Escape escrita por Miaka


Capítulo 15
Drowning for You


Notas iniciais do capítulo

Gente, peço mil perdões pela demora em postar esse capítulo! Eu andei organizando umas ideias e com o andamento em paralelo de Remember Me, acabou que demorei muito. Prometo que o próximo capítulo será lançado em breve! Obrigada por estarem acompanhando!



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Marchava por aqueles corredores. As mãos enfiadas no bolso e os olhos travados que não focavam em nada específico, já que só podia ver, em sua mente, o momento em que Hakuryuu disse que não queria mais vê-lo. Em que o mandou sair daquele quarto e… da sua vida.

Hakuryuu não entendia tudo o que havia feito por ele? O risco em que havia se colocado? - perguntando a si mesmo, Judal se sentia estúpido. Não valia a pena investir em uma relação com ele?

Em menos de doze horas, o relacionamento que acabara de desabrochar tinha chegado ao fim.

Precisava pensar e se sua presença não era bem quista ali, pois bem, ele iria embora. Tomaria um banho, descansaria. Afinal, parecia que Hakuryuu tinha se tornado o centro de sua vida nos últimos dias e Judal sabia que aquilo não estava certo, definitivamente não. Talvez aquela discussão tenha sido um ponto importante para despertar de toda aquela loucura que sentia estar vivendo desde que o conheceu.

— Judal!

Aquela voz chamou sua atenção, interrompendo seus passos. Era ninguém menos que Alibaba.

O loiro, sorridente, abraçou Judal como se este fosse um amigo de longa data. Ele, por sua vez, não soube como reagir com uma atitude tão espontânea. 

— Como está o Hakuryuu?! - ele perguntou ao se afastar.

Judal piscou e então encarou a companhia de seu “amigo”.

Kougyoku estava, nitidamente, desconfortável ao vê-lo. A moça, a todo custo, evitou cruzar olhares com o moreno. Talvez ainda devido a última discussão que tiveram, refletiu.

Er… Ele está bem. O médico disse que ele está se recuperando bem rápido.

— Que bom! - a alegria estava por todo o semblante de Alibaba. - Muito obrigado por ter me avisado que ele tinha acordado e que… que poderia visitá-lo.

— Claro que pode. Hakuryuu é seu amigo. - Judal estava sendo prático. - Bom, eu estou de saída. Nos falamos por aí.

— JUDAL-CHAN!

O moreno já se afastava do casal, seguindo em direção às portas de vidro quando ouviu a voz estridente de Kougyoku.

Virando-se para trás, Judal viu a jovem que ainda não tinha coragem de encará-lo. Parecia tão nervosa. Suor escorria pela lateral do rosto fino da ruiva.

— O que foi? - ele parecia indiferente. - Decidiu ao menos me cumprimentar?

Finalmente ela conseguia encará-lo.

As mãos tremiam segurando firmemente as alças curtas de sua bolsa.

— N-nada. - respondendo rapidamente, em um gaguejar, Kougyoku se encolheu.

Tsc, parece doida…

Voltando a lhes dar as costas, ele seguiu para fora do hospital.

Alibaba, completamente confuso, encarava sua noiva que mordia o lábio inferior. Ela parecia extremamente angustiada.

— Está acontecendo algum problema, Kougyoku?

Balançando a cabeça negativamente, ela impediu que aquele pequeno marejar em seus olhos desaguasse em seu rosto. Vendo-a tão melancólica, o loiro se resignou. Se ela preferia manter o que a afligia em segredo, devia respeitá-la.

 

Chegando ao lado de fora, Judal atravessou a rua sem ao menos olhar para o semáforo verde ou para os lados. Ele só percebeu o carro que vinha em alta velocidade quando escutou o estridente som dos pneus freando bruscamente. A luminosidade dos faróis aumentando, ofuscando seus olhos, até que o carro parou a menos de meio metro dele.

— Seu idiota! Não olha por onde anda?!

Estalando a lingua, a única resposta que Judal ao homem que, furioso, colocava a cabeça para fora do veículo foi seu dedo médio.

Por sorte o outro não estava disposto a uma briga e decidiu seguir em frente, bufando. O mesmo fez Judal ao chegar em seu carro.

Sentou-se no banco do motorista e se encarou no retrovisor central.

Toda a região do olho direito permanecia arroxeada. Um dos diversos hematomas que havia ganhado após ter sido espancado. O que estava fazendo com a sua vida?

Saia daqui! Você é igual a eles! Não quero mais te ver! Suma!”

Apoiando a fronte no volante do carro, Judal rangeu os dentes. Como sentia raiva de si mesmo. Por que Hakuryuu havia dito aquelas coisas? Compreendia que ele podia estar confuso, mas como podia acusá-lo de uma forma tão injusta? Estava tão feliz pensando que havia, finalmente, encontrado alguém por quem poderia pensar em abandonar aquele estilo de vida criminoso.

Ele sabia o que devia fazer. Tomado pela aflição, a vontade se tornava incontrolável.  

Tateou o chão do banco que sentava e, além da pistola que Sinbad havia deixado consigo, havia um pequeno saco plástico, o qual o moreno rasgou. O pó branco se espalhou por sua mão e, esfregando os dedos, o levou até suas narinas.

Apesar de estar conseguindo evitar o consumo da cocaína, Judal sabia: aquele era seu maior vício.

Recostou a cabeça no banco e ali ficou, esperando o efeito daquela droga. Agora ele tinha certeza de que tudo ficaria bem.

 

Observava o lado de fora da janela. Raios rasgavam os céus enquanto estrondosos trovões ressoavam. Apertando os lençóis entre seus dedos, Hakuryuu se sentia culpado. Será que havia sido injusto com Judal?

Duas batidas à porta chamaram sua atenção e antecederam o momento em que Alibaba entrou em seu quarto.

— Hakuryuu?!

— Ah! Alibaba-dono!

A tristeza deu lugar à felicidade de rever seu amigo. Aquele que tanto tinha feito por ele há tantos anos ao seu lado.

— Como está?!

Em passos largos e com um grande sorriso, o loiro caminhou até o leito para cumprimentar Hakuryuu. Abraçou-o com cuidado, mas sem deixar de expor o quão feliz estava por vê-lo bem.

— Melhorando. - Hakuryuu sorria. - Alibaba-dono, eu tenho que pedir perdão. - meneando a cabeça, ele evitou encará-lo. - Saí de sua casa, o preocupei e… e terminei aqui. Não preocupei apenas você, mas a to..

— Não tem nada que me pedir desculpas, Hakuryuu! - Alibaba o interrompeu, segurando firmemente a mão de seu amigo. - O que importa é que está bem! Judal o ajudou!

Hakuryuu só fez engolir a seco ao ouvir o nome daquele que despertara tantos sentimentos nele e, ao mesmo tempo, despertava também o temor de poder estar sendo vítima de mais uma trama de sua família. Será que poderia confiar em Judal tanto quanto… confiava em Alibaba?

— Algum problema?

Os olhos cor-de-mel refletiam preocupação ao ver Hakuryuu agir de uma maneira tão estranha ao ouvir o nome de Judal ser mencionado.

O moreno fitou de canto sua prima, que não havia dito uma palavra sequer até então e Alibaba conseguiu entender, então, a inquietude na expressão de seu amigo.

Era óbvio que Hakuryuu não confiava em Kougyoku para contar algo pessoal, ainda mais algo tão íntimo. O silêncio perdurou e Alibaba, inquieto, pensou em alguma forma de amenizar aquela situação.

— K-Kougyoku, não vai falar com o Hakuryuu?

— Fico feliz que esteja bem, primo. - ela contorceu o lábio, um sorriso contido. - E sinto muito…

Alibaba parecia feliz ao vê-la parecer tomar a culpa do feito de seus irmãos. Era nítido como ela era contra aquelas atitudes inescrupulosas de sua família.

— Obrigada, Kougyoku. E… obrigado por vir me visitar também. - Hakuryuu sorriu.

— Desculpe termos demorado a vir. - Alibaba retomou a palavra. - Tanta coisa aconteceu nos últimos dias…

— Não se preocupem. - o moreno ainda sorria. - Devem estar bem atarefados, afinal, falta pouco para o casamento de vocês, não? - ele tentava ser simpático.

O casal se entreolhou e Kougyoku parecia ainda mais desconfortável, massageando a própria nuca ao desviar do olhar de seu noivo e de seu primo. Hakuryuu parecia confuso. Será que não estavam mais noivos?

— Na verdade, Hakuryuu, - Alibaba começou. - Kouen pediu que adiássemos o casamento por mais dois meses, já que no mês que vem ele vai se casar com...

O par azulado cresceu. Não podia acreditar no que estava ouvindo. Tão rápido? Por quê?

Agora, mais do que nunca, todos os atentados que sofrera faziam sentido. Afinal, sendo Hakuei a única herdeira de toda a fortuna de sua família, era óbvio que Kouen precisava tirá-lo do caminho e se casar o mais rápido possível.

— Não pode ser! - ele cerrou os punhos.

O nervosismo de Hakuryuu se refletiu nos aparelhos que monitoravam seus sinais vitais,, o que deixou Alibaba apreensivo.

— Oe, Hakuryuu, acalme-se! - ele pediu, tocando o ombro de seu amigo.

— Alibaba-dono, você não entende! Não posso permitir que esse casamento aconteça!

— Mas… sua irmã ama o Kouen, não é?

— Não interessa! Ele não a ama! Está apenas querendo o dinheiro que pertence a ela!

Hakuryuu bufou, recostando-se nos travesseiros. Apertou os olhos, sentindo o fôlego lhe faltar, quando o loiro o afagou, tentandoa acalmá-lo.

— Você precisa descansar. - lembrou.

— Eu só vou descansar quando tirar minha irmã das garras desses miseráveis, Alibaba-dono!

 

—----xxxxxxxx-----

À meia-luz provida pelos poucos abajures acesos naquela ampla biblioteca, Kouen tentava ler um pouco, porém parecia impossível. Revirava os olhos, apertando o livro em mãos.

De vez em quando deixava um gemido escapar e fitava o que havia debaixo da mesa antes de tentar retomar à leitura.

Quando então duas batidas antecederam a abertura daquelas portas duplas.

Mantendo-se impassível, mesmo diante da situação constrangedora que apenas ele sabia estar passando, o empresário observou a bela mulher que adentrou a biblioteca. Por mais que não se sentisse atraído por sua única prima, tinha de admitir que ela era dotada de uma beleza especial, sendo filha de quem era.

— Com licença.

Hakuei tinha um pequeno sorriso em seu rosto, um tanto quanto tímido, quando, sutilmente, se aproximou. Apenas ver seu noivo lhe deixava tão feliz.

— Estou ocupado. - ele disse ao suspirar e retomar a atenção ao que lia.

Hakue temia incomodá-lo, mas mesmo receosa, a jovem seguiu apenas até a cadeira adiante da mesa que os separava. Apoiou suas mãos nas costas daquele móvel.

— Prometo ser breve, Kouen-sama.

— Diga logo então, por favor.

O ruivo não fazia a menor questão de encará-la, ignorando-a completamente. Mas Hakuei entendia aquilo como a personalidade forte de seu primo e agora noivo. E, de certa forma, aquela altivez e agressividade a atraíam.

— Eu vim fazer um pedido.

Kouen arqueou uma sobrancelha antes de, convencido a ouvi-la, fechar o livro e depositá-lo sobre a superfície de mogno.

— Disse que eu tinha o direito de escolher um padrinho e uma madrinha para nosso casamento.

— Uhum. - foi tudo o que respondeu.

— Então eu vim dizer que eu escolhi a sua irmã, Kougyoku, e… o Hakuryuu.

Se ele tinha alguma intenção de disfarçar seu espanto e indignação, falhou miseravelmente. A perplexidade estava nítida em seu rosto e, de fato, imaginava que aquela mulher não fosse dotada de mínima inteligência para propor algo assim. Não havia notado ainda que faziam de tudo, absolutamente tudo, para se verem livres de seu irmão?

— Hakuryuu? - o ruivo mordeu o próprio lábio após repetir aquele nome.

— S-sim! E… como também não teria meu pai nem… meu sogro para me acompanhar no altar, eu adoraria que Hakuryuu me levasse até você, Kouen-sama. Ele… está tão crescido, - um sorriso terno cruzava seus lábios. - me lembra tanto Hakuyuu.

Hakuei falava com tanto carinho e parecia ter planejado tanto dizer aquilo. Os olhos azuis brilhavam, tomados pela emoção. Como ela amava o irmão! Parecia tão importante para ela que nem mesmo Kouen parecia capaz de negar aquele pedido. Porém, precisava encontrar outra saída.

— Certo. - ele a encarou. - Mas você acha realmente que ele vai aceitar?

A moça piscou, surpresa com o questionamento de seu noivo.

— Mas… Por que Hakuryuu não aceitaria? Assim como desejo sua felicidade, ele deseja a minha. - parecendo bastante certa do que dizia, Hakuei voltou a sorrir. - Inclusive, Kouen-sama, eu gostaria de saber se… após nosso casamento permaneceremos aqui ou nos mudaremos? Se… se nos mudássemos, eu gostaria que… levássemos Hakuryuu conosco.

As coisas estavam indo longe demais. Se já não bastasse ter que ver aquele garoto, a quem considerava uma peste, em seu casamento com alguém com quem não tinha a menor vontade de partilhar uma vida, agora Hakuei pedia para que abrigasse Hakuryuu?

Não pôde esconder o desagrado ao ouvir aquele pedido e a jovem, contida, instintivamente deu um passo para trás, arrependida de suas palavras.

— M-Me perdoe pela minha audácia, é que… Hahaue-sama e Hakuryuu estão sempre em conflito.

— Isso é um problema que ambos tem que resolver, Hakuei. - o ruivo suspirou. - Ele já é um adulto que tem que resolver seus problemas.

— E-entendo. - ela gaguejou. - Eu vou visitá-lo no hospital e falar com ele, então.

— Nosso casamento é daqui a duas semanas. Acha que ele estará em condições? - não custava tentar, mais uma vez, evitar aquele mal-estar naquele dia que já lhe dava dores de cabeça apenas de pensar sobre.

— Ele irá com certeza, Kouen-sama! Muito obrigada!

Hakuei se curvou, não conseguindo conter a enorme alegria que a invadia. Era a realização de um sonho se casar com o amor de sua vida e ter a honra de ser acompanhada até o altar por seu tão querido irmão caçula. Certamente seus irmãos e seu pai estariam felizes, onde quer que estivessem, ao vê-los juntos neste momento.

Assim que se reergueu, a moça pediu licença e se retirou da biblioteca. E era o que faltava para que Kouen fosse presenteado, mais uma vez, por aquela série de intensas sensações que culminaram, rapidamente, no inevitável, talvez devido à adrenalina que a presença de Hakuei trouxe.

— Enfim…

Aquela bela mulher saia debaixo da mesa, limpando com as costas da mão o líquido esbranquiçado que escorria de seus lábios.

Bela e odiosa, ela sorria com malícia ao encarar um apático Kouen. Nem mesmo parecia ter tido um orgasmo há alguns segundos.

— Acho que estou ficando com ciúmes de você com minha filhinha.

Ela comentou, sentando-se nas pernas do ruivo.

Gyokuen enlaçou com seus braços o pescoço de seu sobrinho e amante.

— Não sei porque. - ele apoiou o queixo em uma mão. - Sabe que não sinto nada por ela.

— Nem por mim… - a mulher riu, deslizando as longas unhas pelo rosto de feições grossas. - exceto desejo, não é? - ela completou.

— Exato. - suspirou Kouen.

— Mas não vai poder se sujeitar a não cumprir suas obrigações como marido com minha filha, afinal, quero ter vários netinhos também. - Gyokuen ria enquanto afundava os dedos nos fios avermelhados. - Já que Hakuryuu agora se revelou gay, minha única esperança de ter netinhos são vocês!

— Como se você realmente se importasse com isso…

Gyokuen então se levantou, ajeitando a longa camisola de renda preta, ridiculamente fina a ponto de deixar seus seios completamente amostra. Exibia-se sem a menor cerimônia, afinal, adorava ver não só Kouen, mas todos babando por sua beleza.

— Está tão angustiado com Hakuryuu em seu casamento por quê?

— Você se esqueceu que era para Hakuryuu estar morto? - retrucou.

— Como é ingênuo, Kouen. - ela sorria. - Pense que podemos ter duas festas no mesmo dia. Seu casamento com Hakuei e o velório do meu querido Hakuryuu!

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Mal houve tempo para ligar o interruptor.

Adentraram o apartamento se atracando. O pescoço do mais mais baixo era alvo de beijos e mordidas enquanto que as mãos do delegado já iam arrancando suas roupas.

— S-Siiin…

Ja’far tentava tirar as mãos que invadiam suas vestes, arrebentava os botões da blusa social. O terno e o colete já haviam ficado no capacho.

— Podem nos ver das câmeras do...

A fala foi cortada pela estrondosa batida da porta. Sinbad a fechou de qualquer jeito enquanto continuava a desfrutar de Ja’far. Afinal, há quanto tempo não se amavam! Finalmente teriam uma folga no dia seguinte e tudo o que o delegado podia querer era aproveitar o máximo seu inspetor.

— Pronto, ninguém mais vai nos ver! - o moreno agarrou Ja’far pela cintura. Verdes e dourados conectados. - Só você e eu agora!

— E não pode esperar? - Ja’far riu. - Vou encher a banheira enquanto você pede a comida japonesa que me prometeu hoje.

Ele facilmente escapou entre os braços de um desolado Sinbad, que bufou. O moreno só pôde observar enquanto Ja’far seguia em direção a suíte.

— E se o entregador chegar enquanto estivermos ocupados? - ele quase gritou, para que seu amado pudesse ouvir, mesmo em um cômodo mais distante.

— Esperaremos a comida e nos alimentaremos bem para que você faça bonito mais tarde, Sin! - o alvo exclamou.

Sinbad farfalhou os fios púrpura. Definitivamente não se conformaria em não ter algum momento íntimo com Ja’far aquela noite. Em paralelo às investigações contra a máfia da família Ren, que tanto havia avançado, duas operações cansativas naqueles últimos dias os deixaram completamente exaustos. Mal haviam voltado para casa.

Seguiu até a suíte e se surpreendeu com Ja’far tirando a própria gravata e desabotoando a blusa de mangas compridas.

Ficou parado ali, no batente da porta, admirando seu tesouro mais precioso se despir. A pele tão branca e leitosa, macia, refletia nos olhos dourados.

Mas assim que Ja’far se viu observado, Ja’far puxou do suporte a toalha mais próxima. A pele clara avermelhou ao ver aquele sorriso bobo nos lábios do delegado.

— S-Sin! O que está fazendo aí?!

— Te admirando, ué… - ele respondeu com simplicidade.

— P-Por que ainda não veio também? - tímido, Ja’far tentava se esconder ainda mais.

— Quem o vê  agir assim pensa que eu nunca o vi nu! - Sinbad ria.

— Já pediu minha comida japonesa? - cruzando os braços, Ja’far fez bico.

— Se eu pedir logo, você promete que não me deixa esperando mais?

Ja’far o encarou, contorcendo os lábios antes de sorrir e assentir. Como amava aquele homem!

Assim sendo, Sinbad puxou o celular de dentro do bolso da calça, mas assim que o fez, o aparelho tocou.

— Quem é? - Ja’far perguntou enquanto o mais alto observava a tela.

— É da delegacia. - respondeu.

Um tanto quanto preocupado, Sinbad atendeu para ouvir a voz de um de seus assistentes. Era Sharrkan, que parecia bastante preocupado.

— Me desculpe incomodar essa hora, delegado, sei que você e o Ja’far-san estão de folga a partir de hoje, mas… recebemos uma denúncia por perturbação de sossego.

— Hm? Normal uma ocorrência dessas a essa hora. - Sinbad não entendia o porquê de estar sendo comunicado daquilo. - Bem, levem muitos cassetetes e tasers. Deve ser um bando de arruaceiros. E levem o Masrur também, claro. - instruiu como costumava fazer.

— S-sim, mas o problema não é esse. Não é por isso que estou te ligando.

— E então? - o moreno estava inquieto. Por que Sharrkan não desligava de uma vez para que pudesse ficar com Ja’far?

— Pelo que indicaram não é só no prédio daquele conhecido seu, o Judal, mas desconfiam que a desordem venha do próprio apartamento dele.

— Judal?! - Sinbad estava surpreso. Ja’far, ao seu lado, preocupado. - Tsc, me dê mais detalhes...

O inspetor nada entendeu quando seu superior saiu da suíte. Seguiu aquele que buscou as chaves do carro, as quais havia deixado sobre a mesa de centro da sala e o terno que havia ficado no carpete de entrada.

— Sin, o que aconteceu?! - ele estava preocupado.

Desligando o celular, Sinbad terminou de se vestir apropriadamente.

— Os vizinhos denunciaram que o apartamento do Judal está com uma música alta desde a manhã, fora que o cheiro de maconha chamou a atenção deles. Parece que ele não atende o interfone, o telefone e nem quem bata em sua porta. - ele suspirou. - Perdão, Ja’far, eu tenho que ir.

— Meu Deus… - Ja’far balançou a cabeça. - Não se preocupe, eu vou com você!

— Não precisa! Eu que… tsc, que me sinto responsável por ele!

Assistindo Ja’far correu para se arrumar novamente, Sinbad esfregou o rosto com as mãos. O que teria acontecido? Será que Judal estava bem? Preocupava-se tanto. Afinal, Serendine e ele haviam cuidado de Judal como um filho, e ele só podia imaginar como estaria decepcionada sua falecida esposa ao ver que aquele que tanto estimava havia se tornado um traficante, um delinquente.

Não demorou muito para que seu inspetor se aprontasse e como ele agradecia aos céus por tê-lo ao seu lado. Sabia como Ja’far estava cansado, trabalhando intensamente não só no campo, como ele, mas também auxiliando nos setores administrativos.

— Eu dirijo! Você tenta ligar para ele! - Ja’far orientou.

Sinbad só pôde concordar enquanto tentava entrar em contato com Judal.

Será que Hakuryuu não sabia o que tinha acontecido? - perguntava-se. O melhor seria ligar para ele, já que Judal não atendia. Porém, após tentar mais de cinco vezes, quando Ja’far já manobrava o carro para saírem do estacionamento do prédio, Sinbad desistiu.

 

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A enfermeira abriu a porta de seu quarto naquele hospital para que sua irmã, que conduzia a cadeira-de-rodas na qual estava sentado, o trouxesse de volta.

Hakuryuu sorria abertamente. Estava tão feliz! Finalmente podia ao menos sair daquele quarto, mesmo que ainda não estivesse permitido andar, e justamente quando respirava um pouco de ar puro, recebia a visita de Hakuei.

— Quer ir para a cama já, Hakuryuu-san?

— Não, não. - ele balançou a cabeça negativamente. - Quero ficar mais tempo assim com a minha irmã.

— Nada de mais passeios por hoje, ok? - a jovem sorriu antes de se curvar e deixá-los a sós.

Assim que ouviu a porta bater, Hakuei se agachou diante de Hakuryuu, segurando sua mão firmemente. Os pares de safiras, cópias um do outro, se refletiam.

— Ah, meu irmão! Como estou feliz em vê-lo bem!

— Aneue… - ele afagou os longos cabelos da moça. - E eu estou muito feliz que tenha vindo me visitar!

— Tentei vê-lo assim que chegou aqui, mas não foi possível. - Hakuei o encarou, acariciando a bochecha daquele que tanto estimava. - Mas vejo que já está bem melhor, não? Encontrei você dando voltinhas pelo hospital! - ela ria.

— Na verdade hoje foi o primeiro dia que o Sphintus-sensei me deixou sair do quarto. - explicou. - Eu queria mesmo era sair daqui… E me perdoe por não ter conseguido me ver antes, aneue, foi uma questão de segurança… Sinbad-dono tem me ajudado muito.

— Não vamos falar disso, ok?

Hakuei propôs num tom totalmente diferente do qual estava falando. Como se a doçura tivesse sido extirpada de seu tom de voz e de suas feiçoes. Parecia até mesmo irritada.

— Aneue…

— Aquele homem vai pagar caro por ter impedido nossa mãe de lhe ver. Sabe como ela ficou preocupada, Hakuryuu?

— Anh?! - incrédulo, ele balançava a cabeça. - Nossa mãe esteve aqui para tentar me matar mais uma vez, se você não sabe!

— CHEGA!

Assustando-se com o exclamar de sua irmã, Hakuryuu foi surpreendido pelo forte abraço que recebeu. Hakuei tremia, parecendo desesperada ao apertá-lo em seus braços.

— Por favor, Hakuryuu! Por favor! Não diga mais nada disso!

Ele sentia as lágrimas da mais velha encharcando seu ombro. Aquilo partia seu coração. Como odiava vê-la chorar, vê-la sofrer.

— AAneue… - gaguejando, Hakuryuu não soube como reagir.

— Não diga mais nada, por favor! Se… - ela se afastou para encará-lo. - Se você insistir nisso, Hakuryuu, nossa mãe vai insistir que você está louco! Ela quer te internar em um manicômio, Hakuryuu!

— Q-quê?! - Hakuryuu empalideceu.

— Se continuar insistindo nessas loucuras, Hakuryuu, eles vão te internar e eu não quero que te tirem de mim! Nem quero que enlouqueça! Por favor, eu imploro! Por mim! - desesperada, Hakuei não conseguia conter suas lágrimas. Encarava seu irmão com tanta piedade. - Eu entendo que… que a morte dos nossos irmãos foi um golpe muito duro para você e… que você nunca conseguiu aceitar e começou a… devanear coisas que não existem! Mas você tem que parar de mentir para si mesmo! Senão…

Hakuei parecia completamente transtornada, mas determinada a salvar Hakuryuu daquele cruel destino. Jamais se convenceria da loucura que era tão evidente a todos de sua família. Acreditava que, com seu carinho, Hakuryuu poderia “se curar” de toda aquela revolta que o fazia criar eventos, situações que ela sabia, ela tinha certeza, jamais aconteceram.

— A-Aneue, eu nunca menti quanto isso, você… Você sabe que quem pôs fogo na empresa foi...

Shhh!!!

Acolhido naqueles braços, Hakuryuu só pôde se entregar à tristeza.

Simplesmente não conseguiria convencer sua irmã. Ela tinha plena certeza de que tudo o que passava com sua família era fruto de sua imaginação. E, bem ou mal, em sua tola ingenuidade, ela era a única que realmente o amava e desejava seu bem.

Sentia-se tão só. Seu peito doía tanto.

Tudo parecia tão surreal que, realmente, era como se estivesse louco. E como queria estar, de fato, vivenciando uma loucura e não ter conhecimento de que sua realidade era tão, tão ruim. Adoraria ter delirado a morte de seus irmãos e todas as atrocidades pelas quais já havia passado.

Acabou cedendo às lágrimas, sentindo-se tão confortável no abraço de Hakuei. Aquela que havia sido muito mais sua mãe do que a própria. Quem lhe cuidou, estimou, amou.

Ficaram assim, abraçados, por um tempo até que sua irmã se afastou, segurando as maçãs de seu rosto e aproveitando para, com a ponta dos dedos, secar suas lágrimas.

— Vai ficar tudo bem, Hakuryuu! Você vai melhorar e… vamos ser muito felizes, certo?

Não havia outra escolha que não fosse acatar aquela insanidade sugerida por ela. Hakuryuu apenas assentiu, desfrutando do único apoio e carinho que jamais suportaria perder.

— Mas… vamos falar de coisas felizes. Eu vim aqui… para fazer um convite muito especial para você. - secando as próprias lágrimas, ela esboçou um sorriso. - Quero que seja padrinho do meu casamento com o Kouen-sama.

— Aneue… Aquele homem não te ama. - Hakuryuu sussurrou.

— Claro que me ama, Hakuryuu. Foi ele que me pediu em casamento. Você… - ela sorriu. - um dia você vai entender, certo?

Hakuryuu repetiu seu gesto anterior, acatando o que ela lhe dizia. Como poderia contrariá-la? Depois da última briga que tiveram, perder o apoio de Hakuei era algo que não suportaria.

— Eu quero muito que entre na igreja comigo! Vai me levar até o altar… como o Hakuyuu-oniisan faria se estivesse vivo, certo?

Ao mesmo tempo em que se emocionava com a consideração de sua irmã por alguém como ele, tão rejeitado, Hakuryuu se sentia entre a cruz e a espada. Como poderia conduzir sua irmã àquele homem inescrupuloso, que tanto a faria sofrer?

— Eu não sei se vou sair do hospital até lá, aneue… - foi a melhor desculpa. Kouen provavelmente riria se soubesse que Hakuryuu havia apelado para os mesmos argumentos.

— Se não puder andar ainda, não tem problema se for assim! Eu mesmo o conduzirei, mas… - ela juntou as mãos de seu irmão entre as suas, seus olhos marejados imploravam. - Por favor, Hakuryuu! Você é tudo o que eu tenho! Eu preciso de você nesse momento tão importante!

 

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Como Sharrkan havia lhe descrito, era possível ouvir o som por toda a vizinhança.

Ja’far estacionou o carro do outro lado da calçada do condomínio e já podiam ouvir a música alta.

E mal seu inspetor parou o veículo, Sinbad abriu a porta para sair. Estava aflito.

— Sin! - o alvo exclamou, chamando sua atenção. - Está esquecendo seu coldre. - ele apontou o porta-luvas.

— Não vou precisar disso!

Foi tudo o que o delegado disse antes de deixar o carro. Ele não estava ali para prender ninguém. E sendo assim, ele fez questão de não se identificar como policial na portaria, e sim como um amigo do morador do prédio 1252.

Pelo elevador, rapidamente chegaram ao décimo segundo andar.

Sinbad seguia na frente, um tanto quanto afoito, e como aquilo incomodava Ja’far. Sabia que quando aquele que conhecia tão bem se deixava levar pelo emocional, ele perdia o foco.

O delegado tocou a campainha uma, duas, três vezes. Nada.

Muito provavelmente Judal nem tinha escutado, afinal, aquela música tão alta não permitia.

— O que faremos? - Ja’far perguntou.

— O óbvio.

Tomando impulso, não foi muito difícil para que, na segunda tentativa, o moreno conseguisse arrombar aquela porta.

Ja’far entrou logo atrás, esse bem mais cauteloso, enquanto analisavam o ambiente completamente vazio. Alguns objetos estavam jogados no chão.

O alvo imediatamente começou a tossir ao sentir o forte cheiro de erva que havia sido queimada ali. Sinbad agitava o braço, tentando dispersar aquele odor, enquanto seguiu para dentro do apartamento que conhecia muito bem, afinal, aquele era o antigo apartamento de Serendine, o qual ela havia deixado para Judal depois que se casou com o delegado.

Ja’far desligou o aparelho de som, mas aquilo não chamou a atenção de ninguém. Seguindo Sinbad, encontraram roupas, sapatos, cacos de vidro e até mesmo uma televisão derrubada no chão do corredor.

Será que era uma cilada de Kouen? Haviam levado Judal? Depois do que haviam encontrado naquele cativeiro, não duvidavam de nada.

E acompanhando o forte cheiro da droga, Sinbad e Ja’far chegaram ao quarto principal daquele espaçoso apartamento. Sacos transparentes rasgados deixavam um pó branco espalhado pelo carpete.

Foi quando chegaram ao closet e viram Judal de pé, mas curvado, com a cabeça abaixada sobre a penteadeira central.

Tapando uma das narinas, ele aspirava aquela fila formada com aquele mesmo pó que tinham visto antes.

Ja’far cobriu os lábios, extremamente chocado ao vê-lo erguer a cabeça. Suas conjuntivas estavam tão vermelhas quanto suas íris costumavam ser. Ainda havia resquício daquele pó em suas narinas, as quais ele constantemente coçava, sentindo uma comichão como se estivesse com uma alergia.

Demorou para que finalmente notasse a presença dos dois ali.

— Aaaaah, foi você que tirou minha música, Sinbaaaad?

Ele ria, tropeçando em suas próprias pernas.

Tirou do bolso da calça larga que vestia mais um cigarro feito artesanalmente e um isqueiro. Mal conseguindo ficar de pé, ele caiu sentado, de costas para uma das portas dos armários.

Sinbad ficava arrasado ao vê-lo naquele estado. Lembrava-se o quanto Serendine o estimava, o quanto Judal era um rapaz inteligente e que fizeram de tudo, absolutamente tudo para lhe dar um futuro digno. Uma família, estudo, apoio.

Lembrava-se de tê-lo visto apenas uma vez em um estado tão deplorável como aquele. Foi justamente quando Serendine faleceu.

E talvez por tê-lo criado tanto ao lado dela, às vezes Sinbad assumia uma postura paterna que não lhe pertencia e que costumava irritar muito Judal. E foi daquela forma que ele decidiu se aproximar do rapaz.

— Judal, o que pensa que está fazendo?

Encarando-o com seriedade, Sinbad cruzou os braços. Ele tinha de se conter, pois sua vontade real era a de esmurrar Judal o máximo que pudesse.

— Não sabe ver? Nunca fumou um baseado, Sinbad? - ele ria, tragando o cigarro já aceso.

— Olha só pra você! - angustiado, Sinbad não se conteve. - O que acha que Serendine pensaria se te visse assim?

— Ela não pode me ver e sabe por quê? Porque ela morreu porque você - não - conseguiu - protegê-la. - Judal praticamente sibilou, a risada sempre presente.

Ja’far estava angustiado ao ver Judal falar aquelas coisas tão cruéis e que ele sabia tão bem que afetavam demais Sinbad, mas precisava conter o delegado, pelo seu próprio bem.

— Sin, não dê ouvidos. Vê como ele está drogado!

— Mas eu ainda estou aqui, Judal! - batendo um pé no chão, ele tentava manter a calma. - E você acha que nós te ajudamos para vê-lo nesse estado?

— Ahhh, vai se foder, Sinbad… Você é um merda que joga isso na minha cara o tempo todo e pra quê? Acha que vou abanar meu rabo pra você? Você não conseguiu proteger nem a sua mul…

— Porque foi você que a atraiu para uma armadilha, não foi, Judal?!

Sinbad vociferou, furioso. Ja’far, apavorado, assistia o delegado dar dois passos a frente em direção a Judal, que arregalou os olhos antes de sua surpresa se converter em ira.

— DO QUE ESTÁ FALANDO?!

— VOCÊ SABE QUEM MATOU A SERENDINE! - gritou o delegado, possuído por uma ira que Ja’far jamais tinha visto antes naquela expressão. - QUANDO VOCÊ SE VENDEU PARA OS OUTROS, QUANDO REVELOU SOBRE NOSSA OPERAÇÃO E COLOCOU A SERENDINE NAS MÃOS DAQUELES CANALHAS!

— Sin! - Ja’far balançava a cabeça negativamente. - Por favor, acalme-se, Sin!

— VOCÊ TEM RAZÃO! - Judal o confrontou, levantando-se. - EU REALMENTE ENTREGUEI O QUE VOCÊS IAM FAZER, EU SABIA TODO O PLANO, MAS VOCÊ ERROU NUMA COISA, SINBAD!

Enfiando a mão no bolso da calça, Judal tirou dela a pistola que outrora lhe fora entregue pelo próprio Sinbad. Destravando-a, Judal a apontou na direção do delegado. Sua mão tremia, mas não ia errar, ele tinha certeza.

— AQUELE DIA NÃO FIZ AQUILO PRA SERENDINE MORRER! ERA PRA VOCÊ TER MORRIDO!

Não houve tempo para reagir. Nem mesmo Ja’far, que já desconfiava que Judal pudesse estar armado, esperava que ele, sob forte efeito de entorpecentes, pudesse ter um reflexo tão rápido.

Um único tiro ecoou por todo aquele apartamento. Um tiro disparado sem arrependimentos, mas que poderia custar muito caro.


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Notas finais do capítulo

Eu prometo que vocês não vão demorar a descobrir o destino desse tiro, ok? ♥
Como sempre eu adoro fazer cenas de discussão. É quando digito mais rápido e fico pensando em réplicas sem fim, com fúria, com raiva e escrever assim me faz bem. Talvez o mais gostoso para escrever, para mim, seja eu ter que transcrever a atitude de cada personagem.
Eu sempre tento, quando faço AU, trazer um pouco da história original para a fic. E impressionante como Hakuei insiste em ser sonsa em qualquer universo. Só essa mulher não vê o que está rolando? Eu me revolto com as atitudes que eu mesma descrevo! Hahaha!
Lembrando que elogios, críticas, comentários sempre são bem-vindos e respondidos! ♥



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