Sakura não sabia dizer exatamente quando as coisas mudaram tanto. Mebuki não mais se referia a Sasuke como uma catástrofe.

Eram catástrofes. Desastre total. “Onde foi que eu errei com essa menina?”

Afinal, eles eram um plural agora. Talvez fossem fadados àquilo desde o dia em que o pequeno Uchiha disse que a achava bonita, anos atrás, após Sakura sentir-se diminuída pelo apelido nada gentil que lhe fora dado. Ou desde o dia em que ele lhe mostrara a língua, na primeira vez que o viu.

Independentemente de quando tudo se iniciara, estavam juntos. Aquele menino mal educado que depois virou um grande amigo, tornou-se seu namorado.

Bastou um ato de coragem de Sasuke, levemente embriagado pela bebida fermentada. Talvez se não fosse aquilo ainda estariam estagnados onde estiveram por tanto tempo. Viraram plural após um beijo doce com gosto de vinho que deu origem a um segundo beijo na manhã seguinte.

Sasuke abraçava o corpo da garota e eles se encaravam de uma maneira que não estavam acostumados a fazer tão abertamente. Sasuke reparava nas poucas sardas que ela tinha e no quão gracioso aquilo podia ser. Sakura reparava nos cílios longos que ele possuía e nos olhos tão negros e tão profundos.

Não era como se estivessem vendo tudo aquilo pela primeira vez. Mas há uma diferença tênue, porém crucial, entre ver e enxergar.

Enxergavam-se, pela primeira vez.

O Uchiha foi o primeiro a sair do agradável torpor em que ambos se encontravam. Sorriu levemente ao encarar os grandes olhos verdes vidrados nos seus. Aproximou-se de maneira lenta e selou os lábios rosados com ternura, antes de levantar-se para escovar os dentes, como sempre fazia naquela rotina que eles tinham criado.

O que se seguiu depois foi a verdade catástrofe, de acordo com Sakura.

Sua mãe não havia ido trabalhar e encontrou com Sasuke saindo do quarto de sua filha. A visão que ela teve foi de um garoto com as roupas amassadas, cabelo desgrenhado e uma escova de dentes nas mãos.

E piercings na cara.

A mulher apenas apontou com o dedo para que ele voltasse para o cômodo, o que foi prontamente atendido. Ela o seguiu e gritou.

E gritou muito.

Expôs, aos berros, tudo o que achava sobre Sasuke. Depois, ainda aos berros, expulsou os dois de casa.

Sakura acabou indo para a casa dos Uchihas, aos prantos. O moreno, ainda que assustado pela situação não esperada, abraçava-a e murmurava palavras de conforto.

Ambos não sabiam bem o que fariam dali para a frente, afinal Sakura estava apenas com a roupa do corpo. Nem mesmo os documentos estavam consigo.

– Nós vamos dar um jeito, você vai ver. Itachi não vai se opor sobre você ficar aqui.

Porém, não foi preciso. Ainda naquele mesmo dia, a matriarca Haruno foi atrás da filha. Não pediu desculpas e nem mesmo encarou o moreno, mas a levou de volta para casa. Lá, apenas agiu como se nada daquilo tivesse acontecido.

A situação toda fez com que o terceiro beijo acontecesse no colégio, um dia depois de toda aquela confusão. Sakura não passou na casa de Sasuke pela manhã, o que o deixou profundamente incomodado. Sendo assim, ele a esperou do lado de fora.

Ela se aproximou em passos incertos. O rosto ruborizado e a maneira como mordia os lábios mostrava o quão insegura estava. Certamente envergonhada por tudo o que acontecera no dia anterior.

– Bom dia, Sasuke-kun.

Como sempre, ele apenas assentiu de leve com um sorriso brincando nos lábios.

– Hmm... Você vai entrar agora?

Sasuke assentiu novamente e quando ela se virou para prosseguir para dentro da escola, ele segurou seu pulso.

– Não está esquecendo de nada?

E antes que ela pudesse pensar em lhe responder, ele a beijou. Colou seus lábios e adentrou a língua em sua boca. Sua mãos acariciavam sua cintura, enquanto as dela rapidamente alcançaram sua nuca.

Quando o ósculo teve fim, ela lhe encarava com as bochechas coradas. Sasuke gostava disso.

Eles deram as mãos e atravessaram os portões do colégio.

E então houve o quarto, o quinto, o sexto beijo. Eles não lembravam quantos mais.

E apesar do desgosto de Mebuki pela situação, Sakura não conseguia evitar. Aquilo tudo parecia tão certo. Estar ao lado dele era certo e ela insistiria o quanto fosse necessário.

Eles insistiriam.

E insistiram.

Desde então, um ano se passou. Um ano desde o primeiro beijo que trocaram. Estavam no terceiro ano do Ensino Médio em um namoro que não era exatamente fácil, pois eles eram muito diferentes. Mas Sakura estava sempre lá na difícil data da morte de seus pais e Sasuke sempre a acalmava depois das constantes discussões que ela tinha com a mãe.

Ela estava lá quando ele não estava bem. E ele marcava presença em cada sorriso que ela dava.

Compartilhavam sonhos, medos, aflições.

Não era fácil, mas era certo. Tão certo que eles insistiriam ainda mais. Ambos já sabiam que fariam faculdade em outra cidade e que morariam juntos a partir do próximo ano.

E mesmo vendo toda aquela perseverança de perto, Mebuki nunca aceitara o namoro. Ela não conseguia compreender o quão sincero era o sentimento dos dois. Não via o quão bem ele fazia para ela. E o quão importante ela era para ele.

Ela apenas conseguia enxergar as falhas dele, agora também dela. Os erros, as brigas, as festas com álcool, o estilo rebelde do garoto órfão.

Mas Mebuki a amava demais para não permitir o relacionamento, porém recusava-se a chamá-lo de namoro. Era uma catástrofe.

Ou melhor, catástrofes. No plural.