Cartas de um Fracassado escrita por Saturno


Capítulo 6
Carta 6: Viagens Sentimentais


Notas iniciais do capítulo

Olá! Boa leitura.



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Quando Lorenza apareceu com um sorriso no rosto, eu sabia que seria um perfeito dia. Eu estava pronto para visitar a pessoa mais importante da minha vida e você deve saber quem é, certo, vovô?


Convidei Lorenza e ela ficou extremamente animada para conhecê-lo e por um momento a imaginei sendo minha namorada.


Mas pensamentos permanecem apenas pensamentos.


— Dirija com cuidado — alertou mamãe, severamente.


Era bom ver que minha mãe estava preocupada comigo, ou com seu carro…


De qualquer forma, eu apenas assenti e comecei a dirigir. Seriam trinta minutos de viagem, já que o asilo fica na cidade vizinha, não muito longe daqui. Eu estava muito animado, é claro, finalmente veria a pessoa que mais falta no meu dia a dia.


Sabe, vovô, nunca entenderei porquê te colocaram em um asilo. Deveriam se sentir honrados de ter sua presença, deveriam saber como é gratificante ter o senhor por perto. Eu vou te tirar daí um dia, vovô, assim que eu começar a trabalhar, vou dedicar meu salário exclusivamente para cuidar do senhor, eu prometo.


— Ei, Brandon… — Lorenza olhou-me rapidamente e, em seguida, olhou para a janela, parecia tímida.


— Sim? — abaixei o volume do rádio, para entendê-la melhor. Olhava atentamente para a estrada, mas queria ver seus olhos.


— Sabe aquele dia que nos conhecemos? — assenti. — Eu te falei que não gostava de pessoas perfeitas, mas disse isso porque nunca conheci alguém perfeito. Mas aí conheci o James e, bem, ele não é perfeito, mas é incrível! — disse ela, com um sorriso de ponta a ponta.


Eu não vou negar que foi bom saber disso, mas também não vou dizer que fiquei extremamente magoado. Ela era livre, afinal. Podia gostar de quem quisesse.


— E porquê está me contando isso? — questionei a ela.


— Porque você tornou tudo isso possível, sabe? Se não tivesse me levado naquela festa eu jamais conheceria James, eu realmente gosto dele. E também, eu e você somos amigos, certo? E amigos contam as coisas um para o outro — murmurou.


— É, acho que sim… — dei de ombros, louco por encerrar aquele assunto de uma vez por todas.


— Ei, mas me conta… Como é o seu avô? — disse ela, de repente. Agradeci aos céus pela mudança de assunto.


— Meu vô, bem, ele é incrível. Sabe, ele perdeu a esposa muito cedo, antes mesmo do meu nascimento. Mas sempre lidou bem com isso, sempre sorria e me ajudava em tudo, ele morava com nós, com a família. E deveria ser assim para sempre. Mas ele ficou doente, realmente doente e indisposto, por isso minha mãe quis colocá-lo em um asilo, foi a pior decisão que ela já tomou — comentei, com certa raiva dela.


— Ele é muito importante para você, não é?


— Sim. Assim como você — falei, me surpreendendo tanto quanto ela.


Por que eu era tão impulsivo? Gostaria de saber como acabar com esse defeito desgraçado.


De qualquer forma, estava feito e não era como se fosse alguma mentira. Ela era importante para mim. Se tornou desde a primeira vez que a vi.


O silêncio perdurou no carro, um pouco desconfortável, mas nada que alguma música da Madonna não mudasse isso.





Estávamos na frente do grande asilo. O pátio era lindo, com diversas árvores pequenas e alguns vasos de flores, possibilitava ver o extenso gramado entorno do prédio.


Depois de assinar um papel, mostrar identidade, deixar os pertences em uma sala, finalmente pude me dirigir até a parte de trás do prédio, onde ficavam as pessoas mais velhas, no jardim, sentados, conversando ou até mesmo dormindo ao ar livre.


Quando pisei no gramado, senti uma sensação ótima. Eu via todas aquelas pessoas e elas pareciam feliz, conversando, sorrindo e alguns mais rabugentos ralhando uns com os outros. E as árvores floridas davam um aspecto ainda mais vivo para o local, me encantando perfeitamente.


Mas essa magia teve um fim.


Vovô, você não sabe a dor que senti ao vê-lo em uma cadeira de rodas, com um soro ao lado e uma enfermeira o alimentando. Seus olhos estavam tão opacos e você parecia o único preto e branco naquele imenso colorido.


Aquilo, com certeza, me machucou. Eu não esperava encontrá-lo nesse estado, mesmo que da última vez que nos vimos, o senhor já estava muito mal, mas não dessa forma.


— Você deve ser Brandon, não é? — perguntou a enfermeira nos levando até ele.


— Sim — comentei, pouco interessado.


— E esta é sua namorada?


— Ah, não. Eu sou amiga dele, Lorenza — ela sorriu timidamente.


Uma árvore grande fazia uma sombra agradável e trazia um vento reconfortante.


— Vovô — chamei-o, atraindo seu olhar.


O sorriso pequeno, porém carinhoso me deixou com lágrimas nos olhos.


— Filho — sussurrou, como de costume, me chamava sempre de filho.


Eu fiquei um tempo sentado em sua frente, o olhando como se aquilo pudesse o ajudar. Até que Lorenza pigarreou e eu me senti um tonto por esquecer que ela estava ali.


— Ei, vô, quero te apresentar a Lorenza, minha amiga — falei, vendo-o sorrir largamente.


— Essa é a famosa Lorenza? — disse baixinho, quase incompreensível. Pisquei um dos olhos, concordando, fiquei feliz ao ver que Lorenza não havia entendido. Ela não precisava saber que eu falava dela em todas as cartas, não é, vovô?


— É um prazer conhecê-lo. Brandon fala muito do senhor — cumprimentou Lorenza, amigavelmente.


— Digo o mesmo — retrucou, dessa vez mais alto.


Eu não fiz nada mais que ficar extremamente vermelho.


Fora isso, o resto do dia foi perfeito. Eu e Lorenza conversamos muito, enquanto o senhor nos observava e sorria. Não conseguia dizer muito, mas eu sabia que você estava feliz com nossa presença, eu podia ver em seus olhos.


Foi um dia agradável, com certeza, mas eu tive que ir embora, infelizmente. Tudo que é bom chega ao fim, não é?


— Eu vou voltar assim que terminar as semanas de provas, vô — afirmei, vendo-o assentir.


— Cuide-se — foi tudo que disse.


Nos despedimos e então estávamos prontos para ir. Mas uma mulher alta e corpulenta nos parou antes de qualquer coisa.


— Ei, você é o Brandon, certo? — sua voz era doce e agradável, assim como seu semblante.


— Sim — falei, curioso.


— Você tem um tempinho? Um tempinho para conversar? — questionou ela.


Olhei para Lorenza, vendo-a assentir. Acenei com a cabeça e nos encaminhamos para um banco, ainda no pátio do asilo, mas dessa vez já não haviam pessoas ali.


— Eu sou Emma, enfermeira do seu avô. Normalmente cuido dele, mas hoje estou de folga. Fiquei sabendo que viria e eu precisava conversar com você — disse ela, com a voz carregada de preocupação. — Seu avô é uma ótima pessoa, cuido dele desde que ele chegou aqui. Sempre de bom humor e com ótimos conselhos, ele costumava sempre me perguntar sobre minha vida…


“O que quero dizer é que eu realmente gosto do seu avô. Ele é especial. Mas você deve ter percebido também como a saúde dele está cada vez pior, ele anda mais indisposto e com muitas dores, as vezes passa o dia na cama, repleto de remédios. E… Não é ele quem escreve as cartas para você, sou eu na verdade. Sei que eu não tenho esse direito, pois não conheço você, mas eu conheço o seu avô e eu sei o que ele diria a você. Tem todo o direito de estar bravo comigo, eu entenderia perfeitamente…”


“Mas saiba que todas as cartas que você manda eu dedico a tarde lendo para ele e você deveria ver o sorriso que ele dá quando escuta suas palavras. Com certeza ele sente como se você estivesse aqui com ele, olhando para ele e pedindo conselhos, da mesma forma que seu pai fazia quando era pequeno.”


Eu não soube o que dizer. Ela parecia extremamente íntima e apesar de ouvir tudo isso, eu não senti raiva ou incompreensão.


— Por que está me contando essas coisas? Você poderia muito bem deixar que eu pensasse que era meu avô quem me escrevia — falei.


— Você sabe que seu avô não está em condições de escrever algo. Eu só queria que soubesse a verdade e que não ficasse bravo comigo, porque eu fazia isso no incentivo de que você voltasse a mandar cartas, pois seu avô as adora — disse ela, com um brilho no olhar. Ele falava como se fosse uma filha perdida.


— Eu prometi que sempre escreveria para ele, não importa o que acontecesse. Eu não quero mais que me escreva como se fosse meu avô, certo? — ela assentiu, com um sorriso torto. — Mas por favor me escreva sobre o estado dele, se ele precisa de alguma coisa, sobre o que ele fala. Eu quero saber como ele realmente está. Pode fazer isso por mim? — pedi.


— É claro! — respondeu, com um sorriso enorme no rosto.


— Obrigado — agradeci.


Conversamos mais algumas coisas e enfim voltamos para casa.


Eu estava surpreso com tudo aquilo, mas como eu disse, não estava irritado. Ela cuidava do senhor, afinal de contas, e mesmo que fosse paga para isso, eu agradecia profundamente.


Obrigado pelo dia incrível, vovô.


Com carinho, do neto fracassado, Brandon.


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Notas finais do capítulo

Eu alterei a sinopse, porque achei que a outra não estava muito interessante, se alguém quiser me opinar sobre, eu vou ficar bem contente.

Enfim, comentem! Beijos no coração.