Aquela situação parecia utópica. Era inacreditável que ela estivesse ouvindo toda aquela história.

Hermione estava sentada à pequena mesa da cozinha em frente àquela mulher estranha. Rony estava de pé, atrás dela, com as mãos apoiadas em seus ombros em um reflexo quase perfeito do outro casal.

A história não podia ser mais absurda e ela ouvia tudo como se estivesse em tranze.

— Isso não é possível — Rony falou mais uma vez assim que a mulher se calou — Nós dois compramos essa casa.

— Eu te disse que aquele corretor não parecia ser de confiança. — a mulher, que agora sabiam se chamar Judy Dowich, falou ao marido, olhando para os dois em seguida — Precisamos resolver essa situação.

— Sim. Precisamos mesmo. — Hermione se fez ouvir, e ainda falava com um ar de incredulidade.

— Olha, senhora Weasley — o homem começou e Hermione sequer tentou corrigir. Já havia percebido que não adiantaria, muito menos naquela situação — entendemos que tudo foi um engano, mas essa casa é nossa, sempre foi nossa.

— Não, senhor Dowich — ela respondeu altiva — Essa casa deixou de ser dos senhores quando a colocaram à venda.

— Mas nós falamos com o corretor, o senhor Flesh, e ele afirmou que falaria com o senhor Weasley — a mulher falou igualmente autoritária.

— Mas ele não falou comigo — Rony se prontificou — Aliás, as únicas vezes que falei com o senhor Flesh foram para vir olhar o imóvel e assinar o contrato.

— Então temos um problema — o homem continuou — Porque ele nos garantiu que a casa estaria desocupada antes de ontem. Ainda esperamos dois dias para voltarmos.

— Mas a casa não está desocupada, não sei se o senhor percebeu — Rony falou irônico.

— Só queremos nossa casa de volta — a mulher comentou entristecida — Vivemos bons momentos aqui. Fizemos as pazes e só queremos continuar de onde havíamos parado.

— Sinto muito, mas não vai ser aqui que continuarão de onde pararam. Estamos bem aqui, agora. Pagamos uma fortuna por essa velharia e vocês não vão tomar essa casa da gente — Rony foi enérgico.

— Rony… — Hermione colocou a mão sobre a dele e ele se abaixou até ela, que cochichou — Acho que podemos falar com o Percy sobre isso, não acha?

— Vou mandar um patrono pra ele.

— Não pode, aqui não, esqueceu? Mas pode mandar um sms pra Gina e ele pode aparatar aqui.

— Com licença — Rony se afastou sob o olhar confiante de Hermione e o senhor Dowich aproveitou para conversar com Hermione.

— Senhora, seja consciente. Vemos que são um casal jovem, tem quanto tempo de convivência? De casados? Um ano. Dois, talvez? Estão começando agora.

"Nós já temos certa bagagem, minha esposa está grávida. Queremos que nosso bebê cresça aqui, onde os seus pais viveram a maior parte de suas vidas. Vocês podem muito bem ir para outro lugar. O que acha?"

— Eu dou meus parabéns a vocês pelo bebê. Imagino que deve ser muito bom estar grávida — Rony, que voltava da sala, parou para ouvir Hermione, lembrando do que haviam passado há alguns dias — Mas, infelizmente, não vamos para lugar nenhum.

"Também não é da conta de vocês, mas Rony e eu estamos juntos a bem mais tempo do que vocês imaginam, talvez mais do que vocês mesmos. Vivemos mais problemas e dificuldades que muitos casais por aí e se estamos aqui, hoje, é porque concordamos com isso.

"Entendo que essa casa tenha um significado especial para vocês, mas também tem um significado muito especial para nós. Como não poderia ser diferente, já vivemos muitas coisas aqui, coisas significativas, e essa casa está cheia de características nossas…"

— Mas por que não podem ir para outro lugar? — a mulher perguntou.

— Por que não vão vocês para outro lugar? — Hermione rebateu — Essa casa é nossa por direito. Nem sei o que ainda estão fazendo aqui.

— Cancelamos a ordem de venda dela. Faz mais de dois meses. — o homem se aborrecia.

— Mas quando cancelaram, o Rony já havia comprado, então, vocês que resolvam isso com a pessoal a qual entraram em contato para cancelar a venda, senhor Dowich, pois o que sei é que a casa foi colocada à venda, sim, e por duas pessoas que não podiam sequer entrar em acordo sobre quem a venderia, o que causou problemas para Rony e eu.

"O problema maior é que, agora, essas mesmas duas pessoas aparecem aqui, na minha casa, pedindo para que eu saia com o meu marido daqui. Isto é, no mínimo, estranho, não acham?"

— E confuso — Rony entrou na cozinha e tão logo se aproximou de Hermione, satisfeito pelo que ela falou, pomposo com o ar de "meu marido". Ouviu a campainha tocar em seguida e foi até à porta. Era Percy, muito bem vestido em um terno escuro, que entrava para a cozinha ao seu lado.

— Boa tarde — ele apertou as mãos do casal antes de cumprimentar Hermione — Sou Percy Weasley, irmão e advogado do Ronald.

Rony quase tossiu quando ouviu o irmão se intitulando advogado, ainda mais quando percebeu que era para lhe defender.

Percy já havia feito coisas do tipo para os irmãos, mas era a primeira vez que Rony presenciava.

Hermione estava ainda mais altiva, sabia por Gina como Percy ajudava os irmãos quando precisavam.

Imaginavam que fosse uma forma de se redimir pelo tempo em que passou ao lado do Ministério.

— Posso saber o que está acontecendo? — Percy continuou, puxando uma terceira cadeira e sentando-se à mesa.

— Como chegou aqui tão rápido? — foi o que o senhor Dowich perguntou, estranhando que ele tivesse aparecido tão logo após a saída de Rony.

— Estava pelas mediações quando recebi o sms do meu irmão. Estão querendo que ele e a Hermione abandonem a casa para que voltem a morar nela. Seria isso?

— Sim… Quer dizer — o homem se atrapalhou — Não é que eles abandonem, mas queremos voltar para cá.

— E vocês se lembram que haviam colocado a casa à venda e por isso o Ronald a comprou? E também a Hermione?

— Como assim ela também comprou? — a mulher perguntou parecendo confusa. Percy olhou para os dois e Hermione continuou.

— Claro que sim. Somos um casal, não somos? É obvio que compramos.

— Mas ele disse…

— Isso é um jeito de falar — Percy continuou, entendendo a deixa de Hermione — Quando meu irmão e sua “esposa” compraram a casa, vocês estavam bem longe daqui.

"A casa foi negociada com corretores, com o corretor — ele se corrigiu depois do olhar que Rony lhe deu — e eles têm documentos legais que comprovam a compra."

— Mas nós cancelamos a venda. Quantas vezes precisaremos repetir?

— Nenhuma mais — Percy foi decisivo — A menos que tenham documentos que comprovem a posse da casa, como sei que Rony e Hermione têm, ou que queiram comprar a casa, caso eles queiram vender, o que não é o caso, vocês não tem direito algum sobre ela, muito menos deveriam estar aqui, agora, exigindo que este casal tão feliz saia dessa casa para que fiquem aqui.

— Como você sabe de tudo isso? — o homem perguntou novamente. Ele estranhava que Percy pudesse saber de tudo tão rapidamente. Ao menos se reunira com o casal antes.

— Meu irmão me mandou um sms, já falei. Agora, se podem me fazer o favor, saiam e procurem o corretor, e caso tenham documentos registrados que confirmem a posse da casa, podem me procurar, eu mesmo agilizarei a saída de meu irmão e minha “cunhada” — e entregou cartões aos dois.

Os dois saíram ao perceberem que realmente não resolveriam nada ali, ainda mais com a presença do tal advogado familiar.

Ao ver a porta se fechar, Percy olhou para os dois e os encarou, esperando explicações.

— Obrigado por vir, Percy — Rony começou.

— Eu ainda estava na mamãe quando Gina recebeu a mensagem. Sorte a sua que ela também estava lá. Mas não precisava ter sido tão exagerado e dizer que estavam expulsando vocês de casa.

— Mas era verdade — ele se defendeu — Pelo menos, era o que eles queriam. Percy continuou com aquele ar de interrogação.

— Sim… — Hermione continuou — Eles acham que somos um casal, e nem tentamos desmentir, afinal, não daria em nada mesmo.

— Sei… — Percy olhou os dois com um sorriso divertido.

— É verdade, mané. Deixa de coisa.

— Olha como você me trata, cenoura. Sou seu advogado. Posso fazer você perder essa casa, se eu quiser, e te denunciar no Ministério por usar magia em uma região impedida.

— Como é? — Hermione olhou de um para o outro.

— Não é nada, Mione — Rony parecia sem graça e coçava a nuca — Obrigado por vir, Percy...

— Rony, o que você fez? — ela o encarou.

— Ah... — o ruivo parecia irritado — Mandei um sms enfeitiçado.

— Enfeitiçado como? — ela se preocupou.

— Quase um patrono falante, só que em celular. Como um áudio — Percy respondeu.

— Rony, podemos ser expulsos daqui. Daí esses dois vêm e tomam a nossa casa.

— Não serão — Percy continuou — Tornei imperceptível. Esqueceu que sou eu que faço o controle de magias para o Ministério?

— Obrigada Percy, novamente — Hermione agradeceu mais tranquila — Você nos salvou.

— Tudo bem. Família é pra isso mesmo — o mais velho respondeu com o rosto avermelhado.

— Mas foi ótima a sua atuação, senhor Dr. Weasley — Rony brincou.

— Não atuei totalmente — Percy explicou — Tenho estudado bastante sobre os trouxas com o papai e me interessei por algumas profissões. A área das leis trouxas é bem interessante, se quer saber.

— E bem o seu estilo — Hermione falou — Obrigada, Percy. Mil vezes, obrigada.

— Não precisa agradecer, "cunhadinha" — ele sorriu novamente — Agora vamos. Mamãe pediu que levasse vocês.

— Por que? — Rony perguntou sem muita animação.

— Quer saber sobre essa história da casa e se certificar que não estão em estado avançado de desnutrição.

— Olha… A Mione cozinha melhor do que aparenta…

— O que quis dizer com isso, Ronald? — ela se virou para ele um tanto que furiosa.

— Que você é quase tão boa quanto a mamãe — Percy defendeu o irmão e ambos sorriram enquanto Hermione cruzava os braços.

Era muito bom ter um pouco dos Weasley perto dela. Era gostoso ver a interação de Percy com os irmãos depois da tragédia na batalha de Hogwarts. Ele continuava estudioso e carrancudo, mas havia deixado um lado mais Weasley transparecer, ainda mais depois do nascimento de sua primeira filha, Molly.

Rony trancou a porta e os três saíram em caminho à praça onde poderiam aparatar. Os irmãos brincavam entre si, e Hermione sorria das bobagens que Rony dizia. Sem dúvidas, era fantástico estar ali, mesmo que por pouco tempo.