Tenebris escrita por Maju


Capítulo 22
Capítulo XXI


Notas iniciais do capítulo

HEY! TCHARAAAM, chego agora com um capítulo fresquinho e vou fingir que eu nem demorei tanto assim, okay? Sobre o que vocês lerão agora, esse capítulo não tem ação, ele é bem descontraído e eu achei interessante fazê-lo já que Draco e Hermione estão num frenesi todo, mas acho que vocês vão gostar, eu explorei muito os sentimentos dos dois o que tornou bem difícil de escrevê-lo.
Até lá embaixo!



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Ele. Odiava. Hermione. Granger.

Estavam em queda livre. Os relâmpagos iluminavam o chão a qual eles estavam prestes a se esborracharem, a grama começava a tomar forma, a chuva cortava seus corpos. Talvez Bellatrix berrasse acima deles, tentando pegá-los, mas Draco não podia dizer com certeza quando seus próprios gritos o impediam de ouvir qualquer coisa.

Se não fossem esmagados pelo chão ou se Bellatrix não os pegasse, ele próprio mataria a Sabe-Tudo.

Que ironia chamá-la de “Sabe-Tudo” quando ela os empurrara para fora da Casa dos Gritos, era o plano de fuga mais desastroso que ele já vira.  Seus neurônios deviam ter derretido com essa porcaria de viagem no tempo.   

Fechou os olhos se preparando para o impacto.

Ele odiava a...

Sentiu os dedos de Hermione agarrarem a lateral de sua camiseta encharcada. A queda pareceu congelar por um mínimo segundo. Então, sentiu um repuxo no umbigo, a visão e a audição se extinguiram e eles não estavam mais descendo.

 Granger!

*

O grito estava preso a sua garganta, Draco ainda sentia que caia, não. Abriu os olhos, estava de volta ao chão, os joelhos bambearam com sua repentina mudança de quase morte em queda livre para a terra firme.

Inclinou-se para frente com o estômago revirando, os sentidos ainda não haviam voltado por completo, pontos negros cegavam-no.

— Onde é que nós aparatamos agora, Granger? – perguntou logo se virando a procura de sua companheira suicida-assassina, mas sua resposta foi um som muito alto soando em seus ouvidos e novamente uma mão agarrando-o e o puxando para trás, Hermione.

Os dois tropeçaram no meio-fio, pulando para a calçada, a visão de Draco finalmente focou. Um monstro metálico passava a toda velocidade pelo lugar que eles estavam um segundo a trás, buzinando e lançando-lhes palavras que Draco acreditava não serem amigáveis.

— Que... Onde estamos? – repetiu a pergunta assim que a caixa metálica com rodas desapareceu. Ergueu os olhos e teve a visão de uma avenida iluminada pelas luzes amarelas dos postes e por letreiros antiquados das lojas que ainda estavam abertas. Eles aparataram no começo dela, próximos a um edifício residencial, onde, felizmente, não havia ninguém muito atento para vê-los surgindo do nada.  

Hermione respirou fundo, virando-se para a esquerda pela calçada e depois para a direita, o coração deu um salto no peito ao reconhecer o lugar que ela os havia trazido. Memórias emergiram do fundo de sua mente, já fazia um bom tempo desde que ela não andava por aquelas ruas, sua última visita fora há três anos quando sua avó estava viva.

Começava a se arrepender de ter aparatado.

Escolheu a direita e caminhou rapidamente, quase correndo. Havia um gosto amargo em sua boca, não queria observar os detalhes, tampouco lembrá-los. Draco apressou-se para acompanhá-la, encarando a lateral de seu rosto a espera de sua resposta.

— Estamos em Lancestter – ofegou ela – Eu vinha com... vinha aqui quando era pequena, nas férias.

— Uma cidade trouxa? – indagou Draco num tom incrédulo, olhando ao redor, alarmado – Por que é que você me trouxe para uma cidade trouxa, Granger? – Obsevou um grupo de jovens com garrafas nas mãos e sorrisos embriagados na porta de uma loja escura e de aparência suja, casais andando de mãos dadas passaram por eles, olhando-os de esgueira.

— Porque... – Ela parou, estreitando os olhos, sem uma resposta aparente – Eu não sei, Malfoy, foi o único lugar que minha mente se deixou levar. É difícil raciocinar quando você está caindo a dez metros de altura e tem uma assassina atrás de você – disse sarcástica agitando as mãos enquanto caminhavam – A propósito, de nada por salvar você. Duas vezes, só hoje.

— Ah, eu deveria agradecer por me jogar de uma janela e quase ser atropelado por aquele... – Draco enrugou a testa, não fazia ideia de qual era o nome – Por a aquela coisa? Talvez pudéssemos ter matado Lestrange, estávamos em vantagem.

— Aquilo se chama ônibus, é um meio de transporte trouxa. E você sabe que, mesmo sendo nós dois contra ela, estávamos em desvantagem, por pouco não perdemos a pedra.

Draco estagnou-se no meio da calçada, um senhor barbudo esbarrou em seu ombro, praguejando pelo garoto ter atrapalhado seu caminho, o loiro ignorou-o esperando que Hermione também parasse, ele queria discutir o que estava se passando na cabeça dela, Granger sempre tinha a palavra final e Draco estava ficando cansado de ser pego de surpresa. Mas a menina só percebeu que ele parara quando já estava a dois metros dele, bufando, voltou até ele com passos pesados, irritada.

— Então só vamos fugir e nos esconder dela? – contestou Draco, cruzando os braços – Até onde eu entendi, Bellatrix pode causar um verdadeiro caos estando aqui, no passado.

— Eu sei, mas acho que ela está mais preocupada em nos encontrar do que mexer com o passado, nós estamos com a pedra, somos um perigo para ela. Bellatrix só viajou no tempo por causa de nós, Malfoy – respondeu, Draco reparou em como ela não parava de mexer os pés, ansiosa.

— Ficaremos longe dela enquanto não pensamos em um plano – continuou, balançando a cabeça com veemência, decidida – Mas já sabemos o que temos que fazer, não é? Descobrir o que a profecia significa.

Draco suspirou, então eles deveriam se apressar antes que não houvesse presente para voltar. Na Casa dos Gritos, ele se convenceu de que não havia como ignorar os versos proféticos, havia sido o globo os trouxera para o passado, desvendando a profecia, talvez encontrassem uma dica de como destruir a relíquia da morte.

Enquanto Hermione tentava decidir o que fariam a seguir e checava se havia dinheiro trouxa suficiente para sobreviverem por pelo menos um dia ali, Draco concentrou-se na movimentação, do outro lado da rua havia uma banda tocando músicas ao ar livre, uma aglomeração de trouxas se formava ao redor dela, algumas jogavam dinheiro dentro de uma caixa quando paravam para ouvi-las. O homem com violino e a mulher tocando piano sorriram para ele. Draco desviou os olhos.

Além de serem perseguidos por uma assassina, Draco ainda teria que aguentar um tour pelo incrível mundo trouxa. Que animador.

Até começou a sentir falta da isolada e fria mansão Malfoy.

— O que fazemos agora?

— Encontramos um lugar para comer – disse a grifinória levantando a cabeça do interior de sua bolsinha.

Com a barriga roncando, aquele sim era um plano que Draco gostava.

Hermione tentou com muito afinco ignorar o aperto no peito e a sensação de que havia algo a impedindo de respirar normalmente. Ela fingiu que a cidade não existia ao redor dela, se concentrou em achar um lugar para comerem e de pôr um pé na frente do outro. Assim, as lembranças não voltariam, assim tudo continuaria trancado.

Assim, ela ficaria bem.

O Café da esquina de aparência antiga foi a opção deles, Hermione já o conhecia, mas ela fingiu que não.

O lugar tinha cheiro de pão e café fresco, pessoas se sentavam em bancos altos com estofado vermelho de frente ao balcão, com xícaras fumegando ao lado. Paredes de vidro possibilitavam a visibilidade do lado de fora. Hermione e Draco se acomodaram em uma das mesas arredondadas encostadas a parede da frente, uma garçonete sorridente lhes trouxe o cardápio.

Draco perdeu a atenção nos nomes dos pratos ao perceber que ele não fazia a mínima ideia do que eram, observou, por cima do papel, uma tela presa próxima ao teto que passava imagens do que parecia um tipo de jogo trouxa, os jogadores corriam atrás de apenas uma bola, o campo era um gramado como no quadribol, porém retangular. Um grupo de homens se reunia próximos à tela, praguejando e torcendo, batendo seus copos no balcão.

  Na filmagem, um dos jogadores caiu no chão segurando os joelhos e a torcida exclamou, o narrador gritava que era falta. O bruxo revirou os olhos, trouxas reclamavam muito, se vissem o quadribol... Não havia emoção num esporte jogado no chão.

Os jovens no café gritaram com a tela e derrubaram bebida no chão, Hermione virou-se para ver o que o estardalhaço.

— É futebol. Os jogadores tem que acertar a bola naqueles aros como no quadribol, mas não tem nada como os balaços ou o pomo de ouro – explicou voltando-se para ele novamente. Draco torceu o nariz.

— Chato. E pelo visto os torcedores são uns idiotas – comentou indicando o grupo com o queixo – Ou todos os trouxas são assim?

Hermione revirou os olhos em resposta e voltou à atenção a garçonete que queria saber seus pedidos.

— Um cappuccino de chocolate e um croissant. – A garota se virou para Draco que não havia escolhido nada, enrolado, ele pediu pelo mesmo. Com um risinho amistoso, ela voltou ao balcão.

Um som alto e agudo cortou o lado de fora, no asfalto, uma daquelas máquinas com rodas, o que parecia serem os transportes dos trouxas, passou como um borrão pelo vidro.

— O pai do Weasel não tinha uma coisa parecida com isso? – Apontou para outro automóvel que passava, Hermione seguiu seu dedo, balançando a cabeça.

— Um carro? É, até o Rony destruí-lo no Salgueiro Lutador.

— Grande ideia essa de usar coisas trouxas no nosso mundo – ironizou torcendo a boca – Só podia ser um Weasley mesmo para se interessar em uma coisa tão arcaica e devagar.

O carro desapareceu e os outros que o sucederam passaram sem chamar atenção.

— Os aviões são o meio de transporte mais rápido dos trouxas e são os únicos que voam – Hermione contou ainda olhando o vidro. Draco encarou-a com o cenho franzido, sem entender porque ela estava contando aquelas coisas, não era como se ele demonstrasse interesse e também não era como se ela estivesse se exibindo, Hermione parecia desesperada para falar sobre qualquer coisa, usava um tom de emergência sem necessidade.

Ela nem havia se importado por ele ter xingado a família de seu melhor amigo. Não estava prestando atenção realmente.

Havia algo a afligindo e Draco estava sendo usado como escapatória.

E confuso, ele entrou no jogo dela.

Seus pedidos foram trazidos interrompendo os pensamentos do garoto e por algum tempo, eles apenas apreciaram a comida.

O tilintar dos talheres embalou-os junto a música tocada pela banda de rua, era possível vê-la pelo vidro, a multidão continuava a sua volta. Tinha um ritmo crescente e uma alta presença do violino.

— Pelo menos de alguma coisa você gostou – comentou Hermione com um sorriso de canto, sem olhá-lo.

— O quê?

— Da música.

— Não, Granger, eu não gostei da música trouxa – negou num tom cínico. Hermione inclinou-se, colocando os cotovelos na mesa.

— Você está batendo o pé no ritmo da música, Malfoy, admita.

O sonserino baixou os olhos para os pés. É. Ele estava. Repetiu o movimento da grifinória, apoiando os cotovelos na mesa.

— Se chama Eleanor Rigby, é uma música dos Beatles.

— Eu não conheço os Beagles— murmurou pausadamente e ao invés de encerrar o assunto ele acabou arrancando uma risada afetada da garota, Draco fechou a cara para ela e Hermione conteve o riso.

— Beatles – corrigiu.

— Tanto faz.

— Você está falando de uma das maiores bandas do mundo.

— Não no meu mundo. Repetindo, tanto faz.

Ele notou o sorriso desaparecer no rosto dela assim como a música acabava, com o assunto finalizado, Hermione curvou-se para baixo, pegando um jornal caído aos pés da mesa, analisou-o enquanto pegava a xícara com a outra mão.

 Draco enfim provou o líquido quente e se surpreendeu por não ser tanto ruim quanto esperava. Já terminava de comer quando percebeu a foto de um homem de terno na primeira página.

— Não se movem? – perguntou cutucando o papel.

— Não.

— Como os trouxas conseguem deixar tudo tão desinteressante?

— Porque aqui não tem magia, Malfoy.

— Como é que você e o Potter conseguiram viver aqui? – Desta vez, para sua própria surpresa e da dela, não havia sido uma pergunta cínica, Draco queria compreender como era estar tão deslocado de seu verdadeiro universo.

Hermione fechou o jornal, se demorando muito mais do que nas outras questões, ele achou que ela não responderia, mas a grifinória encarou os olhos cinzas, unindo as sobrancelhas, incomodada e confusa ao mesmo tempo.

— Eu gostava, sei que pertenço ao mundo bruxo, mas há coisas aqui... – Pausou, engolindo em seco – Havia... – Desviou os olhos, Draco mexeu-se na cadeira, desconfortável, soube, então, que tinha feito a pergunta errada.

E, afinal, o que é que estava fazendo enchendo-a de perguntas sem propósito?

— Esqueça – sussurrou ela, os olhos castanhos traziam uma inquietude prestes a explodir.

E explodiu.

Um segundo depois, de súbito, ela se levantou quase derrubando a cadeira, jogou algo na mesa e saiu correndo pela porta.

Xingando-se, Draco foi atrás dela.

As lojas, as pessoas, as cores, tudo se passava em um borrão policromático. O pânico instalara-se em seu corpo, percorria suas entranhas e chegava a seu peito, arrebatador. As vozes do corredor em Hogwarts soavam em sua cabeça como sinos, não todas, apenas duas. Aparatar naquela cidade fizera todas as emoções que Hermione empurrava para o fundo de seu âmago emergirem em uma explosão frenética.  

Harry e Rony tentaram fazê-la falar sobre aquilo por meses, mas ela não queria, seria melhor assim, fingia que estava tudo bem, repetia a si mesma todos os dias, logo se tornaria verdade. Ela tinha o controle.

E ela conseguiu por um tempo, concentrar-se em outros assuntos e fugir de lembranças que lembrassem eles.           

Então aquele corredor aparecera e Oliver. O lago em Aedes Temperium. E agora aquela cidade.

Os sentimentos reprimidos soltaram-se de uma vez. Tinha a caixa de Pandora dentro de si e ela havia sido escancarada.

As cores passaram mais rápido, Hermione estava correndo, esbarrou em um grupo de jovens, batendo em seus ombros. Draco estava chamando-a, mas ela não queria falar com ele, as lágrimas brotavam em seus olhos. Ela não queria que ele a visse chorando.

Lancestter era lindo no inverno, sua mãe patinara com ela no festival que havia na cidade. Eles vinham visitar os avós quando eram vivos, Hermione lembrava-se exatamente onde a antiga casa deles ficava, ela gostava de brincar no jardim quando era menor e nem sabia que seria uma bruxa. Adora uma loja de doces na esquina, o pai sempre lhe comprava balas de caramelo.

— Granger! – Draco gritou, correndo e ofegando, ela não conseguia manter grande vantagem em distância, ele tinha pernas mais longas. Conseguiu alcançá-la agarrando seu ombro e virando-a, chacoalhando seu corpo.

Hermione piscou, voltando a realidade, o coração martelava no peito, comprimindo a caixa torácica. As lágrimas desciam por seu pescoço, limpou-as como pôde.

— Qual é o problema? – questionou, com a respiração entrecortada.   

— Você não entende – soluçou – É minha culpa! Eu fiz isso!

As palavras escaparam como uma enxurrada.

— Eu tirei a memória deles! Eu precisei... Fiquei com medo de que fossem atrás deles – Draco continuava segurando seus ombros enquanto ela se debatia – Fiquei com medo de que os matassem, eu não podia protegê-los, eu tinha que ajudar Harry!

— Eu sei – concordou tentando acalmá-la, começava a entender o que acontecia – Tudo bem, Granger.

Hermione balançou a cabeça repetidas vezes, as lágrimas pararam de vir, mas o peito continuava martelando. Ela se concentrou no cinza dos olhos dele, eles ficavam bonitos refletindo as luzes da cidade.

As pessoas passavam pelos dois como se fossem uma pedra interrompendo o fluxo de um rio.

Tudo bem, Granger.

Draco continuou repetindo. Os pensamentos foram se organizando dentro de sua cabeça, o borrão policromático tomou forma, a respiração se suavizou.

Inspira. Expira. Empurre para dentro da caixa.

Inspira. Aceite a dor.

Expira. Agora a esqueça.

Estava tudo bem.

— Desculpe – murmurou ela quando o sonserino já começava a se preocupar se ela não reagiria, para alívio dele. Draco acenou com a cabeça e soltou seu ombro, desviando o olhar como num sinal para que esquecessem o assunto.

Hermione o agradeceu mentalmente por isso.

— Não temos dinheiro suficiente para nos hospedarmos num hotel – disse ela após alguns segundos – E também não acho uma boa ideia ficarmos perto dos trouxas com Bellatrix nos caçando.

— O que vamos fazer então?

— Eu tenho uma ideia.

 *

 Os músculos das pernas de Draco reclamavam de dor, em maior parte não porque estavam subindo uma colina por uma trilha no meio da vegetação, mas o corpo sentia aos dores de ter sido arremessado contra uma mesa, na luta com Lestrange.

O silêncio foi desconfortante, um campo de tensão se instalara entre os dois, Hermione caminhava à frente olhando para os pés. Não tocaram mais no assunto, ele sabia o que ela havia feito, as pessoas cochichavam em Hogwarts, porém não sabia que a memória de seus pais não havia sido recuperada, não sabia como funcionava aquele tipo de feitiço, de qualquer forma, não perguntaria.

A trilha íngreme foi se nivelando até chegarem a um espaço aberto e circular com uma vegetação rala, a cidade se iluminava logo abaixo, deviam estar numa espécie de colina ou morro.

— É um ponto turístico – explicou a grifinória com certo desconcerto na voz – As pessoas acampam aqui nas férias.

Ou seja, ela acampava nas férias.

Antes que pudesse perguntar onde é que dormiriam, a grifinória abriu a bolsinha e enfiou praticamente o braço inteiro lá dentro para a surpresa do loiro, puxou uma caixa do tamanho de um livro e colocou-a no chão.

— Sabe montar uma barraca?

— Como é que você tem tudo isso aí dentro? – surpreendeu-se com os olhos levemente arregalados, Hermione deu de ombros.

— É a mesma bolsa que usei ano passado.

Ele não precisou de mais nenhuma explicação, abaixou-se, retirando a varinha do bolso de trás da calça, qual fora a última vez dormira em uma barraca? Na Copa Mundial de Quadribol ele não tivera tempo.

Um frio gélido percorreu sua espinha ao lembrar-se do porquê.

A barraca desmoronou duas vezes e montou-se do avesso as outras três vezes, até que ele conseguiu fazê-la ficar de pé e direita, entortou os olhos para Granger esperando um comentário de sabe-tudo, mas ela estava de costas para ele, sentada perto da beirada.

A cidade abaixo deles se iluminava como estrelas, não estavam longe, podia-se ouvir o som dos carros andando ainda que fosse abafado. Era calmo.

Draco abaixou-se sentando próximo a Hermione, ela cruzara as pernas e tinha as costas eretas. Ele não sabia muito bem o que estava fazendo, talvez fosse o cansaço e as dores no corpo que o estavam impedindo de pensar direito, o sonserino só queria se concentrar em qualquer coisa que não fosse seus problemas com Bellatrix, suas visões e sua cópia no presente.

— Não foi sua culpa – disse e logo franzindo o cenho em dúvida por estar tocando no assunto. Ele não queria se envolver, assim como não a queria pensando nos problemas dele. Não, não queria sua cabeça de heroína e grifinória tentando desvendá-lo como ela sempre fazia com tudo.

Quem estava tentando enganar, seguir sua regra de manter-se fora de assuntos pessoais não era mais possível, não depois do que passaram para pegar a pedra da ressurreição.  Maldito Dumbledore e seus feitiços.

Estava fazendo aquilo porque sabia o que era culpa e como ser corroído por ela.

Estavam expostos um ao outro e ele odiava isso.

— Você não entende.

— Eu também perdi alguém, Granger – cortou friamente. Era claro que ele entendia, as palavras tiveram um gosto estranho em sua boca, ele não tinha dito em voz alta até então.

Hermione sentiu o rosto queimar ao lembrar-se da situação do sonserino, Narcisa estava morta, era por isso que a grifinória conseguiu fazê-lo continuar na missão. Sentiu-se egoísta por ter se esquecido.

— Ela vai voltar quando terminarmos isso – disse quase num tom de promessa. Quando destruíssem a pedra e desvendassem a profecia, Narcisa voltaria.

Draco tinha dúvidas de que conseguiriam terminar. Todo o frenesi do globo os trazendo para o passado, o sonserino não tivera tempo de ficar de luto, nem de pensar sobre a morte da mãe ou como se sentia. A relação com sua família após a guerra havia ficado muito complicada e complexa, seus pais não representavam mais o que ele achava, suas crenças vieram deles e elas estavam quebradas. Narcisa mal falara com ele depois da sentença de Lúcio, não que Draco quisesse. A família Malfoy estava quebrada.

E esse era o principal motivo por ele fugir de assuntos pessoais. Falhara, como sempre.

— Espero que consiga trazê-los de volta. Você merece, muito mais do que eu.

— Não estamos medindo nada, Malfoy, sua perda não é justa também.

Ele iria replicar, mas ela se mexeu, não queria mais tocar no assunto dos pais. Porém o sonserino sentia necessidade de falar, de fazê-la entender. Era estranho, ele conseguia muito bem guardar suas questões para si, mas era como se ela tivesse tocado numa ferida.

Ele tinha que fazê-la parar.

— Eu queria matá-la na Casa dos Gritos – admitiu – Bellatrix. Queria destroçá-la.             

— Ela é nossa inimiga, matou sua mãe, queria nos matar, é como perguntar se queríamos você-sabe-quem morto um ano atrás – concordou, fazia desenhos na terra com os dedos, os cabelos caiam sobre seu rosto.

— É diferente, eu queria que ela sofresse.

— Não seja injusto consigo mesmo, Malfoy.

Ele riu em sarcasmo, observando o horizonte escuro, a frase da garota repetiu em sua mente, livre de qualquer interrupção assassina, deu-se conta do incômodo que o habitava desde Hogwarts, ele havia pensado no assunto na Casa dos Gritos, mas não a confrontara, não houvera a oportunidade e ele achara melhor deixar a questão ser esquecida.

No entanto, ela o incomodava muito mais do que imaginava.

Aquelas palavras na Sala Precisa...

Aquelas que ele não podia aceitar.

Nunca.

— Por que está tentando me convencer de que sou uma boa pessoa? – indagou de uma forma ríspida, não esperava que a frase saísse, escapou por sua garganta, queimando. Hermione enrugou a testa, confusa.

— Por que tenta me convencer de que sou bom, Granger? – insistiu aumentando o tom de voz, levantou-se, ficando de pé ao lado dela – Por que fez isso na Sala Precisa quando eu te contei que matei um homem? Quando você deveria me odiar!

Hermione abriu e fechou a boca, estupefata com a reação dele. Levantou-se também, ficando frente com o loiro.

— Porque é o que eu acho, Malfoy. Porque você não é uma má pessoa, é alguém que foi colocado para fazer escolhas num ambiente cruel. E não cabe a eu julgá-lo, a ninguém.

O sonserino sentiu um arrepio subir por suas costas ao ouvir novamente a frase, era gentil, ele sabia, o que o irritava ainda mais.

— Qual é o seu problema? – vociferou. O maxilar trincado deixava-o com uma aparência intimidadora, os punhos estavam cerrados – Eu te humilhei tantas vezes, te vi ser torturada! Por que está fazendo isso? 

— Porque foi o que eu vi! Vi sua dor por aquele trouxa! – rebateu ela, também elevando a voz, o rosto formigava, quente. Encarava-o em desafio. Draco abriu um sorriso nervoso, balançando a cabeça em negativa.

Arregaçou a manga da camisa, revelando a Marca Negra.

— Pessoas boas não são comensais da morte, Granger, não tem uma marca no braço a vida inteira.

— A marca não importa se você não acredita nela – replicou virando o próprio braço para ele mostrando a palavra cravada em sua pele, o garotou fixou os olhos na cicatriz, atônito – Você não disse a Bellatrix que era o Harry e não matou Dumbledore na torre de Astronomia – aproximou-se dele, citar o nome do antigo professor de Hogwarts o fez fechar os olhos.

— A questão não é o meu problema, é o seu. Está mentindo para si mesmo.

Ele virou-se de costas, as mãos tremiam, a pele pálida havia ganhado uma coloração avermelhada.

— Você não acha que merece – compreendeu, sussurrando muito mais para ela do que para o próprio.

— O quê? – ele se virou com o canto da boca torto, sem entender o que ela dizia.

— Criou uma redoma em si mesmo, aceitou que é mal, mesmo quando sabe que não é como seu pai, você reprime seus sentimentos, porque é mais fácil, porque é assim que os Malfoy são – insistiu incisiva, enfatizando mesmo quando ele acenava em negativo, parou muito próxima já precisando erguer o pescoço para encará-lo, colocou o indicador em seu peito – Não consegue se perdoar, pelo que fez e o que não fez.

Ele piscava, digerindo suas palavras que vieram a ele como um tapa.

— Não é uma pessoa ruim, Malfoy, está confuso porque não sabe aonde pertence. Devia se dar uma segunda chance, fazer outras escolhas.

Os olhos cinzas brilhavam mais do que o natural, úmidos, mas as lágrimas orgulhosas não desceram. Ambos sentiam a respiração descompassada um do outro, o dedo dela continuava em seu peito.

— Talvez eu faça isso.

E ele a beijou.

Havia dor e desespero.

As cicatrizes estavam expostas, as rachaduras estavam abertas, sentiam-nas queimar.

Se havia algo em comum entre Granger e Malfoy, eram os pedaços quebrados dentro de si. Eles eram uma confusão desastrosa, ambos assombrados pelos fantasmas que viviam em suas cabeças.

Ondas elétricas se chocavam, a estática estralava, a tensão de segundos atrás ainda era palpável. 

Por um instante, o mundo entrou em um paradoxo total.

Às vezes as leis que regem o universo devem ser esquecidas, rapidamente. Como um eclipse lunar.

Súbito e anômalo.

Draco parou, abaixando a cabeça, os pensamentos estavam nublados, ele parecia envolto em fumaça. Uma onda fria percorreu suas entranhas ao se dar conta do que tinha feito. Os olhos castanhos estavam fixados a seu rosto.

Teve a certeza de que tinha perdido a cabeça.

Esquivou-se, deixando-a sem palavras, atônita, com os pés grudados ao chão.

Desapareceu pela trilha tornando-se mais uma sombra em meio à escuridão.  

Assim como eclipses lunares, o lapso das regras terminava tão rápido quando começava. Ah, mas eclipses nunca eram esquecidos, nunca.


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Notas finais do capítulo

FINALMENTE ACONTECEU, OUÇO UM ALELUIA? Acreditem, eu estou muito nervosa para saber o que vocês acharam. Vou fazer uma análise primeiro com vocês, não, não é um beijo romântico, ele é um desespero total, esse não é o tipo de história que no primeiro beijo eles vão se apaixonar, isso aqui é slowburn e eu realmente não consigo imaginar Draco e Hermione se apaixonando tão rápido. Por favor, realmente me diga o que acharam, eu tenho sério problemas para escrever cenas mais amorosas, porque sou uma pessoa bem cínica em relação a amor e essas coisas.
COMENTEM, VAMOS ENLOUQUECER JUNTOS, eu mereço vai, finalmente aconteceu o que vocês tanto queriam.

Para escrever esse capítulo eu usei principalmente a análise que a JK fez do Draco no Pottermore os sentimentos em relação a família, a confusão, aqui (http://trechosdelivros.com/confira-novo-conto-de-jk-rowling-sobre-draco-malfoy/) É muito interessante!
Eu sei que a autora disse que Hermione trouxe a memória dos pais de volta, mas como sou meio trágica (hehe) em Tenebris isso não aconteceu ou ainda não, tudo bem? Achei interessante para o próprio desenvolvimento da personagem.
Eu tinha planejado mais coisas para acontecer, mas achei que ia tornar o capítulo muito grande, o próximo continua sendo do passado.
Gostaram de vê-los dar uma passadinha do mundo trouxa? Desculpem, eu tive que colocar os Beatles não deu para segurar haha

Me mandem sugestões de perguntas porque já estou ficando sem ideias, que tal ser a vez de vocês me perguntarem alguma coisa? Ou me falem sobre a sua vida, seus desastres, sua vida amorosa, deem um alô, mas me deixem saber que vocês estão aí, okay?

Beijos!



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