Cartas de um Fracassado escrita por Saturno


Capítulo 3
Carta 3: Temerário


Notas iniciais do capítulo

Olá, obrigada novamente a todos que acompanham. Boa leitura.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/633614/chapter/3

Era a terceira vez em que eu era expulso da aula por ficar ouvindo música alta demais, sendo assim atrapalhando a aula.


A professora Sarah não gostava muito de mim e, bem, eu concordo com ela. As vezes consigo ser bem insuportável.


Caminhei pelos corredores extensos e vazios até chegar na quadra da escola. Não havia ninguém lá e agradeci profundamente por isso.


Caminhei até a arquibancada, passando pelos vestiários.


Parei subitamente quando escutei um ruido baixo vindo do vestiário feminino. Infelizmente eu não estava sozinho.


No entanto, quando aproximei-me mais, por pura curiosidade, percebi que o ruido tratava-se de um choro alto demais.


Com certeza aquilo não era da minha conta, mas minha curiosidade era ainda maior e para amenizar tal defeito, minha mente me obrigou a pensar que talvez a garota estivesse se machucado e precisava de ajuda.


Adentrei o vestiário devagar e me aproximei da fonte do ruido. Havia uma garota sentada no chão, abraçando os joelhos. Não pude ver seu rosto, pois cabelos longos e castanhos impediam-me.


— Ei, você está bem? — obviamente ela não estava, já que soluçava muito.


Olhou-me rapidamente e arregalou os olhos, provavelmente envergonhada por alguém pegá-la chorando.


— Claro! Estou ótima — ela sorriu tristemente e limpou as lágrimas, mas não levantou-se do chão.


Sentei-me ao seu lado e observei a parede branca sem nenhum interesse.


— Você é o cara da festa, não é? — olhei para ela com curiosidade, observei melhor seu rosto e foi como se uma luz houvesse acendido diante de meus olhos. A reconheci no mesmo instante.


— Você é a Lorena! — exclamei, lembrando-me bem de tê-la arrastado para um quarto qualquer da casa.


— Lorenza, na verdade… — mordi minha língua e me amaldiçoei por errar o nome dela. Eu sou realmente péssimo!


— Desculpe… Eu esqueço facilmente nomes — comentei.


— Tudo bem… Brandon, né? O que está fazendo aqui? — questionou, ainda limpava o rosto.


— Eu fui expulso da aula de química. Olha, eu sei que deve ser chato ter uma pessoa qualquer sendo metida e curiosa mas… Porquê estava chorando? — tentei ser o mais educado possível, sem parecer curioso e sim preocupado.


Ela demorou alguns longos segundos — talvez minutos — para me responder, até pensei que havia ignorado minha pergunta. Soltou suspiros pesados, mas por fim, depois de um longo drama — sou um pouco impaciente, algumas vezes — disse:


— Você deve estar sabendo já… Com certeza, sim. Meu pai é o assunto do momento na cidade toda. — bufou, havia irritação em sua voz.


— Desculpe, mas não sei de muita coisa — na verdade eu não sabia de nada.


— O meu pai, bem… Ele está sendo acusado de receber propina e roubar dinheiro junto ao prefeito. Mas eu juro! Meu pai jamais faria algo assim! Ele é policial há vinte anos, nunca roubaria nada. Ele dá a vida todos os dias por essas pessoas, as protege e é assim que o agradecem… O acusando injustamente — suas palavras foram extremamente raivosas, mas eu podia imaginar o quanto estava sendo difícil para ela.


— Bem.. Se você sabe que seu pai não fez isso, então não tem motivos para acreditar nos burburinhos das outras pessoas, não é?


— É… devia ser assim. Mas eu simplesmente não consigo evitar de reparar nos comentários maldosos sobre meu pai e eu, ou dos olhares tortos. Cidade pequena é um saco!


Dei risada. Ela ficava engraçada reclamando das coisas, estava sempre revirando os olhos e mordendo o dedo.


— Do que está rindo? — perguntou ela, seriamente.


Eu realmente não sabia como aconselhar uma pessoa, me perguntava se eu deveria apenas dizer “nossa, que droga”, talvez “vai ficar tudo bem” ou sair correndo e fingir que nada aconteceu.


Tais motivos me levavam a falar coisas que eu não planejava, como:


— Você quer ir a uma festa comigo hoje à noite? — questionei, sem ao menos responder sua pergunta.


Eu a deixei surpresa, pois a vi arregalar os olhos e desviar o olhar. E, no fim, eu também fiquei surpreso com minha própria pergunta. Ela estava triste, obviamente, então é claro que não ia querer comparecer a uma festa qualquer.


Suspirei, me sentindo um idiota fracassado.


Ainda estávamos sentados no chão gelado, ainda éramos estranhos uns para os outros. Mas Lorena, digo, Lorenza fora uma das pessoas com quem mais conversei esse ano sem ela ter me chamado de idiota ou me bater — ainda.


— Eu não gosto de festas — murmurou ela.


— Ah vamos lá, vai ser legal. Prometo a você que vai se divertir — afirmei, bem convincente.


Eu fazia várias promessas, mas podia contar nos dedos quantas eu havia cumprido. E, bem, foi apenas uma: escrever toda semana para meu avô.


— Tudo bem — ela suspirou, parecia receosa, mas sorriu em seguida, levantando-se.


Retirou um papel da mochila ao canto e escreveu um número nele, entregou-me e caminhou para fora do vestiário.


— Foi legal conversar com você, Brandon… E se você puder deixar apenas entre nós o que aconteceu aqui hoje…


— Claro, claro, eu não vou contar a ninguém, não se preocupe. — afirmei, acenando a ela.


Eu havia conseguido convencê-la a ir a festa. O único problema é que não havia festa alguma e eu teria que passar a tarde procurando uma em que alguém me convidasse — ou eu simplesmente poderia entrar de penetra, porquê não?





Foi assim que a reencontrei depois do aniversário do James, vô. Eu não lembro se me senti muito contente por vê-la novamente naquele dia, mas hoje agradeço aos deuses por tê-la comigo.


Quem sabe um dia eu não a leve aí para te conhecer? O que você acha da ideia?


Espero sua carta ansiosamente.


Carinhosamente, do seu neto (nada) querido Brandon.



Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Comentários? Críticas? Sugestões?