Beijo Escarlate escrita por Lailla


Capítulo 2
Aprendendo




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Mal consegui dormir na primeira noite. Acordei naquela grande cama quente e me senti fria, sozinha. Me sentei e fitei uma bandeja de café da manhã no criado-mudo. Acalmei o olhar e saí debaixo das cobertas. Bebi o suco e vi um bilhete na bandeja: “Aula na biblioteca às dez horas.”. Abaixei o copo lentamente me perguntando onde era a biblioteca. Depois de comer, troquei minha camisola rosada e pus um vestido claro de mangas compridas justas, sem decote e saia longa que chegava até meus pés. Saí do quarto e andei pelo corredor, não fazia ideia de onde ficava a biblioteca! Deveria ter chamado Fumiko para me ajudar, mas agora eu também não sabia voltar para o meu quarto. Suspirei arrependida e fitei um quadro na parede. Eram o rei e a rainha sentados no trono com seus dois filhos ao lado. Eu não conhecia o mais novo, mas vi que ele tinha os olhos escuros ao contrário de Shu, que tinha olhos azuis. Reconheci Shu, seu cabelo era um pouco comprido e no quadro ele estava levemente mais curto e o olhar sério. Acalmei o olhar e o analisei. “Ele sempre foi tão sério assim?”, pensei o olhando.

– Você não deveria estar na aula?

– Uh?! – Me virei e vi Shu – Uhm... Gomen! – Fiz uma reverência com medo.

– Tsc. Baka. – Ele reclamou com a testa franzida – Se endireite.

O fiz, mas mantive meu olhar baixo. Eu queria olhá-lo, o achava bonito, mas tinha receio.

– Eu... Não sei onde é a biblioteca.

– Segundo corredor à direita e primeira porta à esquerda. – Ele disse sem emoção.

– Arigatou.

– Hum. – Ele pôs as mãos nos bolsos e saiu andando, passando por mim.

Pus a mão na altura do peito e comecei a andar, abaixando-a em seguida. Se eu teria que me casar com ele, então... Como seria nossa relação? Suspirei pensando que com certeza passaria a maior parte da minha vida sozinha mesmo sendo casada. Encontrei a biblioteca e entrei olhando para as prateleiras nas estantes. Eram tantos livros! Cheguei num espaço aberto e vi uma mesa.

– Ah! Megumi-san! – Um homem com cabelo cinza e rabo de cavalo sorriu. Seus olhos não eram vermelhos.

– Ah... Hai. – Disse em dúvida.

– Sou Toshi. Então? Foi difícil para encontrar a biblioteca?

– Um pouco.

Ele deixou escapar uma risada e me fitou enquanto colocava alguns livros em cima da mesa.

– Ah. – Ele cantarolou – Vejo porque Shu-kun escolheu você.

– Eh?

– Você é bem bonita.

– Hum, arigatou. – Disse sem jeito – Mas acho que o príncipe me escolheu a dedo.

– Shu-kun é um jovem sério e não gosta muito de conversar, porém eu sei que ele não a escolheu a dedo. – Toshi disse.

O olhei em dúvida. Shu me escolheu de verdade?

– Bem, vamos começar? – Ele perguntou.

Assenti com a cabeça. Toshi sentou a minha frente e começou a aula da história deles. Haveria um espaço de tempo de dez meses até o dia do casamento e eu deveria virar uma dama culta e saber toda a história da família para que eu em breve me tornasse um deles.

A Família Kazuhiro se instalou na montanha há 500 anos com a liderança do maldoso rei Madokan. Por anos ele perseguiu as pessoas da vila. As matava e deixava seus subordinados fazerem o que bem entendiam quando a noite chegava. Essa época ficou conhecida como os cem anos do medo. A rainha de Madokan deu a luz a um menino: Tanaka. Quando ele cresceu, matou o pai enquanto dormia para se apossar do trono. Ele não era sádico, porém ainda matava para pessoas para se alimentar. Quando sua esposa deu a luz ao seu sucessor, Sadoka, ele cresceu e se tornou o rei. O líder da vila na época foi até a colmeia, como era chamado o lar dos vampiros, e pediu para falar com o rei. Ele, com medo dos olhos vermelhos por toda parte, pediu um trato para o término a caçada dos humanos. O rei consentiu, porém ele escolheu o que queria em retorno disso. Ele não achava as mulheres de seu reino o suficiente para ele e ouvira falar que a filha do líder era bem bonita. As condições seriam que dali para frente quando o sucessor do rei chegasse à idade adulta ele se casaria com a filha do líder dos humanos. Ele ficou receoso, mas aceitou o acordo. Sadoka casou com Tomoe e a transformou, começando assim aquele sacrifício que nos assolava.

– Você conhecia essa história? – Toshi perguntou.

– Apenas alguns fragmentos. – Disse com o olhar baixo.

– Não precisa abaixar o olhar assim. Sou seu professor e não o rei. – Ele deixou uma risada escapar.

Fiquei sem jeito, mas levantei o olhar. Percebi que ele usava óculos.

– Posso... Fazer uma pergunta? – Perguntei receosa.

– Claro.

– Por que... Alguns de vocês têm os olhos vermelhos e outros não?

– Ah, sim... Bem. – Ele pensou – Isso demonstra quando estamos com sede ou como se... “Ativássemos” a nossa força para uma luta, digamos assim.

– “Sede”? – Disse lembrando que vi vários olhos vermelhos – Mas eu vi alguns que não tem.

– Isso se dá por alguns possuírem um controle bom da sede, mas mesmo quando se tem centenas de anos deixamos escapar quando...

– Hum?

– Quando a pessoa é “apetitosa”, perdoe-me dizer.

– Ah...

– Um bom exemplo é o rei e a rainha. O rei mesmo com um controle perfeito da sede às vezes deixa transparecer como está tentado. A rainha é nova como vampira, ela consegue se controlar, porém deixa claramente transparecer como está com sede.

– Nova?

– Hai, Inori-sama...

Fumiko entrou na biblioteca de repente, fazendo uma reverência.

– Senhorita, está na hora do seu banho. – Ela sorriu gentilmente.

– Banho? – A olhei em dúvida.

– Sim, para o almoço com o rei, a rainha e os príncipes.

– Ah... – Gaguejei – Não sabia que comiam... – Disse sem jeito.

– É mais pelo sabor. A comida em si não nos nutre em nada. – Toshi deixou escapar um sorriso.

– Ah... Claro. – Disse sem graça, não sabia quase nada sobre eles – Com licença, então.

– Amanhã a aula será sobre as três grandes famílias. – Toshi fez um lembrete para si.

– Hai. – Disse, saindo em seguida com Fumiko.

Ela me guiou até um grande banheiro. Era claro e tinha uma grande banheira, que parecia mais uma piscina. Ela desamarrou meu vestido e o tirou, o que me assustou um pouco. Amarrei meu cabelo em um coque, envergonhada por estar nua na frente de outra pessoa, mesmo sendo do mesmo sexo. Fumiko já havia preparado a água e eu precisei apenas entrar. Ela pôs sais de banho dentro e a banheira logo ficou cheia de espuma. Aquilo era incrível, me sentia uma verdadeira princesa. Eu morava numa vila, o máximo de luxo que tínhamos era água quente. Fumiko pegou uma exponha macia e se sentou na beira da banheira, começando a esfregar levemente minhas costas. Corei um pouco, aquilo era tão estranho.

– Anou... Fumiko-san...

– “Fumiko”, senhorita. – Ela disse gentilmente – O rei me mandou ser sua empregada. Pode me chamar pelo nome.

– Ah... Hai. – Eu disse sem jeito – Eu posso... Fazer isso?

– Como, senhorita? – Ela não entendeu.

– Hum, me ensaboar.

– Como desejar, senhorita. – Ela me entregou a esponja.

– Megumi...

– Hum? – Ela me fitou em dúvida.

– Sou... Megumi. – Eu disse tentando dar um sorriso amigável – Minhas irmãs me chamam de Megu.

Fumiko sorriu e foi até as roupas que eu vestiria, arrumando-as.

– Fumiko...

– Hai, senhorita.

– Você sabe se o príncipe é... Gentil? – Perguntei sem jeito.

– Bem... Conheço Shu-kun desde criança. Mesmo com a expressão séria ele era uma criança alegre, educada.

– Mas e... – Abaixei o olhar – Como homem?

– Ah... – Ela corou – Bem... Isso eu não sei responder, senhorita.

– Hum... Claro. – Compreendi – Arigatou.

Eu não sabia e acho que Fumiko também não, mas Shu estava do lado de fora ao lado da porta ouvindo nossa conversa. Ele não demonstrava expressão, apenas prestava atenção com as mãos nos bolsos. Depois do banho, Fumiko me ajudou a me vestir. Era um vestido longo e lilás com mangas compridas. Não possuía nenhuma estampa, porém por cima eu vestida como se fosse um segundo vestido, que era completamente bordado e possuía mangas curtas. Ele se abria abaixou do quadril como um grande decote. Ela penteou meu cabelo e amarrou metade dele. Quando me vi no espelho percebi como era realmente bonita. Sorri alegre e fomos para o salão das refeições.

Quando chegamos, Fumiko fez uma reverência e se retirou. Eu fiquei sem jeito, mas caminhei até eles, que já estavam sentados.

– Megumi-chan! – O rei sorriu – Sente-se, por favor.

– Ah, hai... Majestade. – Fiz uma reverência.

Ele indicou a cadeira ao lado de Shu. Meu olhar estava baixo, mas eu vislumbrava a imagem que vi quando entrei. Era um grande salão com uma mesa comprida e cadeiras de cor dourada, o estofamento era avermelhado e bordado. Os pratos e talheres eram prateados, lindos. Além de ter velas por todo o salão e um lustre dourado magnifico.

– Megumi-chan, esse é nosso segundo filho: Keiji. – A rainha disse gentilmente, indicando-o.

– Muito prazer em conhecê-lo. – Eu disse fazendo uma revência com a cabeça.

– Ah... – Ele cantarolou com um sorriso malicioso, apoiando os braços na mesa – Já vi a razão de Shu ter escolhido você.

– Perdão? – Disse em dúvida.

Shu o fitou com o olhar sério. Keiji respirou fundo como se apreciasse uma fragrância.

– Seu cheiro... – Ele dizia como se fosse seduzido – É tão gostoso.

Corei o olhando surpresa. Shu franziu o cenho, parecia irritado.

– Comporte-se, Keiji. – A rainha disse em reprovação, bebendo algo na taça prateada.

– Gomen, gomen... – Ele cantarolou sadicamente – Mas Shu tem tanta sorte. Diga-me “Megumi-chan”, suas irmãs são tão lindas quanto você? – Ele sorriu maliciosamente.

Shu levantou de repente, fazendo barulho ao arrastar a cadeira e saiu do cômodo. Keiji riu se endireitando na cadeira.

– Keiji. – O rei disse – Pare de importunar seu irmão.

– Ele não gosta disso. – A rainha disse em reprovação.

– Gomen, prometo me desculpar. – Ele deu um sorriso largo e se levantou em seguida, indo embora.

– Perdoe-o, por favor, Megumi-chan. – A rainha disse gentilmente – Ele ainda é imaturo.

– Hum. – Balancei a cabeça tentando sorrir – Tudo bem.

Abaixei o olhar e os empregados nos serviram. Eu comia com o olhar baixo, cabisbaixa. A rainha me fitava.

– Algo errado, Megumi-chan? – Ela perguntou com tom de preocupação na voz.

– Hum. – Pensava – Acho que ele me odeia.

– Shu?

Assenti com a cabeça.

– Bem, ele sempre foi sério, mas creio que não a odeia. – Ela disse sorrindo gentilmente – Shu está tentando aceitar o fato de se casar.

– Aceitar? – A olhei em dúvida.

– Hai. – Ela disse gentilmente.

– Estamos fadados a nos casar com a filha do líder. – O rei disse – Não podemos nos casar com quem amamos por causa dos nossos antepassados.

A rainha o olhou com um sorriso maroto.

– Mas eu tive a sorte de me casar com alguém tão especial quanto minha rainha. – O rei disse com um tom engraçado.

Quis rir e deixei escapar um sorriso.

– Hum, o príncipe... Amava alguém?

– Não. – A rainha disse – Shu quase não sai do castelo. Creio eu que é justamente para não se apaixonar e ser magoado por ter um casamento arranjado.

– Ah... – Compreendi.

– E você? – Ela sorriu – Era apaixonada por alguém?

– Hum, não... – Eu disse sem jeito – Eu sabia que havia probabilidade de ser escolhida. Eram duas de três. – Deixei escapar um sorriso – Então eu passava bastante tempo em casa ou com meu pai. Lugares e pessoas que meninos não se aproximam. – Sorri.

O rei sorriu e a rainha deixou escapar uma risada.

– Hum, eu posso...

– Ah, claro! – Ela sorriu.

Levantei e fiz uma reverência. Ainda era de tarde e eu fui para a biblioteca ler algo. Passei por algumas prateleiras e tirei um livro para ver do que se tratava. Quando ia pô-lo de volta vi Shu do outro lado. Corei ao vê-lo e ele me olhou surpreso. Desviou o olhar e pôs o livro que segurava no lugar, tampando a visão para mim. Andou e passou pela estante.

– Ah... Anou! – Segurei a saia do vestido e corri até ele.

Ele não parou, me apressei mais e segurei na manga de seu terno, fazendo-o parar de repente. Ele parecia ter ficado surpreso, sem reação.

– Gomen! – Exclamei suavemente – Não queria atrapalhar.

– Hum, tudo bem. – Ele disse sem nem ao menos se virar.

Eu não sabia o que dizer, ele cerrou a mão e eu percebi. Voltou a andar, me fazendo largar sua manga. Foi em direção à porta e saiu da biblioteca. Abaixei o olhar, cabisbaixa. Será que a rainha tinha mesmo certeza de que ele não me odiava?

Passei a tarde na biblioteca e Shu não voltou. Na hora do jantar, ele não estava presente. Mesmo não o conhecendo direito, fiquei triste por ele não estar lá. Quando fui dormir, troquei de roupa e pus minha camisola rosada. Ela tinha alguns babados pequeninos no busto e mangas fofas com babados na borda. Deitei pensando se um dia ele deixaria de me odiar. Mas acho que era justamente isso! Ele também era obrigado a casar comigo assim como eu com ele. Ele estava praticamente passando pelas mesmas coisas que eu. Adormeci minutos depois, mas acordei de repente ao ver olhos vermelhos me fitando da frente da cama. Apertei os olhos e sentei assustada, ofegando. Não havia ninguém.

– Nani... – Pus a mão na cabeça.

Só podia estar ficando louca. Estava sonhando, não tinha outra alternativa. Tinha?


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