Beijo Escarlate escrita por Lailla


Capítulo 26
Mais ninguém




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Quando o sucessor atingisse a maioridade, seus vinte anos, ele se casaria com uma humana pelo trato que foi feito. Isso pelo menos antes de Ojii-san quebrar o trato com meu avô humano para libertá-los dessa obrigação. E isso foi o que aprendemos com Toshi-oji-san quando éramos crianças. Ele nos disse que agora quando o sucessor atingisse a maioria, no seu aniversário seria feita uma grande festa para ele conhecer todas as jovens do reino. Agora como as três grandes famílias viviam em apenas um lugar, as jovens dos três reinos participariam. E eu acho que era justamente isso que Ichiro tinha medo.

– Nee, Ichiro. – O chamei.

Ele lia um livro, como sempre.

– Nani? – Ele disse, ainda olhando para as páginas.

– O que você quer de aniversário?

– Não precisa me dar nada.

– Fala logo, baka. – Me irritei.

– Um livro novo.

Fiz cara de tédio.

– É sério.

– Eu estou falando sério. –Ele me olhou.

Suspirei.

– Tá... Onde eu vou conseguir um livro novo? – Me perguntava.

Todos os livros que tinha no reino tinham também na biblioteca. Onde eu conseguiria um livro novo para ele? Com certeza não era aquilo, aquele baka estava brincando comigo. Suspirei mais uma vez e quis mudar de assunto para não me irritar.

– Ne, está nervoso? – Perguntei.

– Com o que? – Ele disse olhando para as páginas.

– Com a festa. Sabe, você vai ter que conhecer todas aquelas garotas... Dançar com elas. Hum, isso vai levar a noite toda. – Pensava em voz alta.

– Vai ser inútil de toda forma.

– Nande?

– Não quero ninguém e nenhuma delas me conhece. – Ele disse, virando uma página.

– Momoko-chan te conhece. – Disse sorrindo.

Ele me fitou e viu meu sorriso que aos poucos ficava maroto. Ichiro às vezes não aguentava e achava graça.

– Pare com isso. – Ele sorriu levemente – Você sabe sobre as regras.

– Mas papai poderia revogá-las. – Pensava – Talvez... Seja possível. – Sorri.

– Não é, Haru. – Ele fechou o livro e me olhou – Não fique pensando em coisas impossíveis.

Acalmei o olhar, ficando cabisbaixa.

– Ichiro... Você bem que podia ter mais esperança. – Disse, me voltando para frente.

Ele acalmou o olhar.

– Gomen. Apenas não gosto de pensar em algo que sei que é impossível.

O olhei e abaixei o olhar. Ele suspirou e levantou.

– Ne, leia esse. – Ele jogou o livro para mim – É interessante.

– Hã? – O peguei, me assustando levemente – Hai.

– Hum. – Ele sorriu e se retirou.

Fiquei na biblioteca lendo e Ichiro começou a andar pelos corredores. Ele pensava e colocava as mãos nos bolsos, inexpressivo. Num momento, parou em frente à pintura da família. Era um corredor onde tinha as pinturas de todas as gerações da família real. A que estava ao lado era de vovô, vovó, Keiji-oji-san e papai, eles eram crianças. Ao lado dessa era papai, mamãe, Ichiro e eu, nós éramos crianças. E ao lado era uma com Keiji-oji-san, tia Seiko e Hana, que era criança. Ichiro olhava para nossa pintura, sua expressão era pensativa e ao mesmo tempo calma. Momoko chegou no corredor e o fitou, virando sem jeito e voltando a andar.

– Momoko-san. – Ele a percebeu.

Ela parou e se aproximou.

– Ichiro-sama. – Fez uma reverência.

Ele ficou surpreso.

– Por que a formalidade?

– Porque... – Ela pensava, corando levemente. Nem Momoko sabia – Gomen. Apenas acho que deva ser assim.

– Hum, hai. – Ele se voltou para a pintura – Mas eu gostaria que me chamasse pelo nome.

Ela corou.

– Hum. – Abaixou o olhar, se encolhendo – Etto... O que está vendo?

Ela se aproximou, fitando a pintura. Papai estava com a expressão calma, mamãe sorria contente, Ichiro sorria levemente com os olhos meio abertos e eu estava de mãos dadas com mamãe, sorrindo. Momoko viu a pintura e ficou admirada. Ichiro a olhou.

– Nunca a viu?

– Hum, já. Mas nunca reparei. – Ela disse – Ichiro...san é bem sério.

Ele deixou uma risada escapar por ela ainda ser formal.

– Hum, hai. Mas eu até que estou sorrindo.

– Hum. – Ela olhou para a pintura e sorriu levemente.

Ichiro a observava e acalmou o olhar, engolindo a seco e voltando a fitar a pintura.

– Ne, Momoko-san.

Ela o fitou.

– Hum... Meu aniversário será em breve.

– Hai. – Ela sorriu.

– E terá aquela festa. – Ele dizia, ela prestava atenção – Ne, você quer... Dançar comigo antes de cortarem o bolo?

Ela o olhou surpresa, arregalando os olhos aos poucos. A dança antes do bolo era vista como um dança especial, era a última antes de cortarem o bolo de aniversário e Momoko sabia disso, assim como todos.

– Uhm... Ichiro...san?

– Eu ficaria honrado de ter uma dança com você. – Ele disse com um sorriso leve, continuando a olhar a pintura – E até poderia dizer que ficaria feliz.

Ela corou levemente e voltou-se para frente, abaixando o olhar.

– Eu também ficaria feliz. – Ela murmurou.

Ele a olhou com o olhar calmo.

– Momoko-san.

– Hã? – Ela o olhou.

Ichiro pegou sua mão e a beijou gentilmente.

– Arigatou. – Ele disse gentilmente enquanto abaixava a mão dela.

Ela o olhava, admirada.

– Arigatou. – Ela sorriu levemente.

...

Eu estava na cozinha. Um lugar grande de cor branca e vários balcões com utensílios, bandejas e panelas. Eu fui sorrateiramente para as bancadas de doces e espionei por atrás delas para ver se não tinha ninguém. Levantei, me endireitando e peguei alguns doces, enchendo a sacola que carregava. Quando me virei para ir embora, Shiori-obaasan estava com os braços cruzados e me encarava. Ela era uma senhora pequena com cabelos grisalhos e tinha centenas de anos, literalmente.

– Haru-chan. – Ela me recriminou seriamente, me chamava como se eu fosse criança. Se bem que eu me comportava como uma de vez em quando.

– A-Anou...

– Como ousa invadir minha cozinha, menina! – Ela exclamou furiosa, se bem que é engraçado.

– A-Ah! Gomen! – Exclamei assustada – Ja ne! Ja ne!

Eu saí correndo enquanto ela tentava me acertar com uma panela. Quando cheguei nos corredores ri e entrei num dos túneis, atrás de um quadro com a pintura de uma paisagem. Fui para o rio e esperei por Yuuro, queria fazer uma surpresa a ele com os doces. Já estava nevando e a paisagem ficava linda com o branco que cobria a grama e os galhos das árvores. Eu vestia um vestido azul com mangas justas e cumpridas e um cachecol vermelho. Alguns minutos depois ele chegou e sorriu pra mim. Eu sorri contente e levantei, indo até ele. Nos sentamos ao lado de uma árvore e eu mostrei a sacola cheia com um sorriso largo.

– Hã? Nani? – Ele a fitou sem entender.

– Entrei escondida na cozinha e peguei alguns. – Disse, mexendo na sacola – Ne, toma.

Eu dei um doce a ele e Yuuro o analisava como se nunca tivesse visto. Era um pão doce com açúcar em cima.

– O que é isso? – Ele perguntou.

– Pão doce, é gostoso. – Sorri.

Ele o aproximou da boca e deu uma mordida, provando. Me olhou surpreso e sorriu ainda mastigando. Eu sorri e peguei um pra mim. Yuuro se aproximou e sentou ao meu lado. Fitei meu colar abaixo de seu cachecol e sorri, comendo meu pão.

– Arigatou. – Ele disse.

– Hum. – Sorri, dando mais uma mordida – Será que seus pais vão desconfiar se você levar alguns?

– Hai. – Ele riu – Mas com certeza eles iriam gostar.

– Hum. – Assenti.

Começamos a conversar enquanto comíamos e entrei no assunto do aniversário do meu irmão que estava se aproximando. Disse sobre as garotas que Ichiro tinha que conhecer e sobre ele escolher uma delas para casar.

– E ele não quer? – Yuuro perguntou.

– Não. – Disse – Ele quer ficar com Momoko-chan, tenho certeza que quer mordê-la.

– E não pode ficar com ela?

– Hum. – Balancei a cabeça – Somos as três grandes famílias reais. Os Kazuhiro, os Saburo e os Akihiko. Moramos no mesmo lugar, mas não podemos misturar as linhagens. São as regras.

– Ah... – Ele compreendeu, pensou e me olhou com os olhos arregalados – Haru... Como assim “Somos”?

– Eh?

– Você disse isso.

– Anou... – Virei o rosto, não contara que era uma princesa.

– Haru.

– Hum... Eu sou uma Kazuhiro... – Disse, apertando os olhos.

– Você é uma princesa?! – Ele exclamou assustado.

O olhei com vergonha.

– Hai... – Forcei um sorriso – E... Kazuhiro é a Família principal entre as três...

Ele me olhava com os olhos arregalados.

– Gomen nasai! – Juntei as mãos – Não pretendia contar... Escapou. – Disse frustrada.

– Hum... – Ele assentiu – O que aconteceria se nos descobrissem?

– Hum. – Pensei – O mais provável seria meu pai me trancar no quarto pra sempre. Com você nada. – Sorri.

– Ah... – Ele pareceu se acalmar e suspirou, o que me fez rir.

– Estava preocupado?

– Um pouco...

– Daijoubu. – Sorri.

Ele me olhou e sorriu.

– Ne, como assim seu irmão quer morder Momo... Hum...

– “Momoko-san”. – Sorri.

– É. – Ele sorriu – Vocês podem morder um ao outro? Isso não é estranho?

– Não. Se chama beijo escarlate.

Ele me olhava sem entender e eu sorri, achando graça.

– Normalmente casais fazem isso. – Expliquei – Os súditos dos Akihiko eram trogloditas, mas aos poucos começaram a se comportar. Os homens mordiam as mulheres sem nem ao menos pedir. Era uma coisa a respeito de se apaixonar pelo sangue, sei lá.

– Ah...

Eu mexi na sacola e descobri um último pão doce, dando a Yuuro com um sorriso. Ele o pegou e o comeu em silêncio, pensando.

– Ne, Haru. – Ele disse ao terminar.

– Hum? – Sorri.

– Alguém já... Anou... – Ele corou um pouco – Já mordeu você?

Processei e corei aos poucos, me voltando para frente e abaixando o olhar.

– Não... – Disse sem jeito.

– Você já mordeu alguém?

Corei mais e abaixei a cabeça, minha franja tampou meus olhos.

– Você foi o primeiro que eu mordi. – Confessei – Gomen.

Ele me olhou surpreso.

– Não precisa se desculpar.

– Não... Eu me descontrolei. – Disse sem olhá-lo.

Ele acalmou o olhar e sorriu, tirando seu cachecol e ajoelhando a minha frente, pondo as mãos contra a árvore e comigo ficando entre elas. O olhei em dúvida e o vi sorrir gentilmente, próximo a mim. Me encolhi e pus a mão cerrada na altura do peito.

– Nani...

– Pode fazer. – Ele disse.

– Eh? – Fiquei surpresa.

– Não tenho mais medo, eu sei que é você. – Ele disse gentilmente.

– Não posso... – Abaixei o olhar.

– Sabia? – Ele sorriu – Às vezes você deixa seus olhos vermelhos quando me olha. E eu sei que o pão doce não te alimenta.

– Gomen... – Disse envergonhada.

Ele pegou gentilmente minha bochecha e me fez olhá-lo.

– Eu quero que você faça. Quero... – Ele corou aos poucos – Que você morda só a mim.

Corei e abaixei o olhar. Ele acariciou meu rosto, fazendo eu me aproximar de seu pescoço. Encostei os lábios no pescoço dele e fechei meus olhos ao passo que ele fechou os dele. Abri a boca e o mordi, tentando ser o mais gentil possível. Ele rangeu os dentes um pouco e eu pus a mão em seu rosto, acariciando levemente sua bochecha com o dedo. Aos poucos ele relaxou a expressão enquanto eu o fazia.

Acho que ele nem compreendia completamente a importância e intimidade do beijo escarlate. Ele era humano e isso não o incluía, mas... Yuuro queria que eu apenas o mordesse e a mais ninguém. Aquilo fez meu coração acelerar. E eu fiquei feliz... Porque também não queria morder mais ninguém.


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