eu jamais desejaria o sofrimento dela para suprir uma necessidade minha.

As palavras de Matthew o atingiram nos lugares certos. 

Estava há poucos minutos de forçar uma jovem alegre, gentil e cheia de possibilidades, a se casar com ele. E mesmo que se enganasse, dizendo que fizera também para o bem das irmãs Robert, Vincent sabia que a verdade era muito mais egoísta do que isso.

Queria uma esposa sem todo aquele drama emocional. E jamais se preocupou verdadeiramente no quanto poderia machucar outras pessoas.

— Eu jamais abandonaria a Gilan.

— Repita isso o quanto quiser, Vincent. — Matthew soltou um suspiro exausto. — Eu não estou numa posição em que possa te julgar.

— O que você está insinuando? — Vincent se aproximou perigosamente do produtor.

— Eu estou dizendo que se Gil me quisesse, seríamos eu e ela fugindo daqui. — Matthew praticamente cuspiu as palavras.

Vincent sentiu a sua garganta arder e suas mãos trêmulas agarraram o colarinho do produtor.

— Como se atreve a me dizer isso? — Vincent rosnou mais alto do que deveria. 

— Pelo menos eu não tenho medo de assumir o que realmente sinto. — Matthew retrucou enquanto empurrava o líder de equipe, se livrando de suas mãos.

Vincent encarava o produtor com um misto de incredulidade e confusão.

— Eu estou apaixonado pela Gil. — Matthew bateu forte no peito. — Pelo menos eu consigo dizer isso em voz alta.

xXx

Gil gostaria de afirmar que aquela cerimônia simples e feita às pressas não era nada parecida com aquilo que um dia sonhara. 

Mas quando pisou no jardim e olhou ao seu redor, sabia que não era verdade. Começou a caminhar pela pequena estrada de pétalas brancas, se esforçando para não derramar nenhuma lágrima. Podia não ser o casamento mais deslumbrante do mundo, e tampouco o noivo mais apaixonado a esperando no altar, mas ver os olhos de Elaine e Kerya, tão felizes e emocionadas, aquecia o seu coração a cada passo.

Gil evitou o olhar de Vincent durante todo o trajeto até o altar, mas sentia o noivo a fitando desde o momento em que surgiu com o seu simplório vestido branco de poucos detalhes. Suas mãos tremiam enquanto segurava um charmoso buquê de lírios azuis, e só se acalmaram quando finalmente chegou até o noivo.

E lá estava ele.

Vincent era a visão que qualquer mulher sonharia encontrar. Ele simplesmente preenchia o lugar com a sua presença. Traços firmes e expressivos, no qual um sorriso se formava. E olhos que faiscavam em seu rosto, sem perder nenhum detalhe do que acontecia, a deixando até mesmo um pouco desorientada.

Gil se aproximou do noivo e ele a segurou, entrelaçando delicadamente os seus dedos. O juiz começou um discurso sobre a importância de preservar a lealdade e o comprometimento numa relação e Gil até escutaria aqueles conselhos de bom grado, se não fosse pelo fato de Vincent não tirar os olhos de cima dela.

— A cerimônia é ali na frente. — ela sussurrou provocativa.

— A culpa é sua por estar tão bonita. — ele retrucou ainda mais baixo, fazendo Gil rir discretamente. Vincent sabia ser amável quando se propunha.

Depois do que pareceu uma eternidade, o que, com certeza, não era verdade, o juiz terminou o falatório. Gil e Vincent trocaram as suas alianças recitando os famosos votos matrimoniais, com algumas adaptações, e tudo parecia muito bonito e verdadeiro… Até o juiz finalmente soltar aquela frase. 

— Por agora, pelos poderes que me são concedidos pela lei, eu os declaro marido e mulher… Pode beijar a noiva.

Como esquecer desse detalhe tão insignificante nos casamentos. 

O beijo. 

Deveria haver um beijo. E ela poderia apenas encostar o seu lábio no dele, sem sequer abrir a boca. Não seria uma má ideia. Ou quem sabe, o noivo poderia beijá-la respeitosamente na testa. 

Seria singelo e bonito, inclusive.

As mãos de Vincent envolveram a sua cintura, fazendo com que os seus pensamentos se dissipassem. Sua pele tocou suavemente o tecido do terno dele, transformando aquele contato em calor instantâneo. Apenas se aproximar de Vincent já fazia o seu corpo todo reagir. Ela ainda mantinha os seus olhos assustadoramente abertos enquanto o noivo ia em direção a sua boca. Cerrou os cílios e esperou que Vincent agisse da maneira que fosse mais conveniente. 

Gil esperava por um pequeno e casto beijo nos lábios, um estalo suave em sua testa, ou até mesmo, um beijo amigável na bochecha.

Mas jamais poderia imaginar que Vincent morderia o seu lábio inferior e o sugaria em seguida. Jamais poderia imaginar que ele tomaria a sua boca num beijo lento para depois provocá-la com a língua. Muito menos poderia imaginar que ele agarraria a sua cintura e a apertaria contra o seu corpo, forçando-a a ficar na ponta dos pés, sem se importar com todas aquelas testemunhas.

Vincent soltou um gemido quase inaudível contra a boca de Gil e percorreu os dedos por toda a sua coluna até alcançar a sua nuca, deixando-a acesa e arrepiada. Ao fundo, os convidados comemoravam com assobios e muitas palmas, e Gil pode ouvir Oliver gritar “Arrumem um quarto”, arrancando algumas risadas.

Por quanto tempo ficaram se beijando? Dez, vinte, trinta segundos? Já parecia durar horas, e mesmo assim, quando Vincent finalmente a soltou, Gil quase lamentou em voz alta. 

Os noivos se posicionaram a fim de cumprimentar os amigos e parentes, e Gil parecia ter ativado o seu piloto automático, porque qualquer coisa que tenha acontecido após aquele beijo, ela mal conseguia se lembrar.

A única coisa que a sua mente repetia, era o quão complicada a sua vida se tornaria agora que finalmente dissera sim para Vincent.

xXx

O jantar havia sido tão agradável quanto a cerimônia, e havia agora apenas alguns colegas que conversavam animadamente com Vincent. Gil sentiu um frio na barriga crescer furiosamente dentro de si, sabia que logo os recém-casados deveriam se retirar e nem se aquilo fosse um casamento de verdade ela estaria tão ansiosa.

Elaine e Kerya riam sem parar e pareciam muito à vontade uma com a outra. Era uma cena tão terna e perfeita que Gil quase se esqueceu dos verdadeiros motivos daquela noite. Pegou mais uma taça de champanhe e bebeu de uma vez, e em seguida, bebeu mais um pouco, tentando desesperadamente não pensar em toda a culpa que sentia. Não demorou muito para que o seu o noivo, agora marido, colocasse as mãos em seus ombros e a puxasse discretamente para um canto.

— Nós temos que ir. — ele murmurou, com a voz rouca e arrastada. — A noite de núpcias, as pessoas esperam que nós… Você sabe.

Gil assentiu segurando o riso, nunca tinha visto Vincent  vermelho e uma vontade incontrolável de abraçá-lo simplesmente lhe ocorreu. E ela o fez. Não sabia se era culpa do alto teor alcoólico em suas veias, mas Gil apenas o puxou para perto e o abraçou.

— Então, me leve daqui. — sua risada escapou alta demais e ela fungou contra o pescoço do chefe.

— Terei que carregá-la novamente? — Vincent devolveu o abraço se embrenhando entre os cabelos de Gil.

— Não seria uma má ideia. — ela soluçou sem jeito. — Eu mal consigo me mexer.

— Segure firme. — Vincent se inclinou envolvendo os seus braços na parte de trás dos joelhos de Gil, a erguendo de uma vez só, naquela posição típica de noivos carregando as suas esposas.

— Acho que os noivos estão planejando uma fuga. — Kerya apontou para eles, fazendo com que Gil escondesse o seu rosto envergonhado contra o tórax de Vincent.

— Se os senhores nos permitem, — Vincent ergueu a voz chamando a atenção de todos. — eu e a Sra. Gilan Parker precisamos ir.

Gilan Parker.

Gilan Parker.

Gilan Parker.

Gil quase engasgou contra o corpo de Vincent quando escutou aquelas palavras. Fazia poucas horas que havia assinado o sobrenome de Vincent no livro matrimonial e ainda não tivera tempo suficiente de se acostumar.  

Quanto mais ouvir alguém chamá-la assim.

E Deus, como esse sobrenome soava atraente nos lábios de Vincent. Não deveria ter exagerado na bebida, pois agora tudo o que a sua mente conseguia pensar era na imagem de Vincent a jogando em sua cama e consumando aquele maldito casamento. Esfregou o seu nariz no colarinho do chefe e respirou aquele perfume como se fosse a sua última lufada de ar.

Nunca, em toda a sua vida, havia sentido tanto desejo com o cheiro de alguém. A necessidade de tocá-lo a consumia de tal maneira que chegava a doer. 

Parecia doente, entorpecida, parecia... Completamente bêbada, é claro.

— Estou completamente bêbada. — Gil precisou dizer. O que desencadeou uma crise de riso.

Gil ria tanto que começou a tremelicar no colo de Vincent fazendo com que o pobre homem quase se desequilibrasse e levasse os dois ao chão.

— Você irá nos derrubar. — ele reclamou tentando soar severo, mas o seu tom divertido o entregou.

Ela tomou impulso e saltou do colo de Vincent. Se encostou no capô do carro e espalmou a sua mão no abdômen, enquanto tentava controlar as gargalhadas que pareciam ainda mais intensas. 

Lágrimas de riso saíam do canto de seus olhos e Vincent apenas a observava.

— Deus, como eu amo você! — Vincent disse entre risadas, fazendo com que Gil parasse de sorrir imediatamente. Ela o olhava totalmente paralisada. 

— Como eu amo você bêbada, — ele corrigiu. — eu quis dizer que é muito engraçado te ver assim. — Vincent explicou sem a encarar nos olhos e correu para abrir a porta do passageiro.

Um silêncio arrasador se instalou no carro durante o trajeto até o apartamento de Vincent. Gil já se sentia bastante sóbria, incrível como um bom susto é capaz de curar qualquer bebedeira.

Vincent dirigiu até a entrada de um prédio com uma arquitetura impressionante. Era engraçado, e intimidador, pensar que aquela seria a primeira vez em um lugar que se tornaria a sua casa por tempo indeterminado.

Assim que entraram no elevador, Vincent girou uma chave no painel que os levou diretamente ao seu andar. A porta se abriu num hall que conectava com a sua imensa sala.

Coisa. De. Rico.

Gil vasculhou o lugar com o olhar. Os móveis eram de tons escuros com um design moderno e sofisticado. Havia um número considerável de obras de arte penduradas na parede, dando um tom menos sério ao ambiente.

Era um contraste do clássico com o contemporâneo e de muito bom gosto, Gil concluiu. Uma escada indicava que o apartamento era ainda maior do que ela conseguia espiar. Lançou uma expressão incrédula para o chefe, era simplesmente magnífico.

— Gostou? — Vincent sequer disfarçou o sorriso petulante.

— É bem bonito. — Gil tentou parecer menos boquiaberta do que de fato estava.

— O seu quarto fica lá em cima. Do lado do meu. — ele explicou, enquanto pendurava o casaco em um cabide ao lado da porta. — Você deve estar com fome, não te vi comer muito na festa.

Gil seguiu o chefe até a cozinha e não poderia esperar menos.

Era espaçosa, bem equipada, e com um balcão ilha no centro. Ela imediatamente pensou em como Kerya ficaria animada em cozinhar naquele fogão cheio de bocas. Vincent abriu a geladeira e começou a colocar alguns aperitivos em cima do balcão e Gil quase chorou de emoção quando percebeu que se tratavam de itens que ela simplesmente adorava.

Ricota com ervas, pasta de ervilha e o mais inacreditável, torta de pecã. A sua sobremesa favorita de todos os tempos. Ele abriu um dos armários e pegou alguns bagels integrais e baguettes francesas. 

Ela o olhou surpresa, esses também eram os seus prediletos. Gil quis perguntar como Vincent soubera exatamente o que comprar, mas preferiu apenas deixar o assunto para um outro momento.

— Vou abrir um vinho. — Vincent informou. — Mas não se preocupe, eu comprei Coca-Cola pra você. — e ele piscou.

Gil não controlou um sorriso. Isso tudo era tão… Atencioso. 

Tinha tanto receio de estar sozinha na presença do chefe, que talvez tivesse subestimado a capacidade dele em ser um bom anfitrião. Comeram sem pressa e sem estender muito os assuntos. Já era madrugada e o cansaço pairava entre eles. As suas costas começaram a latejar por conta de toda a tensão do dia e Gil estalou o pescoço procurando uma forma de se espreguiçar.

— Acredito que queira tomar um banho, certo? — Vincent perguntou. — Você parece cansada.

— Um pouco. — Gil se levantou e colocou os pratos na pia. — Casamentos são mais cansativos do que eu imaginava.

— Deixe que eu limpo depois. — ele pediu. — Venha. Mostrarei o seu quarto.

Subiram a escada que dava acesso ao segundo andar e caminharam por um extenso corredor. Vincent abriu uma das portas revelando o quarto de Gil.

O cômodo era espaçoso, como ela imaginava, e continha poucos móveis. Um grande armário branco, uma mesa de cabeceira e uma penteadeira equipada com um espelho iluminado. A cama king size no centro do quarto, estava arrumada com uma delicada colcha florida. Gil sorriu satisfeita com a decoração simples e minimalista.

— Você pode mudar a decoração se quiser. — Vincent comentou, parecendo um tanto sem jeito.

— Eu adorei. — ela respondeu sincera.

Vincent apenas assentiu e a deixou sozinha para que pudesse desfazer a sua mala. Quando Gil se dirigiu até o banheiro da suíte, teve uma grande surpresa. Se deparou com diversos produtos das marcas em que ela costumava usar. 

Shampoo, cremes, colônias e até mesmo a pasta de dente.

Tudo parecia uma cópia exata do que ela possuía em seu antigo banheiro. Ok. Seria coincidência demais que Vincent comprasse justamente esse itens. Definitivamente, ele andou pesquisando.

Gil tomou o seu banho e foi até uma de suas malas, procurando por algum pijama entre as suas coisas. 

Rendas. Camisolas. Lingeries. Babydolls. Ela revirou os olhos.

Muito obrigada por isso, Kerya. Por sorte, havia levado as suas calças de flanela que tanto adorava e a vestiu junto com uma camiseta velha de banda, calçou uma de suas inúmeras pantufas, a com formato de cachorrinho, e saiu do quarto.

Desceu as escadas devagar, ainda com receio de transitar sozinha pelo apartamento, e logo avistou Vincent lavando os pratos que usaram mais cedo.

Gil sentiu um solavanco no estômago quando percebeu o quanto o chefe parecia à vontade. Aquela era uma visão completamente inédita para ela. Os cabelos de Vincent ainda estavam úmidos e bagunçados, e isso lhe dava um ar muito mais jovem do que aquele topete impecável de todos os dias. Uma calça de moletom caia em seus quadris ressaltando os músculos de suas coxas e de sua bunda. 

Gil subiu os olhos até as costas marcadas por uma fina regata branca e os braços livres e torneados.

Deveria ter vestido a porcaria de um babydoll. 

Soltou um suspiro um pouco mais alto do que deveria, fazendo com que Vincent notasse a sua presença.

— Você gostou do- — ele se virou, travando a voz no meio da frase assim que a viu. Vincent a encarou dos pés a cabeça de uma maneira estranha. — Do seu banheiro?

— Muito. — ela murmurou, ainda tímida com o olhar insistente do chefe.

E então, sem mais nem menos, Vincent soltou uma gargalhada.

— Isso é uma pantufa de cachorrinho? — ele começou a rir ainda mais. 

— É muito confortável se te interessa saber. — ela cruzou os braços fingindo estar ofendida, mas logo soltou uma gargalhada também. Tinha consciência do próprio ridículo, afinal. — Kerya arrumou a minha mala e só tinha, bem, roupas para uma noite de núpcias.

— Camisolas transparentes e essas coisas? — Vincent perguntou erguendo uma das sobrancelhas.

— Exato. — Gil sentiu o seu rosto arder. — Não achei apropriado.

— Não subestime o poder de um par de pantufas, Gilan. — o chefe brincou, enquanto os seus olhos a secavam novamente.

E Gil precisou se segurar para não ceder a vontade de se aproximar dele e tocar o seu abdômen, que se agarrava indecentemente na fina regata branca. Deus! Ela mal conseguia olhá-lo. Isso só podia ser um efeito tardio de todo o champanhe que bebera. Começou a sentir um calor desproporcional e algumas gotículas de suor se formaram em sua testa. 

— Eu estou um pouco intrigada. — Gil procurou desesperadamente qualquer assunto que a distraísse. — No meu banheiro tinha todos os produtos que eu costumo usar, e toda aquela comida, elas realmente são as minhas favoritas.

— Eu sei. — Vincent respondeu sem demonstrar muita emoção, voltando a sua atenção para a louça na pia. — Eu tive uma conversa com a sua irmã.

— Estou impressionada. — Gil o encarava curiosa.

— Nós almoçamos juntos, duas ou três vezes durante a semana. — Vincent revelou. — Eu queria deixar o ambiente um pouco mais confortável para você. — ele começou a guardar a louça, fazendo um barulho um tanto desnecessário. — Sei que não será fácil ficar longe da sua irmã, ainda mais tendo que conviver com um estranho. — ele murmurou ainda de costas para ela. — Gostaria que se sentisse à vontade.

— Obrigada. — Gil murmurou de volta, a sua voz emocionada. — Muito obrigada, de verdade.

Vincent se virou imediatamente e a fitou com os seus olhos escuros e brilhantes.

— Eu sou a única pessoa que deve agradecer. 

Novamente, um silêncio denso pairou entre eles. Vincent exalava um cheiro de colônia pós-barba e seu sabonete caro. Gil prendeu o seu olhar nos braços dele, que permaneciam apoiados no balcão, acentuando ainda mais os traços de seus músculos.

Num ato involuntário, ela passou a língua pelo seu lábio inferior e quando subiu o olhar, flagrou Vincent encarando atentamente a sua boca.

As respirações se tornaram mais altas e ecoavam por todo o cômodo da cozinha. E por um milésimo de segundo, teve a impressão de que Vincent realmente se inclinara um pouco mais em sua direção. Mas o som estridente do telefone dissipou o momento.

Vincent andou até à sala e Gil o seguiu. — Quem ligaria numa noite de núpcias? — ele franziu a testa. — Alô? Ronnie? Quanto tempo. — Vincent atendeu o telefone e Gil se focou na conversa. — Aconteceu alguma coisa? — e então, a expressão dele se tornou sombria. — E como ela está? E em qual hospital? Sim, eu sei.

As mãos de Gil começaram a tremer. Hospital? Quem estava no hospital.? Elaine? Se aproximou ainda mais do chefe, na intenção de escutar a voz do outro lado da linha.

— Eu já retorno a sua ligação, Ronnie. Até mais. — Vincent desligou o telefone e Gil imediatamente se alterou.

— Aconteceu alguma coisa com Elaine? Ela está bem? — perguntou aflita.

— Calma. Minha mãe está bem. Não é nada com Elaine. — Vincent apertou os ombros de Gil. — Era a mãe de Amelia.

— O que houve? — Gil não conseguia parar de tremer. 

— Amelia misturou alguns medicamentos com bebidas. — ele andou pela sala e se sentou no sofá, apoiando os cotovelos em seus joelhos e abaixando a sua cabeça. — Ela está inconsciente. Não sabem ainda a gravidade e nem se Amelia acordará.

Gil sentou-se ao lado do chefe e pousou os seus dedos delicadamente no antebraço dele.

— E você está bem?

— Eu preciso vê-la.

— Entendo. — Gil assentiu. — Então, vá.

— Você não ficará ofendida se eu for? — o chefe a questionou.

— Não acho que você precise da minha aprovação, Vincent.

— E se eu precisasse? Você me daria? — ele retrucou.

Gil desviou o olhar, sabia que o chefe procurava algo em sua expressão, mas ela não queria demonstrar nada. Não queria que qualquer sinal de chateação ou sentimento oscilante pudesse expô-la.

— Você não tem que se justificar para mim. — Gil se levantou do sofá e seguiu em direção às escadas. — Apenas vá.

Enquanto subia as escadas escutou o chefe colocar o casaco, pegar as chaves do carro e entrar no elevador. Gil sentou-se em um dos degraus e encarou o imenso apartamento.

Aquela era só a sua primeira noite ali, mas teve a impressão de que não seria a última que passaria sozinha.

 


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Notas finais do capítulo

Até semana que vem... o/