"Não vai dar!" Sasuke-kun falou frustrado. "A música não é boa o bastante! Não importa o quanto tentemos... Só se mudássemos a melodia inteira da música. Mas isso demoraria muito."

"O Teme está certo." Naruto concordou. "Melhor escolhermos outra música."

Nós já estávamos há mais de uma hora somente escutando tentativas frustradas de melhorar o arranjo de Counting Stars. Ino e Tenten, que haviam voltado há algum tempo com sacolas cheias de comida, já estavam quase dormindo.

Suspirei.

Eu tinha algumas ideias. Mas não sabia se seria certo falá-las.

Meu costume era fazer música com apenas um instrumento.

Eu criava as letras e melodia.

Mas era só.

Não sentia necessidade de criar um arranjo. Não imaginava minhas músicas com guitarras, baterias ou qualquer outro instrumento que não fosse o que eu usava para compor (piano ou violão).

Até eu ver Gaara criando suas músicas.

Ele se preocupava com cada nota e cada som. No momento em que criava a melodia já imaginava um solo de guitarra, como seria a batida da bateria, ou até mesmo se um violino ficaria bem na música.

E então ele gravava os vocais e um instrumento por vez. Depois, juntava tudo e a mágica estava feita.

Eu estava encantada com a arte de fazer arranjos. Sempre ajudava Gaara no que podia. Dando sugestões que, eu tinha que admitir, ficavam boas.

De modo, que eu tinha criado um arranjo para Counting Stars em minha cabeça. Mas não sabia se funcionaria. Ou se deveria falar.

Mas os meninos já estavam perdendo a cabeça. E eu tinha que ajudá-los, certo? Não é para isso que amigos serviam?

"Eu tenho uma ideia." Finalmente falei, quando eles já estavam discutindo qual outra música tocariam.

"Counting Stars não vai dar, Sakura-chan." Naruto falou. "Não está boa o suficiente."

"Vamos fazer do meu jeito, e se não gostarem eu aceito qualquer música que escolherem sem falar nada." Disse.

Eles me olharam sem esperança.

"Tudo bem. Não custa nada." Sasuke-kun falou.

Sorri. Havia um instrumento especial que o Sasuke-kun adorava tocar, mas nunca tinha o usado na banda.

"Sasuke-kun, você trouxe sua flauta?" Perguntei.

O moreno me olhou estranho. "Está na mala."

Claro. Ele não viajaria sem ela. Seu irmão, Itachi, havia o ensinado a tocá-la. E mesmo que Sasuke-kun não admitisse, eu sabia que ele ainda pensava que a flauta era um meio de conectá-los.

"Pegue-a. Você vai precisar." Eu disse.

"Eu toco flauta por diversão, Sakura. Mas ela não é algo que fique bem com o som da banda." Ele falou.

"A música pode ser divertida." Afirmei. "Apenas confia. Eu tenho uma ideia."

Sasuke-kun fez o que eu pedi, mesmo não colocando fé.

"Ok. A ideia é a seguinte." Comecei. "O som está bom. A melodia, a sincronização dos instrumentos..." Falei. "Mas não está empolgante. Esse é o problema. É como se a música fosse o tempo todo num ritmo apenas. Nós podemos começar com ela mais calma e então, fazê-la ganhar força."

"Estou gostando." Naruto mudou seu olhar sem esperanças para um interessado. "Continue."

"Sasuke-kun." Chamei. "Você começa a música sozinho. Apenas com o violão, cantando o refrão de modo lento."

Levantei-me pegando o lápis e a folha em que a letra da música estava a escrita.

Marquei 6 versos. Entreguei para Sasuke-kun.

"Cante de maneira lenta o que eu marquei. Como se fosse acústico." Disse.

Sasuke-kun obedeceu.

Começou a tocar e cantar, acusticamente.

Lately, I've been, I've been losing sleep

Dreaming about that things we could be

But, baby, I've been, I've been praying hard

Said, no more counting dollars

We'll be counting stars

Yeah, we'll be counting stars

E então parou de tocar.

"Ótimo. Assim mesmo."

"E agora?" Neji perguntou.

Percebi que todos estavam atentos, inclusive as meninas.

"Levanta, Sasuke-kun." Puxei-o. Ele não colocou resistência. "Ponha a flauta no seu bolso de trás."

Ele estranhou, mas pegou a flauta do chão e fez o que pedi.

"Ok." Continuei. Sasuke-kun segurava o violão, que se pendurava em seu corpo por uma alça. "Quando você terminar de cantar o acústico com o violão, Naruto entra com a guitarra e Neji com a bateria. Você coloca o violão para trás do corpo, deixando-o pendurado pela alça, e puxa a flauta."

"Isso não vai funcionar. Tocar flauta na apresentação?" Ino falou.

Ignorei-a. Continuei a falar com Sasuke-kun. "Sabe aquele solo que você tocou na apresentação da escola no ano passado?" Ele assentiu com a cabeça. "Quero que use-o nessa música."

Sasuke-kun me encarou. "Não vai combinar."

Em minha cabeça, o solo de flauta que ele havia feito ano passado combinaria perfeitamente com o som da música.

"Custa tentar?" Questionei. "Eu contei quinze segundos que vocês levam na parte instrumental até a parte cantada começar." Falei. "Parte acústica, joga o violão para trás do corpo, Neji e Naruto entram e você começa a tocar a flauta. Tentem."

Os meninos assentiram, mesmo com receio.

Sasuke-kun voltou a cantar e tocar a parte acústica. Naruto e Neji entraram com seus instrumentos logo depois. E então veio o som da flauta.

Per-fei-to.

"Incrível!" Neji falou assim que terminaram de tocar.

"Cara! Combinou demais!" Tenten falou, empolgada.

"Acho que vou chorar!" Naruto, como sempre, exagerado.

Sasuke-kun me olhou surpreso. "Isso foi incrível!"

Sorri, encabulada. "Obrigada."

"Mais que incrível... Foi genial." Shikamaru falou. "Sempre dissemos que a flauta de Sasuke não poderia ser usada na banda, por não combinar com estilo. Mas ela só fez acrescentar."

"Eles procuram originalidade." Eu disse. "A flauta vai ser um diferencial."

"Como você conseguiu imaginar isso?" Ino perguntou. "Essa ideia não passou na cabeça de ninguém."

Muita convivência com Gaara.

Ele adorava instrumentos diferentes.

Mas, claro, não poderia falar isso.

"Bom... Passou na minha." Dei de ombros. Fiquei lisonjeada com o olhar de meus amigos. Acho que pela primeira vez, eles não estavam me subestimando. Voltei a falar sobre a música. "Depois que essa parte terminar, Sasuke-kun, você coloca a flauta de volta no bolso e pega o violão, novamente, voltando a tocá-lo." Falei. Ele assentiu. "E essa mesma parte instrumental com a flauta pode ser usada na transição da primeira parte da música para a segunda. Logo após o refrão."

"Boa! Vamos tentar." Neji disse.

"As minha ideias ainda não acabaram." Falei.

"Pode mandar, que agora eu estou empolgado!" Naruto riu.

"Então... Todos vocês tem a voz boa." Falei. "E eu gostei quando cantaram juntos em uma parte da Tenerife Sea. Acho que podem usar isso aqui, também. Para dar uma melhor dinâmica."

"Tipo no refrão?" Neji perguntou.

"Sim." Confirmei. "Vocês cantam o refrão juntos. Como o repetem duas vezes, ficaria interessante se cantassem juntos na primeira vez, mas na segunda fosse só a voz de Sasuke-kun."

"Gostei da ideia." Neji falou.

"Mas não cantarão juntos apenas o refrão." Voltei a pegar a letra da música, marcando novos versos. "Venham aqui." Chamei. Os meninos se aproximaram de mim. "Olhem." Dei a folha para eles.

Eles analisaram.

"As partes marcadas a gente canta junto?" Naruto perguntou.

"É. Como a intenção aqui é fazer a música crescer gradativamente, na primeira parte da música vocês deixam o Sasuke-kun cantando sozinho. Entram só no refrão. Já na parte dois vocês cantam a marcação."

Old, but I'm not that old

Young, but I'm not that bold

Eles cantaram, testando as vozes juntas.

Hum... "Acho que 'young' o Sasuke-kun canta só. Vocês voltam a acompanhá-lo no 'but I'm not that bold'." Falei.

Eles testaram novamente.

"Ótimo." Sorri.

I couldn't lie, couldn't lie, couldn't lie

Continuaram a cantar as partes marcadas juntos.

"Sim." Aprovei. "Agora, a partir do 'take that money'." Instruí.

Take that money

Watch it burn

Sink in the river

The lessons are learnt

Cantaram a última parte.

"Ficou bom." Afirmei. "Na versão de vocês, esse verso é repetido quatro vezes. Continuem com isso. Mas acho que o Sasuke-kun canta primeiro sozinho, na primeira vez. E então vocês entram, cantando juntos as três seguintes." Sugeri. "Para ficar mais legal, acho q a batida pode ser só do Neji. Sem o violão e a guitarra. E então entra o refrão, com todos os instrumentos e vozes. Dêem potência. É o 'grand finale'."

"Cara! Eu estou tão animado!" Naruto sorriu de orelha a orelha. "Vamos logo colocar tudo em prática!"

E então, os meninos se prepararam para tocar a música, conforme minhas dicas.

Lately, I've been, I've been losing sleep

Dreaming about that things we could be

But, baby, I've been, I've been praying hard

Said, no more counting dollars

We'll be counting stars, yeah, we'll be counting stars

Sasuke-kun começou ao violão, como o combinado.

Logo os meninos entraram com a guitarra e bateria, começando a parte instrumental. Sasuke-kun tocou, belamente, sua flauta.

Depois, colocou-a novamente em seu bolso e voltou a tocar o violão.

I see this life like a swinging vine

Swing my heart across the line

And my face is flashing signs

Seek it out and you shall find

Sorri. A sincronia da banda estava perfeita. As meninas estavam balançando a cabeça ao som da música, claramente curtindo.

Old, but I'm not that old

Young, but I'm not that bold

I don't think the world is sold

I'm just doing what we're told

Sasuke-kun cantou sozinho. Neji e Naruto só começariam a cantar a partir do primeiro refrão.

I feel something so right

Doing the wrong thing

I feel something so wrong

Doing the right thing

I couldn't lie, couldn't lie, couldn't lie

Everything that kills me makes me feel alive

A voz do moreno era clara, grave e linda. A música parecia ter sido feita para a sua voz. Talvez fosse mesmo. Afinal, a composição era da banda.

Lately, I've been, I've been losing sleep

Dreaming about that things we could be

But, baby, I've been, I've been praying hard

Said, no more counting dollars

We'll be counting stars

Os meninos cantaram juntos. A sincronia entre eles só melhorava. Parecia que tinham nascido para tocar juntos.

Lately, I've been, I've been losing sleep

Dreaming about that things we could be

But, baby, I've been, I've been praying hard

Said, no more counting dollars

We'll be, we'll be counting stars

Sasuke-kun repetiu o refrão, cantando sozinho.

I feel the love and I feel it burn

Down this river, every turn

Hope is a four-letter word

Make that money, watch it burn

A segunda parte da música começou. Shikamaru e as meninas estavam muito animados. Maravilha! É assim que o pessoal que vai julgar a audição tem que se sentir.

Old, but I'm not that old

Young, but I'm not that bold

Os meninos cantaram juntos. Ótimo!

I don't think the world is sold

I'm just doing what we're told

Sasuke-kun cantou sozinho.

I feel something so wrong

Doing the right thing

A potência de sua voz aumentou.

I couldn't lie, couldn't lie, couldn't lie

Os meninos juntaram-se novamente ao canto.

Everything that drowns me makes me wanna fly

Mais uma vez, somente Sasuke cantou essa parte.

Logo veio o refrão, unindo as vozes dos garotos.

Lately, I've been, I've been losing sleep

Dreaming about that things we could be

But, baby, I've been, I've been praying hard

Said, no more counting dollars

We'll be counting stars

"Isso está incrível, Sakura!" Ino jogou seus braços ao redor de meus ombros. Ri, concordando.

Lately, I've been, I've been losing sleep

Dreaming about that things we could be

But, baby, I've been, I've been praying hard

Said, no more counting dollars

We'll be, we'll be counting stars

A voz de Sasuke-kun brilhou sozinha na repetição do refrão.

E então o ritmo da música diminuiu. A guitarra e o violão se silenciaram. Havia apenas a batida da bateria de Neji.

Take that money

Watch it burn

Sink in the river

The lessons are learnt

Como eu havia instruído, Sasuke-kun cantou o verso sozinho.

Take that money

Watch it burn

Sing in the river

The lessons are learnt

Os meninos juntaram-se, cantando o trecho por repetidas três vezes.

Everything that kills me...

Makes feel alive

Sasuke-kun cantou.

E então a música explodiu no refrão, com os instrumentos e vozes na potência máxima.

Lately, I've been, I've been losing sleep

Dreaming about that things we could be

But, baby, I've been, I've been praying hard

Said, no more counting dollars

We'll be counting stars

"A música já era boa... Mas agora...!" Tenten falou, sorrindo. "É fenomenal!"

Lately, I've been, I've been losing sleep

Dreaming about that things we could be

But, baby, I've been, I've been praying hard

Said, no more counting dollars

We'll be, we'll be, counting stars

Sasuke-kun deu seu melhor quando sua voz voltou a ficar sozinha.

Os meninos então se juntaram para o cantar a última parte da música.

Take that money

Watch it burn

Sink in the river

The lessons are learnt

Repetiram o trecho por quatro vezes, finalizando a música.

Eu, Shikamaru e as meninas explodimos em aplausos e gritos.

"Arrasaram!" Ino gritou.

Os meninos da banda se juntaram em um abraço.

"Bom trabalho, galera!" Neji falou, sorrindo.

Naruto correu até mim, levantando-me do chão e me arrancando um gritinho.

"Sai, Naruto!" Dei-lhe um tapa no ombro.

Ele me soltou.

"Você foi demais, Sakura-chan!" Falou. "Obrigado! Obrigado! Obrigado!"

"Não foi nada." Respondi. "O mérito é de vocês. Foram vocês que arrasaram."

"O que você fez com a música foi nada menos que genial." Neji falou. "Não sabia que tinha essa genialidade em você."

Eu não era de corar, mas se fosse, provavelmente estaria igual a uma pimenta.

"Obrigada, Neji." Agradeci, envergonhada. "Mas foi só uma música."

"Uma música que estávamos quase descartando por não ser empolgante o suficiente." Sasuke-kun falou. "E então, você a transformou na melhor música da 3P!"

Meu coração se iluminou com as palavras de Sasuke-kun. Sorri, em um misto de vergonha e orgulho. Eu havia o impressionado.

Mas na verdade, eu mesma estava impressionada.

Era a primeira vez que eu fazia um arranjo sem a ajuda de Gaara.

E tinha ficado muito bom!

"Você está perdendo seu posto de empresário da banda, Shikamaru." Naruto falou, com tom de zombaria.

"Acho que Sakura está mais para produtora do que para empresária." Shikamaru rebateu.

"Você já pensou em seguir carreira como produtora?" Neji perguntou. "Isso aqui foi incrível. Como aprendeu?"

Sorri amarelo. "Eu só imaginei na minha cabeça." Afirmei. "Que bom que funcionou."

"Um dom natural." Ino falou, olhando-me com... Admiração?

"Você devia investir nisso, Sakura." Tenten falou. E pela primeira vez desde nossa briga, o clima não parecia tenso entre a gente. "Sei lá... Estudar mais sobre isso. Aperfeiçoar-se."

"Concordo." Hinata falou. "Você nos disse que não sabe o que quer fazer quando crescer. Talvez seja isso. Talvez seja produzir música. Porque talento você mostrou que tem."

Ri, lisonjeada. Mas nós sabíamos que aquilo não era possível. "Em Konoha já é difícil viver de música sendo uma banda. Imagine sendo uma produtora!" Balancei a cabeça. "Nunca daria certo."

"Concordo." Sasuke-kun falou. "Mas sabe de uma coisa?" Olhou-me com firmeza. "Um dia a 3P vai ter fama. E se você continuar fazendo o que fez hoje, então com certeza será a nossa produtora número um."

"Uma produtora famosa!" Naruto riu. "Nós todos seremos famosos!"

"E a gente?" Tenten perguntou, com tom de brincadeira, apontando para ela, Hinata e Ino.

"Vocês..." Neji falou. "Podem ser do fã clube oficial." Zombou, rindo.

Tenten fez cara de ofendida e jogou um travesseiro nele.

Neji aparou-o em suas mãos, e não pensou duas vezes antes de jogá-lo de volta.

Mas Tenten se abaixou e o travesseiro acertou Ino.

Pronto.

Foi o bastante para guerra de travesseiros se iniciar.

Shikamaru foi o primeiro a me acertar. E Sasuke-kun foi o primeiro que acertei.

Estávamos fazendo uma bagunça, batendo uns nos outros com travesseiros sem nos importarmos com o fato de estarmos pisando em cima de nosso futons, onde dormiríamos.

Houve um momento em q tropecei e caí. Tenten se jogou em cima de mim com seu travesseiro.
Nós duas rimos, enquanto os outros se aproveitaram para nos acertar.

Naquele momento não havia segredos ou desavenças.

Apenas diversão e amizade.

*

*

*

Eu não conseguia dormir.

Ainda não havia tido tempo para pensar em tudo que acontecera.

Mas agora minha mente trabalhava a toda velocidade.

Pensava em mamãe. No concurso. Em tudo que meus amigos me disseram... Apenas pensava e pensava.

Se eu ao menos pudesse desligar meus pensamentos...

Suspirei.

Eu era a única que não estava dormindo.

Os futons estavam organizados em duas fileiras de quatro. Na de cima, ficamos nós, as meninas. E na de baixo, estavam os meninos.

Merda!

Precisava de sono, mas estava longe de obtê-lo.

Minha mãe.

Ela havia me dito que odiava o fato de eu ser parecida com meu pai.

Mas por quê?

Que os dois costumavam brigar por qualquer coisa, eu sabia. Eu via.

Mas ela tinha dito que a música destruiu tudo de bom que eles tinham.

O que isso significava?

Era verdade que mamãe não gostava quando papai e vovô me ensinavam a tocar. Ela ficava irada. Dizia que meu pai não devia ficar enchendo minha cabeça de bobagens.

Mas me ocorreu que pudesse haver um motivo por trás disso tudo.

E se havia... O que era?

A música era divina. A melhor coisa do mundo. Como poderia causar a destruição da relação de meus pais?

Não fazia sentido.

E por que, mesmo odiando, mamãe nunca havia me interrompido em todas as vezes que eu tocava, achando que ela estava dormindo?

Não era do feitio dela aceitar algo que a desagradasse.

Se eu fazia algo que não estivesse de acordo com o que ela queria, logo ela me bombardeava com sua raiva.

Então por que não o fizera quando me escutou tocar na calada da noite?

E isso nos levava a outro ponto: ela queria que eu fizesse a audição.

Ela achava que eu tinha o talento necessário.

Eu não conseguia acreditar.

Minha mãe me achava talentosa.

Mas, de algum modo, isso não era uma coisa boa, para ela.

Em um momento de nossa conversa, achei que ela estivesse me expulsando de casa.

Algo em mim ainda achava.

Ela deixou claro que esperava que eu não retornasse.

Doía pensar nisso.

Doía até pensar em seu abraço.

Mas isso doía de uma forma boa.

Costumava pensar que nunca ganharia um abraço seu.

E apesar de desajeitado... Havia sido... Certo.

Do jeito que uma mãe abraça a filha.

Meus pensamento foram interrompidos quando meu celular vibrou.

Alguém me ligava.

Atendi sem nem mesmo ver quem era, antes que acordasse algum de meus amigos.

"Alô?" Disse, levantando-me e indo para o banheiro.

"Sakura." Respondeu e reconheci a voz imediatamente.

Claro.

Era Gaara.

"Está tarde." Falei baixo. "O que quer?"

"O endereço de onde está." Respondeu. "Preciso te dar algo."

Pisquei surpresa. "E tem que ser agora?"

"Obviamente." Respondeu.

Bom... Eu não iria dormir tão cedo, de qualquer maneira.

"Espera. Eu vou ver." Falei.

Saí lentamente do banheiro e procurei o papel com o endereço na bolsa de Neji, tentando não fazer barulho para não acordar ninguém.

Quando achei, voltei ao banheiro.

"Anota aí." Disse a Gaara, passando-lhe, em seguida, o endereço.

"Estarei aí daqui a pouco." Falou, desligando o telefone.

*

*

*

Quarenta minutos haviam se passado e nada de Gaara.

Talvez não viesse mais.

Não importava. Provavelmente era algo relacionado ao concurso mesmo. E eu não estava interessada.

Quer dizer...

Eu não queria estar interessada.

Talvez Gaara e minha mãe estivessem certos.

Talvez eu fosse mesmo talentosa.

Sempre achei que meu talento não seria o suficiente para me fazer viver de música. Mas talvez eu estivesse errada.

Talvez eu me subestimasse.

Meus amigos gostaram do que eu fiz com a música deles.

Pela primeira vez eu havia sido eu mesma com eles. E não havia tido rejeição. Pelo contrário. Eles haviam me elogiado muito.

Haviam me olhado diferente.

E eu gostei.

Gostei de ver o olhar de admiração deles. Gostei de tê-los surpreendido.

Hoje eu havia dado um passo grande ao compartilhar uma de minhas ideias musicais com meus amigos.

Mas participar da competição... Isso era outra coisa.

Não conseguiria.

Era exposição demais para alguém que estava começando a se descobrir.

Eu não conseguia cantar nem na frente dos meus amigos o que dirá na frente do mundo inteiro.

Ugh.

Tenho arrepios só de imaginar.

E havia a 3P, também. Eu nunca competiria contra eles. Eu estava no time deles.

Meu celular vibrou.

Uma mensagem de Gaara.

"Estou aqui na frente. Desça." Dizia.

Suspirei. Ele havia mesmo vindo.

Vesti um longo casaco e, silenciosamente, desci ao encontro de Gaara.

*

*

*

Um carro preto estava parado na frente da casa do pai de Neji. O vidro abaixou o suficiente para eu ver que era Gaara.

Entrei no banco de passageiro.

"Achei que não viesse mais." Falei.

"Isso aqui não é Konoha em que nada é realmente distante de alguma coisa." Respondeu, dando partida no carro. "Tokyo é grande e esse endereço, definitivamente, é longe do hotel em que estou hospedado."

Assenti. Resolvi mudar de assunto. "Você não vai me levar pra longe não, certo? Preciso dormir daqui a pouco."

"Relaxa." Falou. "A gente vai pra um lugar aqui perto."

"Onde?"

"Relaxa." Repetiu.

Bufei. "Estou relaxada." Depois de um momento de silêncio, perguntei: "De quem é esse carro?"

"É alugado." Respondeu. "Aluguei quando cheguei."

"Ah sim."

Depois de alguns minutos, ele estacionou o carro em uma espécie de mirante, onde se podia ver as luzes noturnas de Tokyo, fazendo-me desejar ter tempo de conhecer a cidade.

Gaara e eu saímos do carro.

O ruivo pegou uma linda caixa em prata escura do banco de trás.

Era isso que ele queria me dar?

"Não está preocupado com nenhum papparazzi?" Perguntei.

"Não realmente." Deu de ombros. "Olhe em volta. Não tem ninguém aqui. E eu precisava falar com você em um lugar tranquilo."

"Sobre?"

Gaara me olhou firme. "Participe do concurso."

Bufei. "Vira o disco, Demo."

Ele continuou me olhando sério. "Eu entendo que você tem medo. É assustador, eu sei. Ter um talento assim é assustador. Você se pergunta se é bom o suficiente e se as pessoas gostarão de você. Se te aceitarão. Eu sei." Falou, captando minha atenção. "Mas você não pode deixar seus medos te vencerem."

Gaara me deixou sem palavras.

Como ele podia me entender tão bem?

"Eu acho que não nos conhecemos por acaso." O ruivo continuou a falar. "De todas as cidades, eu fui mandado para Konoha. Tão pequena e desconhecida... Mas foi onde eu fui parar. E de todas as pessoas que poderiam te ver cantar, quem te viu fui eu." Seu olhar perfurava o meu. "Nunca acreditei em destino. Até que te conheci. Chega a ser engraçado o jeito que as nossas vidas ficavam continuamente colidindo uma com a outra. Em algum ponto, eu peguei o caminho que me trouxe até você. E eu te encontrei."

Minha respiração se alterou.

Sim. Eu também pensava como era engraçado que mesmo sendo de mundos completamente diferentes, eu e Gaara havíamos nos conhecido e até mesmo nos tornado amigos.

Mas isso não era destino. Como poderia ser?

"O acaso às vezes trabalha tão bem, que chega a nos enganar, fazendo-nos pensar que destino existe." Falei, tentando ser sensata.

Gaara balançou a cabeça. "Não." Disse. "Você sabe que isso não pode ter sido acaso. Esse tempo todo nós estávamos procurando um pelo outro. Você procurava por alguém que pudesse te ver por trás da sua máscara, e eu procurava por alguém que fizesse eu me sentir vivo novamente." Olhei para o ruivo, surpresa. "Sim. Eu me meti em encrencas, participei de muitas festas e fiz coisas das quais não estou orgulhoso. Tudo na tentativa de achar algo que completasse o vazio que eu sentia. E então, eu te conheci. E você fez eu sentir a música de novo. Redescobrir a minha paixão por ela. A razão pela qual eu quis tanto me tornar um cantor. Você foi minha amiga sem pedir nada em troca. Você também me viu por detrás da máscara. Você me viu como uma pessoa, não como uma celebridade. E não sabe o quanto eu sou agradecido por isso."

"Gaara..." Comecei, incerta. Como eu poderia responder a tudo aquilo?

"Não precisa dizer nada." Falou. "Eu só estou dizendo que acredito que houve uma razão para termos nos conhecido. Agora nós chegamos em um ponto diferente. Um ponto onde eu posso te ajudar e você pode me ajudar. Nós podemos ser um time. Nós podemos vencer todas as batalhas, desde que as enfrentemos juntos."

"Você fala sobre a competição?" Perguntei.

"Sim."

"Gaara... Eu não consigo." Balancei a cabeça. "Você sabe disso."

"Consegue sim." Afirmou. "Mas eu não vim aqui te dizer para tirar sua máscara em frente ao mundo inteiro. Não. Eu vim aqui para pedir que a use."

Olhei-o confusa. "Como assim?"

E então, Gaara me entregou a caixa prateada.

"Abra." Ele disse.

Passei a mão pela tampa da caixa. Com cuidado, abri-a.

Fiquei surpresa com o que vi.

"Uma... Máscara?" Indaguei.

"Sim." Respondeu, com firmeza.

Ela era linda.

Era uma máscara de gato que devia cobrir até acima da boca. Toda em prata escura, tinha alguns detalhes em sua superfície que davam o toque especial.

"O que... Por que... Está me dando isso?" Pisquei confusa.

"Quero dizer que você não precisa entrar nesse concurso como Haruno Sakura." Olhou-me, sorrindo. "Você pode ser, simplesmente, Lümina."

O... Quê?

"Lümina?" Repeti, vagarosamente.

"Se algo der errado... Não vai ter problema, porque ninguém saberá que é você de qualquer maneira." Gaara olhava-me com olhos esperançosos.

"Nada daria errado?" Encarei-o. "E você? Que eu saiba precisa de alguém que vença!"

"Eu não tenho problemas com isso. Porque eu já me decidi. Se não for você, não vai ser ninguém. A minha indicada é você, e só você." Falou, firme.

Que merda Gaara estava dizendo?

"Então quer dizer que se eu não participar, você também não vai?" Perguntei, irritada. "Você perdeu de vez a cabeça, Gaara?"

"Não." Rebateu. "Eu estou apenas fazendo aquilo que eu acredito ser o certo."

Balancei a cabeça. "Você não pode colocar essa responsabilidade em cima de mim."

"Isso não é sobre mim, é sobre você." Falou. "Eu gosto da Columbia Records, mas se eles me colocarem para fora, eu sei que consigo outra gravadora. Não vai ser o fim da linha para mim. Mas se você perder essa oportunidade, então, sim, vai ser o fim da linha para você. Você vai passar a sua vida inteira pensando no que poderia ter sido se apenas agarrasse a chance em sua frente. A chance que todo aspirante a músico passa a vida querendo e nem sempre consegue. Vai passar a sua vida inteira sendo apenas uma fã, escondida nas sombras. A escolha é sua."

As palavras de Gaara me atingiram. Mas eu não podia... Não podia...

Merda!

"Gaara..." Estava preparando a minha negativa.

"Não precisa responder." Ele disse. "Vou te levar para casa e você pensa sobre isso. Ainda tem tempo para pensar. Apenas me prometa uma coisa, ok?"

"O quê?"

"Eu quero que você seja treinada por mim até o dia da competição em Nova York." Falou, sério. "Se até lá eu não conseguir mudar a sua cabeça, então aceitarei sua decisão. Prometa."

"Eu..." Comecei incerta. "Prometo. Eu prometo." Respondi firme.

Afinal... Depois de tudo, esse seria o único pedido que eu poderia atender.