Quando Hermione abriu os olhos, instintivamente se assustou, mas permaneceu imóvel.

Sentiu a respiração compassada de Rony ao seu lado sobre a cama e se deu conta do que havia acontecido entre os dois.

Respirou pesadamente e observou o teto. Percebeu que ainda estava nua sob o lençol e lembrou de como acabou sem roupas.

Poderia negar a quem quisesse ouvir que não sentia nada, que não queria nada e que não esperava nada, mas a verdade é que ela se lembrava dele e de como se sentia bem ao seu lado muitas vezes, mesmo com toda a sua infantilidade e irresponsabilidade.

“São tantos i's pra adjetivar esse garoto que até perco as contas...”

Pensou enquanto o observava. Nem se deu conta do sorriso abobalhado que se formou em seu rosto.

Respirou novamente e decidiu levantar. Precisava pensar muito bem em como lidaria com a situação em que se meteram.

Passou a mão com leveza sob o travesseiro, temendo acordá-lo, e puxou o pijaminha que estava lá. Vestiu e saiu.

Na cozinha, tomou um copo grande de água enquanto lembrava da acalorada noite anterior.

“Rony sempre foi tão romântico nesses momentos... Ele não mudou nada em todos esses anos... Será que esteve com outras mulheres além de mim?”

A incerteza povoou a mente da morena. Fazia tanto tempo desde a última vez em que tinha passado uma noite com Rony que ela pensou ter esquecido daqueles detalhes.

Todavia, aquela noite foi suficiente para trazer de volta sentimentos e sensações que ela não conseguiu ter com mais ninguém, inclusive o ciúme ao imaginar que outra mulher poderia ter estado em seus braços. Outra que não ela.

A lembrança das mãos do ruivo sobre seu corpo, de seu peso sobre o dela, de seus beijos e de seu calor fizeram com que ela desviasse o pensamento de coisas que a deixavam ansiosa, levemente nervosa, com desejo de voltar ao quarto e acordá-lo para continuarem o que fizeram durante a noite, mas ela não faria isso. Decidiu cozinhar.

— Bom dia, Hermione — ela ouviu a voz do ruivo alguns minutos depois e sentiu os pelos da nuca se ouriçarem.

Ele parecia ansioso, talvez esperando a reação que ela teria.

— Bom dia — respondeu o mais tranquilamente possível — Estou fazendo panquecas. Quer a sua com o quê?

— Com o que você estiver fazendo as suas. Não quero te dar trabalho — ele respondeu se aproximando, ponderando se estavam bem ou não — Precisa de ajuda?

— Ér... — ela deu uma olhada rápida ao redor — Você pode fazer o suco. Está quase tudo pronto.

— Tudo bem — ele resolveu se calar.

Os dois permaneceram em silêncio enquanto faziam suas tarefas. Sentaram-se à mesa e comeram quase sem falarem nada.

O clima era estranho, como se as perguntas estivessem sobrevoando suas cabeças, mas nenhum dos dois arriscava começar a fazê-las.

— Ficaram muito boas — o ruivo tentou puxar assunto. Hermione estava estranha.

— Obrigada.

Ele não imaginou que isso aconteceria depois de uma noite de amor. Pensou que acordaria e encontraria Hermione ao seu lado, deitada sobre seu peito e que poderia observá-la enquanto dormia, do mesmo jeito que fazia quando eram namorados e escapavam dos pais nos finais de semana.

Percebeu que não seria assim quando se viu sozinho na cama, com sua roupa dobrada sobre a cadeira da escrivaninha.

Naquele instante ele sentiu que havia invadido um território inabitado há muito tempo e se preocupou ao equiparar o que aconteceu após o beijo que trocaram semanas antes.

“Se ela mal falou comigo depois de um beijo, imagina depois disso...”

Resolveu se vestir e descer. Sabia que ela estava na cozinha porque era pra onde ela sempre ia quando queria pensar.

Sorriu intimamente ao comprovar seu pensamente encontrando a garota da maneira que imaginou, se dando conta que estava aprendendo detalhes sobre ela que nunca havia reparado nos anos de namoro.

— Posso fazer uma pergunta? — ele começou e ela o olhou com apreensão.

Passaram-se alguns instantes antes que ela respondesse. Talvez estivesse avaliando se deveria ou não responder a pergunta que viria.

— Pode — a resposta saiu um pouco seca, mas ele não se intimidou.

— Por que você sempre vem cozinhar quando está nervosa?

Ela olhou para ele com mais atenção. Era uma pergunta estranha, uma que Hermione não imaginou que ele fizesse e que a pegou desprevenida, poque ela não sabia que fazia o que ele dizia.

— Não sei... Eu faço isso?

— Sim... Você faz — ele respondeu com um sorriso leve — Percebi faz um tempo. E costuma cozinhar muito bem quando está nervosa. Melhor do que o normal... Como agora. Essas panquecas estão deliciosas.

— Mas não estou nervosa — falou acusadoramente, o encarando — Quem te disse que estou nervosa?

— Hermione, a quem você quer enganar? Somos adultos e eu não vou aceitar ficar nessa de que nada aconteceu entre a gente.

— Rony, eu não quero falar sobre isso... — a voz saiu baixa e ela preencheu a boca com panqueca em seguida.

— Hermione. Não adianta. Eu não vou deixar isso pra lá. A gente dormiu junto. Sei que você deve ter vindo pra cá pra pensar em mil e uma formas de a gente passar por cima disso como se nada tivesse acontecido, mas antes de você resolver qualquer coisa, você precisa permitir que eu dê a minha opinião porque isso diz respeito à minha vida também.

— Não estou decidindo nada, muito menos por você — foi enfática, pega de surpresa. Não imaginava que fosse tão transparente em suas atitudes ao ponto de Rony percebê-las.

“Ou será que ele está mais atento do que quando eu conheci...?”

— Hermione, a gente fez amor e, por sinal, foi muito bom...

— Não quero falar sobre isso — ela interrompeu sentindo o rosto quente e ele continuou tranquilamente, deixando a garota um pouco intimidada.

— E eu entendo que você esteja confusa e nervosa, eu também estou...

— Não estou confusa nem nervosa.

— Mas a gente precisa decidir o que está acontecendo aqui...

— Não está acontecendo nada.

— Porque eu não quero ser ignorado por você de novo...

— Não estou te ignorando.

— Isso me machuca.

Ela o olhou com atenção. Se perguntou se ele realmente estava sendo sincero. Ele parecia sincero e Hermione não sabia como agir. O medo de se deixar enganar por seus sentimentos a aterrorizava.

— E o que você quer que eu faça? — Hermione perguntou com a face avermelhada. Estava claramente nervosa. A voz começava a se alterar.

— Eu não sei... Eu não sei o que fazer, mas não podemos simplesmente ignorar o que aconteceu. Temos que encontrar uma solução juntos...

— Rony, a gente pode ignorar, sim. Foi um erro o que aconteceu aqui... — ela parou um instante antes de continuar. Rony a olhava atentamente e ela tinha convicção do peso de suas palavras — A gente não pode simplesmente ficar brincando de amigos coloridos...

— Só se a gente seguir aquele filme que vimos dia desses... — falou com um leve divertimento na voz. Ele também estava nervoso.

— Isso não é um filme. Isso aqui é vida real e é difícil de viver. O que aconteceu entre a gente foi um erro...

— Você acha que foi um erro? — ele a interrompeu com segurança — Não parecia errado ontem.

— Você me agarrou! — ela começou a aumentar a voz.

— Porque você pediu — ele respondeu aumentando o tom também.

— Eu não pedi! Que loucura você está dizendo? — ela continuou, o encarando.

— Ah... Deixa eu te lembrar — ele continuou com um falsete, imitando Hermione — “Nunca tive medo de correr riscos”.

— Eu não pedi — ela o olhou com irritação.

— E essa frase quis dizer o quê, Hermione? O que você quis dizer com isso? Eu acho que entendi o recado, até porque te conheço muito bem e sei que não teria lei de proibição de uso de magias que te impedisse de me petrificar se eu tentasse alguma coisa que você não quisesse.

— Eu não quero falar sobre isso — ela se levantou, acompanhando o tom de voz, e caminhou em passos largos para a sala.

— Não? E por que não, Hermione? — ele foi atrás, a voz igualmente alterada — Por que isso te abala? Por que você não consegue admitir que queria fazer amor comigo? Por que é tão difícil pra você?

— Por que é tão difícil pra você entender que eu não quero falar sobre isso!? — gritou.

— Por quê? — ele se movia nervosamente pela sala — Por quê? Você quer saber por quê?

"Porque eu passei cinco anos da minha vida esperando que você um dia voltasse pra gente conversar e não suporto o fato de nunca termos realmente conversado sobre isso.

"Porque eu não consegui nem mesmo me sentir atraído por uma garota depois que você foi embora quando o que eu mais queria era mostrar o quanto eu estava por cima.

"Porque quando você chegou aqui eu vi a possibilidade de entender que merda aconteceu entre a gente quando terminamos. Porque...

"Porque eu queria saber o motivo de você ter ido embora e não ter mais falado comigo e porque isso sempre me magoou."

— Porque eu... Eu não aguentava mais a sua infantilidade. Sua dependência por seus pais. Sua dificuldade em aceitar mudanças. Eu esperei tanto, Rony... Tanto.

— Do que tá falando? — perguntou claramente irritado e curioso — Esperou pelo quê?

— Nada, Rony. Não estou falando de nada. Simplesmente não quero falar sobre esse assunto. Não quero falar sobre nada com você — subiu as escadas com rapidez e ele foi em seguida.

— Mas eu quero. Eu quero resolver essa situação. Não vou ficar brincando de gato e rato com você o resto da minha vida— apressou o passo e entrou no quarto da moça antes que ela fechasse a porta.

— Você quer saber mesmo? — ela perguntou retoricamente, em um tom totalmente esganiçado, mexendo os braços com nervosismo — Tá bom então, eu vou dizer.

"Eu queria sim, Rony, admito. Queria fazer amor com você. Não teria feito se não quisesse e você sabe muito bem disso. Mas isso foi um erro.

"Não somos nada, não temos nada e nem teremos nada. Você vive a sua vida e eu vivo a minha. Isso não pode e não vai acontecer de novo, entendeu?"

— Não, não entendi e nem aceito — ele a encarou e ela reparou que os olhos dele estavam dilatados.

Hermione não teve tempo de responder. O ruivo a tomou novamente em seus braços e os dois se beijaram intensamente, com pressa.

Ela sequer ofereceu resistência ao aperto do rapaz e se entregou à situação que se colocaram imediatamente.

Em poucos instantes estavam novamente sobre a cama da garota e, assim como ela imaginou assim que acordou, continuaram o que haviam iniciado durante a noite.

Rony era intenso em seus beijos e toques, e cada novo sussurro ou gemido da morena lhe causava um turbilhão de emoções que serviam como combustível para que ele se empenhasse ainda mais.

Hermione só queria que aquele instante não acabasse. Tinha a convicção de que aquilo não poderia ser bom para os dois.

Sabia que estavam se enforcando na própria corda que estavam desenrolando, mas se permitiu amar novamente e ter em seu corpo o mix de sensações que apenas aquele ruivo era capaz de despertar.

Depois daquele momento, ambos estavam deitados sobre a cama, olhando para o teto, sem roupas e com a respiração audivelmente alterada.

Em silêncio, Rony olhou para ela, mas ela não fez o mesmo. Ele respirou fundo, claramente irritado, e levantou.

Ainda nu, pegou suas peças de roupas espalhadas pelo quarto e se encaminhou até a porta.

Ela sentia o coração apertado. O peito batia rapidamente. Queria que ele ficasse, mas a incerteza e o medo do que poderia acontecer se fizesse isso lhe deixava desesperada.

Ela olhou para ele e contemplou aquele rapaz que a conquistou ainda no vagão do primeiro ano escolar.

Ele tinha a mão sobre a maçaneta da porta e antes que ela realmente pudesse pedir que ele ficasse e admitisse que estava errada, ele falou:

— Se você acha que é melhor a gente esquecer, então vamos esquecer. Fazer de conta que não houve nada e passar uma borracha em nossas lembranças. Bom dia.