1 semana depois.

Marah

"Entre a vegetação distorcida corríamos pela floresta, acesa pela luz da noite, eu me alegrava cada vez que Luan gargalhava, estava sendo divertido!

—Onde vamos!?- disse alto enquanto me esforçava para alcançar o lobo veloz

—Apenas me siga!

Já havia pego o ritmo, quando de repente Luan empacou, num susto quase desci morro a baixo

— Você é louco??

gritei, ele gargalhou, fiz uma careta a ele e ri um pouco,  seguimos caminhando agora com calma.
Fomos até o centro de uma vasta clareira, apreciei a noite, leve, em paz. E não tensa e suspeita como costuma ser.
Apenas paramos e ficamos ali, tínhamos a vista da lua ao longe.
—Está com medo?- ele disse simplesmente

—An?- grunhi confusa, minhas orelhas agiram frenéticas procurando uma possível ameaça, porém já tínhamos liberdade e idade o suficiente para enfrentar um coiote com facilidade.

—Das ameaças, conflitos..- continuou

Soltei uma lufada no ar -Estou..- olhei Luan nos olhos, sua expressão era suave, seus olhos cor âmbar tinham um brilho diferente, mais peludo agora seu pelo que antes foi um marrom mais leve agora tinha um tom mais escuro com traços mais marcantes, somados a sua postura havia se tornado um lindo lobo.

Com todas estas situações conflituosas, eu temia pelo pior. Desejava toda noite que a mãe Lua abençoe minha família e nossas terras.

Mas esse sentimento de temor era deixado de lado cada vez que Luan estivesse perto

—Eu também sinto- ele suspirou -mas esse sentimento de temor é deixado de lado toda vez que tenho você perto.

Senti meu corpo se arrepiar,  uma boa sensação ascendeu em mim, eu estava corada e surpresa, achava que me via com olhos de irmão, mas que bom que não!
Virei o focinho numa tentativa besta de esconder a timidez -E-eu sinto o mesmo..

—Se eu me deitar aqui, você deitaria comigo e esqueceria do mundo?
Ele exalava um pouco de nervosismo, mas falava com mais certeza que nunca, agora eu sentia também. Sorri um pouco emocionada talvez.
Me deitei ao seu lado, Luan me cobriu com um abraço e eu retribui o ato, sorrimos juntos.

Eu ficaria aqui pra sempre, somente eu, ele, e a companhia dos vaga-lumes"


Todo o momento se esvaiu assim que abri meus olhos, o peso da realidade veio a tona. Funguei o focinho tentando conter minhas lágrimas, senti a garganta queimar. Encarei o céu.

—Marah, venha, vamos caçar- Melany chamou -papai quer reforços.

Sacudi meu corpo tirando a neve de cima de mim, assenti e me contive mais um pouco antes de ir até os outros.

—Mas como você dorme!- Will falou num tom provocativo.

Ignorei o lobo, vi de relance ele com uma expressão confusa. Notei que talvez uns tenham notado meu comportamento. Não estou com cabeça pra brincadeiras justo agora.

Enquanto esticava meu corpo, vi meus pais darem as ordens a Sam e Karen, ouviam atentos.

—Hm- grunhi -meus pais, vão ficar?

—Já tiveram o trabalho de localizar e trazer o bando pras proximidades. Talvez fiquei pra descansar.
Jack bocejou

—Estão passando as coordenadas a Sam e Karen, mas vamos indo?
Luke chamou, assentimos.
Os outros dois haviam nos alcançado

—Foram descansar?- Melany indagou, referia-se a nossos pais.
—Fizeram parecer que sim, mas tenho certeza que vão conversar sobre.
Karen disse, opiniões começaram a ser ditas sobre o assunto. Desfoquei minha  atenção e me afastei um pouco.

Eu reforçava minha mente todos os dias a não lembrar disso, por causa deles estamos passando por tudo isso.

—Marah!- Anita deu um leve puxão em minha orelha, virei a cabeça e vi todos me olhar confusos e com certa...pena?

—Vamos irmã, está na hora.
Ela falou baixo.

Saímos da floresta com cautela, quando estávamos a uma distância considerável, consegui identificar o alvo entre os outros, era visível que havia uma ali mais frágil. Fizemos a divisão dita, dei atenção ao ar, estava a nosso favor, mas temi pela mudança de rota do vento.

Ao passo que nos aproximávamos, os sons das águas congelantes e os que aquele grupo de cervos emitia ficava mais altos.

Era um campo largo, não havia vegetações que pudesse nos cobrir para tocaia,  havia uma floresta neutra, mas do outro lado do rio.
Talvez não fossem burros, encontrei a sentinela, atenta enquanto seus companheiros aproveitavam das águas.

Procurei por meus companheiros de caça, todos em suas posições. Se falharmos sabemos que irão usar a água como vantagem. Então, vamos afastar o grupo dali.

Cumpri o papel, bati com força minhas patas no chão espalhando neve, era agora.
Mesmo com agito no grupo não demorou pra notarem minha aproximação, e quando a sentinela berrou o caos tomou conta, pularam no rio, eu já havia os alcançado.

Mas algo havia acontecido

—Marah!
Ouvi sua voz, meu coração gelou
—Luan!?
Fiquei perdida, eu já estava dentre a confusão de cascos, neve e água pelos ares, pânico, me senti parte deles, tentei focar em correr dali, quase me choquei de frente com um grande macho que me ameaçou com seus chifres, derrapei na neve e consegui desviar de diversos cervos mas senti a força do impacto quando colidi com um deles.

Tudo ficou turvo, agora eu estava de baixo de toda aquela confusão, deixei a correnteza me arrastar dali e alcancei a margem.

Os outros vinham me alcançar, eles haviam chego, todos frustrados e irritados.

Diversos "Você está bem?" "O que estava fazendo?" "Por que fez aquilo?" eram ditos.
Eu só conseguia tossir recompondo meu fôlego, meu corpo estava trêmulo e senti minhas patas dormentes, foi tudo muito rápido 

—Marah o que você fez!?
Sam vociferou passando por todos

—Eu não fiz nada- cuspi as palavras ainda ofegante

Aquela altura os cervos já estavam longe, meus irmãos estavam a nossa volta, todos atentos a discussão que se formará aqui

—Exatamente! Eu disse que não era a hora, os cervos estavam atentos a nós!- ele mostrou os dentes -Por que não obedeceu minhas ordens!?

O comportamento de Sam havia me irritado.

É, eu errei, me senti vulnerável, todos pareciam a favor de Sam, ouvi os murmúrios, mas o fato dele estar mais preocupado com a caça que ver se sua irmã estava bem me chateou, contudo não me submeti a sua postura, fiquei a seu nível

—Aqui você não dá as ordens, apenas dita as informações. Você não é o alfa, muito menos meu pai!
Rosnei cara a cara com Sam.
Karen e Will vinham intervir mas empurrei o lobo a minha frente e corri dali, deixando Sam pra trás com os pelos eriçados e incredulidade e surpresa estampada no focinho de todos

Quando alcancei a floresta, olhei pra trás, os outros seguiram a diante, talvez fossem alcançar os cervos novamente, enquanto Sam e Will me encaravam de longe.

Virei as costas e adentrei na floresta, o instante que havia ouvido sua voz ecoou na minha cabeça, por que?

Tudo estava distorcido a minha frente, eu estava apenas..fugindo, mas de que? De minha mente? Minhas emoções? Desde que Luan se foi não tive paz pra lamentar sua morte, toda a luta constante, os dias difíceis.

Agora foram somados, estou sobrecarregada, estou tão apavorada por sentir tudo isso e ele não estar aqui pra me confortar como havia prometido estar.

 Encontrei-me numa densa floresta de pinheiros, havia somente neve e uma leve névoa aqui. Não temi de estar aqui, pelo contrário.
Parei sob um grande pinheiro, ao passo que me recompunha, hesitante, me deitei, não havia o que fazer.
Naquele momento eu só consegui sentir a paz que o sono traria.

"As florestas e campos agora eram cobertos pelo sol, que despertava a vida. As aves cantavam incessantemente.

As pétalas de cores intensas cintilavam como o brilho dos vaga-lumes.
Marah apreciava cada belo detalhe de mais uma bela manhã que começará, a pequena loba ansiava poder correr até a grama rasteira e perseguir as borboletas que coloriram o ar.

Com o consentimento de seu pai, ela correu até as borboletas, que se espalharam pelo céu.
Tudo era lindo e divertido, até Marah ouvir um agito nos arbustos, de imediato lembrou-se que seu pai havia reforçado diversas vezes que ela tomasse cuidado e não se afastasse muito, ela estava a uma distância considerável da base, mas caso algo fosse acontecer a filhote teria que correr bastante por sua vida.

A filhote ficou tensa, pronta pra uma fuga, mas o que estava escondido ali tinha uma silhueta familiar

—Quem está aí?- chamou curiosa
Sem respostas, mas conseguiu ver uma cauda marrom e peluda. "Coiotes e raposas não são marrons"
—Apareça!
Contudo, dali foi revelado o inesperado: um filhote de lobo
—Ah!
Marah arquejou surpresa, logo temeu que ele não estivesse sozinho
—Desculpe, eu só quero brincar!- ele grunhiu acuado

—Quem é você? O que faz aqui? São as terras de meu pai!
A loba de pelos claros intimidou o filhote, mesmo receiosa Marah mostrou sua posição assim como fora ensinada

—E-eu me chamo Luan!- ele cambaleou um pouco -por favor me deixe ficar aqui! Perdi minha mãe estou sozinho!
Marah se calou, sentiu pena do filhote e vergonha de sua postura ultrajada -Sério?- disse baixo

—Sim..estou vagando a um tempo, a uns dias encontrei este lugar, aqui há uma boa quantidade de pequenas presas. Consigo me manter!- explicou-se -

Sei que estas terras tem dono, vejo vocês! Mas ficava escondido por medo, cobrindo meu cheiro com o das presas mortas, eu observava você e outros filhotes brincarem por aí de vez em quando, mas vi você sozinha achei que talvez eu pudesse...

Marah ouviu quieta cada palavra, agora estava mais calma. Talvez ele não fosse perigoso, sentia isso.

—Hm, me chamo Marah.
—Belo nome!- Luan foi simpático

Após se apresentarem com mais decência, tiveram uma breve conversa, começaram a brincar entre si.
Contudo, seus encontros foram diários, a dupla decidiu manter segredo. Marah todos os dias inventava as melhores desculpas pra sair sem a companhia de seus irmãos, seus pais começaram a desconfiar e logo descobriram os dois.

Houve maior rebuliço, mas após palavras de Marah e explicações de Luan, os lobos foram compreensivos.
Os Gray Wolves viveram alguns dias difíceis, ainda tinham assuntos pendentes, a presença do lobinho ali foi suspeita aos olhos dos alfas no momento da descoberta.
Max e Sarah, o casal de alfas, aceitaram a ideia de acolher o filhote, devido a decisão dos pais os outros lobos o receberam bem, com o tempo já o tinham como um irmão.

Foi ótimo ter um novo focinho ali, Luan virou grande amigo de Luke e melhor amigo de Marah.
Os filhotes iam crescendo, contudo a amizade foi se tornando mais que isso"

Despertei ofegante, minha mente me forçava lembrar de tudo isso, era como um castigo, quando na verdade deveria ser bom.

Mas eu não me conformava com a forma de como Luan foi tirado de nós, tirado de mim.

Eu jurava que conseguia ouvir sua risada naquela tarde que nos conhecemos em minha mente, tão real quanto ouvi sua voz hoje, mas creio que ter sido um devaneio meu..talvez fosse Sam chamando minha atenção..
Lágrimas desciam por meu focinho, eu estava quase desabando, outra vez, me contive. Eu tinha que me conformar. Estava me recompondo pra voltar, o sol não esteve presente nos céus hoje, mas sua luz já estava cedendo.

Quando virei-me me deparei com minha mãe, ela me observava em silêncio, vi seus olhos cinzas marejados

—Mãe..
Minha voz soou quebradiça
—Venha cá, pequena

Mamãe me acolheu em seu abraço, não me contive mais -Eu o amava mãe, por que tiraram ele de mim..?
Desabafei entre lágrimas e soluços, mamãe hesitou no que dizer e apenas me confortou mais em seu abraço, senti gotas gélidas de suas lágrimas sobre mim.

Sei que depois ela me daria uma orientação.
Luan foi minha paixão, mas também fora seu filho.
Naquele instante, eu senti que talvez, eu não fosse a única com tantos sentimentos guardados.