Durante escrita por Nina


Capítulo 1
Antes


Notas iniciais do capítulo

Eu totalmente dedico (olha a moral) essa história a minha melhor amiga, como um presente um pouco atrasado de aniversário, porque se ela não fosse a personificação perfeita do que eu imagino Lily Evans em um Universo Alternativo, eu jamais teria conseguido escrever essa história.



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ANTES de conhecer James Potter, Lily vivia a vida contando com riscos que poderiam vir a acontecer. Era meticulosa, responsável e politicamente correta. Suas roupas eram sempre escolhidas no início da semana, e seu cabelo quase nunca era visto em penteado diferente do meio-preso. Ela era comum, diária, e quase apagada.

Eu digo quase porque, apesar de qualquer falha em sua personalidade, Lily Evans era uma das meninas de beleza mais excêntrica que a maioria das pessoas já teve o prazer em conhecer. Seus cabelos eram cor de acaju, macios e brilhosos, e contrastavam de maneira bela com os olhos exuberantemente verdes e as sardas teimosas em seu rosto afinado.

E não, ela não era daquele tipo de menina que simplesmente não conseguia enxergar o seu tipo de perfeição. Ela era perfeita dentro de seus ajustes, em seus padrões e gostos. Vestia-se com classe, cuidava semanalmente dos seus fios e sempre tratava da pele com cremes e maquiagem. Ela sabia como ser vaidosa.

E diária.

Sempre a mesma coisa.

E, mesmo assim, James era capaz de enxergar nela a pessoa mais misteriosa, intrigante e divertida de todas.

ANTES de conhecer Lily Evans, a vida de James era intensa, e essa era a melhor parte. Não que o rapaz vivesse em festas, ou curtisse mais o momento do que o sentimento – na verdade era justamente o contrário. James Potter parecia estar sempre sentindo as coisas ao seu redor. Sentindo com profundidade o amor pelos amigos, pela família e pelos esportes como o futebol.

E se ele ia para festas, não era para beber até cair ou apostar com Sirius quem iria ficar com mais meninas – isso Sirius fazia com os outros garotos. Se ele ia para festas, era para sentir o quanto de felicidade ele poderia desfrutar com as pessoas ao seu redor. Ele amava, ele vivia.

Diferente de Lily, que apenas planejava.

Como qualquer clichê, o cenário em que se conheceram foi a escola. Sim, a Hogwarts High School. O lugar que dispensava quem você era e qual o seu grau de capacidade para valorizar as futilidades daqueles ricos alunos, como dinheiro e roupas de marca. Uma das melhores escolas, todos tinham conhecimento disso, mas poucos sabiam tirar proveito.

Lily sabia, e James também.

Era uma tarde chuvosa de outubro quando Marlene McKinnon, a melhor amiga de Lily, decidiu mudar o rumo da vida de James para sempre.

“Tenho essa amiga, a Lily” ela começou, e a única coisa que James pensou naquele momento era se conhecia ou não a garota à sua frente. “E ela precisa viver”.

“Quem é você?” ele deixou a pergunta escapar. “Desculpe se fazemos alguma aula juntos, eu sou apenas péssimo com nomes. Ou rostos”.

“As pessoas me chamam de Mackie. Por causa de McKinnon, meu sobrenome. Marlene McKinnon” ela era atrapalhada com as palavras, e fazia James sorrir. “E você é James Potter, fazemos biologia juntos”.

Sim” ele lembrou. “Você é a garota dos desenhos”.

“Sou, mas não é esse o assunto da conversa”.

“Estava falando sobre Lily?”.

“Tenho observado você, Potter. Consideravelmente popular. Relativamente bonito. Aparentemente legal”.

“Gosta de palavras que terminam com mente?”.

“Você é perfeito para Lily”.

“Perdão?”.

“Ela é essa garota que precisa urgentemente de alguém que a instigue. Que a desafie. Que a provoque. Alguém que discuta com ela e divirja com ela. Vocês parecem opostos o bastante para serem iguais”.

E James se perguntou se Marlene era louca.

“Ela é ruiva” continuou a menina. “Não muito difícil de achar, na verdade. Está na aula de química avançada, que eu sei que você também está. Tudo o que eu peço é que preste atenção nela”.

E ele prestou.

Ele observou Lily de longe durante a aula de química na manhã seguinte. Seus olhos eram atentos ao quadro, mas nunca ao professor. A cada observação adicionada pelo mestre, ela tomava nota em seu pequeno caderninho rosa. Ela tinha mania de colocar os cabelos para o lado esquerdo quando estava distraída. Em cima da sua mesa, sempre eram dispostos, em ordem, caneta azul, preta, vermelha, lápis um, lápis dois, borracha e corretivo. O estojo fica em seu colo, e ela sempre usava todas as cores que podia em suas anotações.

Ela tinha TOC. Balançava a perna com frequência, mordia as bochechas com frequência e roía as unhas com frequência.

Não foi a última vez que James perdeu seu tempo olhando aquela interessante garota ruiva e de olhos verdes.

Lily, por outro lado, sempre soube quem James Potter era. Não que gostasse dele. Na verdade, Lily só gostava de duas pessoas no Ensino Médio: Marlene McKinnon e Severus Snape. Eles eram seus amigos desde a infância, e ela não suportava a ideia de criar novos laços, principalmente com pessoas como aquelas que eles eram obrigados a conviver. Fúteis e mesquinhos, e nem mesmo James estava livre de tal julgamento.

Por isso, quando o Potter se aproximou dela uma semana perto das férias de Natal, seu instinto rapidamente a deixou alarmada. Odiava sair da zona de conforto.

“Então é com você que eu falo sobre o jornal da escola?”.

Lily quase suspirou aliviada. Eram apenas assuntos profissionais.

“Eu mesma” seu sorriso era simpático.

Do outro lado, James se sentiu perdido com aquele sorriso.

“Eu gostaria de participar”.

“Sinto muito, estamos lotados”.

“Tenho uma sugestão para o projeto” ele insistiu, antes que ela perdesse o interesse em sua presença.

“É Potter, não é?”.

“Costumam me chamar de Jimmy, na verdade”.

“De qualquer modo, pessoas de minha confiança entram no jornal. Eu levo-”.

“Leva muito a sério” ele se apressou em completar. “Gosto de escrever contos. Acho que seria interessante adicionar essa coluna ao jornal”.

“Quer escrever contos para o jornal da escola? Você?”.

“Digitei esse aqui” ele entregou um papel, que só então Lily percebera estar em suas mãos. “Se ajuda a leitura, é sobre Emmeline Vance”.

Lily, contrariada, pegou a história que, mais tarde, havia sido o marco inicial para o furacão que devastaria a vida organizada da ruiva.

“Darei a resposta amanhã” ela prometeu.

Antes de James, Lily era contra mudanças. Não acreditava que o jornal precisasse de adições em seu conteúdo, mas era justa e leu o que o rapaz havia escrito como prometido. Era bom. Um bom conteúdo, com ironias e jogo de palavras que satirizava a situação da garota Vance na escola, sem citar nomes. Tinha visão de mundo, tinha opinião, e agradou Lily.

E, quando Lily contou para James que eles poderiam tentar, ele soube que, em qualquer outra situação, antes dela, ele jamais mostraria o que escrevia para alguém.

Se apaixonar por alguém é algo que acontece aos poucos e com James não foi diferente. Foi definitivamente aos poucos, cada dia beirando mais o descontrole, cada dia se pegando a gostar de uma pequena parte de Lily, até que gostasse dela inteiramente.

Mas a percepção do fato... Ah, aí é outra história. Teve um momento chave, depois do Natal. Era noite de ano novo, na verdade, e de todos os lugares que James esperava ver Lily, definitivamente não era em uma festa, com bebidas e tudo mais.

Ela parecia diferente. Espontânea, de um jeito que ele jamais vira. Ela sorria, gargalhava, até, para uma moça talvez mais velha e muito parecida com ela, exceto pela cor dos cabelos, que eram loiros. Talvez dos olhos, James não tinha certeza.

Lily estava tão linda que James foi incapaz de não passar a noite a observando e foi só depois da meia noite que ele decidiu se aproximar. Não que estivesse sem coragem, mas a garota era estranha demais para que aceitasse de bom grado a aproximação de alguém como James.

Era preciso ter calma.

“É agora que eu desejo feliz ano novo” ele sorriu, oferecendo um copo de refrigerante para ela, que aceitou abaixando o olhar.

“Você por aqui” murmurou baixinho, sem esconder a surpresa na voz. “Frase clichê para se dizer”.

“Ficaria legal, se eu estivesse escrevendo um conto” ele contou. “Sabe, duas pessoas se encontrando em uma festa, então ela fala você por aqui. Parece interessante, e eu inclusive já tenho um final”.

“Qual seria?”.

“Uma dança”.

“Não”.

“Por que não?”.

“Por que sim?”.

“Tudo bem, sem danças” ele cedeu. “O que gostaria de fazer?”.

“Com você? Nada”.

“Vamos lá, é noite de ano novo” ele insistiu.

Depois de muito pensar, Lily soltou:

“Na verdade, estou há meia hora procurando alguém para ir comigo até a praia. Meu pai não me deixa ir sozinha” ela explicou. “Antiquado, não é?”.

“Eu vou”.

“Encontre-me na saída dos fundos, vou avisar para ele”.

E, com aquela frase, dita de forma tão próxima ao seu rosto, ele soube que ela havia ingerido álcool. Lily Evans, a garota certinha e perfeita de Hogwarts, havia bebido. James sabia que ela estava comunicativa demais para ser apenas sorte.

“Trouxe refrigerante” ela mostrou, dando um copo para ele.

“Você parece diferente”.

Ela soltou uma risadinha.

Eu bebi” sussurrou perto do ouvido dele, como se aquilo fosse algo errado. Um segredo. “Champanhe!”.

“E agora está com refrigerante?”.

“O negócio de beber é saber quando parar; é o que Mackie sempre me disse” falou Lily. “Estava me sentindo alegre demais, então parei.

“É a primeira vez?”.

“Sim. Emocionante, não é?”.

James riu.

E entendeu o que Marlene dizia sobre Lily precisar urgentemente ser instigada. Ela precisava viver. Precisava ser divertir. Precisava ser jovem. O brilho da adrenalina dava um toque especial em seu olhar, e James sabia que ela precisava ser assim a sua vida toda, não apenas em uma noite de ano novo quando seu pai permitira que ela desse alguns goles em um copo de champanhe responsavelmente.

Lily Evans precisava amar.

E, naquela noite, James a beijou. E, naquela mesma noite, Lily o empurrou.

Mas ele estava apaixonado, e ela, perdida.

O recesso escolar havia acabado e não demorou para que naquela primeira segunda-feira de janeiro James procurasse pela sua garota. Sabia que havia errado, e era inteligente o bastante para contornar o que havia estragado e acertar dessa vez.

“Evans!” ele chamou, e ele gostou de ver que ela ficara vermelha ao ouvir o sobrenome sair da boca dele.

“Sim?”.

“Preciso de ajuda com química” ele disparou. “Sei que errei com aquele beijo, e eu peço desculpas, mas estou desesperado com a matéria e não estaria procurando a aluna mais brilhante do nosso ano se não fosse urgente”.

Demorou quinze segundos – James contou – para que ela parasse de analisá-lo e falasse:

“Quer que eu acredite que você, que participa da aula avançada, está tendo dificuldades urgentes?”.

“É com a questão desafio” ele explicou. “Estou louco tentando, e tentando”.

“Bem, você deveria tentar de outra maneira” ela disse e, embora ela sorrisse, sua voz estava ácida. “Também não consegui essa, sinto muito”.

Foi naquele dia que James passou a chamar Lily mentalmente de garota-esquiva, e, com isso, era um desafio pessoal.

Antes de Lily, seu coração estava forte o bastante para nunca desistir de um desafio pessoal.

E, antes de James, Lily não tinha nada que bloqueasse seu coração de ser preenchido.

“O que você fez?” perguntou Marlene, no meio do mês.

“Como assim o que eu fiz?”.

“Eu confio em você a tarefa de mudar a vida da minha amiga, e você simplesmente faz com que ela odeie você?”.

“Ela me odeia?” James perguntara, magoado.

“Bem, não” falou Marlene, após ponderar. “Mas ela não sossega! Passa dia, passa noite, e ela está falando de você. Reclamando! Ah, James Potter é um irresponsável. Ah, James Potter escreve de um jeito clichê. Ah, James Potter não entende que eu não estou a fim de ser amiga dele”.

James só gostaria de pedir que ela calasse a boca.

“Ela é tão teimosa” exasperou-se Marlene, sentando-se com o rosto entre as mãos.

“Por que insiste tanto nisso?”.

“Você a observou, não observou?” ela perguntou, fazendo James assentir. “Quero o melhor para ela. Ela é minha melhor amiga, sabe? Ela precisa que alguém a mexa com o coração dela”.

E foi naquele dia que James viu o quanto Marlene era emotiva, porque ela começara a chorar.

“Marlene, escute” chamou James. “Existem chances... Quero saber de você... Mesmo que ela fale isso tudo de mim, você acha que ela pode, eu não sei, se apaixonar por mim algum dia? Você a conhece como ninguém, não é mesmo?”.

“Sim. Digo, sim, conheço, e sim, talvez você tenha chances”.

“Talvez eu esteja apaixonado por ela” ele contou, o que era uma mentira. Ele já estava, e completamente. “Mas eu vou precisar da sua ajuda”.

“Acha que eu já não venho ajudando? Falo para ela sobre você o tempo inteiro”.

“Não esse tipo de ajuda” ele falou. “Quero que me fale sobre ela. O que ela gosta, o que ela detesta, o que estou fazendo de errado”.

E, depois que Marlene passou quase duas aulas daquele dia, falando sobre quem Lily Evans era de verdade, sobre situações, aventuras e desventuras, James soube o que precisava fazer.

Antes de Lily, ele jamais pensara em conhecer os pais de alguma menina da escola.

Antes de James, nenhum garoto havia sido convidado para jantar com sua família.

Contudo, ali estava ele. Sábado, 29 de Janeiro, véspera do aniversário de Lily Evans, às duas horas da tarde. Ele vestia uma despojada camisa vermelha, e fizera questão de, pela primeira vez na vida, pentear os cabelos.

Antes de Lily, ele também não via seu penteado estiloso como o de alguém que havia acabado de sair de uma montanha-russa.

Mas ali estava ele, não é mesmo?

“James?” Lily perguntara, espantada, ao vê-lo em sua porta. “O que você está fazendo aqui?”.

Ela diz que não, mas gosta de uma ousadia, ele se lembrou das palavras de Marlene.

“O trabalho de inglês. Você já leu o livro?”.

“Não estou entendendo, eu-”.

“Ia fazer com a Marlene, mas ela está a fim do meu amigo, Sirius Black, você sabia? Ela ficou bem feliz em trocar de dupla comigo”.

“Seu atrevido!”.

“Lily?” James ouviu a voz de outra garota, talvez um ou dois anos mais velha que Lily. “Ora, quem é você?”.

“A dupla dela para o trabalho de inglês” disse James, com um sorriso. “E você?”.

“Irmã dela” ela respondeu. “Bem, entre, está frio aí fora”.

“O quê?” a voz de Lily era estridente quando James, mais do que feliz, entrou em sua casa. “Tuney!”.

Obviamente, há um limite para tudo, então saiba onde parar com as provocações, continuara Marlene.

“Se for incômodo, posso voltar outra hora” disse James.

Lily bufou.

“Você ao menos sabe como é para fazer o trabalho?”.

Marlene estava certa, afinal, mesmo que Lily tivesse passado a tarde inteira resmungando coisas sobre James.

“Acho que terminamos” disse James.

Mas Lily pensava outra coisa naqueles últimos minutos de trabalho. Ela se virou bruscamente, deixando de ter como o foco da visão o trabalho, para olhar diretamente nos olhos castanho-esverdeados de James.

“O que você quer, afinal?” Lily perguntou.

Em seus pensamentos, a menina pensava o pior de James. Não gostava dele, não ia com a cara dele. Ele era egocêntrico, egoísta, arrogante, e todas essas outras coisas. Tinha certeza que ele estava a usando apenas como objeto pessoal de diversão, que era idiota, imaturo, e tudo que Lily sempre detestou.

Porém, no seu interior, alguns sentimentos mais obscuros a preenchiam. Medo. Ela não sabia se medo de estar certa, ou medo de estar errada. O medo a fazia criar toda aquela visão a respeito de James, medo de cair por ele e estar certa. E, se estivesse errada, então, ele seria a causa da sua desordem.

Já estava sendo, de qualquer forma.

No profundo do seu coração, Lily sabia que James tinha algum valor. Bonito, pelo menos, ele era. Não tinha o melhor corpo de Hogwarts, nem músculos excessivamente definidos, mas não era desleixado, e ela podia ver. Ele era magro e alto, porém forte. Tinha cabelos de aparência sedosa e, por Deus, ela gostava mais do que deveria de como os seus óculos caíam em seu rosto.

“Como assim o que eu quero?” questionou James, sem entender.

“Esqueça” ela abaixou os olhos.

“Lily!” sua mãe chegara ao escritório. “Petúnia disse que tinha mesmo um rapaz com você aqui, fazendo um trabalho”.

“James Potter, senhora” apresentara-se James, polidamente.

“Potter, não é mesmo? Não seria o filho de Charlus?”.

“E Dorea”.

“Ele foi o meu professor de francês, olhe que coincidência!” exclamou a mãe de Lily. “Por que não fica para jantar, querido? Teremos massa essa noite”.

Lily gostaria de mandar a sua mãe calar a boca, mas, mesmo assim, ela foi educada ao se conduzir para a sala de jantar com James ao seu encalço – e, consequentemente, para um dos minutos mais tortuosos da vida de Lily até então.

“Lily nunca me contou que era sua amiga” disse a Sra. Evans, levando os pratos para a mesa.

James prontamente tomou os pratos da sua mão, sendo prestativo e educado.

Antes de James, um ato daquele teria feito Lily suspirar, mas ela só pensava no quanto ele era bajulador.

“Acho que ela não me considera um amigo” disse James, olhando diretamente em sua direção. Lily bufou.

“Somos colegas” ela contou. “Apenas colegas.”.

“Vejo que são. Gosta de suco de laranja, querido?”.

“Sim, por favor.”.

“Então, se são apenas colegas, posso saber como acabou em nossa casa?” perguntou a senhora, virando-se para Lily em seguida: “Vá chamar sua irmã para o jantar”.

Ela obedeceu, deixando James sozinho para responder aquela pergunta. Deu graças a Deus que aquele era um dos dias que seu pai chegava tarde em casa, e que não teria chance de interrogatórios constrangedores, muito menos insinuações na direção do Potter.

Quando ela e Petúnia sentaram-se à mesa, o prato de James estava servido, e ele terminava de contar a mãe de Lily uma história que a menina só pegara o final:

“Então anda sendo bem complicado para a minha mãe” ele falava. “Ajudo no que posso, mas admito que às vezes é mais fácil apenas sair de casa”.

Lily franziu a testa.

“Meu tio-avô também teve AVC” contou a mãe de Lily. “Charlus é forte, passará por essa bem”.

James se limitou a assentir, e Lily entendeu o que se passava. Recusava-se a sentir pena dele, mas era quase inevitável. Nunca fora capaz de ver James como alguém vulnerável. Contudo, ali estava ele.

“Segundo lugar na Olímpiada de Biologia?” espantou-se a Sra. Evans em algum ponto da conversa. “Isso é fantástico, James!”.

“Perdi as inscrições da última olímpiada” lamentou-se Lily, em uma das poucas vezes que se pronunciara naquele jantar.

“O ato mais irresponsável da vida dela” brincou Petúnia, deixando Lily corar.

James se exibia sozinho, ela tinha a família para fazer isso por ela.

“Se a Lily tivesse participado, tenho certeza que teria sido uma concorrente difícil de abater”.

“Tenho certeza que sim” James sorria em sua direção. “Mas esse ano teremos novamente, posso lembrar a Lily de fazer”.

“Não é necessário” garantiu a menina. “Eu já fiz. As inscrições já abriram”.

E, sendo forçada a ter um bom comportamento perante a família, Lily teve a primeira conversa com James, onde foi capaz de conhecer, mesmo que um pouco, quem era aquele popular garoto da sua escola. O que escondia aqueles óculos de armadura marota, afinal de contas?

Logo, enquanto ele estava no banheiro, minutos antes de ir embora, Petúnia se aproximara de Lily e sussurrara em tom de fofoca:

“Mamãe gostou dele. Ele é um ótimo rapaz, Lily, aproveite”.

“Não há nada para aproveitar” ela mentira, revirando os olhos.

Do lado de fora da casa, onde Lily fora arrastada pela boa educação para deixar James no portão, ela pensava nas últimas horas. Antes dele, ela jamais ouvira sua irmã se interessar em sua vida, aparentemente, amorosa. Antes dele, ela nunca se sentira tão bem depois de um jantar.

Antes dele, ela nunca se sentira tão nervosa na presença de um ser humano.

“Saia comigo” ele pediu, parando na calçada. “Saia comigo, Lily Evans”.

“Bem” ela começou. “Antes eu diria não sem hesitar”.

“E agora?”.

“Agora preciso de um tempo para considerar o convite” ela falou. “Me convença”.

E o sorriso de James foi o maior de todos.

Porém, Lily Evans era mais complexa do que isso. Insegura, inconstante, e um reboliço de pensamentos. Algumas horas de pensamento lógico depois, ela chegou à conclusão de que seria uma péssima ideia, além de perda de tempo, sair com aquele garoto.

Era apenas uma ilusão que ela não cometeria o erro de cair.

Antes de Lily, James levara poucos foras na vida, mas nenhum deles havia sido tão doloroso.

“Por quê?” ele perguntara.

“Porque não gosto de você” ela dissera, e parecia estar falando com sinceridade. “Porque você representa tudo o que eu gostaria de evitar na minha vida”.

E, mais uma vez, James a beijou. E, mais uma vez, ela o empurrou.

“Não se atreva” rosnou a menina. “Nunca mais”.

Levou algum tempo para que a mágoa de James passasse, mas não para que ele esquecesse Lily. Ele não esqueceu. Ainda pensava no quanto gostaria de fazer parte da vida daquela menina, e do quanto gostaria de compreendê-la.

Cerca de um mês depois, quando arrumou coragem para conversar com Marlene, a notícia que ouvira, porém, fora boa.

“Ela só precisa de um motivo” disse Marlene, em um suspiro cansado. “Você se afastou no primeiro obstáculo, um mês sem falar com ela depois de chamá-la para sair, o que acha que ela anda pensando?”.

“Ela mandou...”.

“E você, pelo visto, não entende nada de mulheres” resmungara Marlene. “Ela gosta de você, seu animal. Conheço-a como parte da minha vida, eu sei que ela gosta”.

“Gosta?”.

“Sim. Pare de ser um babaca e a chame para sair de novo”.

“Por que você não me disse antes?”.

“Achei que estava errada sobre você” confessou Marlene. “Pelo visto, não”.

James a abraçou.

“Eu juro que a primeira coisa que eu farei quando sair com Lily é juntar você e o Sirius”.

E Marlene ficara tão feliz quanto ele.

Foi necessária uma semana para que James planejasse tudo que precisava planejar para o seu primeiro e mais encantador encontro com Lily Evans. Não era preciso dizer que antes dela ele jamais havia feito nada parecido, porque, a essa altura, todos já perceberam que essa foi a primeira vez que James se apaixonara por alguém.

“Evans!” ele gritara seu nome, após a educação física.

Nervosamente, segurava um pedaço de papel em mãos, e em nada melhorou o olhar curioso, e ao mesmo tempo acanhado, que Lily lançou em sua direção ao se virar.

“Escrevi esse conto”.

“Você já não entregou o conto dessa semana?”.

“Não é para o jornal” ele esclareceu. “É para você. Quero que leia, e que depois aceite sair comigo”.

Lily, desconfiada, pegou o papel da mão do rapaz, assentindo e se afastando.

Ela não era totalmente fria. Se a comparassem com Marlene, é verdade que ela pareceria quase sem coração, tendo em vista que a amiga chorava até mesmo com alguns comerciais de TV. Lily não. Lily era daquelas que, por mais que tivessem um bolo entalado na garganta, ela não choraria. Não por não querer, mas por não conseguir.

Ela muitas vezes se perguntara qual era seu problema. Por que não fazia amigos com a facilidade que a maioria? Por que desperdiçava sua adolescência apenas estudando, e gostava disso? Por que ela não era capaz de expor os sentimentos como qualquer pessoa conseguiria?

Era o que James explicava no conto, que parecia ser mais uma declaração do que um conto, e uma das coisas mais sinceras que Lily tivera a chance de pôr as mãos em.

E, ali, ela chorou.

Chorou porque, pela primeira vez, não se sentiu uma garota complexa. Sentiu-se mais como alguém que tinha uma chance para a felicidade. Era fácil para os garotos olharem em sua direção, acharem seu rosto bonito, e se apaixonarem. Era fácil todos os meninos com quem ela já tentara conversar acabarem dando em cima dela, quebrando totalmente seu espaço, mas não era fácil achar alguém como James Potter.

Ela se sentiu única, e isso era o que provavelmente toda menina gostaria, inclusive alguém tão, aparentemente, fechada como Lily. Ela só era mais exigente que algumas outras pessoas, mas não significava que não gostaria de viver seu conto de fadas.

“Um lírio para outro lírio” foi o cumprimento de James na manhã seguinte, fazendo-a ruborizar. “Leu o conto?”.

“Li”.

“E então?”.

Ela gostaria de falar que foi a coisa mais linda que já fizeram por ela, mas ela não daria esse gosto a James.

“Aceito sair com você” decidiu. “Mas eu tenho que perguntar para a minha mãe e para o meu pai”.

“Você é superprotegida, não é?”.

“Você não faz ideia”.

Isso poderia ter deixado James assustado, mas ele era imprudente o bastante para ansiar a data que conheceria o pai de Lily Evans.

“Passo na sua casa no sábado, às oito horas da manhã”.

Ela assentiu, e, quando foi embora, James pôde voltar a respirar tranquilamente. Ele, de fato, não sabia se daria certo.

Mas deu, e no dia combinado, na hora combinada, depois de conseguir autorização com os pais, Lily Evans esperava sentada por James em sua calçada, com belas tranças ruivas uma de cada lado dos seus cabelos.

“Fiz uma lista de destinos para nós hoje” disse James, assim que ela se ergueu do chão para cumprimentá-lo. “O primeiro lugar é o Museu de História Natural de Londres, já foi?”.

“Uma vez, quando eu era muito pequena” respondeu Lily, e ele via o quanto ela se esforçava para esconder o sorriso animado. “Esse museu, as coisas que tem nele... É quase a minha vida”.

James riu.

Lily era exagerada, e era a primeira vez que ele via o brilho desse traço seu.

“Ótimo, então você vai aproveitar o nosso passeio”.

“Você está jogando baixo me levando para esse museu, Potter”.

“Quando eu era pequeno, meus pais me levavam quase todo mês” ele contou. “Eu sempre corria para a parte dos dinossauros, é fantástica”.

“A verdade é que eu não lembro muito”.

“Eu chorei da primeira vez que eu fui” confessou James, rindo. “Eles têm um jogo de luz sensacional, parecia real para uma criança de seis anos”.

“Claro, James, era quase um Jurassic Park”.

“Mas era” ele insistiu. “Estou falando para você”.

Chegando ao museu, os dois pareceram se encontrar e ter um assunto de conversa empolgante. Estudiosos e inteligentes como eram, foi fácil um completar o outro com informações desconhecidas. “Sabia que...?” e “Eu li em algum lugar...” foram as frases mais usadas, e, para quem achava que ir para o museu é chato, deveria tentar ir com James Potter, que conseguiu divertir Lily nas duas horas em que estiveram por lá.

“A moça deve ter ficado com raiva de nós dois” ela riu.

“Foi divertido. Não posso fazer nada se ela não sabia explicar as coisas direito para os turistas”.

“É, quem não sabe que pteurossauro é uma ordem de classificação, e não uma espécie?”.

“Ver você questionando a autoridade do museu me surpreendeu” revelou James. “Lily Evans menina certinha faria isso?”.

“Ela errou a ordem do sistema solar” o tom de Lily mostrava sua indignação. “É claro que eu faria”.

O Potter soltou uma risada.

“Você está com fome?” ele perguntou. “São doze e meia”.

“Estou dolorosamente faminta, na verdade”.

“Pobre Lily” ele brincou. “Tudo bem, o que acha de visitar Sirius Black?”.

“O quê?”.

“Ainda está confiando em mim, não está?”.

“Estou”.

“Ótimo”.

Não demorou mais do que doze minutos para que Lily e James chegassem a um pequeno apartamento perto do Museu de História Natural. Era pequeno e simples, e Lily se surpreendeu ao ver o local que Sirius morava.

“Ele saiu da casa dos pais” falou James, antes que Lily questionasse a respeito. “Preferiu morar em um lugar pequeno que não fizesse tanta bagunça”.

“Ah”.

Aqueles garotos tinham mais problemas do que ela imaginava.

“O que vamos fazer aqui, afinal?”.

“Cozinhar”.

“Cozinhar?”.

“Fazer o nosso almoço” esclareceu James. “Se eu não te conquisto com a minha beleza extraordinária, Evans, que eu conquiste pelo paladar”.

E, para a surpresa de James, em vez de reclamar como Lily sempre fazia, ela riu alto.

“Vamos provar, então” ela decidiu. “Seu amigo vai estar em casa? E por que não estamos indo para a sua casa?”.

“Sei que está doida para conhecer meu quarto, Lily, mas hoje não”.

“Engraçado, você” ela ironizou, vendo James apertar a campainha.

“Olá, James e garota do James” Sirius abriu a porta, sem camisa e com um belo sorriso de lado.

Lily corou, e James pegou uma blusa jogada de qualquer maneira na mesa da sala e lançar na direção do amigo.

“Vista-se, Sirius” ele mandou, fazendo o outro rir alto.

“Eu não sou a garota do James” resmungou Lily, desconfortável.

“Tudo bem, pombinhos” provocou Sirius, saindo do apartamento. “Não façam nada que eu não faria”.

Lily precisou revirar os olhos ao ouvir o som da porta se fechar.

“Tudo bem, vamos começar” determinou James, sendo ousado o bastante para tocar na mão dela e arrastá-la para a cozinha.

Ela não puxou de volta. Ela, na verdade, terminou de entrelaçar os seus dedos.

A receita, James dissera, era uma lasanha especial dos Potter, e que ele confiaria em Lily o segredo molho para que ela fizesse enquanto ele cuidava das outras partes. Ela riu, e James gostou de perceber que da metade do dia para o final, Lily parecia bem mais leve e alegre.

Sem perfeccionismos, sem chatices, sem reclamar, sem se afastar.

Terminaram alguns minutos e muita bagunça depois, com uma bela lasanha no forno. Sirius teria trabalho para arrumar aquilo, mas, naquele momento, eles só esperavam o almoço ficar pronto em frente à TV, zapeando os canais conversando distraidamente sobre assuntos aleatórios.

“Espera, deixa aí” mandou James, segurando o braço de Lily antes que ela mudasse de canal.

“Ah, James Potter, você acaba de perder pontos comigo”.

“Ora, por quê?”.

“Gosta da família real?”.

“Não” ele confessou. “Eu só queria ver a notícia. Acho, na verdade, tudo isso um nojo”.

Lily semicerrou os olhos.

“Explique-se”.

“Bem, eu sei que é nosso símbolo e tal, que devemos ser patriotas e amar nossa cultura, mas isso tudo é...” ele bufou. “Pessoas compram produtos por preços altíssimos só porque o príncipe tocou ali. Usam lencinhos bordados com o nome do príncipe, porque, oh, é o nome do príncipe. Usar lencinho James Potter ninguém usa”.

Ela soltou uma risadinha.

“Vire um escritor famoso e todos usarão” ela brincou. “Ou não”.

“Não” ele ria de volta.

“Eu concordo com você” falou Lily, cautelosa. “Eu sinto um carinho pela família real, e tenho orgulho dela, na verdade, mas odeio o que fazem em frente à mídia”.

“Odeio tudo que se aproveita da mídia para conseguir lucrar” ele disse. “Tipo as igrejas”.

“Você não acredita em Deus?”.

“Sinceramente?” ele perguntou, olhando nos olhos dela. “Não”.

“Eu acredito” contou Lily e, por um momento, ela voltara a ser a Lily-esquiva de antes. “E minha fé é das fortes”.

Era como se ela o desafiasse a discordar.

“A lasanha” ele tentou mudar de assunto. “Vou ver se está pronta”.

E, por mais que o clima tenha ficado tenso por alguns minutos, logo a frieza se dissipou. A lasanha estava deliciosa, e James conseguiu conduzir a diversão de volta.

“Você tem um próximo destino?” perguntou Lily.

“Vamos passar na casa do Remus, pegar a bicicleta dele e do pai, e vamos até um lugar".

Assim foi feito. Lily sorriu para Lupin já que, por mais que não fossem totalmente amigos, era com ele que ela procurava tirar algumas dúvidas que acumulava na escola, já que antes ela não sabia que James era tão inteligente.

O destino de James dava em um penhasco. Não muito alto, na realidade, e era a beira de uma cachoeira. Um dos lugares mais bonitos que Lily já conhecera. Tinha verde para todos os lados, e flores das mais variadas cores e tipos.

“Eu tiraria o sapato” aconselhou James.

“Por quê?”.

“Como por quê? Porque vamos pular, ué”.

“Está louco?”.

“Eu já pulei aí” ele garantiu. “Não tem pedras, não é fundo e não está tão gelado”.

“Pulou bêbado, provavelmente”.

“Nunca fiquei bêbado”.

“Acredito” ela ironizou.

“Estou falando sério”.

“Não tem jeito, você não vai me convencer a pular”.

“Lily, quantas vezes na vida você cometeu uma loucura?”.

“Eu já abri um salgadinho no supermercado e nunca paguei”.

James riu.

“Confie em mim” ele implorou. “Vamos, me dê a mão”.

“Não vou pular”.

“Nada de mal vai te acontecer. Cadê sua coragem, ruiva?”.

Ela olhou mais uma vez para o penhasco, depois para a mão de James, fechou os olhos, suspirou e tirou os sapatos. Ela ia. Mais uma vez naquela tarde, eles entrelaçaram os dedos e, prendendo a respiração, eles correram até a ponta e pularam.

Antes de James, Lily nunca se sentira tão sem certeza, tão sem, literalmente, chão. Antes de James, Lily nunca fora desafiada daquela maneira e, mesmo em situações de risco, ela nunca se sentira tão segura por alguém. Era perigo, mas parecia certo, porque, pela primeira vez, Lily sentia que estava viva.

E, antes de Lily, James nunca se sentira tão feliz em ver outra pessoa daquela maneira.

Lily ria sem parar quando emergiu, sem parecer acreditar no que havia acabado de fazer. James adorava o seu sorriso.

“Legal, não é?” ele perguntou.

Ali foi o momento certo, o sentimento certo, porque ela se aproximou dele o bastante para que suas respirações se entrecortassem.

“Pode me beijar agora, se quiser”.

James a beijou sem pensar duas vezes. Com o barulho da água respondendo aos seus movimentos, dos galhos se mexendo por causa do vento, e das batidas ritmadas dos seus corações, eles trocaram um beijo calmo, molhado e apaixonado.

Porque, sim, eles estavam completamente apaixonados um pelo outro. Lily agora sabia.


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Notas finais do capítulo

O que acharam dessa Lily e desse James e dessa história? Gostaram? Não? Qualquer comentário é válido.
Até o próximo! :)