Ovelhas Negras escrita por Bianca Vivas


Capítulo 18
Lola não sabe o que Felipe nunca disse




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Maria de Lourdes

Os dois entraram confiantes na sala. O menino mais baixo falou algo com a professora. Em seguida, sentou novamente ao lado dela. Com o canto do olho, Lola viu Felipe seguir para o fundo da sala. Luan apontou para o garoto, contudo ele o ignorou veladamente. A sensação de que algo estranho estava acontecendo crescia a cada segundo dentro dela.

Desde o dia em que almoçou na casa de Felipe e ele se recusou a chamar Luan, Lola começou a desconfiar. Agora, Felipe nem a beijara de volta direito. Ele não estava apaixonado por ela? Na cabeça de Lola, só tinha uma explicação para isso acontecer: Luan tinha dito algo para Felipe. Aquele ciúme idiota dele estava estragando sua amizade com Felipe! E ela nem sabia porque se importava tanto com isso, mas o fato do mundo querer afastá-la dele, a fazia ter vontade de se aproximar ainda mais, só para provar que não seguia os desejos alheios.

Ela voltou a fitar o quadro e a observar a professora falando. Porém, nem escutava as palavras que saiam da boca da mulher. Muito menos entendia o que ela escrevia e que, supostamente, os alunos deveriam anotar. Lola apenas mordia a caneta, pensando sobre o problema que estava tirando seu sono.

— Vem cá, onde você achou Felipe? — A menina perguntou para Gabriel de repente.

— No banheiro, por quê? — Gabriel, que estava concentrado na aula, levou um susto ao ouvir a voz da colega e acabou borrando a página com a tinta da caneta. — Por que quer saber isso?

— Por nada. — Lola franziu o cenho, notando que Gabriel enxugava as mãos na calça jeans. — O que ele estava fazendo lá?

— Ele passou mal. Nada demais. Por quê? — Ele fitava Lola e sua voz falhava a cada palavra. A menina percebeu que ele estava se esforçando demais para não desviar os olhos.

— Você é um péssimo mentiroso — Lola disse, por fim, bem devagar.

Ela voltou sua atenção para a professora à frente, mesmo sem entender uma única palavra do que a mulher dizia. Gabriel continuou olhando a garota por alguns segundos. Lola podia ouvir os dedos dele tamborilando na mesa e o som do contato da pele da mão com a calça jeans. Ela sentia que Gabriel estava nervoso. Isso só aumentava suas suspeitas quanto a Luan e Felipe.

Lola tinha quase certeza de que Luan havia dito algo para Felipe. Talvez o ameaçado. As ideias sobre brincadeiras de Luan eram completamente diferentes das de Felipe. Lola nem queria imaginar o que seu suposto melhor amigo havia dito para seu namorado de mentirinha. Em sua mente, toda vez que pensava sobre o assunto, era algo ainda mais absurdo.

— Olha, eu não posso te contar — Gabriel atirou. A voz do garoto, além de muito baixa, estava um pouco assustada. — Mas você é a suposta namorada dele e ele vive falando que é apaixonado por você, então acho que tenho que falar isso pra você.

— Tá, para de enrolação e fala logo. — Lola estava impaciente e revirava os olhos a cada palavra.

— É que... bem... sabe... — Gabriel esfregava as mãos mais uma vez na calça jeans e falava o mais baixo que conseguia. — Tem alguma coisa acontecendo entre Felipe e Luan.

—Conta uma novidade, garotão. — Ela deu um suspiro, irritada. — Eu quero saber é exatamente o que está acontecendo entre eles, entendeu?

Lola olhava para o menino, inquisitiva. Queria respostas e esperava que Gabriel as tivesse. Todavia, seu colega apenas prestava atenção na aula e nada dizia. Por fim, ele deu de ombros e, sem nem olhar para ela, respondeu:

— Isso você vai ter que perguntar para ele.

Lola forçou um sorriso amarelo e voltou a fingir que prestava atenção na aula. Começou a brincar instintivamente com as tranças de seu cabelo. Algumas vezes, soltava suspiros. Toda vez que fazia isso, Gabriel olhava para ela. A atitude de Lola era sempre a mesma: virar o rosto. E se Luan estivesse ameaçando mesmo Felipe ou fazendo o garoto acreditar que estava sendo perseguido, ela nunca saberia. Felipe não falaria. Luan jamais se entregaria. E Gabriel se recusava a abrir a boca.

Ela passou o restante das aulas pensando sobre isso. Sempre olhava para o fundo da sala, procurando pelos rostos dos dois meninos. Felipe estava sempre olhando para frente, mas Lola tinha a impressão de que seu olhar estava vago. Parecia fitar um lugar bem distante. Não falava nada e, vez ou outra, parecia que fazia alguma anotação. Luan, por sua vez, dava algumas encaradas em Felipe e quando notava os olhares de Lola, piscava para ela. Luan continuava o mesmo. Apenas Felipe estava mudado.

Com um sacrifício enorme, Lola conseguiu chegar à única decisão sensata que poderia tomar. Ela teria de falar com Felipe e perguntar o que estava acontecendo. Ou nunca descobriria e seria obrigada a ficar com a dúvida. Não era algo que Maria de Lourdes estava preparada para lidar.

Quando o último sinal bateu, ela enrolou para guardar seu material. Sabia que Felipe gostava de colocar tudo de maneira meticulosa na mochila. Só para não danificar seus materiais. Ela sempre o achou organizado demais. Enquanto ajeitava todas as listas que recebera no dia dentro do caderno, Lola percebeu algo pelo canto do olho. Luan também estava enrolando para guardar as coisas

A garota achou bem estranho aquilo. Porém, seria ótimo ter aquela conversa com os dois de uma vez. Especialmente Luan, que parecia estar infernizando a vida de Felipe.

O grande problema foi que Felipe também percebeu que, tanto Luan quanto Lola, estavam enrolando para arrumar o material. Para fugir deles, Felipe jogou o resto das coisas que estavam na carteira dentro da mochila. Encaminhou-se para a porta quase correndo. Queria sair o mais depressa possível. Lola, entretanto, foi mais rápida.

Ela pulou na frente, bloqueando sua passagem. Jogou as negras tranças para trás e pôs as mãos na cintura. Parecia mais uma mãe do que uma adolescente de dezessete anos com dificuldades para seguir regras.

— Preciso falar com você — ela disse com a voz firme, respirando fundo várias vezes.

— E eu preciso ir para casa — Felipe respondeu, com a voz bem baixa, em tom de súplica.

O menino estava com os olhos vermelhos e as sobrancelhas unidas. Mordia o lábio inferior e sua cabeça pendia para o lado. Ele segurava a mochila com força demais e olhava de Lola para Luan, e deste para a porta. Lola suspirou, analisando suas possibilidades.

— Sinto muito — ela disse, correndo até a porta —, mas eu preciso saber o que diabos está acontecendo com você!

— Não está acontecendo nada. Nada, Lola! — Ele respondeu alteando a voz. — Dá pra confiar em mim?

— Tem certeza? — Luan perguntou lá do fundo, dando um sorriso de canto e sentando numa das cadeiras. — Se a Lolita está desconfiada, ela deve ter alguma razão.

— Cala a boca, Luan — Lola cortou e então se voltou para Felipe: — Ele tem razão.

Lola sabia que estava forçando a barra. Dava para ver que Felipe tentava se controlar ao máximo. Ele era um garoto tímido, e se estava acontecendo mesmo algo sério, ela tinha medo de qual seria sua reação. Se ele caísse em prantos, ela podia lidar com isso. Seu medo era que o menino tivesse uma explosão de raiva. Ela definitivamente não saberia o que fazer.

Ele suspirou e se apoiou na parede atrás de si. Passou uma das mãos pelo cabelo e mais uma vez Lola se perguntou o que estava acontecendo com ele.

— Olha, eu não tenho que te dar satisfação da minha vida. Você não é nada minha.

As palavras de Felipe cortaram o ar e atingiram a garota em cheio. Ela sentiu a cabeça girar e achou que, de alguma forma, estava sendo sugada para debaixo de toda aquela cerâmica. Lola cambaleou alguns passos e procurou algo para se apoiar. Ainda não acreditava no que acabara de ouvir. Até Luan tirou o sorriso do rosto ao ouvir àquilo.

— Eu sou sua namorada — foi a única coisa que ela conseguiu dizer. Sua voz era um sussurro quase inaudível, mas Felipe deve ter ouvido, porque começou a rir.

Era um riso seco e sem humor. Parecia que ele estava se lamentando por alguma coisa.

— Namorada de mentira — ele corrigiu. — Ou melhor, ex-namorada de mentira.

Ele passou por ela, empurrando-a para o lado e saiu porta à fora. Lola nem teve mais forças para retrucar ou impedir que ele fosse embora, muito menos para exigir qualquer explicação. Sua cabeça girava. Ela sentia náuseas só de lembrar o que Felipe acabara de dizer. Nunca pensou que aquele namoro de mentira acabaria daquele jeito. Ele era o elo fraco, não era?

Mesmo assim, algo dentro de Lola dizia que ele não falava aquilo de propósito. Existia alguma coisa escondida que Felipe não estava contando. Ela sentia isso. Ela sabia disso. Ele estava escondendo algo, ou seus olhos não estariam tão cheios de lágrimas, quando ele saiu pela porta da sala de aula. 

 


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