Eu estava entediado. Sentando há mais de uma hora nas poltronas desconfortáveis do auditório e sendo obrigado a ouvir uma palestra sobre como a metodologia de ensino da universidade era considerada a melhor, o tédio bateu forte em mim.

Olhei para os lados tentando chamar a atenção de alguém disposto a conversar comigo e me tirar deste estado maçante ao qual eu me encontrava. Foi quando meus olhos pousaram em uma figura sentada a poucas cadeiras distantes de mim e eu vi uma forma de me divertir.

A garota que eu olhava possuía cabelos castanhos, quase ruivos até os ombros e olhava fixamente para o palco onde o reitor da faculdade falava coisas que para mim eram sem sentido. Do que me interessava o funcionamento dos cursos de exatas se eu estudava direito? Chegava a ser irritante o fato de que toda vez que eu tentava levantar para ir embora o coordenador do meu curso me lançava olhares nada amigáveis que me faziam voltar para o meu assento.

Voltei meus pensamentos para a beleza que estava na minha frente. Tentei chamar sua atenção fazendo gestos em sua direção, mas ela nem sequer virou a cabeça. Tentei chama-la, mas meu coordenador lançou olhares ameaçadores para mim novamente e eu me forcei a ficar em silêncio. Bufei de raiva e encostei-me ao respaldo na cadeira, pensando em um jeito de falar com a garota até a palestra acabar.

Foi quando reparei na pequena cabeça loira que me olhava fixamente por debaixo da franja. Levantei uma das sobrancelhas de modo inquisitivo ao reparar que a loirinha estava sentada do lado do meu objetivo e lancei para ela um sorriso insinuador. Percebi ela corar e virar rapidamente para frente, me dando as costas. Aumentei ainda mais o sorriso ao perceber a loirinha cutucando a garota ao seu lado e apontando para mim logo em seguida. Foi quando uma ideia maravilhosa surgiu na minha cabeça e eu me preparei para coloca-la em campo.

Aproximar-me de Angelina foi a coisa mais fácil que eu já tinha feito. Ela era tão ingênua que eu quase não podia acreditar na sua existência. O plano tinha sido bem sucedido e foi muito fácil conseguir a atenção de Aurora, a beleza que tinha tirado a minha concentração no dia da palestra. Não pude conter o meu ego inflar ao perceber que Aurora estava respondendo aos meus olhares e sorrisos maliciosos. Era só uma questão de tempo até eu poder tê-la em meus braços e na minha cama.

O problema seria me livrar de Angelina. A loirinha tinha se tornado meu passatempo oficial e seria um bônus no meu plano, caso eu conseguisse leva-la para cama também. Eu me divertia com seu jeito inocente de ser e antes que eu percebesse, ter Angelina tinha se tornado uma missão de vida para mim e eu não sossegaria até ter tirado seu jeito puro de ser.

Vi a oportunidade perfeita de me livrar dela quando depois de um mês de namoro, ela perguntou senão iriamos em um encontro. Neguei veemente e falei que era perda de tempo, eu queria deixa-la tão nervosa que ela não teria escolha a não ser terminar comigo. Meu tiro saiu pela culatra quando ela concordou comigo e privou-se de ter um encontro.

Aos poucos eu me vi caindo na graça de Angelina. Suas piadas sem sentido e seu jeito inocente tinham me chamado atenção. Aurora estava ficando impaciente, queria que eu terminasse com Angelina a todo custo, mas eu me negava, não aguentei a garota ao meu lado por tantos meses para não tirar uma casquinha depois.

Acho que Aurora percebeu a atenção que eu estava dando a Angelina e passou a ser mais descarada em suas investidas. Ela aparecia de toalha sempre que eu estava no apartamento e não se importava de me acariciar por debaixo da mesa quando Angelina estava presente. Quando eu finalmente cedi ao meu desejo e me deixei levar por Aurora, parecia que um peso tinha saído dos meus ombros.

Depois da minha primeira noite com Aurora, eu comecei a me dedicar totalmente a Angelina. Eu comprava presentes e fazia promessas, que no fundo eu sabia que eram falsas, mas Angelina parecia ser feita de ferro porque nunca me deixava passar além de uns amassos. Até que em uma das minhas tentativas, eu a irritei tanto que ela me confessou da promessa que ela tinha feito quando era adolescente.

Foi como se tivessem jogado um balde de água fria em mim. Angelina tinha prometido ficar virgem até a graduação da faculdade, e eu não queria desperdiçar o meu tempo durante tanto tempo. Ela fazia medicina! São mais anos do que eu gostaria de aceitar.

Aurora riu de mim quando falei para ela que eu tinha desistido de ter alguma coisa com Angelina. Realmente a situação parecia uma piada, um relacionamento de quase seis meses e que não passava de alguns beijos. Eu tinha decidido que iria terminar com Angelina, não havia mais motivos para continuar com ela, visto que eu tinha alcançado meu objetivo principal que era Aurora.

As coisas saíram um pouco do planejado quando eu decidi aproveitar que Angelina estava no banco e fui visitar Aurora no apartamento. Concentrados apenas no clima quente que nos rodeava, não percebemos que Angelina tinha chegado até ouvir seu grito vindo de algum lugar do apartamento. Percebi que não poderia mais adiar a situação e resolvi falar a verdade.

Porém, Aurora foi mais rápida e em meia dúzia de palavras explicou a situação de uma forma clara e um pouco rude. Ela poderia ter ocultado algumas informações a fim de preservar um pouco do orgulho de Angelina, mesmo eu acreditando que não sobraria muita coisa do mesmo depois do choque da situação.

Eu ainda lembro as palavras horríveis que Aurora falou para sua colega de quarto e de com eu havia entrado em choque ao ouvir tais coisas. Infelizmente, eu não podia negar a veracidade dos fatos, afinal se Angelina tivesse se entregado a mim não haveria motivos para eu procurar Aurora, mesmo que esta tenha sido minha meta no inicio.

Angelina saiu correndo do apartamento e eu perguntei para Aurora se não tínhamos passado dos limites dizendo coisas tão cruéis. Não sei se ela não ouviu minha pergunta ou não quis responder, o fato é que não vi Angelina por um dia inteiro depois daquilo. Aurora achava que não a veríamos depois do escândalo que ocorreu.

Imagine nossa surpresa ao ver que Angelina tinha voltado para buscar suas coisas e tinha trazido alguém com ela. No começo eu tinha achado que ele era um primo ou algo do tipo, mas o jeito que eles se tratavam deixava claro que não eram parentes.

Fiquei ainda mais espantado por ela ter permitido que ele entrasse no seu quarto. Angelina sempre se recusava a me deixar entrar, ela dizia que não confiava em mim o suficiente para permitir a minha entrada em um recinto que possuía uma cama.

Aurora me lançou olhares indagadores durante todo o tempo que Angelina permaneceu no apartamento. Eu estava me coçando de tanta curiosidade, quem era aquele cara? E porque ele parecia tão à vontade com Angelina? Não consegui resposta para nenhuma das minhas perguntas. Aurora tentou fazer um interrogatório com o desconhecido, mas ele a rechaçou imediatamente.

Eu podia perceber que Aurora estava no auge de sua raiva. Eu não me surpreenderia se ela começasse a espumar pela boca nesse momento. Reparei quando Angelina levou as malas para fora e voltou para buscar o cachorro que tinha passado as últimas horas trancado na área de serviço. Percebi o sorriso malicioso que apareceu nos lábios rosados de Aurora e no segundo seguinte ela já tinha colado nossas bocas em um beijo profundo.

Consegui escutar o arquejo de Angelina e o barulho de seus passos apressados no piso do corredor. Não consegui dar muita atenção a isso, pois Aurora se aproximou ainda mais de mim e embrenhou suas mãos em meu cabelo. Não pude devolver a caricia porque no instante seguinte Aurora tinha se afastado e uma dor intensa se fez presente no meu maxilar e eu fui parar no chão.

Jogado no chão frio e com uma dor forte no queixo, eu não conseguia assimilar muita coisa. Os gritos acusadores de Aurora e outra pessoa falando se misturavam na minha mente, mas houve algo que eu entendi perfeitamente. “Deixem Angelina em paz”. Essas quatro palavras me fizeram pensar se ficar com Aurora tinha sido a escolha certa no final das contas.