A caminho de casa escrita por Liah


Capítulo 5
Memórias




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Edward

Eu queria arrancar a cabeça daquele filho da puta. A ideia era apenas mandá-lo tirar as mãos da minha mulher, mas o que saiu foi um rosnado que premeditava desmembramento em massa. Mal comecei a me mexer quando dois pares de mãos se colocaram em meu peito me restringindo. Jasper e Emmett, é claro.

– Filho, se acalme. Estamos entre amigos. Dylan faz parte da família agora, e você não quer começar uma guerra. - Era Carlisle, e eu senti uma onda de calma passar por meu corpo.

– Pare com isto, Jasper!

– Acalme-se! Você fez suas escolhas, e Bella fez as dela.

Tudo isso foi sibilado tão baixo que não sei se mais alguém na sala ouviu, mas, para mim, as palavras de Jasper foram gritadas.

Porque ele tinha toda razão. Bella podia muito bem ter feito outras escolhas. Os sentimentos que ela nutria por mim, sentimentos esses que eu fiz questão de esmagar, eram todos humanos. O meu amor por ela nasceu em minha forma vampira e era imutável, mas ela não sabia disso. Eu a fiz acreditar diferente. De repente o ciúmes que havia me acometido há alguns segundos, foi substituído por raiva. Raiva de mim mesmo. Eu magoei a mulher que amo e deixei o tempo passar, com a desculpa de fazer o que era melhor pra ela, esqueci de pensar nas mudanças que invariavelmente aconteceriam, corri o risco de outro alguém aparecer e agora podia ser tarde demais.

Bella entrou na sala e parou aturdida, seus olhos se arregalaram minimamente e então voltaram ao normal. Eu queria me chutar por ainda não conseguir ouvir o que estava pensando. E agora nada podia fazer para suprimir minha curiosidade anterior, seus olhos cor de chocolate tão profundos que me mostravam sua alma, eram de um vermelho frio. Seu coração irrefreado que por tanto tempo guiou cada passo meu, estava parado, imutável, não havia som. Suas bochechas sempre tingidas por um rubor que me era tão familiar, estavam pálidas. Nem mesmo com a mania de prender os lábios entre os dentes ou os cílios batendo freneticamente enquanto ela piscava pra tentar colocar um pouco de lucidez em sua mente eu podia contar. Bella não esboçava reação. Estava tão imóvel que mais parecia uma estátua a ser adorada em seu esplendor e beleza.

Em um átimo estava em sua frente, deixando que seu cheiro invadisse as minhas narinas e preenchesse todo o meu ser. Ah, como seria fácil agora conviver com ela, uma vez que não havia quaisquer outros desejos em mim que o de um homem por uma mulher. Precisei tocá-la, saber se ela era real. Minha memória perfeita me lembrava de uma Bella tão diferente dessa que via agora. Será que ela ainda era quente?

Levantei minha mão e a toquei, delicadamente, quase como o roçar de uma pétala, como fiz na primeira vez que me permiti tocá-la em frente a aula de educação física. Sua pele não tinha mais aquele calor humano, mas de alguma forma eu me senti incendiar. Nossas temperaturas estavam equilibradas e era tão natural pra mim. Bella finalmente parecia feita para mim. Mas continuava tão imóvel. Eu me lembro como, na primeira vez em que fiz isso e, na verdade, em muitas vezes depois, ela recostou a cabeça em minha mão e fechou os olhos, se deixando levar pelo meu toque. Com tristeza entendi que naquela época, mesmo indo contra toda razão, Bella confiava em mim. Agora éramos dois estranhos, Bella é uma recém nascida, com os instintos de preservação aguçados e ela nunca havia me visto em sua forma vampira. Eu precisava acalmá-la.

– Bella, amor, ta tudo bem. Você está segura. Eu estou aqui. - A intenção era confortá-la, mas Bella se afastou. Ainda fria, ainda impassiva. Meu toque não é mais bem vindo.

– Oh, acho que está na hora de parar com isso não é Edward? - Ela riu, uma risada musical, desconhecida até então. Antes eu conhecia cada um de seus sorrisos, mas agora não fazia ideia do que essa risada queria dizer. Quanto mais dela eu havia perdido? - Eu estou bem, não preciso mais de um herói.

Não precisa mais de mim.

– Olá Cullens, é bom vê-los - fez uma pausa olhando ao redor da sala e parando em Rosalie e Alice, e seu olhar era qualquer coisa, menos caloroso. - Todos vocês.

Mas que merda, quantas vezes um homem poderia ser atacado pelo ciumes e ainda assim resistir? Dylan entrou na sala e capturou sua atenção imediatamente.

– Hey tartaruga. Achei que íamos chegar aqui hoje.

– Tartaruga é? Você vai ver só.

Ele a atacou e Bella se esquivou e saiu correndo, rindo. Eu assisti aquela cena, que mais parecia a cena de um romance Hollywoodiano, e dessa vez não foi ciumes que senti. Foi pesar. O que via era a cena de duas pessoas apaixonadas. Bella havia mesmo feito outra escolha afinal.

E meu castigo seria ver a mulher que amo compartilhar a eternidade com outro homem.

Bella

Corri uma distância inimaginável e subi na árvore mais alta que encontrei até o topo. Quantas vezes não fiz um caminho parecido nas costas de Edward? Edward! Ele estava ali. Ainda disposto a me resgatar. Diabos, achei mesmo que seria indiferente a ele. Mas ao vê-lo ali, parado, tão lindo. Tão mais lindo que nas minhas memórias falhas. Faz meses desde a última vez que vi Edward, e sei que, mesmo quando tudo o que tinha eram minhas patéticas tentativas de mantê-lo vivo na minha cabeça e não perder nenhum de seus traço, ele ainda é mais bonito ao vivo. E agora que minha visão é perfeita... Como é possível resistir a alguém tão lindo? Mais parecido com um anjo do que com o demônio que sempre afirmou ser. E então ele me tocou. Tão suave, tão gentil. Agradeci mentalmente por ele, aparentemente, ainda não poder ler meus pensamentos e por minha imortalidade ter tendencia à imobilidade. Como humana, jamais poderia disfarçar o quanto estava abalada por sua presença. Mas como vampira era só me manter imóvel.

Dylan finalmente me alcançou e se pôs ao meu lado.

– Olha como é linda essa paisagem... - A paisagem era realmente linda em sua mistura de verde e branco, mas eu mal a estava registrando. Apenas queria que Dylan ficasse em silêncio. Sim, a imobilidade era algo natural para os vampiros, mesmo para Dylan. Quando se tem a eternidade pela frente, não há problema algum em perder horas, ou dias, apenas vendo a paisagem. Eu precisava daquela quietude pra por os meus pensamentos em ordem. Usei a chegada de Dylan e um desafio que sabia que ele não ia recusar pra poder fugir dali o mais rápido possível. Não sei por quanto tempo teria aguentado minha máscara de frieza sem desmoronar.

Eu estava quase me entregando à calidez de seu toque quando ele me chamou de amor e eu acordei pra vida. Não! Edward estava apenas sendo muito nobre, como sempre. Provavelmente ainda não está ciente do meu auto controle e acha que minha adaptação à essa nova vida é muito mais difícil do que é realmente. Sua aparição aqui se deve somente a uma visita familiar para suas primas, e, ao me ver, deve ter sido levado pela onda de proteção que sempre teve comigo. Sim, era isso. E eu não podia mais deixar isso acontecer. Já era muito difícil encarar meus sentimentos sem ele sendo o perfeito cavalheiro que é, e eu preciso remover o senso de responsabilidade que ele tem por mim. Ou me tornaria um fardo para ele, e ele uma tormenta para mim.

Suspirando voltei ao presente, terei que passar os próximos dias fazendo Edward acreditar que está livre de mim, que podemos ser amigos. Família até. Eu jamais o perturbarei novamente. Eu entendi meses atrás que não sou boa para ele, e ele precisa saber que estou conformada com esse fato. Mais do que isso, que estou feliz. E então ele poderá viver em paz, e eu também. Eu acho. Talvez se eu repetisse muito isso pra mim mesma, em algum momento, me convenceria.

Dylan me olhava.

– A presença dos Cullens deve ser perturbadora pra você...

– O quê? Não! Claro que não - respondi num tom de quem não se importa, o que não condizia em nada com a realidade. Eu estou muito mais que perturbada. Com todos eles. Representam tantos sonhos partidos, a família que pensei que faria parte, minha melhor amiga que me abandonou sem olhar pra trás, meu primeiro amor perdido... - Não, é apenas estranho vê-los sob a perspectiva da minha vida atual. - Vendo que Dylan não ia desistir, resolvi usar a melhor manobra de defesa. Ataque! - Dylan, você nunca me contou sua história. Quantos anos tem?

– 22. Ou melhor, essa era a idade que tinha quando fui transformado, há três anos.

– Onde você vivia?

– Em Wichita, no Kansas.

– É impressão ou está sendo propositalmente evasivo? - Ele deu uma risada cansada.

– Sempre tão observadora... - resmungou mais para si mesmo - Acho que me envergonho um pouco em falar sobre o meu passado com alguém como você.

– Alguém como eu?

– Sim, alguém perfeito.

– Oh, não seja bobo, eu não sou perfeita.

– Tudo bem então, alguém que mesmo devendo ser uma vampira louca e sádica, decide não se tornar um monstro pra não desonrar a memória do pai. Alguém que se muda de cidade para não se tornar um peso para a mãe, e depois decide se mudar de novo para não ser um peso para os amigos. Alguém que convive com vampiros e os ama, mesmo tendo que arriscar a vida pra isso e insiste na alma que nem eles acreditam que têm e se recusa a enxergar a quantidade de maldade neles. Você passou a vida toda colocando outros na frente Bella, sendo boa. Genuinamente boa.

De repente eu me senti mal. Essa é a impressão que passo? A de uma santa?

– Não é bem assim Dylan. Eu tenho muitos defeitos.

– Me diz um então.

– Eu penso mal das pessoas. O tempo todo. - Falei em tom de piada.

– Há! Realmente, acho que você vai pro inferno. Não Bella, é sério, você é tão diferente de mim.

Ah não, mais um auto averso pra eu lidar. Esperei. Ele precisava falar, eu simplesmente sabia que sim. E, suspirando, ele finalmente começou.

– Eu fui um garoto bastante problemático Bella. Meus pais morreram quando eu mal tinha quatro anos, e eu fui parar em um orfanato. Arrumei mais brigas do que posso contar. A vida naquele lugar... não era fácil. Eu me tornei um lutador.

– Teve que lutar pela vida, não vejo nenhuma vergonha nisso, na verdade é adm... - mas ele não me deixou concluir.

– Não! Nada disso. Queria dizer que foi bonito assim, mas a verdade é que me tornei literalmente um lutador. De boxe.

– Oh! - Eu ri da minha própria conclusão precipitada. Mas parei quando vi uma sombra em seu olhar.

– Nesse meio rola muito dinheiro Bella. As apostas são altas. E muita gente realmente acredita na justiça do esporte. - Ele riu amargo, e eu entendi.

– Era combinado, não era?

– Sim. A maioria das lutas são combinadas. Na verdade a última luta que lutei pra valer foi ainda na rua. Depois que fui contratado pra lutar com os profissionais, todas eram combinadas. Mesmo aquelas que eu não sabia. E, sendo muito honesto, eu não me importei com isso. Não em muito tempo. - Ele ficou em silêncio e minha curiosidade voou alto.

– O que mudou?

– Um dia uma senhora apareceu na minha porta carregando um garotinho pela mão. Ela veio me xingar porque o marido havia perdido tudo apostando em uma luta que não era real. Nunca foi. Mas o marido dela, um viciado em apostas, se iludia com tudo aquilo, e se matou quando perdeu tudo.

– Não foi justo te xingar por isso. A culpa não foi sua. - E ele me olhou com uma infinita tristeza

– Eu também me disse isso. Mas foi, não foi? Todo o glamour daquela vida, a grana alta, os cassinos luxuosos, as lindas mulheres... É um mundo sujo, e eu fazia parte dele Bella. Era um dos maiores. Não tenho orgulho em dizer que ri daquela mulher e disse que não era problema meu se ela se casou com um fracassado. O olhar que ela me lançou, tão destituído de emoção. Seria melhor se ela tivesse me batido. Aquele olhar vai me assombrar pra sempre. O menino que ela puxava pela mão não devia ter mais de três anos, e acenou pra mim enquanto ela ia embora. Alguns dias depois eu soube que ela também se matou. Entende o que eu fiz Bella? Ao rir daquela mulher eu tirei dela a única coisa que a mantinha em pé, se vingar de mim. Eu não tive família e aquele garoto também não teria. Por minha culpa. E quantos outros não passaram pela mesma coisa? Eu pensava sobre isso dia e noite, estava me consumindo.

Dylan caiu em um silêncio cheio de dor, e eu não me sentia mais no direito de invadir a vida dele, então apenas fiquei ali, o apoiando. Mas a história ainda não havia acabado. E quando ele falou, olhando para os próprios pés, sua voz não era mais que um sussurro.

– Eu comecei a me drogar. Precisava esquecer. Aparecia completamente chapado aos eventos, me tornei violento. Em pouco tempo fui deixado de lado e meu dinheiro se esgotou. Então comecei a ir à clubes clandestinos. Eu ainda era um boxeador muito bom e queria dinheiro para comprar mais drogas. Mas esses eventos eram esporádicos. Precisavam demorar pra acontecer porque não podiam ser delatados. Um dia estava tão desesperado que eu mesmo armei uma luta. Num porão abandonado. Resolvi acender lanternas pra uma iluminação mais baixa, pra não correr o risco de alguém de fora ver e sermos pego. Eu lutei, e venci. E então uma lanterna caiu. O fogo se espalhou tão rápido. O porão era muito velho, fazia parte de um prédio fechado aguardando início de reforma, tinha tanta madeira e tanto tecido... As pessoas lá dentro... Não tiveram nem chance. Eu tentei chamá-las pra única saída que conhecia, mas eles não ouviam, estavam muito desesperadas pra conseguirem me escutar. Se consegui tirar 20 de lá foi muito, e mais de 100 pessoas morreram queimadas.

Eu havia parado de respirar, acho que nunca tinha imaginado um vampiro chorando, mas com certeza as palavras entrecortadas de Dylan representavam isso. E eu o abracei. Precisava diminuir sua dor de algum jeito. Ouvi ele dizer baixinho em meus cabelos.

– Eu tentei me matar, pulei de uma ponte. Mas de alguma forma consegui sobreviver tempo o suficiente para o meu criador me encontrar. Seu nome é Vladmir. Ele é uma boa pessoa, viu em mim a possibilidade de uma família. E, enquanto eu era um recém nascido descontrolado, realmente foi assim. Ele cuidou de mim. Mas seus hábitos alimentares eram normais, e eu já tinha mortes demais na minha consciência. Então fui embora, e parei aqui. Os Denali me acolheram, como acolheram você, e eu fiquei. As vezes me pergunto se realmente os mereço.

– Não fale assim. A eternidade é muito tempo para remoer culpas. Todo mundo tem um passado que não se pode mudar Dylan, o que importa é saber que tipo de pessoa você será a partir de agora.

– Obrigada Bella.

Nós ainda ficamos abraçados por muito tempo e eu me perguntei se de novo não estava sendo egoísta usando meu amigo pra fugir dos meus problemas que eram tão menores que os dele.

– Bella?

– Oi.

– Eu sei que você ainda não ta pronta pro que eu quero. Mas entenda, você já mudou tudo em mim. É a primeira vez que estou lutando por algo realmente admirável.

– Dylan... - Eu disse me afastando, mas ele me segurou em seus braços

– Shiii Bella, eu sei. Não se preocupe, não é só por você, e não é de uma maneira romântica, ao menos, ainda não. Eu quero ser digno da sua amizade, de ser sua família. O que vai ser do nosso relacionamento...? Caramba, eu não sei, não posso negar que me sinto muito, muito tentado. Mas nem você, nem eu estamos prontos pra isso. Quando pudermos ser felizes sozinhos, quem sabe não poderemos fazer feliz um ao outro?

Ele disse a última parte olhando nos meus olhos e sorriu de novo aquele sorriso covinhas. Depois me estreitou de novo em seu peito e, naquele instante, eu prometi que faria o que tivesse ao meu alcance pra manter aquele sorriso ali.

Voltamos para casa em passos humanos, demoramos horas falando sobre tudo, e sobre nada. Dylan me mostrou suas tatuagens, que a transformação não foi capaz de apagar. E, devo admitir, algumas eram muito sexys. Pareceu tão natural andar de mãos dadas com ele que por um momento eu quase me esqueci o que me aguardava. Quase.

Pra que vocês saibam como é o Dylan da minha cabeça ;)


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Notas finais do capítulo

Ahh, eu sei, eu sei. Roubei uma trechinho de Querido John... mas ah, me perdoem vai, quem não ama essa cena? *-* Ficou fofa não ficou??
O Dylan é um personagem inspirado em Belo Desastre. Se não leram, leiam que é muito lindo =D
Me digam, team Edward ou team Dylan? Pra quem estão torcendo?
Aguardem os próximos capítulos, muitas mudanças a caminho ;)



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