Escape escrita por Miaka


Capítulo 21
Searching for you II


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoal! ♥ Antes de começar esse capítulo, eu quero pôr um trigger warning para uma situação pesada que eu decidi há um bom tempo incluir na história. Eu sei que a maioria que lê Escape entende que eu realmente trabalho com temas meio pesados, mas se você se sentir desconfortável - por mais que eu tenha tentado descrever de uma forma sutil - ao ler uma cena que eu creio que vocês vão perceber o que vai acontecer, eu estou colocando um * para demarcar o início e o fim dessa narrativa. Mas peço que, como sempre, não abandonem a fic e apenas evitem ler o que pode ser desagradável para você. Respeito a sensibilidade dos meus leitores e agradeço muito se, mesmo evitando ler essa parte, prosseguirem a leitura! Obrigada a todos por acompanharem! Essa fic é meu deleite, mas eu realmente decidi tratar de todos os temas bizarros possíveis nela! Conto com vocês para ficarem comigo até o final dessa história - e me acompanhar em outras também! ^^ Vejo vocês no final do capítulo! ♥



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Já passava das duas da tarde quando chegou de volta em seu apartamento. Afinal, além de ter que levar algumas mercadorias as quais a entrega já estava atrasada, Judal precisava voltar às aulas. Ou voltava a frequentar à faculdade regularmente ou perderia a bolsa que havia conseguido graças a seu ótimo desempenho durante o ensino médio, jogando futebol pela sua escola. Não, ele não gastaria o dinheiro que Serendine depositava, todo mês, para garantir seus estudos. Ele não se sentia digno de usufruir daquele valor.

Mas assim que Judal cruzou a porta ele sentiu o maravilhoso aroma de uma boa refeição misturado ao agradável perfume de limpeza.

O capacho da porta não estava ali, como o carpete felpudo do centro da sala. O porcelanato branco estava completamente limpo - para não dizer brilhando, os móveis sem pó e os poucos adereços que ele tinha naquela decoração clean reluziam, assim como as vidraças e o vidro da mesa de jantar.

Porém, não havia felicidade em chegar e ver sua casa assim, como há anos não via. Aliás, em nenhum momento sua casa ficou tão asseada daquela forma. Judal parecia furioso.

Ele cerrou os punhos e rangeu os dentes antes de soltar a mochila pesada no chão.

— Hakuryuu!!!

Não houve resposta. Talvez fosse a mistura do barulho que vinha da cozinha: o som alto da panela de pressão trabalhando combinado com a música baixa que tocava e que, provavelmente, fez com que seu novo acompanhante não ouvisse seu chamado.

Judal marchou, bastante irritado, até a cozinha.

— Hak...

Ao cruzar a porta da cozinha, interrompendo seu próprio caminhar, ele arregalou os olhos escarlate.

Hakuryuu usava uma camiseta sua, o que, com a gritante diferença de porte de ambos, fazia com que ela ficasse bem mais larga em seu corpo, bem menor que o de Judal, além de uma calça de moletom. Sobre tudo havia um avental cor-de-rosa adornado com babados em renda branca - a mesma cor do lenço que ele amarrava no topo dos fios azulados que estavam soltos. Algumas mechas acabavam caindo na frente do rosto banhado em suor.

Ele observava atentamente a panela a qual mexia, delicadamente, com uma colher de pau.

De seus lábios entreabertos ele soprava um cantarolar baixinho que acompanhava Without You, da Mariah Carey, que tocava em seu celular, outrora pousado sobre um dos balcões da cozinha. E como aquele ambiente também estava limpo!

A presença de Judal nem ao menos foi notada e talvez aquele detalhe fosse a cereja do bolo. Ver como Hakuryuu, distraído e despreocupado, era lindo em toda sua essência: com os cabelos bagunçados, abatido pelo cansaço, suando e mesmo assim a sorrir, a trabalhar com tanto cuidado.

Ele retirava o saleiro da bancada ao lado do fogão e o agitava sobre a panela para, recolocando-o em seu devido lugar, extrair um pouco daquele molho, batendo a colher sobre a palma da mão oposta e então deslizar a língua, suavemente, por sua pele.

Um gemido de satisfação escapou por seus lábios ao degustar daquele sabor. Ideal! - ele pensou antes de, com um sorriso, desligar a chama do fogo e se virar para trás. Foi quando o par de esmeraldas de tons desiguais encontraram Judal.

Ele estava ali parado, atônito, como se houvesse sido enfeitiçado pela beleza e graciosidade de Hakuryuu que, por sua vez, nada entendeu e chegou a se assustar ao se ver observado por Judal. Nem ao menos percebera que ele tinha chegado.

— Judal! - ele levou uma mão ao centro do peito. - Que susto! - suspirando, ele secou a mão no avental. - E então como foi...

Como não viu quando Judal chegou tão perto? A mão dele aninhou o rosto de Hakuryuu ao mesmo tempo em que o outro braço envolveu a cintura do mais jovem.

O coração falhou uma batida ao vê-lo tão próximo. Os rubis que ele tinha no lugar dos olhos ficando tão miúdos ao analisar seu rosto, admirando cada detalhe. Cada detalhe que Hakuryuu odiava, certamente, mas que eram tão lindos, ao menos ao ver de Judal.

— Ju-Judal… - ele gaguejou e, instintivamente, deu um passo para trás. Naquela breve distração Hakuryuu acabou encostando as mãos no fogão que ainda estava tão quente. - AH!!!!

Era como se Hakuryuu estivesse tocando em brasas. Ele afastou Judal em um empurrão ao mesmo tempo em que segurou a mão que havia entrado em contato com o forno quente.

— Oe, Hakuryuu! - Judal se alarmou. - Se machucou muito?!

O que para alguns seria uma simples queimadura, bastante leve, era um terror para Hakuryuu que, apavorado, sem responder, encarava a palma avermelhada. E não era para menos.

Ele se lembrava muito bem como era ter aquela sensação se alastrando por quase todo o seu corpo. Queimando, lhe consumindo. Aquela expressão de tanto pavor assustou Judal.

— Oe, acalme-se! - ele correu para abrir a torneira da pia. - Coloque a mão aqui!

— T-Tudo bem. - Hakuryuu balançava a mão. - É que… É que essa sensação me deixa… muito assustado, me desculpa.

Hakuryuu se sentia um tanto quanto envergonhado ao parecer tão frágil diante de Judal, que o conduziu, puxando-o pelo pulso, até a pia, onde a água corrente bateu na região avermelhada.

O mais jovem apertou os olhos. As lágrimas ali acumuladas acabaram escorrendo por seu rosto e ele se sentia constrangido. Como era fraco.

— Me desculpa, Judal…

Hakuryuu pedia enquanto sentia o choque da água fria bater em sua pele. Acabou virando-se de frente e, tão próximo, escondendo o rosto no peito do moreno que, lentamente, tocava a pele avermelhada.

— Não tem porque pedir desculpas! Se está reclamando assim é porque está doendo muito!

— É… É só uma queimadura bem leve, mas… mas eu faço todo esse escândalo...

— Eu imagino que para você é uma dor bem mais forte, Hakuryuu.

Judal não o encarou ao falar aquilo, mordendo o lábio inferior ao encarar a mão do rapaz, a qual ele tirou da água, envolvendo-a em um pano de prato.

— Fique aqui um pouco.

Ele sentou Hakuryuu em um dos bancos altos da cozinha e foi até a geladeira. Do freezer ele retirou um pouco de gelo. E pegando outro pano de prato, estendido nos azulejos brancos e azuis da cozinha, ele fez uma pequena trouxa para aquelas pedrinhas, a qual ele depositou sobre a mão de Hakuryuu.

Por mais que se contorcesse com a dor, Hakuryuu foi forte e obedeceu Judal que, tomando liberdade, desamarrou aquele lenço de sua cabeça e afagou seus cabelos.

— Vai passar. Só tem que se esquecer da sensação.

Hakuryuu assentiu e Judal beijou, com sutileza, o topo dos fios escuros. Ageste gesto era o suficiente para que o mais novo corasse.

— Você é bastante corajoso indo cozinhar depois de tudo o que aconteceu. Era para ter muito medo de qualquer coisa que tivesse… fogo. - concluiu Judal.

— Eu tinha muito medo, mas… a minha irmã me matriculou em um curso de culinária para que eu superasse isso.

— Ah, é por isso que cozinha tão bem, então? - Judal sorriu de forma simpática. - Aprendeu desde cedo!

— Sim! Desde que era criança tomei gosto pela culinária. Ela me ajudou a superar meu medo e eu… fico feliz em cozinhar para as pessoas que gosto. - Hakuryuu correspondeu aquele gesto.

— Pois é. - Judal puxou o banco adjacente e se sentou. - Eu estou muito chateado com você! - ele o encarou.

— Por quê? - Hakuryuu perguntou com o coração apertado. O que havia feito de errado?

— Ora, tem que ficar de repouso ainda! - o moreno respondeu como se fosse a coisa mais óbvia do mundo (e era). - Fez faxina, comida! Está se esforçando assim para quê?!

— É o mínimo que posso fazer para agradecer sua hospitalidade, Judal. - Hakuryuu desviou o olhar. - Se não fosse por você, eu ainda estaria debaixo do teto da minha mãe e, provavelmente, já estaria morto. - ele suspirou.

— Bobo! Não quero que faça nada para me agradecer. Está aqui e isso me deixa feliz!

Novamente os olhares se encontraram e Hakuryuu corou, engolindo a seco. Como devia reagir? Mas foi Judal que recuou dessa vez, deixando-o um tanto quanto surpreso e… decepcionado.

— O que foi? - Hakuryuu indagou ao vê-lo se afastar.

— Eu que tenho que pedir desculpas. - Judal suspirou. - Fico dando em cima de você direto. Não quero que pense que é obrigado a ser… meu “namoradinho” porque te deixei ficar aqui.

— Mas eu quero que você dê em cima de mim! - Hakuryuu se levantou. Mas droga, por que suas pernas tremiam tanto? Faltava-lhe coragem.

Judal se virou de frente e encarou aquele que estava mais corado que o molho de tomate que quase transbordava daquela panela, ainda borbulhando.

Hakuryuu reunía forças para assumir seus sentimentos naquele momento. Mas ele não ia querer ter de se preocupar se ia dormir no quarto ao lado e não na cama de Judal, não é?

— Não disse que somos namorados?! Eu quero ser seu namorado! - afirmou um determinado Hakuryuu. - Então… dê em cima de mim e… - ele engoliu a seco. - continue o que ia fazer quando chegou!

Com os punhos cerrados e trêmulos, Hakuryuu ficou a observar Judal, esperando uma reação daquele que fora surpreendido pela sinceridade e intrepidez do rapaz.

Ele respirou fundo e, sem mais cerimônias, caminhou de volta até o mais jovem. E, por mais que Hakuryuu esperasse que as mãos dele o tocassem, suas carícias, Judal nada fez. Apenas ficou parado a sua frente, mais uma vez observando o rosto - do qual Hakuryuu tanto se envergonhava daqueles estigmas, as cicatrizes que o acompanhavam há tantos anos.

— Como você consegue ser tão bonito, Hakuryuu?

— Anh!?

Piscando, desentendido, ele nada entendeu ao ouvir a pergunta de Judal. Mas subitamente o braço do moreno envolveu sua cintura e o puxou para perto. Seus quadris agora estavam colados e Hakuryuu ergueu o rosto de leve para encarar aquele que era poucos centímetros mais alto. Seu coração voltava a acelerar.

— Eu não consigo mais aguentar me segurar e ficar sem te beijar.

O sussurro de Judal foi breve o suficiente para que logo abocanhasse os lábios de Hakuryuu. E mesmo surpreso ele cerrou os olhos para desfrutar daquele sabor. A língua quente deslizando pelo interior da sua boca enquanto que os braços dele, bem feitos, o envolviam, inclinando-o sobre aquele balcão. Uma sensação indescritível atravessava o seu corpo enquanto ele se entregava, de corpo e alma, àquele que amava.

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Os olhos verdes se abriram lentamente. A claridade ofuscava sua vista ao mesmo tempo em que sua cabeça doía tanto. Estava deitado no chão? - ele se perguntava ao sentir a superfície dura onde seu rosto estava apoiado.

O assoalho era de cimento puro, úmido, molhado em algumas partes. Havia fezes de rato espalhadas e as telhas altas de amianto refletiam naquelas poças que fediam à urina.

Sentindo uma dor aguda em sua fronte, ele tentou levar a mão até o alto da cabeça, mas o sutil movimento foi o suficiente para perceber que seus braços estavam presos.

Ele olhou para baixo e viu as algemas que envolviam seus pulsos. Essas eram ligadas à correntes bem grossas e enferrujadas, as quais ele seguiu e viu que davam a volta em um cano grosso, que estava no mesmo estado - quase podre de tanto ferrugem.

Foi quando se lembrou de que havia saído do orfanato e, logo foi abordado por Barbarossa, que lhe apontou uma arma e depois, subitamente, tudo ficou escuro. Então havia sido levado ali por ele - concluiu, suspirando pesado. No que havia se metido?

Ja’far virou a cabeça para o lado oposto e encontrou o pequeno grupo que ria, divertindo-se em uma conversa descontraída. Um forte odor de maconha instigava seu nariz e ele sentia que ia acabar tossindo - mas o melhor era que pensassem que ainda estava inconsciente, ele pensou, tentando se conter, mas o pânico misturado com o cheiro odor foram a combinação perfeita para que seu plano falhasse.

Ao ouvir os fortes tossidos que vinham do canto daquele amplo galpão, o grupo se alarmou e logo se aproximaram daquele que tentava recuperar o fôlego.

— Olha lá, não é que a bela adormecida acordou?

— Até que enfim! Não via a hora de começar nosso trabalho!

Os dois homens, os mais robustos que haviam ali, bem fortes e altos, comentavam de forma animada. Ja’far não conseguia parar de tossir. A chegada daqueles homens havia piorado sua situação.

— Avise ao Barbarossa-sama! Ele jáj deve estar entediado de revirar o celular dessa bichinha!

Então suas suspeitas estavam mais que corretas. Não era um pesadelo. Realmente fora distraído o suficiente para ser pego por Barbarossa.

Mas Ja’far dependia deles naquele momento e, antes de ser um inspetor da polícia, era um psicólogo e psiquiatra competente o suficiente para saber que não deveria demonstrar resistência e, sim, colaboração com quaisquer fosse o plano daqueles loucos. Estava à mercê deles.

— P-Por favor… - Ja’far começou. - Onde… Onde estão minhas coisas? - ele lutava para falar enquanto era interrompido pela tosse seca. - Eu preciso de algo que está na minha bolsa!

— Isso aqui? - o de porte menor tirou do cós da calça a pistola que lhe pertencia. - É disso que você precisa!? - ele apontou a arma para Ja’far.

Balançando a cabeça negativamente, Ja’far tentava conter o fôlego. Depois de tantos anos de terapia, ele podia jurar que estava curado daquilo, porém a prevenção sempre falava mais alto e ele insistia em manter seus medicamentos consigo.

— Eu tenho… Tenho asma! Preciso do nebulímetro que… que está lá! Por favor…

Os dois se entreolharam e gargalharam. Ja’far se sentia patético, ao mesmo tempo em que o desespero fazia aqueles sintomas piorarem. Precisava se manter calmo como ela havia lhe ensinado.

— Ora, ora, finalmente acordou então!

Foi só então que Ja’far notou que, ao fundo daquele galpão, havia uma escada de ferro. Os passos daquele homem ecoavam pelo lugar tão amplo e vazio.

Ja’far piscou e constatou, ao ver Barbarossa, que seu menor problema era uma crise de asma. Ali estava o assassino que destruiu a vida da esposa de Sinbad, a vida do próprio Sinbad e que, provavelmente, destruiria a sua também.

Vestido em um terno italiano feito sob medida, Barbarossa trazia a bolsa que pertencia a Ja’far em uma de suas mãos. Uma pasta preta que aparentava estar bem mais vazia do que quando Ja’far havia a visto pela última vez.

Os olhos verdes brilharam quando, ao se aproximar, ele a jogou ao chão. Vários pertences escaparam para fora do compartimento aberto, entre eles o celular de Ja’far, cuja tela trincou de ponta-a-ponta ao ir ao chão, uma caneta tinteiro, o distintivo e… o desejado nebulímetro.

— Me desculpe, mas a sua carteira ficou com os outros rapazes. Eles estão na internet comprando algumas coisinhas com seus cartões de crédito.

Mesmo algemado, Ja’far conseguiu se sentar e fez menção de se arrastar até o objeto tão desejado.  Afinal, a corrente que o prendia àquele cano tinha, mais ou menos, dois metros. Mas assim que Barbarossa percebeu o que sua vítima queria alcançar, o Louis Vitton forrado em couro esmagou, com toda sua força, o nebulímetro que se desfez em mil pedaços.

Os olhos verdes, arregalados, encararam Barbarossa enquanto ele permanecia a lutar por fôlego. Ele era bastante alto, Ja’far pensou quando ele se agachou para vê-lo melhor, enfiando a mão em seu terno e tirando a pistola que estava presa ao coldre.

— Podemos te dar algo de mais qualidade para melhorar essa sua tosse, Ja’far!

Ao falar aquilo, Barbarossa segurou o queixo de Ja’far e, sem a menor sutileza, tratou de enfiar aquele cano na boca do inspetor que tremia, tanto de medo quanto pelos espasmos da crescente falta de ar.

— Você gosta, não é? - Barbarossa sorriu com malícia enquanto deslizava aquele cano por dentro da boca de Ja’far. - Quietinho… Ou eu posso, sem querer, disparar essa arma e você não vai querer beijar seu delegadinho com um buraco na boca, não é?

Retirando a arma dali, Ja’far voltou a lutar pelo ar que lhe faltava, mas tentando ao máximo não emitir barulho qualquer, temendo por sua vida mais do que nunca. O gosto metálico do material daquela pistola ainda bastante presente.

Barbarossa, então, pegou o celular que estava no chão e, com alguns toques, decidiu mostrá-lo ao inspetor. Os olhos de Ja’far voltaram a crescer.

— Seu amorzinho ligou mais de dez vezes para você nas últimas duas horas. Será que ele não confia em você?! Eu também não confiaria, afinal, você disse a ele que iria num laboratório, fazer alguns exames, mas estava passeando num orfanato. Por acaso você encontra algum amante lá? Como a Serendine fazia comigo?!

— Ser… Serendine-sama nunca traiu o Sin!

O cano da arma acertou com tudo o rosto de Ja’far, que foi imediatamente ao chão. O hematoma arroxeado surgiu quase que no mesmo instante em que recebera o golpe, agora do lado oposto de onde havia recebido o anterior.

Ja’far encarou o chão e viu o sangue pingar. Seu supercílio havia sido rasgado com tamanha violência. Mas, ridiculamente, o inspetor conseguia respirar melhor. Talvez a adrenalina tivesse o ajudado a combater aqueles terríveis sintomas.

— Eu pedi sua opinião? - perguntou Barbarossa com um sorriso. - Ela era uma puta que começou a sair com o Sinbad quando ainda era minha noiva! - havia fúria naquelas palavras. - E adivinha? O Sinbad sabia de tudo!

— E ele… E ele pediu que a Serendine-sama deixasse tudo claro! O casamento de vocês era pra satisfazer os desejos dos seus pais!!!!! - Ja’far vociferou antes de decidir encará-lo com desprezo. - E o que eu tenho a ver com isso?! Você matou a Serendine-sama! Matou o filho dela com o Sin também! Então siga sua vida! Nem para a cadeia você foi! Está aqui, correndo risco comigo, podendo ser pego!

— E você acha que tenho medo do Sinbad? - Barbarossa riu. - E, aliás, eu não posso seguir minha vida porque eu… - agarrando os fios alvos de Ja’far, ele o puxou para mais perto. - andei sabendo que você faz o Sinbad muito feliz, sabia, Ja’far? E eu prometi que jamais deixaria o Sinbad ser feliz…

— P-Por quê isso?! - gaguejava um trêmulo Ja’far. - Serendine-sama nunca te amou, independente do Sin chegar…

— Cala a boquinha, senão eu vou tirar a diversão dos meus subordinados fodendo mais ainda com sua carinha de boneca, Ja’far. - Barbarossa disse entre os dentes.

— O que você quer de mim?! - insistiu o inspetor.

— De você? - ele riu ao pegar o celular com a tela completamente quebrada. - Não quero nada. Só convidamos você aqui para darmos um pequeno susto no Sinbad. Se, ouviu bem? - enfatizando, Barbarossa se levantou. - Se você se comportar bem, podemos te deixar vivo. Do contrário voltamos àquele orfanato e matamos a pequenina Esla-chan, o que acha?!

Ja’far tinha os olhos arregalados. Como ele sabia da menina que estava para adotar? E até mesmo o nome que decidira registrá-la. Provavelmente estava os espionando há bastante tempo, então. O desespero lhe consumia enquanto ele assistia Barbarossa entregar o celular ao homem ao seu lado.

— Vamos começar a diversão então, não é?! - perguntou ele com um sorriso. - Não se preocupe. Não vamos fazer nada que você não goste! Aliás, você gosta muito, não é?! - Barbarossa debochava.

— Já estou filmando, chefe! - avisou o homem que apontava o celular para o desentendido Ja’far.

*trigger warning*

Foi quando ele ouviu o barulho de um zíper se abrindo. O pânico refletido em seus olhos quando viu os cinco homens que se aproximavam, todos bastante animados e que já começavam a se despir. Estava completamente cercado, mesmo que se visse algemado.

Instintivamente ele balançou a cabeça para os lados e forçou os pulsos, presos àquelas algemas, na tentativa de se libertar. Não acreditava que fariam aquilo. Não! Não era possível.

— AH!!!

Ja’far exclamou quando um deles se agachou e começou a lhe arrancar os sapatos e, subseqüentemente, a calça social. E com a força que Ja’far fazia para não permitir aquilo, suas vestes acabavam se rasgando enquanto os outros lhe puxavam o paletó, os botões da blusa social branca sendo arrebentados com a violência.

— NÃO! NÃO!  

Seus gritos, completamente inúteis, eram abafados pelas gargalhadas daquele bando que o via como um suculento pedaço de carne. Então um daqueles homens abocanhou seus lábios, os outros já seguravam suas pernas, forçando-o a abri-las. Ja’far já estava completamente despido enquanto se sentia entorpecer pelo hálito péssimo de um de seus violentadores, uma mistura de àlcool com um forte cheiro de podre.

— Não perca um ângulo sequer. - Barbarossa ordenou àquele que, com um sorriso, filmava toda a situação.

— Sim, senhor!

Sentindo aquela língua percrustrar sua boca, sem dó, Ja’far decidiu mordê-la. E como numa reação instantânea, o homem que se afastou ergueu o punho e acertou sem dó seu estômago.

A dor daquele golpe foi o suficiente para que não pudesse mais relutar. Sem fôlego e zonzo ele foi posto de bruços. Mas ele não podia se permitir perder a consciência. Não! Não se entregaria. Então ele sentiu suas pernas serem abertas, travadas ao chão, cada uma por um de seus algozes.

— Po-Por favor, não… - ele suplicava, sentindo-se patético.

— Ele é um franguinho, mas até que é forte! - riu aquele que tinha as calças abaixadas e se ajoelhou diante de Ja’far. - Vamos logo para o melhor, não é?

Ja’far balançava a cabeça negativamente, sentindo seu estômago revirar ao perceber a intenção daquele homem, porém algo pior estava por vir.

— AAAAHH!!!!

As lagrimas escorreram por seu rosto quando a dor provou a veracidade daquele pesadelo.

*trigger warning*

Naquele momento, Ja’far só tinha uma certeza: havia morrido ao sair daquele orfanato e, apesar das boas ações que colecionou durante toda sua vida, tudo tinha sido em vão: fora enviado ao inferno. Mas a pior parte era a certeza do inevitável: ele jamais voltaria a ver Sinbad.

—--------xxxxxx---------

A delegacia estava bastante movimentada e os funcionários não estavam dando conta do grande fluxo de trabalho. Somente naquela manhã a equipe do delegado Sinbad havia prendido seis criminosos e as testemunhas e familiares dos marginais se amontoavam na recepção. O falatório intenso que era misturado a berros chegava até mesmo na sala mais afastada no segundo andar daquele prédio, onde o delegado tentava, pela vigésima vez, entrar em contato com seu inspetor.

— Delegado, tem uma senhora pedindo para falar com você com urgência! É sobre o menor que prendemos em flagrante mais cedo.

Ele ignorou completamente o moreno que abriu apenas metade da porta.

— Delegado?!

— Anh?!

Sinbad parecia completamente distraído, só percebendo após aquele segundo chamado a presença daquele rapaz. Era Sharrkan. Um de seus auxiliares principais e tenente da polícia.

— Sharrkan! Me desculpe! - ele se levantou. - Ja’far chegou já? Está lá embaixo?

A pergunta do delegado era uma mera ilusão para seu próprio conforto, afinal, sabia que a primeira coisa que Ja’far faria, ao chegar, era ir até sua sala. Nao iam almoçar juntos? Afinal, já estava tão tenso com aquela história de exames. Será que Ja’far estava doente e nao queria lhe contar?

— Não o vi hoje. Não disse que ele viria só à tarde?

— Sim, mas já passa das três e ele me mandou uma mensagem meio-dia dizendo que em meia-hora estaria aqui! Estou preocupado! - Sinbad nem ao menos percebeu o quão ríspido estava sendo com seu subordinado.

— Fi-Fique calmo, delegado. O Ja’far-san deve ter ido almoçar, acabou perdendo a hora.

— Não! Ele teria me avisado! - Sinbad estava aflito. - Alô!?

O moreno ficou a observar a ligação de seu superior, notando como Sinbad balançava a perna cruzada e, com a mão livre, batia as pontas dos dedos sobre a mesa. Ele estava bastante tenso.

— Sim! É Ja’far, o nome. Ele foi fazer alguns exames aí pela manhã. Pode me dizer a que horas ele saiu, mais ou menos? - foi durante aquela pausa que o delegado ficou completamente pálido. - Não… Não havia nada marcado com esse nome?!

— Ih… - Sharrkan presumiu o pior. Conseguiu ver um par de chifres acompanhando o ahoge pontudo que ficava no topo da cabeça de seu superior.

— M-Muito obrigado, então. Me desculpe o incômodo. - ele desligou o telefone antes de encarar o moreno. - Sharrkan, Ja’far não esteve no laboratório que disse que ia. Ele… mentiu pra mim? - Sinbad estava atônito.

— Não fique preocupado, delegado. Talvez o Ja’far-san esteja planejando uma surpresa. - Sharrkan tentou pensar positivo. - E se esta pensando besteira, por favor, ele jamais o trairia!

— Não, tem algo muito estranho nisso! - determinado, ele caminhou até o cabideiro no canto da sala para recolher o paletó. - E eu sei quem sabe onde ele está! - bradou Sinbad enquanto caminhava até a saída.

— M-Mando a moça subir? - Sharrkan indagou.

— Não. Eu não vou atender ninguém agora.

O delegado saiu da sala enquanto terminava de vestir seu terno, batendo a porta atrás de si. E ele tinha um destino certo enquanto caminhava, bastante preocupado.

Sem cerimônias ele escancarou a porta da sala que ficava na outra extremidade do corredor.

— AH!!!

A médica legista deu um salto da cadeira quando ouviu a porta se abrir tao repentinamente e de uma forma nada sutil.

Com o susto ela acabou derrubando vários tubos de ensaio que estavam sobre sua mesa, tão bem organizada, onde terminava de realizar alguns testes.

Levando a mão até o centro do peito, ofegante, ela encarou o delegado.

— Poderia bater antes de abrir assim e não me matar de susto, não é? Ainda bem que já tinha terminado de conferir algumas digitais! - ela cruzou os braços após bater as mãos no jaleco branco que ela usava sobre a roupa social.

— Yamuraiha, é urgente. Eu preciso que me diga onde Ja’far está! - ele exigia.

— Anh?! - ela piscou. - Que eu saiba ele foi fazer uns exames hoje, não?

— Yamuraiha! - Sinbad segurou o ombro da legista, sem perceber que o apertava um pouco. - Eu sei que Ja’far não foi fazer exame nenhum e mentiu!

A médica engoliu a seco e aquele silêncio quase fazia Sinbad sufocar.

— Por favor! - ele praticamente suplicava. - Eu não sei o que está acontecendo, mas sei que você é confidente do Ja’far! Só quero saber onde ele está! Ele me disse que chegaria na hora do almoço, no entanto ele desapareceu e não atende as minhas ligações!

Foi a vez de Yamuraiha se assustar, ficando tão aflita quanto o delegado estava.

— Meu Deus!

— Por favor, Yamuraiha, eu estou preocupado! Me diga a verdade!

— Eu… Eu não devia falar, mas… O Ja’far-san hoje esteve no orfanato católico que… que ele tem frequentado. Ele está agilizando todo o trâmite da adoção de uma criança em segredo para lhe fazer uma surpresa! - ela sussurrou logo em seguida, como se falasse com o próprio Ja’far: - Me desculpe, Ja’far-san!

O delegado a soltou, suspirando profundamente. Tinha de ir no orfanato que Ja’far havia ido, então. E mesmo que, em nenhum momento, Sinbad cogitasse que Ja’far estava lhe enganando, aquilo lhe trouxe alívio. Provavelmente ele havia perdido a hora então, encantado com as crianças, certo? - Sinbad tentava se convencer e se acalmar. Tudo estaria bem, ele tinha certeza. Precisava manter o foco.

— Onde é esse orfanato, Yamuraiha?

— Fica num convento! Faz tempo que Ja’far-san vai até lá semanalmente.

— Tsc, ele não me contou nada… - Sinbad farfalhava os fios púrpura. - Sabe onde é? Pode me indicar e vamos até lá?!

A mulher apenas assentiu e seguiu o delegado que saiu empurrando a porta para deixar a delegacia. Ele nao se importava mais com seu trabalho. Tudo o que tinha em mente agora era saber onde Ja’far estava e por que aquele pressentimento ruim parecia lhe sufocar? Um sentimento tao ruim quanto… quanto o que sentiu ha 4 anos atras.

Ele permaneceu em silencio o tempo todo, o cenho franzido. Yamuraiha angustiada ao seu lado, tambem bastante preocupada com seu amigo.

Assim que virou a esquina que a legista lhe indicou, Sinbad avistou o peugeot que pertencia a Ja’far. Seu coraçao parou por um instante e ele deixou o carro em qualquer lugar, indo em direçao ao automovel de seu companheiro. Mas assim que chegou proximo, ele se assustou ao ver a chave na porta. Olhou ao redor e tentou procura-lo. Ja’far nao teria deixado o carro aberto e ido a qualquer outro lugar.

— Meu Deus! - Sinbad cobriu o rosto com as maos.

— A-Acalme-se, delegado! Vou perguntar no orfanato que horas o Ja’far-san saiu daqui!

— T-Ta, por favor!

Sinbad, imediatamente, tirou o celular do bolso da calça social preta. Por que sua mao tremia tanto?

Hakuryuu estava praticamente deitado sobre o balcao da cozinha com Judal sobre si, ainda depositando beijos em todo seu colo, puxando aquela camiseta que ficara tao larga nele. Eles percebiam que, como as coisas estavam indo, teriam que ir para a cama em breve. Mas a musica no celular de Hakuryuu foi interrompida por uma ligaçao.

— Droga! - Judal resmungou. - Deixa essa merda pra la! - ele voltou a beijar Hakuryuu.

— J-Judal, melhor atender! - o mais jovem o empurrou. - Depois continuamos. - ele deu uma piscadela.

Bufando, Judal apoiou os punhos nos quadris. Hakuryuu logo correu ate o celular e o atendeu.

— Sinbad-dono? - ele estava surpreso. - Ha quanto…. Anh? O Ja’far-san? Nao. Nao esteve conosco e nem falei com ele hoje.

Atento a conversa, Judal foi ate a geladeira, de onde tirou uma lata de cerveja.

— Que?! Mas que estranho! Nao faço ideia! S-Sim, claro! Pode vir! - aflito, Hakuryuu encarou Judal. - Estamos esperando!

— O que aconteceu? - perguntou o moreno quando seu companheiro havia desligado.

— Judal… O Ja’far-san sumiu e tudo indica que ele foi sequestrado!

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Yamuraiha atravessou a rua correndo, bastante ofegante, antes de se aproximar de Sinbad. E pela expressao de medica legista, as noticias nao eram nada boas.

— Delegado, a madre disse que o Ja’far-san saiu daqui por volta de meio-dia!

— Já comuniquei o desaparecimento para a delegacia. Já devem estar começando a ir procurá-lo! - Sinbad bufou. - Eu estou indo na casa de dois amigos que podem me ajudar.

— Ajudar?!

Sinbad suspirou.

— Eu creio que isso possa ser alguma represaria as investigações que temos feito quanto a mafia dos Ren, a proteção que temos dado ao Hakuryuu-kun, digo, ao Ren Hakuryuu. - ele se corrigiu.

— Seria uma covardia! O Ja’far-san so esta fazendo o trabalho dele!

— Eu estou… com um mau pressentimento!

— Pense positivo, delegado! - a moça de seios volumosos tocou seu ombro. - Pode estar se preocupando à toa.

Antes ele pudesse dar ouvidos às palavras de Yamuraiha, mas tudo o que ele sentia era um imenso vazio. O mesmo vazio que o corroía no dia em que Serendine morreu e ele, tolamente, pensou até o fim que era uma preocupação boba. Ele sabia que Ja'far estava em perigo. Seu coração dizia isso. Ele sentia como se pudesse ouvir Ja'far lhe chamando, lhe pedindo ajuda.

A angustia estava estampada na expressão do delegado quando ele cruzou os braços na parte superior do carro e apoiou sua cabeça.

— Meu Deus, Ja’far, onde você está?!


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Notas finais do capítulo

Bem, pessoal, eu juro que tentei escrever da forma mais sutil esse tipo de situação porque, de certa forma, isso também me incomoda. Mas quando eu decidi fazer essa cena, eu ponderei bastante porque isso vai abrir espaço para a entrada de novos - novos? - personagens e para que eu encaixe finalmente nossos três núcleos vilanescos da fic!
O Barbarossa, além de cruel e invejoso, é preconceituoso. Porém, na minha sincera opinião, o preconceito dele surge do momento em que ele criou uma espécie de "amor não-correspondido" pelo Sin, idolatrando ele por vê-lo conseguir ter o que ele quer sempre? Acho que estou fazendo spoiler da fic hahaha!
Quanto a Juhaku, finalmente saimos do zero a zero! Pena que sempre alguém interrompe e mais problemas estão a caminho.
Espero que estejam gostando e muito obrigada pelas reviews - e apesar de atrasar para responder, eu leio todas assim que chegam e me acabo de felicidade! É meu combustível para escrever, então, não se acanhe. Me escreva e fale o que gosta/não gosta da fic! ♥ Um beijo e até o próximo capítulo!



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